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Processo n.º 64/2014. Recurso jurisdicional em matéria penal.
Recorrente: A.
Recorrido: Ministério Público.
Assunto: Medida da pena. Pena desproporcionada.
Data do Acórdão: 30 de Julho de 2014.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
A punição com pena de 10 (dez) anos e 9 (nove) meses de prisão, para crime cuja penalidade varia entre 4 e 16 anos de prisão, em que avulta um circunstancialismo atenuativo da culpa do arguido, é desproporcionada.
O Relator
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
  
I – Relatório
O Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base, por Acórdão de 17 de Janeiro de 2014, condenou o arguido A, pela prática em autoria material, na forma consumada e em concurso, de:
- Um crime de estupro, previsto e punível pelo artigo 168.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão;
- Um crime de violação agravada, previsto e punível pelos artigos 157.º, n.º 1, alínea a) e 171.º, n.º 4, do Código Penal, na pena de 10 (dez) anos e 9 (nove) meses de prisão;
  Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 12 (doze) anos de prisão.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 22 de Maio de 2014, julgou improcedente o recurso interposto pelo arguido.
Recorre, ainda o arguido, para este Tribunal de Última Instância (TUI), relativamente ao crime de violação na forma agravada.
Imputa ao acórdão recorrido:
  - O vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, por não ter apurado se havia nexo de causalidade adequada entre a ofensa à integridade física da 2.ª ofendida e a prática das relações sexuais entre ambos;
  - O vício de contradição insanável da fundamentação, por contradição entre os factos provados e a fundamentação probatória da matéria de facto na parte em que indica declarações da ofendida;
  - O vício de erro notório na apreciação da prova, por não haver provas que usou a violência ou ameaça grave para forçar a ofendida a ter relações sexuais;
  - Erro de direito por não ter atenuado especialmente a pena ao arguido, que não deveria ter sido condenado a pena superior a 3 anos de prisão, suspendendo-se a sua execução.
  O Ex.mo Procurador-Adjunto pronunciou-se pela improcedência do recurso.

II – Os factos
Estão provados os seguintes factos:
- A 1ª ofendida B nasceu em 13 de Outubro de 1997 e vivia à data do facto em Macau com os seus pais e frequentava o 8º ano no [Escola (1)].
- A partir de Dezembro de 2011, a 1ª ofendida começou a arranjar amigos através da rede social “FACEBOOK” e saiu muitas vezes com os amigos conhecidos através da internet.
- Na altura, a 1ª ofendida B inseriu 13 de Outubro de 1996 no seu “FACEBOOK” como a sua data de nascimento.
- Em 17 de Março de 2012, pelas 15:00, em casa de C, sua ex-colega de estudo, a 1ª ofendida foi ao rede social “FACEBOOK” através do telemóvel de C, e lá conheceu o arguido A.
- Na altura, o arguido utilizava sempre o nome A1 para arranjar amigas na rede social “FACEBOOK”.
- Naquele dia, na conversa com a 1ª ofendida B realizada no “FACEBOOK”, o arguido pediu à 1ª ofendida que fosse a casa dele para conviver.
- Na altura, a 1ª ofendida B não queria encontrar-se com o arguido, portanto disse-lhe que podiam encontrar-se num cibercafé, a hora e local seriam ser combinados posteriormente.
- Naquele dia à noite, a 1ª ofendida B não voltou para casa antes da hora combinada com os familiares e como tinha medo de ser repreendida pelos pais, acabou por decidir pernoitar em casa de C.
- Em 18 de Março de 2012, pelas 13:00, a 1ª ofendida B usou outra vez o telemóvel de C para entrar na internet. Na altura, a mesma recebeu através do “FACEBOOK” outra mensagem do arguido a perguntar porque não aceitou o convite dele.
- O arguido convidou de novo a 1ª ofendida B para a sua casa mas a mesma respondeu que precisava de acompanhar amigo e disse que ia se encontrar com arguido mais tarde.
- Na madrugada de 19 de Março de 2012, a 1ª ofendida B e a sua amiga D e o namorado desta, E, deslocaram-se a um cibercafé ao pé do McDonald´s em Fai Chi Kei a fim de entrar na internet. No cibercafé, a 1ª ofendida recebeu outra vez, mediante o “FACEBOOK”, a mensagem do arguido para convidá-la para a casa dele.
- Na altura, a 1ª ofendida B aceitou o convite do arguido, por isso o arguido deu-lhe o endereço da sua residência, sita na [Endereço (1)], e o número do telefone, dizendo-lhe para ir a casa dele.
- Naquele dia, pelo 0:30, dirigida por E, a 1ª ofendida B chegou à entrada do edifício onde ficava a casa referida do arguido. A seguir, a 1ª ofendida entrou sozinha no edifício e apanhou elevador para a casa do arguido, estando este à sua espera fora da porta da casa.
- O arguido conduziu a 1ª ofendida B ao interior da sua casa que era uma residência composta por duas fracções autónomas (D e E do 3º andar), com cinco quartos e duas salas. O arguido ocupava sozinho um quarto.
- Na altura, o arguido conduziu a 1ª ofendida B directamente ao seu quarto. A seguir, o arguido sentou-se na margem da cama e entrou na internet através de computador. E a 1ª ofendida B usou o telemóvel do arguido para jogar jogos e os dois começaram a conversar.
- Até às 2:00 da madrugada do mesmo dia, a 1ª ofendida B disse ao arguido que queria dormir, assim, deitou-se de lado na cama do arguido com as costas viradas para o mesmo e dormiu.
- Posteriormente, o arguido abraçou por trás a 1ª ofendida B com o braço esquerdo, acariciando com a mão esquerda o peito dela.
- A 1ª ofendida B acordou e virou-se para o arguido. Naquele momento, o arguido retirou a mão esquerda e continuou a conversar com a 1ª B ofendida na cama. Durante a conversa, o arguido abraçou sempre a 1ª ofendida B.
- Um pouco depois, o arguido acariciou de novo o peito da 1ª ofendida B por cima da roupa. Na altura, a 1ª ofendida B disse que não queria e empurrou o arguido, mas este não ligou e beijou-a na boca. Neste momento, a 1ª ofendida B não reagiu.
- Em seguida, o arguido puxou as calças de ganga e as cuecas da 1ª ofendida B para baixo, até aos joelhos. Na altura, a mesma disse por duas ou três vezes “não tires”, batendo, ao mesmo tempo, nas mãos do arguido. Depois, o arguido tirou o seu pijama e cuecas, introduziu, sem usar preservativo, o seu pénis erecto na vagina da 1ª ofendida B e começou com movimentos de vai e vem. Cerca de 10 minutos depois, o arguido retirou o pénis e ejaculou na barriga da 1ª ofendida B.
- F (2ª ofendida) nasceu em 10/03/99, à data do facto tinha apenas 13 anos de idade, estudava a 6ª classe e vivia com a sua família em Zhuhai.
- Em finais do mês de Janeiro de 2013, o arguido conheceu a 2ª ofendida F através do “FACEBOOK”. Posteriormente, por várias vezes conversou com a 2ª ofendida no “FACEBOOK”.
- Por volta das 9H00 do dia 2/02/2013, o arguido telefonou à 2ª ofendida F, convidou-a para ir à sua casa divertir, sita na [Endereço (1)], o seu objectivo era aproveitar essa oportunidade para ter relações sexuais com a 2ª ofendida. A 2ª ofendida aceitou ir à casa do arguido.
- Dado que a mãe do arguido estava em casa, por isso o arguido convidou a 2ª ofendida para ir passear a Zhuhai Gongbei China, tendo a 2ª ofendida F aceite o convite.
- Nesse mesmo dia, pouco depois, o arguido e 2.ª ofendida F deslocaram-se a Gongbei China através das Portas do Cerco. Por volta da meia-noite, a 2ª ofendida F queria voltar para a sua casa em Zhuhai descansar. Na altura, o arguido sugeriu à 2ª ofendida F para não regressar a casa e fazer companhia nas massagens, tendo a 2ª ofendida aceite a sugestão.
- Cerca da 1H00 da madrugada do dia 03/02/2013, o arguido levou a 2ª ofendida F à “casa de massagens” que fica em Gongbei, China, perto do “supermercado” e pediu ao empregado da casa de massagens para lhe arranjar um quarto duplo, a fim de ficarem os dois sozinhos.
- Em seguida, o arguido e a 2ª ofendida vestiram a roupa fornecida pela casa de massagens, a 2ª ofendida F com vista a facilitar as massagens despiu o sutiã. As massagens duraram cerca de 3 horas, os dois foram sucessivamente à sauna, posteriormente regressaram os dois ao quarto para descansar.
- Pouco depois, a 2ª ofendida F adormeceu na cama de massagens. A seguir, o arguido trancou a porta do quarto, juntou as duas camas de massagens, em seguida, deitou-se ao lado da 2ª ofendida F.
- Quando a 2.ª ofendida F adormeceu, o arguido beijou a orelha e o braço da 2ª ofendida F, fê-la acordar.
- Na altura, o arguido sugeriu fazer sexo com a 2ª ofendida F, mas ela recusou. O arguido não ligou, tornou a demonstrar que queria “fazer amor”, mas a 2ª ofendida F insistiu que não queria.
- O arguido ficou zangado, por várias vezes deu bofetadas na cara da 2.ª ofendida F, ela sentiu dores e medo. Durante o qual, a 2ª ofendida F tentou defender-se e gritar por socorro, mas o arguido, de imediato, com as duas mãos, deu-lhe palmadas no pescoço, virou-a de costas, encostou-a na cama, dando-lhe socos na parte das costas, a 2ª ofendida F sentiu dores e começou a chorar.
- Em seguida, o arguido despiu a sua roupa e ordenou à 2ª ofendida F para despir também a própria roupa.
- A 2ª ofendida F sentiu medo e ficou preocupada que se oferecesse resistência seria novamente agredida, por isso obedeceu às ordens do arguido, despiu a sua roupa.
- Naquele momento, a 2ª ofendida F disse que estava com menstruação, mas o arguido não ligou, usou o seu corpo, forçosamente abriu e levantou as pernas da 2ª ofendida F, sem usar preservativo, o arguido introduziu o seu pénis erecto na vagina da 2ª ofendida F e começou com movimentos de vai e vem. Cerca de 10 minutos depois, o arguido ejaculou na barriga da ofendida F.
- Após, o arguido ordenou à 2ª ofendida F para não contar a terceiros o facto da prática das relações sexuais entre ambos.
- À data do facto, o arguido sabia que provavelmente a 1ª ofendida B não completou 16 anos de idade. Porém, o arguido, abusando da inexperiência da mesma, seduziu-a muitas vezes para ir a casa dele nas altas horas de noite, com intenção de acariciar o corpo da 1ª ofendida, despir-lhe a roupa e fazer sexo com a mesma.
- À data do facto, o arguido sabia que a 2ª ofendida F ainda não completou 14 anos de idade e sem consentimento dela, usou a violência para obrigá-la a fazer sexo com ele.
- O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente a conduta supracitada.
- O arguido bem sabia que a sua conduta é proibida e punida por lei.
- Na audiência, foi provado ainda o seguinte facto:
- O arguido é primário, conforme o registo criminal.
Factos não provados:
- Realizada a audiência de julgamento, não foi considerado provado o seguinte facto descrito na acusação:
- À data do facto, o arguido sabia bem que a 1ª ofendida não completou 16 anos de idade.

III - O Direito
1. As questões a resolver
O arguido foi condenado pela prática de dois crimes. Neste recurso apenas está em causa o 2.º crime, o atinente à violação agravada.
As questões a apreciar são as suscitadas pelo arguido, atrás mencionadas.

2. Vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada
Segundo ao arguido o acórdão do Tribunal Judicial de Base enferma do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, por não ter apurado se havia nexo de causalidade adequada entre a ofensa à integridade física da 2.ª ofendida e a prática das relações sexuais entre ambos.
Não é exacto o alegado pelo arguido.
Pratica o crime de violação quem tiver cópula com mulher por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para realizar a cópula, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir (artigo 157.º do Código Penal).
Recordemos os factos provados na parte pertinente:
“- Pouco depois, a 2ª ofendida F adormeceu na cama de massagens. A seguir, o arguido trancou a porta do quarto, juntou as duas camas de massagens, em seguida, deitou-se ao lado da 2ª ofendida.
- Quando a 2.ª ofendida F adformeceu, o arguido beijou a orelha e o braço da 2ª ofendida F, fê-la acordar.
- Na altura, o arguido sugeriu fazer sexo com a 2ª ofendida F, mas ela recusou. O arguido não ligou, tornou a demonstrar que queria “fazer amor”, mas a 2ª ofendida insistiu que não queria.
- O arguido ficou zangado, por várias vezes deu bofetadas na cara da 2.ª ofendida F, ela sentiu dores e medo. Durante o qual, a 2ª ofendida F tentou defender-se e gritar por socorro, mas o arguido, de imediato, com as duas mãos, deu-lhe palmadas no pescoço, virou-a de costas, encostou-a na cama, dando-lhe socos na parte das costas, a 2ª ofendida sentiu dores e começou a chorar.
- Em seguida, o arguido despiu a sua roupa e ordenou à 2ª ofendida F para despir também a própria roupa.
- A 2ª ofendida F sentiu medo e ficou preocupada que se oferecesse resistência seria novamente agredida, por isso obedeceu às ordens do arguido, despiu a sua roupa.
- Naquele momento, a 2ª ofendida F disse que estava com menstruação, mas o arguido não ligou, usou o seu corpo, forçosamente abriu e levantou as pernas da 2ª ofendida, sem usar preservativo, o arguido introduziu o seu pénis erecto na vagina da 2ª ofendida e começou com movimentos de vai e vem. Cerca de 10 minutos depois, o arguido ejaculou na barriga da 2.ª ofendida F”.
Por conseguinte, ficou claramente provado que o arguido agrediu várias vezes a ofendida e só por isso ela tirou a roupa. Esta ainda tentou evitar a prática de relações sexuais, dizendo que estava com menstruação. O arguido não ligou e forçou a prática de tais relações, abrindo e levantando as pernas da ofendida.
Houve, portanto, nexo causal entre as agressões e o acto de a ofendida tirar a roupa. E foi nessa sequência que o arguido forçou a prática de relações sexuais.
De resto, tendo o arguido forçado o acto, abrindo e levantando as pernas da ofendida, e introduzindo o seu pénis erecto na vagina da ofendida, sempre seria irrelevante haver nexo de causalidade entre as bofetadas que deu à ofendida e a prática de relações sexuais, porque estas foram à força, com violência, independentemente de ela já estar coagida pelas agressões anteriores.
Improcede o vício suscitado.

3. Vício de contradição insanável da fundamentação
  Entende o arguido que o acórdão do Tribunal Judicial de Base está viciado de contradição insanável da fundamentação, por contradição entre os factos provados e a fundamentação probatória da matéria de facto na parte em que indica declarações da ofendida.
  São os seguintes os factos provados:
“- Em seguida, o arguido e a 2ª ofendida F vestiram a roupa fornecida pela casa de massagens, a 2ª ofendida com vista a facilitar as massagens despiu o sutiã. As massagens duraram cerca de 3 horas, o arguido e 2.ª ofendida foram sucessivamente à sauna, posteriormente regressaram os dois ao quarto para descansar.
- Pouco depois, a 2ª ofendida F adormeceu na cama de massagens. O arguido trancou a porta do quarto, juntou as duas camas de massagens, em seguida, deitou-se ao lado da 2ª ofendida.
- Quando a 2.ª ofendida F adormeceu, o arguido beijou a orelha e o braço da 2ª ofendida F, fê-la acordar.
- Na altura, o arguido sugeriu fazer sexo com a 2ª ofendida F, mas ela recusou. O arguido não ligou, tornou a demonstrar que queria “fazer amor”, mas a 2ª ofendida F insistiu que não queria.
- O arguido transformou-se violento, por várias vezes deu bofetadas na cara da 2.ª ofendida F, ela sentiu dores e medo. Durante o qual, a 2ª ofendida F tentou defender-se e gritar por socorro, mas o arguido, de imediato, com as duas mãos, deu-lhe palmadas no pescoço, virou-a de costas, encostou-a na cama, dando-lhe socos na parte das costas, a 2ª ofendida sentiu dores e começou a chorar.
- Em seguida, o arguido despiu a sua roupa e ordenou à 2ª ofendida F para despir também a própria roupa.
- A 2ª ofendida F sentiu medo e ficou preocupada que se oferecesse resistência seria novamente agredida, por isso obedeceu às ordens do arguido, despiu a sua roupa”.
  A fundamentação probatória da matéria de facto, em que o arguido detecta contradição com os factos provados atrás citados, é a seguinte:
  “Na audiência de julgamento, a 2.ª ofendida F prestou declarações, descrevendo os factos relativos ao acto sexual entre ela e o arguido que correspondem com a acusação, no qual, a 2.ª ofendida declarou que depois das massagens foram à sauna, na altura, já tinha pedido à 2.ª ofendida para ter relações sexuais, mas a ofendida recusou, ele começou a ralhar com a 2.ª ofendida que ela lhe enganou, por isso deu bofetadas na 2.ª ofendida, na altura, a ofendida não queria ter relações sexuais com o arguido, mas como tinha receio que o arguido lhe agredisse novamente, por isso, aceitou ter relações sexuais, a fim de demorar tempo, até o arguido adormecer, evitando ter relações sexuais com ele; posteriormente, como a ofendida queria dormir, por isso não foi imediatamente embora do quarto”.
  Salvo o devido respeito, não há nenhuma contradição.
  A ofendida não queria ter relações sexuais com o arguido. Mas como este se mostrava violento, dando-lhe bofetadas, ela disse-lhe que acedia a ter tais relações para ver se o arguido adormecia e evitava ter relações sexuais com ele. As declarações da ofendida foram, assim, produzidas em manifesta reserva mental, para enganar o arguido.
Improcede o vício suscitado.
  
  4. Vício de erro notório na apreciação da prova
  Alega o arguido que o acórdão de 1.ª instância enferma do vício de erro notório na apreciação da prova, por não haver provas que ele usou a violência ou ameaça grave para forçar a ofendida a ter relações sexuais.
  Trata-se de uma alegação estimável, mas inócua.
  Na verdade, o arguido tem uma versão diferente da ofendida, apresentando para tal um conjunto de mensagens alegadamente trocadas entre os dois.
  Mas isso não basta para integrar o mencionado vício.
  O conteúdo das mensagens não contradiz os factos considerados provados pelo Tribunal.
  O Tribunal Colectivo teve oportunidade de ouvir o arguido e a ofendida e de concluir no sentido mencionado.
  Não se vislumbra que tenha havido qualquer erro evidente e ostensivo, ou seja, erro notório na apreciação da prova.
  Improcede o vício suscitado.

5. Atenuação especial. Medida da pena.
Pretende o arguido a atenuação especial da pena. Argumentos:
- A ofendida disse-lhe que aceitava ter relações sexuais com ele;
- Ao entrarem no quarto das massagens, a ofendida tirou o sutiã, o que foi uma tentação para um rapaz de 22 anos.
Nenhuma das circunstâncias é particularmente relevante no sentido da diminuição forte da culpa do arguido.
É certo que a ofendida, após ter sido agredida pelo arguido, referiu-lhe aceitar ter relações sexuais com ele. Já vimos que tais declarações foram feitas com reserva mental. Mas não se mostra ter sido conhecida tal reserva pelo arguido e é este conhecimento que releva no presente contexto da culpa do arguido.
Mas, posteriormente, a ofendida mostrou muito claramente não querer ter relações sexuais com o arguido e, não obstante, este forçou-a a tal.
Quanto ao acto de tirar o sutiã, para vestir roupa própria, a fim de ser massajada, não foi esse acto que determinou o arguido à prática de relações sexuais. Provou-se que ele já tinha isso em mente quando convidou a ofendida a ir a sua casa, o que só não concretizou por a mãe estar em casa. De resto, os actos de exibição corporal não podem justificar a prática de violações.
Em suma, não existe o condicionalismo previsto no n.º 1 do artigo 66.º do Código Penal, para a atenuação especial: “existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena”.
Não obstante, afigura-se que a pena cominada, de 10 (dez) anos e 9 (nove) meses de prisão, para o crime em questão, se mostra desproporcionada dentro dos limites definidos na lei.
Na verdade, ao crime de violação agravada, previsto e punível pelos artigos 157.º, n.º 1, alínea a) e 171.º, n.º 4, do Código Penal, cabe uma penalidade de 4 a 16 anos de prisão.
A agravação de um terço nos limites mínimo e máximo da penalidade do crime de violação (3 a 12 anos de prisão) prevista no artigo 171.º, n.º 4, do Código Penal, é motivada pela idade inferior a 14 anos da ofendida.
Embora tal agravação se verifique com qualquer idade inferior a 14 anos, certo é que a ofendida estava a pouco mais de um mês de completar os 14 anos.
Os factos ocorreram num quadro de relacionamento amoroso entre arguido e ofendida, em que esta conhecia certamente a idade do arguido, não se mostrando muito saudável tal relacionamento, aceite por ela, dada a diferença de idades entre os dois, tendo 22 e 13 anos de idade.
A ofendida aceitou ir com o arguido para a casa de massagens, a uma hora (meia-noite) em que uma jovem da sua idade já devia ter regressado a casa.
Importa, ponderar, ainda a juventude do arguido.
Nos termos do artigo 65.º, n.º 1, do Código Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
Parece ajustada ao caso uma pena de 7 (sete) anos de prisão e, em cúmulo jurídico com a pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão cominada pelo crime de estupro, uma pena única de 8 (oito) anos de prisão.

IV – Decisão
Face ao expendido, julgam parcialmente procedente o recurso, condenando o arguido, pela prática em autoria material, na forma consumada, de um crime de violação agravada, previsto e punível pelos artigos 157.º, n.º 1, alínea a) e 171.º, n.º 4, do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão e, em cúmulo jurídico com a pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão cominada pelo crime de estupro, previsto e punível pelo artigo 168.º, n.º 1, do Código Penal, na pena única de 8 (oito) anos de prisão.
O arguido pagará custas, com taxa de justiça de 2 UC.
Macau, 30 de Julho de 2014.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai





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Processo n.º 64/2014