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Processo nº 486/2011
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 17 de Julho de 2014

ASSUNTO:
- Marca
- Capacidade distintiva

SUMÁRIO:
- Não é de admitir o registo duma marca que visa assinalar os serviços e produtos que têm o mesmo destino ou campo de aplicação duma outra já registada, com natureza idêntica, existindo os mesmos circuitos e hábitos de distribuição, e que é susceptível de induzir o consumidor médio em erro ou confusão, bem como gerar o risco de associação.
O Relator









Processo nº 486/2011
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 17 de Julho de 2014
Recorrente: A Limited
Entidade Recorrida: Direcção dos Serviços de Economia

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 31/03/2011, decidiu-se julgar improcedente o recurso judicial da ora Recorrente, confirmando a decisão do Departamento de Propriedade Intelectual dos Serviços de Economia, pela qual se recusou o registo da marca nº N/4XXX3, para a classe 43º.
Dessa decisão vem recorrer a Recorrente, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. A marca B não se destina a assinalar todos os serviços cobertos pela marca
2. A DSE e o Tribunal a quo deveriam, no mínimo, ter concedido a marca quanto aos serviços em que não há identidade ou afinidade, a saber: prestação de serviços de alojamento, serviços de agência de viagens e planeamento, reserva e serviços de informação sobre alojamento fornecidos por meios electrónicos;
3. O artigo 126° do RJPI dispõe que "quando existam fundamentos para recusa do registo de uma marca apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que este foi pedido, a recusa do registo restringe-se apenas a esses produtos ou serviços";
4. É relevante para os presentes autos saber se a marca B é uma marca de prestígio:
5. A marca B goza do estatuto de marca de prestígio na medida em que os consumidores já associam esta marca a outros ramos de actividade comercial e não apenas aos serviços de viagens e alojamento, o que lhe confere registabilidade imediata;
6. Não existe imitação de marca nos termos do artigo 215° nº 1 conjugado com o artigo 214° nº 2 alínea b) do RJPI;
7. O registo da marca anterior resultou de um acto objectivo de concorrência desleal bem como um acto de manifesta má fé;
8. Ao não revogar o despacho da DSE a sentença recorrida violou os artigos 214º, 215º nº 1, 216° do RJPI e o artigo 158° do Código Comercial.
Pedindo no final que seja revogada a sentença recorrida, concedendo consequentemente o registo da marca N/4XXX3.
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A Direcção dos Serviços de Economia respondeu à motivação do recurso da ora Recorrente, nos termos constantes a fls. 104 a 111 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Fica assente a seguinte factualidade pelo tribunal a quo:
1. Em 10 de Maio de 2010, a Recorrente requereu o registo de marca para actividade comercial e industrial na classe 43ª, que tomou o número N/4XXX3, assim reproduzida B
2. O pedido de registo foi apresentado para a classe 43º, cobrindo “prestação de serviços de alojamento incluindo mas não limitados a agendamento e reserva de alojamento; serviços de agências de viagens relacionadas com a obtenção de refeições e alojamento; planeamento, reserva e serviços de informação sobre alojamento fornecidos por meios electrónicos, incluindo contactos e comunicações com os clientes; fornecimento de alimentos e bebidas; restaurante, lounge, cafetarias, bar, serviços de catering para viajantes; sendo todas as acima referidas em relação aos serviços das companhias aéreas; café, hotéis, motéis, restaurantes para refeições leves, serviços de cantinas”.
3. Esse registo foi recusado pelo Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia (DPI) através de Despacho publicado no Boletim Oficial do dia 01 de Setembro de 2010.
4. A Companhia aérea “A” da Recorrente conta com uma frota de 133 aeronaves e tem voos diários para 145 destinos em vários países do mundo, tais como, Estados Unidos da América, Reino Unido, Alemanha, Zimbabué, Canadá, Japão, China, Tailândia e muitas localidades na Austrália.
5. A Recorrente criou em 2004 uma linha aérea subsidiária de voos “low cost”, denominada B, que oferece ao público voos domésticos na Austrália e no Sudeste Asiático, incluindo Macau.
6. A Recorrente começou a usar a marca B e como sinais identificadores dos serviços prestados pela companhia aérea low cost.
7. As marcas B e começaram a ser usadas desde 2008 em Macau e noutros países no Sudeste Asiático no que respeita aos serviços relacionados com o transporte aéreo.
8. A marca B da Recorrente encontra-se registada na China, Austrália, Indonésia, Japão, Região Administrativa Especial de Hong Kong, Costa Rica, República Democrática do Laos, Camboja, União Europeia, Índia, República Dominicana, Brasil, Canadá e Chile.
9. Encontrava-se já registada em Macau, para assinalar produtos ou serviços da classe 43ª, cobrindo “café, cafetarias, hotéis, motéis, restaurantes, restaurantes para refeições leves, serviços de bar e cantinas” a marca , sob o número N/4XXX8.
10. Por sentença proferida no processo nº CV1-11-0043-CAO (acção de anulação da marca N/4XXX8 intentada pela ora Recorrente com fundamento na notoriedade e prestígio da sua marca registanda), julgou-se a acção improcedente por não ter provado a marca registanda da Recorrente gozar em Macau de notoriedade e muito menos de prestígio.
11. A referida sentença transitou em julgado em 09/06/2014 (certidão de fls. 133).
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III – Fundamentos
Como fundamentos do presente recurso, a Recorrente invocou:
- a não verificação da imitação da marca N/4XXX8;
- o prestígio e a notoriedade da marca registanda; e
- a má-fé do registo da marca N/4XXX8.
Em relação aos dois últimos fundamentos, por sentença proferida no processo nº CV1-11-0043-CAO (acção de anulação da marca N/4XXX8 intentada pela ora Recorrente com fundamento na notoriedade e prestígio da sua marca registanda), julgou-se a acção improcedente por não ter provado a marca registanda da Recorrente gozar em Macau de notoriedade e muito menos de prestígio.
A referida sentença transitou em julgado em 09/06/2014 (certidão de fls. 133).
Nesta conformidade e por força do caso julgado, não se nos afigura ser necessário apreciar novamente aquelas duas questões nesta sede.
Pelo exposto, é de considerar como improcedentes os referidos fundamentos do recurso.
Resta assim a questão de se saber se existe ou não imitação da marca registada N/4XXX8.
Não há qualquer margem de dúvida em afirmar que a semelhança gráfica e fonética entre a marca registanda da Recorrente e a marca registada N/4XXX8 é evidente.
Ambas se destinam para assinalar os produtos e serviços da Classe 43.
Para a Recorrente, não obstante ambas as marcas se destinarem para a mesma classe de serviços e produtos, o certo é que os serviços e produtos que ela pretende assinalar com a sua marca registanda são diferentes dos da marca N/4XXX8, pelo que não se pode dizer existir imitação entre uma e outra.
Pois, entende que:
“..As classes não são secções estanques, isto é, pode haver imitação de marcas que se encontrem incluídas em classes diferentes. Portanto, quanto a lei refere – se destinem a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins – tal limitação é aplicável dentro da mesma classe ou entre classes diferentes desde que os produtos sejam, pelo menos, afins. Por outras palavras, o facto de uma marca cobrir produtos incluídos numa determinada, não impede que possa haver semelhança ou afinidade entre os respectivos produtos ou serviços.
O mesmo se poderá dizer em sentido inverso. O facto de duas marcas se encontrarem a assinalar produtos ou serviços na mesma classe não significa necessariamente que haja semelhança ou afinidade entre os respectivos produtos ou serviços...”.
Feita a comparação entre os serviços e produtos assinalados pelas duas marcas em referência, concluiu a Recorrente que os serviços a seguir discriminados, que a sua marca registanda visa assinalar, não se encontram identificados na lista de serviços da marca registada N/4XXX8:
- prestação de serviços de alojamento;
- serviços de agência de viagens; e
- planeamento, reserva e serviços de informações sobre alojamento fornecidos por meios electrónicos.
Nesta conformidade, defende que a DSE deveria ter concedido o registo da sua marca quanto aos serviços e produtos não assinalados pela marca registada N/4XXX8, ao abrigo do artº 216º do RJPI.
Quid iuris?
Antes de mais, cumpre-nos realçar que os serviços de viagem que a marca registanda da Recorrente visa assinalar são aqueles que estão relacionados com a obtenção de refeições e alojamento.
Salvo o devido respeito, entendemos que os três serviços supra descritos têm o mesmo destino ou campo de aplicação da marca registada N/4XXX8, com natureza idêntica, existindo os mesmos circuitos e hábitos de distribuição (obtenção de alojamento e refeições).
Assim, um consumidor médio, ao confrontar com os referidos serviços da Recorrente, pode ser levado a crer que os mesmos provêm ou derivam dos serviços da marca N/4XXX8, ou seja, tal como afirmado pela sentença recorrida, pode pensar-se “que existe uma qualquer relação de tipo jurídico, económico ou comercial entre as diferentes origens de produtos ou serviços finais”.
Ficam assim verificados todos os requisitos previstos no nº 1 do citado artº 215º do RJPI, concluindo-se desta forma que a marca registanda da ora Recorrente consiste na imitação da marca nº N/4XXX8, susceptível de induzir o consumidor médio em erro ou confusão, bem como gerar o risco de associação, pelo que o seu registo deve ser recusado nos termos do artº 214º, nº 2, al. b) do RJPI.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento do presente recurso, mantendo a sentença recorrida.
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Custas do recurso pela Recorrente.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 17 de Julho de 2014.


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Ho Wai Neng
(Relator)

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José Cândido de Pinho
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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Tong Hio Fong
(Segundo Juiz-Adjunto)





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