打印全文
Processo nº 579/2013
(Recurso Jurisdicional)

Relator: João Gil de Oliveira
Data: 17/Julho/2014

Assuntos:

- Poderes delegados; recurso hierárquico necessário
- Execuçao do acto para efeitos do n.º 2 do art. 28º do CPAC


SUMÁRIO:

1. Se no despacho de delegação e subdelegação de poderes se prevê expressamente que o acto com poderes delegados e subdelegados está sujeito a recurso hierárquico necessário, não é possível dele recorrer contenciosamente, não obstante alguma irregularidade na sua notificação, acabando o interessado por o compreender e estando ciente da sua natureza e necessidade de impugnação graciosa.

2. O pagamento voluntário de uma quantia tida por indevidamente auferida não integra uma situação de execução do acto para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 28º do CPAC.

O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira
Processo n.º 579/2013
(Recurso de Decisões Jurisdicionais)

Data : 17 de Julho de 2014

Recorrente: B (B)

Entidade Recorrida: Chefe de Departamento de Gestão de Rec. Do Corpo de PSP

    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    B B (XXXX XXXX), vem recorrer da decisão proferida pelo Mmo Juiz do Tribunal Administrativo que que julgou irrecorrível contenciosamente o acto posto em crise, do Exmo Senhor Chefe de Departamento de Gestão de Recursos do Corpo de Polícia de Segurança Pública, alegando, para tanto, em síntese, o seguinte:
    I. Havendo a decisão proferida no processo disciplinar que foi instaurado à recorrente, por ausência ilegítima pelo prazo de 11 dias seguidos, corporizada no Despacho de 05.09.2012 do Exmo. Senhor Secretário para a Segurança, que lhe aplicou pena de demissão, sido notificada por Aviso publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 49/2012, IIª S., Fls. 14784, de 05.12.2012, a mesma só pode ser executada 15 dias após a publicação - entendimento contrário faria indevida interpretação e aplicação do artigo 275.° do EMFSM.
    II. Porque assim é, foi o tempo de serviço da recorrente contado até à data de 20.12.2012 e publicado em ordem de serviço, que a recorrente havia sido abatida ao efectivo da CPSP, por haver sido demitida com efeitos a partir de 20 de Dezembro de 2012- interpretando e aplicando correctamente o referido art. 275.° do EMFSM.
    III. Posteriormente, foi o referido acto de contagem do tempo de serviço rectificado, pelo acto administrativo recorrido de 21.02.2013, considerando-se que a mesma havia sido abatida ao efectivo do CPSP a partir do dia 06.09.2012, dia seguinte ao da prolação do referido despacho punitivo, e em execução do referido acto publicada rectificação na Ordem de Serviço n.º 37 de 26.02.2013 do CPSP de que a mesma havia sido abatida a partir dessa mesma data e não a partir da data anteriormente mencionada - o acto recorrido padece de vício de violação de lei, por fazer indevida interpretação e aplicação do art. 275.° do EMFSM.
    IV. Deste acto foi a recorrente notificada, consignando-se que do mesmo podia apresentar reclamação, o que a recorrente fez no dia 28.02.2013, não havendo a mesma sido decidida no prazo legal, de 15 dias, cujo termo se verificou em 15.03.2013.
    V. Entretanto, como dito, o acto inquinado de vício de violação de lei foi executado através da publicação do seu abate ao Corpo da PSP com efeitos a partir de 06.12.2012 e através do acto que lhe foi notificado em 13.06.2013 de que devida restituir, no prazo de 15 dias, a quantia de MOP$101,829.70, de vencimentos e subsídios indevidamente recebidos após a referida data de 06.12.2013, sob pena de ser iniciado processo de execução, pelo que, a recorrente em 13.06.2013 já procedeu à restituição.
    VI. Ainda que, nos termos da lei, o acto não seja definitivo, estando sujeito a recurso hierárquico necessário, porque o mesmo por decisão administrativa já foi executado, pode o mesmo ser directamente sujeito a impugnação contenciosa - entendimento contrário faz indevida interpretação e aplicação do art. 28.°, n.º 2, do CPAC.
    VII. Ainda que, assim se não entenda, porque foi a indevida notificação do acto administrativo à recorrente que a determinou a interpor recurso contencioso do mesmo, para salvaguardar o seu direito de impugnação do acto, deve a entidade administrativa ser responsabilizada por não ter observado a lei que rege os termos das notificações dos actos administrativos, ainda e quando, repetidamente solicitada a fazê-lo, nomeadamente, assumindo as custas do processo, embora se saiba estar a mesma isenta do seu pagamento.
    Termos em que,
    Deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra, que considere o acto recorrível por ter sido, por decisão administrativa, sujeito a execução imediata, nos termos do art. 28.°, n.º 2, do C.P.A.C.,
    E, se assim, ser a mesma parcialmente revogada, condenando-se a entidade recorrida a suportar as custas do processo, por ter sido a sua incorrecta e indevida notificação do acto que deu causa ao recurso contencioso.
    
    O Exmo Senhor Procurador-Adjunto oferece o seguinte douto parecer:
    O douto aresto sob escrutínio entendeu rejeitar o recurso contencioso, visto ser o acto/objecto do mesmo irrecorrível, quer por se tratar de mero acto de execução de acto do Secretário para a Segurança, quer por se não apresentar como verticalmente definitivo.
    A recorrente, aparentando aceitar esta última asserção, alega que, "malgré tout", tal acto será contenciosamente recorrível, à luz do disposto no n° 2 do art. 28°, CP AC, por ter sido determinada a execução imediata, argumentando ainda com as deficiências de notificação de que foi alvo, desta feita tendo como pretensão designadamente a responsabilização da Administração, quanto a custas processuais.
    Não vemos como possa assistir-lhe razão.
    É inequívoco (bastando, pata tal, atentar no conteúdo dos n.ºs 1 e 5 da O.E. 122/2009 de 20/12/09, n.ºs 1 (6), 3, 4 e 5 do despacho do Secretário para a Segurança n.º 15212009 da mesma data e n.ºs 2, 5 e 6 do Despacho 2/CPSP/2010 do comandante do CPSP de 10/2/2010) que do acto alvo do recurso contencioso cabia recurso hierárquico necessário.
    Nesse sentido, porque carecendo de definitividade vertical, tal acto apresenta-se, efectivamente, como contenciosamente irrecorrível, independentemente de o mesmo poder ou não configurar acto de mera execução de despacho do Secretário para a Segurança, matéria que se apresenta, em nosso entender, altamente duvidosa, mas cujo escrutínio se mostrará prejudicado, constituindo, pois, inútil excrescência da douta decisão recorrida.
    De todo o modo, invocando o facto de, no seu critério, aquele acto ter sido sujeito a execução imediata por força de decisão administrativa, esgrime a recorrente com a recorribilidade do mesmo, à luz do preceituado no n.º 2 do art. 28°, CPAC.
    Porém, em parte alguma do procedimento divisamos qualquer decisão daquela natureza, isto é, a determinação da execução imediata do decidido.
    Se, ao arrepio das disposições legais a tal atinentes, antes de decorridos os prazos previstos como garantia dos particulares para reacção ao decidido, a Administração porventura "forçou" a execução, isto serão "contas de outro rosário", a contender, quiçá, com a ineficácia do decidido, ou indevida execução do mesmo, a não implicarem, naquilo que agora nos ocupa, a recorribilidade do acto em questão.
    Quanto às vicissitudes das notificações e respectivos contornos à recorrente, lastimando-se os atrasos, enganos e faltas de resposta pela Administração a tal nível, a verdade é que, situando-se a matéria em plano exterior ao acto, não contenderá, consequentemente, com a validade intrínseca do mesmo, o que não invalida que os prejuízos eventualmente advenientes de tais omissões ou erróneas informações não possam ser assacados a quem de direito, não se configurando, porém, este o meio processual idóneo para o efeito, como também se não vê que, por tais "atribulações" nas notificações empreendidas se possa satisfazer a pretensão da recorrente quanto ao não pagamento das custas processuais.
    Donde, nos termos preconizados, sermos a entender não merecer provimento o presente recurso.
    
    II - FACTOS
É do seguinte teor a decisão recorrida, daí constando a factualidade pertinente:
“Notificada de que o delegado do procurador junto deste Tribunal se pronunciou sobre a questão da recorribilidade do acto recorrido, deduzida em fls. 16 dos autos, a recorrente indicou que:
1. Já foi executado o acto praticado aos 21 de Fevereiro de 2013 pelo Chefe do Departamento de Gestão de Recursos do CPSP (vide a ordem de serviço de 26 de Fevereiro de 2013 do CPSP, constante da fls. 12 dos autos) e está preenchido o disposto do art.º 28.º do Código de Processo Administrativo Contencioso;
2. O acto referido do Chefe do Departamento de Gestão de Recursos foi praticado com competência conferida por despacho n.º 2/CPSP/2010 (10 de Fevereiro de 2010) do Comandante do CPSP, deste modo, o acto recorrido foi verticalmente definitivo;
3. A recorrente apresentou no dia 28 de Fevereiro de 2013 ao Comandante do CPSP a reclamação relativamente ao acto recorrido e emitiu-lhe ainda a notificação avulsa através do Tribunal Judicial de Base, foi informada no dia 19 de Março do mesmo ano de que a reclamação estava a ser julgada e não havia decisão definitiva (vide as fls. 10 a 11 e 41 a 50 dos autos);
4. A recorrente pediu no dia 21 de Março de 2013 ao Comandante do CPSP que fosse notificada do acto recorrido nos termos do art.º 70.ºdo Código de Procedimento Administrativo. Como não foi respondida e quase foi expirado o prazo da interposição de recurso contencioso, interpôs o presente recurso judicial no dia 25 de Março de 2013 (vide as fls. 51 e 51v. dos autos);
5. Por ofício n.º 1586/DRHDGR/2013P do CPSP (8 de Abril de 2013), respondeu-se à recorrente que a sua reclamação foi nula e desnecessária (vide a fls. 52 dos autos).
Com base nisso, pediu que seja julgada improcedente a excepção do Ministério Público e aceite o presente recurso contencioso, por razão de que o acto recorrido foi executado, mesmo estando sujeito a impugnação administrativa necessária.
*
Dispõe o art.º 28.º do Código de Processo Administrativo Contencioso:
“Artigo 28.º
(Precedência de impugnação administrativa necessária)
  1. São actos administrativos contenciosamente recorríveis os que, produzindo efeitos externos, não se encontram sujeitos a impugnação administrativa necessária.
  2. A sujeição a impugnação administrativa necessária não obsta, porém, à recorribilidade contenciosa dos actos quando estes sejam, por força da lei ou de decisão administrativa, de execução imediata.
  3. A recorribilidade de actos anuláveis, quando precedida de impugnação administrativa necessária, depende da observância, quanto a esta, do disposto no artigo 149.º, no n.º 1 do artigo 155.º e no artigo 156.º do Código do Procedimento Administrativo.
  4. A inobservância das disposições referidas no número anterior impede igualmente o interessado de presumir tacitamente indeferida a impugnação administrativa interposta.”
  De acordo com a disposição legal referida, normalmente, para satisfazer o pressuposto processual da recorribilidade do acto contenciosamente recorrido, o legislador exige que o acto recorrido produza efeitos externos e não esteja sujeito a impugnação administrativa necessária (vide o art.º 28.º n.º 1, 3 e 4). Excepcionalmente, pode-se aceitar recurso contencioso respeitante a actos administrativos verticalmente não definitivos, sempre que estes sejam, por força da lei ou de decisão administrativa, de execução imediata (vide o art.º 28.º n.º 2).
No caso, conforme a alegação da recorrente na petição inicial, é recorrido o acto administrativo praticado aos 21 de Fevereiro de 2013 pelo Chefe do Departamento de Gestão de Recursos e constante da notificação n.º 042/DRH/DGR/2013 (vide a fls. 11 dos autos), na qual havia o seguinte teor:
“……
  Por despacho proferido aos 5 de Setembro de 2012 pelo Secretário para a Segurança, foi punida a ex-guarda n.º 3XXXXX, B, com pena de demissão.
Para executar o despacho, após feita a investigação, de 18 de Setembro de 1991 até 5 de Setembro de 2012, a pessoa do notificando prestou serviços ao governo:

Prazo
Dias de serviços
Dias de serviços para efeitos de aposentação
Observações
18/09/1991 – 02/08/1992
320
320
---
03/08/1992 – 06/02/2011
6762
6762
---
18/02/2011 – 05/09/2012
566
566
---
Total
7648 dias, ou seja, 20 anos 11 meses e 18 dias
7648 dias, ou seja, 20 anos 11 meses e 18 dias

O tempo de serviço referido foi verificado por informação n.º 001/2013 deste Departamento, emitida aos 15 de Janeiro de 2013.
Relativamente ao cálculo desse tempo, se a pessoa do notificando não concordar com o respectivo teor, pode apresentar reclamação dentro de 15 dias contados do 1º dia após a recepção da presente notificação.
……”
Da notificação referida não se vê qualquer alegação sobre a competência.
Por outro lado, constam respectivamente do despacho n.º 152/2009 do Secretário para a Segurança (publicado no Boletim Oficial de 23 de Dezembro de 2009) e do despacho n.º 2/CPSP/2010 (publicado no Boletim Oficial de 17 de Março de 2010) os teores seguintes:
“Despacho do Secretário para a Segurança n.º 152/2009
   Usando da faculdade conferida pelo artigo 64.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau e nos termos do artigo 7.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999 e do n.º 5 da Ordem Executiva n.º 122/2009, o Secretário para a Segurança manda:
  1. Subdelego no comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), superintendente-geral n.º 1XX XXX, C, do CPSP, a competência para a prática dos seguintes actos:
  1) Relativamente ao pessoal militarizado do CPSP:
……
  (6) Contar e liquidar o tempo de serviço prestado no CPSP, remetendo à DSFSM a respectiva documentação.
……
  3. Por despacho a publicar no Boletim Oficial, homologado pelo Secretário para a Segurança, o comandante poderá subdelegar nos segundos-comandantes, ou no pessoal com funções de chefia as competências que forem julgadas adequadas ao bom funcionamento do CPSP.
  4. A presente subdelegação de competências é feita sem prejuízo dos poderes de avocação e superintendência.
  5. Dos actos praticados no uso das subdelegações aqui conferidas, cabe recurso hierárquico necessário.
……”
“Despacho n.º 2/CPSP/2010
  No uso da competência conferida pelo Despacho para a Segurança n.º 152/2009, de 20 de Dezembro, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 51, II Série, de 23 de Dezembro de 2009, subdelego:
……
  2. Na chefe do Departamento de Gestão de Recursos, intendente n.º 1XX XXX, D, as competências que me foram subdelegadas, e a que se referem os n.os 1.1) (6), 1.2) (1), 1.2) (4) ,1.3) (2) e 1.3) (5) do referido despacho, designadamente:
  1.1) (6) Contar e liquidar o tempo de serviço prestado no CPSP, remetendo à DSFSM a respectiva documentação;
……
  5. A presente subdelegação de competência é feita sem prejuízo dos poderes de avocação e superintendência.
  6. Dos actos praticados no uso das subdelegações aqui conferidas, cabe recurso hierárquico necessário.
Corpo de Polícia de Segurança Pública, aos 10 de Fevereiro de 2010.
O Comandante, C, superintendente-geral”
Tendo em conta o teor dos dois despachos de subdelegação, este tribunal entende que o acto administrativo praticado aos 21 de Fevereiro de 2013 pelo Chefe do Departamento de Gestão de Recursos e constante da notificação n.º 042/DRH/DGR/2013 consiste em contar e liquidar, com a competência conferida, o tempo de serviço prestado pela recorrente, pelo que não é verticalmente definitivo.
Além disso, a recorrente emitiu a notificação avulsa através do Tribunal Judicial de Base, da resposta do CPSP de 19 de Março de 2013 (notificação n.º 078/DRH/DGR/2013, vide as fls. 29 a 50 dos autos) consta o seguinte teor:
“……
Vem responder da forma seguinte:
- Quanto ao andamento dos procedimentos, por despacho n.º 39/SS/2012, proferido pelo Secretário para a Segurança no dia 5 de Setembro de 2012, B foi punida com pena de demissão. Portanto, o nosso CPSP procedeu ao cálculo do tempo de serviços desse pessoal, do dia de entrada até o dia de demissão, e o resultado foi de 20 anos 11 meses e 18 dias.
- Quanto às resoluções definitivas, B conheceu o resultado referido do tempo de serviços no dia 22 de Fevereiro de 2013 e apresentou, dentro de prazo legal, ao nosso CPSP a reclamação escrita, que actualmente fica a aguardar julgamento, pelo que não há resolução definitiva.
……”
Termos em que, a recorrente foi informada de que a sua reclamação apresentada no dia 28 de Fevereiro de 2013 estava a ser julgada e não havia decisão definitiva.
A recorrente defendeu que foram executadas a contagem e a liquidação feitas pelo Chefe do Departamento de Gestão de Recursos, transcreve-se aqui o seguinte teor de alteração da ordem de serviço n.º 238 de 26 de Dezembro de 2012, constante da ordem de serviço n.º 37 de 26 de Fevereiro de 2013 (vide a fls. 12 dos autos):
“ORDEM DE SERVIÇO DO CPSP N.º 37
DE 26 DE FEVEREIRO DE 2013
……
RECTIFICAÇÃO/MARCHA/ABATE
  Que, se rectifique o publicado no art.º 10-E. 2 da O.S. n.º 238 de 26 de Dezembro de 2012, respeitante a averbamento.
  Onde se lê:
  Por despacho do Exm.º Senhor Secretário para a Segurança de 05 de Setembro de 2012, foi abatido ao efectivo deste Corpo de Polícia, por ter sido demitido, a partir de 20 de Dezembro de 2012, a Guarda no. 3XXXXX, B.
  Deve ler-se:
  Por despacho do Exm.º Senhor Secretário para a Segurança de 05 de Setembro de 2012, foi abatido ao efectivo deste Corpo de Polícia, por ter sido demitido, a partir de 06 de Setembro de 2012, a Guarda no. 3XXXXX, B.
……”
Conforme o teor de alteração referido, não há informação suficiente para revelar que a alteração foi feita de forma a executar o acto do Chefe do Departamento de Gestão de Recursos de 21 de Fevereiro de 2013, porém, indicou que o acto a alterar consistiu em despacho n.º 5 de Setembro de 2012 do Secretário para a Segurança, portanto, ao abrigo do art.º 135.º do Código de Procedimento Administrativo, foi o Secretário para a Segurança, em vez do Chefe do Departamento de Gestão de Recursos, que gozou da competência de praticar o acto de alteração.
Pelo exposto, este tribunal entende por improcedente a pretensão da recorrente de ser julgado satisfeito o disposto do art.º 28.º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Transcreve-se aqui ainda o seguinte teor do despacho n.º 39/SS/2012 do Secretário para a Segurança de 5 de Setembro de 2012, constante do aviso do CPSP (publicado no Boletim Oficial de 5 de Dezembro de 2012):
“Despacho do Secretário para a Segurança n.º 39/SS/2012
Consultados os elementos constantes do presente processo disciplinar, vem suficientemente provado que a arguida, guarda n.º 3XX XXX, B, do Corpo de Polícia de Segurança Pública, não se apresentou ao serviço após o gozo de férias, ou seja, se ausentou do serviço durante o período de 7 a 17 de Fevereiro de 2011, sem qualquer justificação ou autorização, constituindo-se em ausência ilegítima por 11 dias seguidos. No dia 18 de Fevereiro, a arguida apresentou-se no Comissariado de Inquéritos, serviço a que esta pertence.
……
Considerando o conteúdo da acusação e as respectivas circunstâncias atenuantes, creio firmemente que a infracção disciplinar desta é grave, daí que não possui as condições básicas para continuar o desempenho de funções.
  Nesta conformidade, ouvidos o Conselho Disciplinar do CPSP e o Conselho de Justiça Disciplinar e considerada a censurabilidade da infracção disciplinar e o comportamento anterior da arguida, bem como considerando que a ausência ilegítima desta já ultrapassou muito mais do que os 5 dias seguidos, eu, no uso das competências que lhe são conferidas pela Ordem Executiva n.º 122/2009 e pelo artigo 211.º do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, e nos termos do Anexo previsto no n.º 2 do artigo 4.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, decido aplicar, ao abrigo da alínea c) do artigo 240.º do referido Estatuto, à arguida B, guarda n.º 3XX XXX do CPSP, a pena de demissão.
  Notifique a arguida de que da presente decisão cabe recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância, nos termos da lei.
Comando do Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau, aos 13 de Novembro de 2012.
O Comandante, C, superintendente.”
Na decisão referida do Secretário para a Segurança não se indicou expressamente a data da entrada em vigor da demissão, o Chefe do Departamento de Gestão de Recursos efectuou a contagem e liquidação na execução do despacho referido do Secretário para a Segurança, assim sendo, em conjugação com o teor de alteração constante da ordem de serviço acima mencionado e salvo o respeito absoluto pelo melhor entendimento da mesma questão, este tribunal entende que, o acto recorrido não contém conteúdo material que provoca danos da recorrente, mas sim construi um acto de mera execução. Ao abrigo dos art.ºs 110.º, 138.º do Código de Procedimento Administrativo e art.º 20.º n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, os actos de mera execução não podem ser objecto de recurso contencioso, por motivo da sua irrecorribilidade.
Mesmo não aceitando como acto de mera execução o acto do Chefe do Departamento de Gestão de Recursos, como esse acto não é verticalmente definitivo, o CPSP notificou a recorrente, por ofício n.º 1586/DRHDGR/2013P (8 de Abril de 2013), de que o Comandante (superior do Chefe do Departamento de Gestão de Recursos e não autor do acto) já decidiu sobre a sua reclamação apresentada no dia 28 de Fevereiro de 2013. Não importando se a recorrente entender ou aceitar a decisão, não se pode dar como recorrível o acto de contagem e liquidação efectuado pelo Chefe do Departamento de Gestão de Recursos no dia 21 de Fevereiro de 2013.
Pelo exposto, ao abrigo do art.º 46.º n.º 2 alínea c) do Código de Processo Administrativo Contencioso, este tribunal determina rejeitar o presente recurso contencioso, uma vez que o acto recorrido é irrecorrível.
Custas pela recorrente com a taxa de justiça fixada em 2 UC..
Registe e notifique.
*
2 de Maio de 2013
Juiz
Ass. vide o original”

    III - FUNDAMENTOS
    1. O Mmo Juiz no Tribunal Administrativo rejeitou o recurso contencioso, visto ser o acto posto em crise ser irrecorrível, quer por se tratar de mero acto de execução de acto do Senhor Secretário para a Segurança, quer por se não apresentar como verticalmente definitivo.
    Vem a recorrente alegar que foi atribuladamente notificada e foi por causa dessas confusões que se viu obrigada a recorrer contenciosamente do acto praticado pelo Chefe de Departamento de Recursos Humanos relativo à sua contagem do tempo de serviço na sequência da pena de demissão que lhe foi aplicada.
    2. Desse despacho, proferido no âmbito de poderes delegados, cabia recurso hierárquico necessário, mas dele veio, indevidamente, interpor recurso contencioso, pedindo, depois de uma alegação algo confusa, não se sabe bem o quê, que a Administração seja condenada nas custas do processo pelos erros da notificação, pugnando sempre pela justeza da interposição do recurso, face ao disposto no artigo 28º, n.º 2 do CPAC.
     Somos a sufragar aqui o entendimento vertido no douto parecer, sufragando a decisão proferida na 1ª Instância.
    
    3. Quanto à verticalidade do acto, dúvidas não restam de que os despachos de subdelegação, publicados no BO são expressos quanto à necessidade de recurso hierárquico necessário.
    Quanto às notificações que se sucederam no respeitante à contagem do tempo de serviço, elas ficaram a dever-se a lapsos que a própria entidade recorrida se aprestou a reparar, ficando claro, que, a final, a recorrente não deixou de se ter por devidamente notificada, ainda que o tenha sido por diligência, iniciativa e esforço seu, não cabendo a este tribunal censurar uma má prática ou uma prática porventura menos expedita e transparente da Administração.
    A notificação constitui um mero requisito de eficácia ou oponibilidade do acto administrativo, não interferindo com a sua validade. Pelo que a falta de notificação de um acto não faz dele um acto enfermo de vício de forma e muito menos de vício de violação de lei. Mesmo admitindo que tal notificação não tivesse sido recebida pela A. e/ou concluindo-se que a mesma não obedeceu aos requisitos legais do CPA, sempre a consequência dessa omissão não seria a nulidade ou mesmo a anulabilidade do acto, mas antes tendo por consequência, por se tratar de “um elemento exterior ao acto” a “inoponibilidade do acto ao seu destinatário (e não a sua invalidade)”, ou seja, trata-se de um mero requisito de eficácia do acto que não tem a virtualidade de alterar a natureza ou as características desse mesmo acto, apenas podendo relevar para efeitos de contagem dos prazos de impugnação ou operar no plano da responsabilidade civil extracontratual da Administração.1:
Acresce que a falta de notificação em nada prejudicou o direito de a recorrente impugnar o acto, que não deixou de, tempestivamente, ficar inteirada do conteúdo do acto, como ela própria reconhece.
    Tanto assim que, para além do pedido de condenação em custas da entidade recorrida - como é possível, vista a sua isenção? – no que toca em relação a essas irregularidades mais nada pede.
     Mostra-se, pois, evidente, face ao conteúdo da Ordem executiva n.º 122/2009 de 20/12/09, Despacho do Secretário para a Segurança n.º 15212009 da mesma data e Despacho 2/CPSP/2010 do Comandante do CPSP de 10/2/2010) que do acto cabia recurso hierárquico necessário, não sendo passível de recurso contencioso, como já se assinalou.
    
    4. Assim se entra na análise da recorribilidade do acto ao abrigo do disposto no n° 2 do art. 28°, CPAC, por ter sido determinada a execução imediata.
    Sobre a afirmação produzida na douta sentença, de que esse acto não era passível de recurso, por ser um acto de mera execução do acto de demissão da recorrente, proferido pelo Senhor Secretário, estamos com as dúvidas do Senhor Procurador, na medida em que esse acto parece ter efeitos autónomos. É que a contagem e liquidação do tempo de serviço não deixam de configurar uma situação jurídica com efeitos próprios e autónomos das do acto sancionatório.
    De todo o modo, estes efeitos autónomos só se estabilizariam depois da definição da situação jurídica da recorrente, corrido o procedimento gracioso respectivo que se impunha.
    5. Fica assim a consequência que a recorrente retira relativa à exequibilidade imediata do acto com repercussão na sua esfera patrimonial, resultante do facto de ter pagado as quantias por reposição de retribuições indevidamente auferidas, à luz do preceituado no n.º 2 do art. 28°, CPAC.
    A questão que aqui se coloca não residirá no pagamento, mas nas razões por que pagou ou se a causa desse pagamento não terá resultado de precipitação da sua parte, cabendo-lhe impugnar pelos meios e no tempo oportunos a liquidação efectuada.
    Tal, como assinala o Digno Magistrado do MP, não se divisa qualquer decisão que determinasse a execução imediata do decidido, não se podendo ter como tal uma mera notificação de pagamento, estando em curso um procedimento impugnatório necessariamente suspensivo do acto reclamado.
    
    Em face do exposto, o recurso não deixará de improceder.
    
    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao presente recurso contencioso.
    Custas pela recorrente, com 6 UC de taxa de justiça.
               Macau, 17 de Julho de 2014,
               
Presente (Relator) Vítor Manuel Carvalho Coelho João A. G. Gil de Oliveira

(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng

(Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho
1 - Mário Esteves de Oliveira, in Código do Procedimento Administrativo, 2.ª edição, em anotação ao art.º 68°
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------

579/2013 1/21