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Processo n.º 118/2014
Recurso penal
Recorrente: A
Recorrido: Ministério Público
Data do acórdão: 3 de Dezembro de 2014
Juízes: Song Man Lei (Relatora), Sam Hou Fai e Viriato Manuel Pinheiro de Lima

Assuntos: - Crime de tráfico de estupefacientes
- Atenuação especial da pena
- Medida concreta da pena

SUMÁRIO

1. A verificação das circunstâncias referidas no n.º 2 do art.º 66.º do Código Penal de Macau não constitui fundamento, por si só, para a atenuação especial da pena, que tem como pressuposto material a acentuada diminuição da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena, tal como expressamente estabelece o n.º 1 do art.º 66.º.
2. Ao Tribunal de Última Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada.

A Relatora,
Song Man Lei
  ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
  
1. Relatório
Por Acórdão proferido pelo Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base em 20 de Junho de 2014, o arguido A foi condenado, em autoria na forma consumada, pela prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes p.p. pelo art.º 8.º n.º 1 da Lei n.º 17/2009, na pena de 9 anos e 6 meses de prisão efectiva.
Inconformado com o Acórdão, recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, cujo Juiz relator do processo proferiu decisão sumária no sentido de rejeitar o recurso.
Apresentada a reclamação desta decisão para a conferência, foi a mesma indeferida.
Vem agora A recorrer para o Tribunal de Última Instância, formulando na sua motivação do recurso as seguintes conclusões:
(1) O acórdão recorrido julgou evidentemente improcedente a motivação do recurso interposta pelo recorrente, pelo que, indeferiu a reclamação contra a decisão sumária da rejeição do recurso proferida pelo relator do TSI em 12/09/2014, nos termos do artº 407º, nº 6, al. b) do CPP.
(2) Isto é, manteve a decisão sumária da rejeição do recurso interposto pelo recorrente contra o acórdão do proc. nº CR2-13-0262-PCC do TJB, proferida em 12/09/2014; e condenou o recorrente pela prática de 1 crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p.p. artº 8º, nº 1 da Lei nº 17/2009, a pena de 9 anos e 6 meses de prisão.
(3) No acórdão recorrido, expôs detalhadamente os factos, a parte do direito e a decisão;
(4) Mantemos desde sempre todo o devido respeito face ao acórdão proferido pelo Tribunal, especialmente o acórdão recorrido, que sempre merecerá o máximo respeito.
(5) Mas o próprio recorrente continua inconformado com a decisão da improcedência do recurso interposto; isto é, mantém inconformado com a medida da pena fixada, pela prática de 1 crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p.p. artº 8º, nº 1 da Lei nº 17/2009, bem como, apresenta os motivos seguintes, desejando que o Tribunal aceite a presente reclamação.
(6) O recorrente no julgamento da 1ª Instância confessou integralmente e sem reservas, foi beneficiado nos termos do artº 325º do CPP. Esta confissão do recorrente foi logo no momento da detenção e sempre manteve esta conduta, o que demonstra também arrependimento.
(7) Ele declarou que reconhece o mal da droga, nomeadamente vimos da sua confissão, que o seu arrependimento provém do fundo do coração, ele esclareceu toda a verdade do facto, disse a origem e destino da droga, desejando compensar para a estabilidade social de Macau.
(8) Além disso, o recorrente é de nacionalidade da Tanzânia da África, vive permanentemente nesse país, ele tem a seu cargo, a sua esposa e 4 filhos e filhas.
(9) A razão que levou o recorrente praticar o facto ilícito, foi porque alguém lhe aliciou que se praticasse tais factos ilícitos, iria compensar um montante equivalente a 10 anos de rendimento.
(10) O recorrente tem a seu cargo uma família com vários membros, ele é o único suporte familiar; o recorrente foi condenado, com certeza que irá afectar os membros da família, especialmente os 4 filhos, provavelmente vão deixar de frequentar a escola.
(11) Proporcionar educação aos menores, também tem sido um valor fundamental, firmemente defendido pela RAEM.
(12) No presente processo, vimos que o recorrente apenas trouxe a droga para Macau de passagem, que depois seria transportada para o exterior, por outras palavras, ele apenas serviu de instrumento de transporte, ele não foi autor ou membro da associação.
(13) De qualquer modo, o recorrente finalmente foi acusado da prática do crime de tráfico da droga, bem como foi condenado pelo Tribunal da 1ª Instância e fixada a pena.
(14) O recorrente depois da detenção ficou preso preventivamente até à presente data, durante o qual tem sempre portado bem.
(15) O recorrente não tem direito a permanência em Macau, bem como foi condenado pelo Tribunal a quo – o presente recurso não foi interposto somente por causa da medida da pena, temos a certeza que, depois de o recorrente sair da prisão, com certeza que estará proibido de reentrar em Macau por muito longo tempo.
(16) Além disso, ele reconhece perfeitamente o mal da droga, portanto é de acreditar que o recorrente nunca mais irá praticar tais crimes. Isto trará certa garantia tanto para a estabilidade social de Macau como para outras sociedades.
(17) O recorrente tem necessidade de reafirmar aqui que, salvo todo o devido respeito pelo colectivo da 1ª Instância e da decisão reclamada.
(18) Mas entende o próprio recorrente que o acórdão reclamado julgou improcedente o seu recurso,
(19) Manteve a medida da pena fixada no acórdão da 1ª Instância, pela prática de 1 crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p.p. artº 8º, nº 1 da Lei nº 17/2009, isto significa que os factos supracitados não foram apreciados da melhor forma e de modo completo, bem como, não reconheceu que ele preenche as circunstâncias atenuantes previstas nos artºs 66º, nº 2, a), c) e d), 67º; assim como, o artº 65º, nº 2, al. c) , d) e e) do CP.
(20) Padece do vício de “erro na interpretação da lei” previsto no artº 400º, nº 1 do CPP, pelo que deve declarar a sua anulação.
(21) O recorrente entende que, salvo melhor opinião da conferência do TSI que sempre merecerá respeito, deve declarar que o recorrente preenche o disposto nos artºs 66º, nº 2, a. c) e d) e o artº 65º, nº 2, al. c), d) e e) do CP, que por sua vez beneficie de atenuação especial da pena.
(22) Assim como, vem mui respeitosamente requerer ao TSI que, com base na medida da pena fixada no acórdão recorrido, aplique ao recorrente, pela prática de 1 crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas p.p.p. artº 8º, nº 1 da Lei nº 17/2009, uma pena igual ou inferior a 7 anos e 6 meses de prisão.
(23) Finalmente, o recorrente vem requerer ao Tribunal que proceda oficiosamente ao conhecimento de todos os vícios legais constantes no processo e que faça a habitual justiça.

Respondeu o Ministério público, apresentando na sua resposta à motivação do recurso as seguintes conclusões:
1. Em princípio o TUI não devia intervir na medida concreta da pena determinada no acórdão recorrido.
2. De facto, segundo os elementos constantes no processo, o recorrente A não é residente de Macau, ele através de dissimulação de droga no seu corpo trouxe do estrangeiro, 108 embalagens de heroína, com peso total de 1150.24 g (com uma percentagem de 50.06%, correspondente a 21.42 g, com uma percentagem de 50.71% correspondente a 561.59 g).
3. Face ao reconhecimento dos factos supracitados, o recorrente A não pôs nenhuma questão.
4. Quanto à medida da pena de casos análogos de dissimulação de droga no corpo, temos muita jurisprudência do TSI para consulta.
5. No acórdão recorrido do presente processo, O colectivo aquando determinou a pena, considerou completamente o disposto no artº 65º do CP.
6. No recurso do recorrente A, ele tornou a salientar que depois de ser detido foi colaborante, pelo que, devia beneficiar de atenuação especial nos termos do artº 66º, nº 2 al. c) e d), bem como artº 67º do CP.
7. Contudo, sempre concordámos que: “Somente porque o agente confessou integralmente e sem reservas os factos que vêm imputados, não é uma conclusão para diminuição, por forma acentuada, da ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade de punição. Além disso, as circunstâncias acima referidas não preenchem situação especial ou excepcional de atenuação, assim sendo, não é aplicável a atenuação especial da pena nos termos da lei.” (proc. de recurso do TSI nº 171/2010 de 22/04/2010)
8. Vimos o praticado pelo recorrente A, nunca ele poderia beneficiar de qualquer regime de atenuação especial.
9. O crime praticado pelo recorrente A, é frequente ver em Macau, a natureza, o grau de ilicitude e o resultado são graves, a actividade da droga tanto para os próprios toxicodependentes como para a saúde pública e estabilidade social é gravemente prejudicial; além disso, condutas relacionadas com a droga, demonstra tendência a afectar a camada mais jovem, portanto os problemas provenientes disso são bastantes graves; além do mais, a quantidade da droga trazida pelo recorrente A é elevada, nestes termos, são extremamente grandes as exigências de prevenção geral relativamente à sua conduta.
10. Quanto à sua culpabilidade, dos factos provados, o recorrente A sabia perfeitamente as características e a natureza da respectiva droga, mas livre, consciente, voluntariamente e com dolo, praticou o crime em causa, daí vemos que ele tem fraca consciência pela lei e baixa capacidade para ser cumpridor das leis, assim sendo, as exigências de prevenção geral têm de ser mais altas.
11. Tendo em conta que o recorrente A não é residente de Macau, veio aqui com o objectivo principal de transportar a droga dissimulada no seu corpo para o exterior, o grau de ilicitude é muito elevado, a natureza e a gravidade do crime cometido são altas, bem como, tendo em conta a moldura penal aplicável, a situação concreta do facto, a natureza e a quantidade da droga apreendida, assim como este crime afecta gravemente a saúde pública e estabilidade social, considerando as exigências da prevenção do crime (seja prevenção especial ou geral), entendemos que o Tribunal a quo condenou o recorrente A, a pena de 9 anos e 6 meses de prisão não foi excessiva.
12. Por isso, entendemos que o acórdão recorrido não aplicou erradamente a lei, especialmente, não violou o disposto no artº 400º, nº 1 do CPP, artºs 66º, nº 2, a. c) e d) e 65º, nº 2, al. c) , d) e e) do CP.

Nesta instância, a Digna Procuradora-Adjunta do Ministério Público emitiu o douto parecer, entendendo que se deve rejeitar o recurso por ser totalmente improcedente.
Foram corridos vistos.

2. Factos
Nos autos foram dados como provados os seguintes factos:
- No dia 10/07/2013, pelas 9H15, o arguido A, veio da Tailândia a Macau através do avião Thai Airways TG750, no átrio do posto fronteiriço do Aeroporto Internacional de Macau, o pessoal da PJ interceptou o arguido A junto do carrossel de bagagens.
- O pessoal da PJ com consentimento do arguido A, conduziu-o ao gabinete do Aeroporto Internacional de Macau para proceder a verificação corporal através de aparelho raio X.
- No aparelho raio X foi encontrado objecto desconhecido no interior do seu corpo.
- Posteriormente, o pessoal da PJ levou o arguido A ao banco de urgência do CHCSJ para exame.
- Através de exame raio X, foi encontrado objecto desconhecido no interior do seu corpo.
- O pessoal de assistência médica, de imediato, organizou o arguido para proceder a defecação, das 4H30 de 11/07/2013, às 6H40 da tarde de 12/07/2013, o arguido A defecou 108 embalagens de heroína que estavam embrulhados com fita plástica transparente de forma oval, dentro da embalagem tinha pedaços de objecto de cor amarela clara.
- Após exame laboratorial, os pedaços de objecto de cor amarela clara encontrados dentro de 4 embalagens de forma oval, contêm heroína, substância controlada na tabela 1 A da Lei 17/2009, com peso total de 42.78g (após análise quantitativa, a percentagem de heroína é de 50.06%, correspondente a 21.42g); o resto das 104 embalagens de forma oval com objecto de cor amarela clara, contêm heroína, com peso total de 1107.46g, (após análise quantitativa, a percentagem de heroína é de 50.71%, correspondente a 561.59g)
- A droga supracitada foi engolida pelo arguido A, na retrete pública do átrio de partida do Aeroporto da Tailândia, posteriormente, ele apanhou o voo e entrou em Macau com a droga dissimulada no corpo, o seu objectivo era transportar a droga para Cantão, a fim de ganhar uma compensação de USD$5000.
- Além disso, o pessoal da PJ encontrou no corpo do arguido A, 1 telemóvel, 2 cartões SIM, 2 E-Ticket, 5 boarding passes, USD$1300, RMB$35 e NOP$800.
- O telemóvel e 2 cartões SIM são instrumentos de contacto para a prática da actividade de tráfico da droga.
- O arguido A sabia perfeitamente a natureza e as características da droga.
- O arguido A livre, consciente, voluntariamente e com dolo praticou o facto supracitado.
- O arguido A bem sabia que a sua conduta é proibida e punida por Lei.
- O arguido na audiência de julgamento confessou integralmente e sem reservas os factos.
- O arguido declara ser comerciante, aufere mensalmente USD$100.
- Tem como habilitações literárias o 1º ano do ensino secundário, tem a seu cargo a esposa e 4 crianças.
- Conforme consta no seu registo criminal, o arguido é primário.

3. Direito
A questão suscitada prende-se com a medida concreta da pena aplicada ao recorrente, pretendendo este que o Tribunal atenue especialmente a pena nos termos do art.º 66.º n.º 2, al.s c) e d) do Código Penal de Macau, com a fixação de uma pena não superior a 7 anos e 6 meses de prisão para o crime de tráfico ilícito de estupefacientes.
Invoca o recorrente a violação da disposição nos art.ºs 66.º n.º 2, al.s c) e d) e 65.º n.º 2, al.s c), d) e e) do Código Penal de Macau.

Ora, nos termos do art.º 66.º n.º 2, al. c) e d) do Código Penal de Macau, são previstas como circunstâncias que devem ser ponderadas para efeitos da atenuação especial da pena “ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados” e “ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta”.
No entanto, é de salientar que a verificação das circunstâncias referidas no n.º 2 do art.º 66.º não constitui fundamento, por si só, para a atenuação especial da pena, regime este que tem como pressuposto material a acentuada diminuição da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena, tal como expressamente estabelece o n.º 1 do art.º 66.º.
No ensinamento do Prof. Figueiredo Dias, “A diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto, resultante da actuação da(s) circunstância(s) atenuante(s), se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo. Por isso, tem plena razão a nossa jurisprudência – e a doutrina que a segue – quando insiste em que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excepcionais pode ter lugar: para a generalidade dos casos, para os casos «normais», lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximos e mínimos próprios”.1
A jurisprudência também tem entendido que, para atenuação especial da pena, o importante é demonstrar-se a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena. Ou seja, só depois de valorizar todas as circunstâncias verificadas no caso concreto e se da imagem global do facto resulta a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena é que se deve atenuar especialmente a pena.
Daí que, para efeitos da atenuação especial da pena, há de apurar se existem no caso concreto circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, ao comando do n.º 1 do art.º 66.º do Código Penal.

Expostas tais considerações, é de voltar ao nosso caso concreto.
A favor da sua tese, alega o recorrente que em audiência de julgamento confessou integralmente e sem reserva a prática dos factos ilícitos, tendo revelado a origem e o destino da droga que trazia consigo, atitude esta que tinha mantido desde a sua detenção, o que demonstra o seu arrependimento.
Na realidade, decorre da matéria de facto provada que o recorrente foi interceptado no Aeroporto Internacional de Macau, vindo da Tailândia, tendo o pessoal da Polícia Judiciária detectado, através de aparelho raio X, no interior do seu corpo objectos que foram depois identificados como heroína, com peso líquido total, apurado com a análise quantitativa, de 583.01 gramas, objectos estes que estavam embrulhados com fita plástica transparente em 18 embalagens de forma oval e foram engolidos pelo recorrente no Aeroporto da Tailândia, com destino para Cantão.
Foi neste circunstancialismo é que ficou detido o recorrente, que agiu livre, consciente e voluntariamente, bem sabendo a natureza e as características da droga, com intenção de obter compensação ilegítima.
Face a uma situação como esta, não se afigura aceitável a tese do recorrente quanto à verificação da circunstância prevista na al. c) do n.º 2 do art.º 66.º do Código Penal de Macau, já que a detecção da droga dentro do corpo do recorrente e a consequente detenção tornam irrelevante a sua confissão, insusceptível de demonstrar o arrependimento sincero exigido na norma citada.
E a revelação do recorrente sobre a origem e o destino da droga não passa de mera declaração, vaga e genérica, sem nenhuma contribuição para a identificação, muito menos a localização e a captura, de outros traficantes de droga.

Invoca ainda o recorrente a sua boa conduta após a detenção e a prisão preventiva.
Ora, constata-se nos autos que o recorrente foi detido em12-7-2013 e está preso preventivamente desde o dia seguinte à presente data.
Basta dizer não ter passado muito tempo sobre a prática do crime e ser normal manter-se uma conduta adequada, sem nenhuma infracção disciplinar no Estabelecimento Prisional de Macau, para demonstrar não estar verificada a circunstância prevista na al. d) do n.º 2 do art.º 66.º do Código Penal de Macau.

Mesmo admitindo-se a verificação da circunstância referente ao arrependimento sincero, haveria sempre de dizer que não está preenchido o pressuposto material da atenuação especial da pena, que é a acentuada diminuição da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena, expressamente estabelecido no n.º 1 do art.º 66.º.
O recorrente conhece bem a natureza e as características da droga que transportou para Macau, com o meio descrito nos autos, e agiu de forma livre, voluntária e consciente, com intenção de obter compensação pecuniária, o que revela sem dúvida o grau muito elevado da sua culpa.
É de salientar que o tráfico de estupefacientes causa, hoje em dia, problemas sociais muito graves não só para Macau mas também para a China e para todo o mundo, que reclama a colaboração de todos os países e regiões no combate a este tipo de crime.
E são prementes as exigências de prevenção geral, face à realidade social de Macau, em que se tem detectado problemas graves relacionados com o tráfico e consumo de estupefacientes, impondo-se prevenir a prática do crime em causa, que põe em risco a saúde pública e a paz social.
Ora, face a todo o circunstancialismo apurado nos autos, nomeadamente a natureza e a gravidade do crime pelo qual foi condenado o recorrente, a sua culpa revelada nas actividades ilícitas, que é intensa, o grau elevado da ilicitude dos factos, a quantidade da droga apreendida nos autos e as exigências de prevenção criminal, que são, sem dúvida, acentuadas, dúvidas não restam que é de afastar a atenuação especial da pena pretendida pelo recorrente.

Há que ver ainda a medida concreta da pena.
Nos termos do art.N 40. n. 1 do Código Penal de Macau, a aplicação de penas visa não só a reintegração do agente na sociedade mas também a protecção de bens jurídicos.
E ao abrigo do art.º 65.º do Código Penal de Macau, a determinação da medida da pena é feita “dentro dos limites definidos na lei” e “em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal”, tanto de prevenção geral como de prevenção especial, atendendo a todos os elementos pertinentes apurados nos autos, nomeadamente os elencados no n.a 2 do artigo.
No caso em apreciação, o crime pelo qual foi condenado o recorrente é punível com a pena de 3 a 15 anos de prisão.
Ponderado todo o circunstancialismo do caso concreto, nomeadamente as circunstâncias acima referidas e o comando do art.º 65.º do Código Penal de Macau, não se nos afigura excessiva a pena de 9 anos e 6 meses de prisão aplicada ao recorrente, que foi encontrada dentro da moldura penal fixada para o crime de tráfico ilícito de estupefaciente e em função da culpa do recorrente e das exigências de prevenção criminal.
A alegada situação familiar e económica não tem o valor atenuativo pretendido pelo recorrente.
Tal como tem entendido este Tribunal, “Ao Tribunal de Última Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada”2, pelo que se não se estiver perante essas situações, como é no caso vertente, o Tribunal de Última Instância não deve intervir na fixação da dosimetria concreta da pena.

É de concluir pela improcedência do recurso.

4. Decisão
Face ao expendido, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com a taxa de justiça fixada em 6 UC.
  
   Macau, 3 de Dezembro de 2014
  
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
  
1 Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, p. 306.
2 Ac. do TUI, de 23 de Janeiro de 2008, 19 de Setembro de 2008, 29 de Abril de 2009 e 28 de Setembro de 2011, nos Processos nºs 29/2008, 57/2007, 11/2009 e 35/2011, respectivamente.
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