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Processo n.º 127/2014. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para a Economia e Finanças.
Assunto: Fixação de residência em Macau. Pedido de renovação da autorização de fixação de residência. Motivo de força maior.
Data da Sessão: 13 de Fevereiro de 2015.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
Dispondo o artigo 23.º, n. os 3 e 1, do Regulamento Administrativo n.º 5/2003, que a falta do requerimento para renovação de autorização de residência, dentro do prazo máximo de 180 dias, a contar do fim do prazo de validade de autorização de residência, salvo por motivo de força maior devidamente comprovado, implica a caducidade de tal autorização, não satisfaz a previsão das normas a prova do motivo de força maior, durante apenas parte do mencionado período de 180 dias.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A (doravante designada por recorrente), interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário para a Economia e Finanças, de 8 de Agosto de 2013, que indeferiu pedido de renovação da autorização de residência temporária em Macau, por a recorrente ter requerido o pedido de renovação de residência fora de todos os prazos previstos no regulamento aplicável.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 18 de Setembro de 2014, negou provimento ao recurso.
Inconformada, interpõe recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), suscitando três questões:
- A notificação de 10 de Julho de 2009 foi dirigida para o endereço da agência imobiliária e não para o endereço da residência declarada pela recorrente;
- A recorrente não conhece as leis de Macau, não sabia das exigências do regime de renovação da autorização de residência;
- A não renovação no prazo aconteceu por força maior, por doença grave que impossibilitou a recorrente de fazer o pedido em tempo.
O Ex.mo Procurador-Adjunto emitiu douto parecer em que se pronuncia pela improcedência do recurso.

II - Os Factos
Estão provados os seguintes factos:
1 - Em 26/09/2005 a recorrente havia requerido autorização de residência com fundamento em investimento imobiliário, que lhe fora concedida por despacho de 25/03/2006.
2 - Este pedido foi apresentado por B, da agência Real Estate Investment Immigration Consulation, de acordo com uma procuração para o efeito.
3 - Nesse pedido foi apresentado o nome da procuradora B para contactos no âmbito do procedimento.
4 - Em 10/07/2009 a agência imobiliária foi notificada da aprovação de renovação da autorização de residência temporária por aquisição de imóvel e, bem assim, sobre as regras da renovação, nomeadamente da regra dos arts. 18º e 19º do Regulamento Administrativo nº 3/2005 e 23º do Regulamento Administrativo nº 5/2003.
5 - Em 2009, a recorrente, através de B, solicitou à Administração a renovação da autorização de residência, que lhe havia sido concedida com fundamento em investimento imobiliário, tendo obtido deferimento por despacho de 30/06/2009, com prazo de validade até 25 de Março de 2012.
7 - Este pedido foi apresentado pela referida B.
8 - A recorrente regressou a Macau em 29 de Janeiro de 2013.
9 - No Canadá foi internada de urgência no Hospital no dia 23 de Maio de 2012.
10 - E entre os dias 19 e 29 de Setembro de 2012 esteve internada no Hospital, na cidade de Cantão, na República Popular da China, onde foi submetida a uma intervenção cirúrgica.
11 - A recorrente apenas requereu a renovação de autorização no dia 1 de Fevereiro de 2013.
12 - Nessa data, a recorrente apresentou junto da Administração a respectiva declaração e atestado de internamento hospitalar, para justificar o atraso no requerimento para renovação.
13 - Foi elaborada a Proposta Nº XXXXX/GJFR/2013, com o seguinte teor:
«Auto n.º XXXX/2005/1R
Data: 25/2/2013
Exm.º Senhor C, Director Adjunto do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência:
Primeiro. Apresentação do pedido:
1. Em 30 de Junho de 2009, nos termos do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, foi concedida, à requerente A, a renovação de autorização de residência temporária, com fundamento do investimento em bens imóveis. A concessão da renovação também foi estendida ao seu esposo D e aos seus descendentes E e F, cujos títulos de residência temporária foram todos renovados para 25 de Março de 2012 (vd. o processo n.º XXXX/2005/1R).
2. Em 1 de Fevereiro de 2013, a requerente apresentou junto do Instituto uma declaração e documento comprovativo do diagnóstico de doença (anexo 1), indicando que, só quando entrou em Macau em 29 de Janeiro de 2013 pelo Terminal Marítimo de Passageiros da Taipa, aquela conheceu que não tinha requerido a renovação de autorização de residência temporária no prazo de 180 dias contados desde o termo da sua validade. Em relação à falta do requerimento para renovação, a requerente apresentou a seguinte motivação:
(1) Durante Maio de 2012, estava internada em hospital no Canadá e convalescia, pelo que não se atrevia a voltar.
(2) Durante 19 e 29 de Setembro de 2012, estava internada em Hospital para a realização duma intervenção cirúrgica.
(3) Antigamente, a companhia intermediária prestava assistência aos assuntos relacionados com a autorização de residência. Mas tal companhia não existe agora, nem contactou com a requerente, de forma que ela não requeresse tempestivamente a renovação. Por isso, a requerente pediu que, tendo em conta a sua situação, lhe fosse concedida uma oportunidade para renovação.
3. Nos termos do artigo 23.º do Regulamento Administrativo n.º 5/2003, subsidiariamente aplicado pelo artigo 23 do RA n.º 3/2005, a falta do requerimento para renovação dentro do prazo de 180 dias contados desde o termo da validade da autorização de residência, salvo por motivo de força maior devidamente comprovado, implica a caducidade da autorização de residência e a perda do tempo continuado para efeitos de aquisição da qualidade de residente permanente.
4. Apresenta-se a seguir a análise do pedido da requerente:
(1) A autorização de residência temporária da requerente foi válida até 25 de Março de 2012, devendo esta requerer a renovação no prazo de 180 dias (21 de Setembro de 2012) contados desde o termo da validade, caso contrário, implica-se a caducidade da autorização de residência.
(2) No entanto, a requerente não requereu a renovação dentro daquele prazo acima referido, com um dos motivos de que durante Maio de 2012, estava internada em hospital no Canadá e convalescia, pelo que não se atrevia a voltar. Tal motivo não é aceitável por a requerente não ter apresentado qualquer documento comprovativo.
(3) Em 10 de Julho de 2009, através da notificação de deferimento n.º XXXXX/GJRF/2009 (anexo 2), o IPIM expressamente notificou que: “nos termos do artigo 19 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 a renovação de autorização de residência temporária deve ser requerida ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau pela requerente e os seus membros familiares nos primeiros 60 dias dos 90 que antecedem o termo do respectivo prazo. Nos termos do artigo 23 do RA n.º 5/2003 subsidiariamente aplicado, a falta do requerimento para renovação dentro do prazo de 180 dias contados desde o termo da validade da autorização de residência implica a caducidade da autorização de residência e a perda do tempo continuado era efeitos da qualidade de residente permanente.” Por isso, devia a requerente conhecer bem que tinha que requerer a renovação dentro daquele período e, a falta do requerimento implica a caducidade da autorização de residência.
(4) Segundo a requerente, durante 19 e 29 de Setembro de 2012, estava internada em Hospital para a realização duma intervenção cirúrgica. A mesma apresentou os respectivos documentos comprovativos. Após a análise dos documentos, provou-se que a requerente tinha se submetido à intervenção cirúrgica e tinha estado internada em hospital no período por ela referido. No entanto, a requerente não notificou o IPIM de forma qualquer (oral, email ou oficio, etc.) antes do período. Além disso, apenas decorridos 10 dias desde a sua entrada no hospital até à saída. A requerente podia requerer a renovação ao Instituto desde a data do termo do prazo da autorização de residência (ou seja, 25 de Março de 2012) até à de internamento hospitalar (19 de Setembro de 2012), ou até antes do termo do respectivo prazo, pelo que é difícil aceitar o seu motivo da falta de requerimento.
(5) A requerente mais declarou que, antigamente, a companhia intermediária prestava assistência aos assuntos relacionados com a autorização de residência, mas tal companhia não existe agora, nem tinha contactado com ela, de forma que ela não requeresse tempestivamente a renovação. Na verdade, o sujeito do requerimento para renovação é a requerente, mas não a companhia intermediária, pelo que a existência ou não desta não afecta a renovação requerida pela requerente ao Instituto. Por isso, o motivo não é justificado.
(6) É de enfatizar que a força maior trata-se dum fenómeno natural e social imprevisto, inevitável e insuperável. Neste caso, os motivos (doença e não existência da companhia intermediária) da falta do requerimento para renovação no prazo legalmente fixado apresentados pela requerente não são de força maior. Além disso, o requerimento para a autorização de residência temporária não é necessariamente dirigido ao IPIM pessoalmente pela requerente, podendo também ser feito por representante a quem a requerente delegue o poder.
5. Face ao exposto, dada a falta do requerimento para renovação dentro do prazo de 180 dias contados desde o termo da validade da autorização de residência, por motivo de não força maior, sugere-se declarar, nos termos do artigo 23, n.º 3 do Regulamento Administrativo n.º 5/2003, subsidiariamente aplicado pelo artigo 23 do RA n.º 3/2005, a caducidade da autorização de residência temporária concedida à requerente A, ao seu cônjuge D e aos seus descendentes E e F, e o indeferimento da renovação de autorização de residência temporária requerida ao Instituto em 1 de Fevereiro de 2013 pela requerente.
Submeto à apreciação e decisão superiores.
Técnico superior
(Ass. V d. o original)
G
Anexos:
1. A declaração e o documento comprovativo da doença apresentados pela requerente em 1 de Fevereiro de 2013.
2. O ofício n.º XXXXX/GJFR/2009 do IPIM e o registo de comunicação.».
14 - Na sequência dessa proposta foi emitido o seguinte parecer do Gabinete Jurídico e de Fixação de residência:
“Concordo com o teor desta proposta. Dado que a requerente não pediu ao Instituto a renovação de autorização de residência temporária no prazo de 180 dias contados desde o termo da sua validade, e que os seus motivos apresentados não se trata de força maior, sugiro que declare, nos termos do artigo 23, n.º 3 do Regulamento Administrativo n.º 5/2003, subsidiariamente aplicado pelo artigo 23 do RA n.º 3/2005, a caducidade da autorização de residência temporária concedida à requerente A, ao seu cônjuge D e aos seus descendentes E e F, e que seja indeferida a renovação requerida ao Instituto pela requerente em 1 de Fevereiro de 2013.
Submeto à apreciação da Comissão Executiva.
C,
Director Adjunto do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência”.
15 - Em 8.4.2013 o Secretário para a Economia e Finanças proferiu, então, o seguinte despacho):
“Concordo com o parecer”.
  Este é o acto recorrido.


III – O Direito
1. As questões a apreciar
As questões a apreciar são as suscitadas pela recorrente, atrás mencionadas.

2. O endereço da recorrente para efeitos de notificações
É pacífico entre as partes do processo que o prazo para a recorrente requerer renovação da autorização de residência temporária em Macau terminava em 25 de Setembro de 2012.
Na verdade, aquele pedido deve ser feito nos primeiros 60 dias dos 90 que antecedem o respectivo prazo de autorização (artigo 19.º, n.º 1, do Regulamento Administrativo n.º 3/2005), sendo que findo o prazo de validade de autorização de residência, os interessados podem ainda requerer a renovação no prazo máximo de 180 dias, mediante o pagamento de multa (artigo 23.º, n.º 1, do Regulamento Administrativo n.º 5/2003).
Este último prazo terminava, como se disse, em 25 de Setembro de 2012.
Só em 1 de Fevereiro de 2013, requereu a recorrente a renovação da autorização de residência.
Diz que não foi notificada, em 10 de Julho de 2009, da aprovação da renovação da autorização de residência.
Mas foi, por intermédio da sua procuradora, que indicou como pessoa para contactos no âmbito do procedimento, aquando da efectivação do seu pedido de residência em Macau.
Improcede o vício suscitado.

3. Desconhecimento das leis de Macau
Alega a recorrente que não conhece as leis de Macau, não sabia das exigências do regime de renovação da autorização de residência.
Mas, nem em Macau, nem em algum território ou País, ao que se supõe, o desconhecimento das leis exime do seu cumprimento, muito menos no caso da recorrente que pretendia ser residente de Macau e a quem foi concedido tal estatuto. Menos, ainda, no caso específico das leis que regiam a renovação do estatuto de residência. Como se diz no artigo 5.º do Código Civil, a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.

4. Doença. Força maior.
Alega a recorrente que a não renovação no prazo aconteceu por força maior, por doença grave que impossibilitou a recorrente de fazer o pedido em tempo.
De acordo com o artigo 23.º, n.º 1, do Regulamento Administrativo n.º 5/2003, a falta do requerimento para renovação dentro do prazo do n.º 1, salvo por motivo de força maior devidamente comprovado, implica a caducidade da autorização de residência e a perda do tempo continuado para efeitos de aquisição da qualidade de residente permanente”.
Vejamos.
O último prazo para requerer a renovação da residência terminava em 25 de Setembro de 2012.
Só em 1 de Fevereiro de 2013, requereu a recorrente a renovação da autorização de residência.
Provou a recorrente que foi internada de urgência no Hospital, no Canadá, no dia 23 de Maio de 2012.
Não alegou quando saiu do Hospital. Temos, assim de considerar que, a partir do dia seguinte, 24 de Maio de 2012, deixou de estar internada, ou pelo menos não fez prova de estar internada.
Provou a recorrente que entre os dias 19 e 29 de Setembro de 2012 esteve internada no Hospital na cidade de Cantão, na República Popular da China, onde foi submetida a uma intervenção cirúrgica.
E nada mais.
Logo, entre de 24 de Maio e 18 de Setembro de 2012 não tem a recorrente qualquer motivo de força maior para não ter requerido o pedido de renovação.
Aliás, mesmo antes e até durante o período de doença, bem podia a recorrente ter deduzido o pedido por meio de procurador, como fez anteriormente.
Improcede o vício suscitado.
O acórdão recorrido não merece censura.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso jurisdicional.
Custas pela recorrente, fixando a taxa de justiça em 6 UC.
Macau, 13 de Fevereiro de 2015.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai


O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho






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Processo n.º 127/2014

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Processo n.º 127/2014