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 ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
A interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Exmo. Senhor Chefe do Executivo da RAEM proferido em 13 de Março de 2012 que ordenou a desocupação, no prazo de 15 dias a partir da recepção da respectiva notificação, da ponte-cais n.º XX, situada no Porto Interior, a remoção dos bens que nela ainda permaneciam bem como a devolução do terreno ao Governo da RAEM, sem direito a qualquer indemnização.
Por Acórdão proferido em 16 de Janeiro de 2014, o Tribunal de Segunda Instância decidiu negar provimento ao recurso, mantendo o acto administrativo recorrido.
Inconformada com a decisão, vem a A recorrer para o Tribunal de Última Instância, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
I. Vem o presente Recurso interposto do douto Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância que negou provimento ao Recurso Contencioso interposto pela ora Recorrente do acto administrativo consubstanciado no despacho exarado pelo Senhor Chefe do Executivo de 13 de Março de 2012, na Proposta da Capitania dos Portos n.º XX/ATJ/2012, que ordenou a desocupação da ponte cais n.º XX.
II. A ora Recorrente não se conforma com a decisão assim proferida pelo Tribunal de Segunda Instância, estando em crer que a mesma padece de erro de julgamento consubstanciado na violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade, justiça e razoabilidade.
III. Os factos dados por assentes pelo Douto Tribunal recorrido não poderiam conduzir à decisão que foi lavrada, no que respeita à violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade, justiça e razoabilidade.
IV. Andou bem o douto Tribunal a quo ao concluir que as pontes cais estão, na sua generalidade, alinhadas entre si, no entanto, no presente processo nada aponta para que em frente à ponte cais n.º XX exista algum estrangulamento ou condicionante que justifique a não renovação da licença de ocupação e o seu despejo.
V. Dos elementos existentes nos autos, para além da decisão arbitrária da entidade recorrida, resulta que, a localização (alinhamento e largura da via) da ponte cais XX é exactamente igual à da ponte cais XX e XX, conforme resulta das fotografias juntas com o requerimento datado de 04/10/2012.
VI. Ou seja, a situação da ponte cais n.º XX é pelo menos igual à data ponte cais n.ºs XX e XX, contudo estas últimas têm merecido por parte da Administração um tratamento completamente diferente, tendo vindo a ver as suas licenças anualmente renovadas.
VII. Donde se retira que em circunstâncias factuais iguais a Administração teve uma actuação diferente, em claro prejuízo da ora Recorrente.
VIII. Quanto à igualdade jurídica aludida na decisão sob recurso, salvo devido respeito por melhor opinião, ela só não existe porque, em violação destes mesmos princípios da igualdade, proporcionalidade, adequação e justiça, a licença de ocupação da ponte cais n.º XX não tem vindo a ser renovada desde 2010.
IX. Pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, mal andou o douto Tribunal de Segunda Instância ao considerar que a ordem de desocupação consubstanciada no acto administrativo sob recurso não é violadora do princípio da igualdade.
X. Não resulta de nenhum elemento junto aos autos e nem sequer tal foi abordado pela entidade administrativa ao longo de todo o procedimento, que a ocupação da ponte-cais n.º XX a curto e médio prazo impede o andamento do projecto de construção da via de circulação de transportes públicos em causa, ou se a imediata desocupação da ponte cais n.º XX se reputa essencial para efeitos do andamento de tal projecto.
XI. Quatro anos volvidos desde a não renovação da licença e dois anos volvidos desde a ordem de desocupação, não foi movida uma pedra com vista à implementação do aludido corredor exclusivo de autocarros e nem a população de Macau sequer ouviu falar em tal projecto – conforme aliás foi atestado pelas testemunhas ouvidas nos presentes autos.
XII. Não se tendo apurado que a não desocupação da ponte cais n.º XX tenha dado causa ao não andamento do projecto ou ao seu eventual atraso.
XIII. Por outro lado, se durante todo este tempo o Projecto de construção de um corredor exclusivo para autocarros da Barra até ao Porto Interior se desenvolveu e está a decorrer, então não se compreende em que medida se reputou necessária, adequada e razoável a não renovação da licença da ponte cais n.º XX e seu consequente despejo.
XIV. No que ao caso concreto diz respeito, salvo devido respeito por melhor opinião, um hiato de 4 anos desde a não renovação da licença e de 2 anos desde a ordem de desocupação sem que se retire que o não acatamento de tais actos tenham causado atrasos no projecto de obra em causa é, por si só, sintomático da desproporcionalidade, desadequação e injustiça de tais medidas.
XV. E assim sendo, do facto de não se ter apurado a urgência e manifesta necessidade de se proceder de imediato à desocupação da ponte-cais n.º XX, o douto Tribunal a quo não poderia nunca concluir que ao acto administrativo em crise se reputa proporcional, justo e razoável.
XVI. Pelo menos no curto e médio prazo, os interesses do ora Recorrente seriam nitidamente e injustificada mente preteridos em nome de um interesse público que não se reputa actual – o dos utentes da futura e alegada via exclusiva para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra.
XVII. Pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, a renovação da licença de ocupação à ora Recorrente pelo menos durante este quatro anos em que se viu obrigada a recorrer à via judicial para tentar fazer valer os seus direitos, sempre seria uma medida mais adequada, justa e proporcional que não contenderia e nem impediria a prossecução do interesse público.
XVIII. Ao decidir como decidiu, Douto Acórdão incorreu em manifesto erro de julgamento, aceitando o desrespeito dos mais elementares princípios fundamentais do direito que regem a actividade da Administração Pública, como sendo o princípio da igualdade, proporcionalidade, justiça e razoabilidade, violando, respectivamente, os artigos 5.º, 7.º do CPA e 21.º, n.º 1 alínea d) do CPAC.

Contra-alegando a entidade recorrida, pugna pela improcedência do recurso.
E o Exmo. Procurador-Adjunto do Ministério Público emitiu o douto parecer, entendendo que não merece provimento o presente recurso.
Foram corridos os vistos.
Cumpre decidir.

2. Factos Provados
Nos autos foram dados como assentes os seguintes factos:
A ora recorrente é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à actividade de importação e exportação de bens e produtos.
Por contrato de trespasse outorgado no Cartório Notarial do Dr. B, em 12 de Outubro de 1993 os então proprietários da ponte-cais n.º XX e titulares da licença de título precário da ponte de atracação, C, D e E, trespassaram a referida licença a favor da ora recorrente.
Na sequência da outorga do aludido contrato de trespasse, em 19 de Outubro de 1993, a ora recorrente solicitou à então Capitania dos Portos do Governo de Macau, a transmissão para seu nome da licença de exploração da ponte-cais n.º XX.
Transmissão essa que foi deferida por oficio n.º XXXX/XXX/CP da Capitania dos Portos de Macau datado de 21 de Outubro de 1993.
Desde então a recorrente tem explorado publicamente a ponte-cais n.º XX do Porto Interior, aí se se encontrando normalmente atracadas diversas embarcações e instalado um estabelecimento de venda de peixe e marisco, de seu nome “XXX蟹欄”, aí se encontrando também a sede da sociedade ora recorrente.
Em 10 de Julho de 2006, a ora Requerente, na qualidade de proprietária da ponte-cais n.º XX e na qualidade de representante do proprietário da ponte-cais n.º XX deram entrada na DSSOPT de um projecto conjunto de desenvolvimento de ambos os cais.
O aludido projecto consistia na construção de um edifício de três andares, no qual se incluía uma estação de carga e descarga de pescado, estacionamento de embarcações, zona de comércio de produtos do mar, um estabelecimento de comidas e bebidas e ainda de uma área destinada a instalar os escritórios de ambos os requerentes da licença de construção.
Após entrega do aludido projecto, em 8 de Novembro de 2006, os requerentes da licença, obtiveram o parecer positivo da DSSOPT que condicionou a atribuição da licença das obras a efectuar nas duas pontes cais à emissão de pareceres pela Capitania dos Portos de Macau, Companhia de Electricidade de Macau, Corpo de Bombeiros e Gabinete de Planeamento.
A Capitania dos Portos de Macau, depois de convidada pela DSSOPT para se pronunciar quanto à viabilidade do projecto apresentado pelos acima identificados requerentes, veio opor-se à emissão da licença de construção com os fundamentos constantes do despacho n.º XXXXX/DURDEP/2006 de 10 Agosto.
A recorrente foi desde Out./1993 titular da licença de ocupação a título precário da ponte-cais n.º XX até 31/12/2010.
As diferentes pontes cais encontram-se de um modo geral alinhadas entre si, mas existem à frente de cada uma delas, estrangulamentos diferentes subordinados a condicionantes diversas.
Por via do despacho do Exmo. Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas em 5 de Julho de 2011, na proposta n.º XX/DAPE-ATJ/2011 foi-lhe indeferida a renovação da licença de ocupação a título precário,
Decisão com a qual o ora recorrente não se conformou tendo inclusive do mesmo recorrido contenciosamente, tendo sido proferida decisão já transitada em seu desfavor.
Vindo a presente entidade recorrida, através do acto ora sob recurso, determinar a desocupação por parte da ora recorrente da ponte-cais n.º XX nos termos que melhor constam do acto recorrido.

O despacho que ordenou a desocupação da ponte-cais n.º XX foi notificado nos seguintes termos:
“Assunto: Despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e sua reversão ao Governo da RAEM

Aos advogados F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V:
I. De acordo com o despacho proferido pelo Chefe do Executivo na Informação n.º XX/ATJ/2012 da Capitania dos Portos em 13 de Março de 2012, notifica-se no seguinte:
Para a construção de corredores exclusivos para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, é necessário reservar a Ponte N.º XX do Porto Interior como via pública, e analisando as respectivas situações, o Chefe do Executivo, ao abrigo dos dispostos no art.º 7.º da Lei Básica, e nos art.ºs 41.º, al. o) e 174.º, n.º 1, al. c) da Lei de Terras, deu a seguinte ordem:
1. A titular da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior – a A – deve desocupar-se da Ponte N.º XX do Porto Interior no prazo de 15 dias a contar da recepção da notificação, a fim de reverter este terreno ao Governo da RAEM, mas não tem direito a qualquer indemnização;
2. O interessado deve proceder à remoção dos bens deixados na Ponte N.º XX do Porto Interior no prazo acima referido;
3. Em relação aos bens deixados na Ponte N.º XX do Porto Interior após o prazo acima referido, por não haver normas correspondentes na Lei n.º 6/86/M ou na Lei de Terras, deve-se aplicar por analogia o art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 6/93/M, de 15 de Fevereiro, ou seja que estes bens podem permanecer temporariamente no local indicado pela Capitania dos Portos depois de serem registados num auto; e caso não tenham sido reclamados os respectivos bens no prazo de 15 dias, serão considerados abandonados e perdidos;
4. Se o interessado não cumprir o seu dever, nos termos do art.º 144.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, ficam todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias, por conta do interessado.
Consta do anexo o extracto da Informação n.º XX/ATJ/2012 da Capitania dos Portos.

Nos termos do art.º 149.º do Código do Procedimento Administrativo, o interessado pode apresentar reclamação ao Chefe do Executivo no prazo de 15 dias a contar da recepção do presente ofício.
Nos termos do art.º 25.º, n.º 2 do Código do Processo Administrativo Contencioso e do art.º 36.º, al. 8) da Lei n.º 9/1999, republicada no Despacho do Chefe do Executivo n.º 265/2004, o interessado pode interpor recurso contencioso da supracitada decisão ao Tribunal de Segunda Instância no prazo de 30 dias a contar da recepção do presente ofício.
O interessado pode consultar o processo da Ponte N.º XX do Porto Interior no Departamento de Assuntos Portuários e Embarcações da Capitania dos Portos nas horas de funcionamento.

II. Se o interessado não cumprir o dever segundo a notificação acima referida, ficam por sua conta todas as despesas. Para o efeito, a Capitania dos Portos vem, de acordo com o princípio da boa fé previsto pelo art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo, emitir as seguintes instruções:
Ficam por conta do interessado todas as despesas para a remoção e o tratamento dos bens deixados na Ponte N.º XX do Porto Interior, pagas pelo Governo da RAEM, incluindo as despesas de transporte, armazenagem, guarda e limpeza. O montante das despesas é fixado conforme as circunstâncias concretas, prevalecendo a liquidação final. Tomando como referência casos semelhantes, as referidas despesas serão cerca de MOP$200.000,00 a MOP$600.000,00.

Director
(Ass.- vide o original)
Wong Soi Man”

O despacho proferido louvou-se na informação seguinte:
Anexo
Extracto da Informação n.º XX/ATJ/2012 da Capitania dos Portos

I. Relatório
1. Ponte N.º XX do Porto Interior, n.º de cadastro XXXXXXXX.
De acordo com a certidão de registo predial emitida pela Conservatória do Registo Predial em 29 de Agosto de 2011, a Ponte N.º XX do Porto Interior não se encontra descrita na CRP.
2. A última licença de ocupação a título precário (n.º XXX/2009) da Ponte N.º XX do Porto Interior expirou em 31 de Dezembro de 2010, e a sua titular é a A.
Depois, o Governo da RAEM não concedeu qualquer nova licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior.
3. A A apresentou no dia 14 de Outubro de 2010 à Capitania dos Portos requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior para o ano 2011.
Para o supracitado requerimento, no dia 5 de Julho de 2011, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas proferiu despacho na Informação n.º XX/DAPE-ATJ/2011 da Capitania dos Portos, indeferindo o requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior e solicitando que a titular da última licença de ocupação a título precário, ou seja a A, procedesse à remoção dos bens desmontáveis no prazo de 30 dias, a fim de devolver a Ponte ao Governo da RAEM.
4. A Capitania dos Portos já notificou, em 11 de Julho de 2011, o interessado dos seguintes assuntos através do ofício n.º SATJXXXXXXXC:
“De acordo com o despacho proferido pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas em 5 de Julho de 2011 na Informação n.º XX/DAPE-ATJ/2011, notifica-se no seguinte:
1. Indefere-se o requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior;
2. Solicita-se que a titular da última licença de ocupação a título precário, ou seja a A, proceda à remoção dos bens desmontáveis no prazo de 30 dias, a fim de devolver a Ponte ao Governo da RAEM.”
5. Porém, a A ainda não procedeu à remoção dos seus bens na Ponte N.º XX do Porto Interior.
6. No dia 13 de Janeiro de 2012, a Capitania dos Portos realizou, através do ofício n.º SATJXXXXXXXF, audiência escrita do interessado sobre o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM.
7. Para a audiência escrita referida no ofício n.º SATJXXXXXXXF, o advogado W de [Escritório de advogados], representando a A, apresentou à Capitania dos Portos o seu parecer por escrito no dia 26 de Janeiro de 2012.

II. Análise
8. Foi concedida à A a licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior em 1994.
A relação jurídica de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior pela A foi regulada pela Lei n.º 6/86/M (Domínio Público Hídrico) de 26 de Julho, vigente na altura.
De acordo com o anexo II da Lei n.º 1/1999 (Lei de Reunificação), a Lei n.º 6/86/M não foi adoptada pela legislação da RAEM, todavia, enquanto não for elaborada nova legislação, as questões nele reguladas são tratadas de acordo com os princípios contidos na Lei Básica da RAEM, tendo por referência as práticas anteriores.
9. Actualmente, não há provas de que a Ponte N.º XX do Porto Interior tornou-se bem particular em 1 de Julho de 1870 ou da sua posse por particular, nem foi provado que o anterior Governo de Macau confirmou segundo a Lei n.º 6/86/M que a Ponte N.º XX do Porto Interior era propriedade privada.
Segundo a certidão de registo predial emitida pela Conservatória do Registo Predial em 29 de Agosto de 2011, a Ponte N.º XX do Porto Interior não se encontra descrita na CRP.
10. Nos termos do art.º 7.º da Lei Básica da RAEM, os solos e os recursos naturais na Região Administrativa Especial de Macau são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos, de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento, bem como pelo seu arrendamento ou concessão a pessoas singulares ou colectivas para uso ou desenvolvimento. Os rendimentos daí resultantes ficam exclusivamente à disposição do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.
A Ponte N.º XX do Porto Interior não foi reconhecida como propriedade privada antes do estabelecimento da RAEM, pelo que é propriedade do Estado, e o Governo da RAEM é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento.
11. De acordo com a Portaria n.º 122/89/M de 31 de Julho, a Ponte N.º XX do Porto Interior encontra-se no âmbito de domínio público hídrico.
Pelos expostos, a Ponte N.º XX do Porto Interior é reconhecida como domínio público.
12. Tomando como referência o art.º 13.º da Lei n.º 6/86/M, a licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior confere aos seus titulares o direito de utilização desta ponte no prazo de validade da licença.
Com a expiração da última licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior (n.º XXX/2009) em 31 de Dezembro de 2010, o direito da original titular – a A – de utilizar a Ponte N.º XX do Porto Interior já caducou.
Por isso, a partir do dia 1 de Janeiro de 2011, a A não teve o direito de utilizar a Ponte N.º XX do Porto Interior.
13. Tomando como referência o art.º 17.º, n.º 2 da Lei n.º 6/86/M, após o termo de validade da última licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior (n.º XXX/2009) em 31 de Dezembro de 2010, a A deve desocupar-se da referida ponte.
14. Em 15 de Dezembro de 2010, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego mencionou no relatório n.º XXXX/DDPDT/2010 a concepção de construção de corredores exclusivos para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, sugerindo aos respectivos serviços a reserva das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior como terreno destinado à construção de vias públicas, e nos planeamentos de desenvolvimento das construções próximas e de aproveitamento de terrenos, deve-se também considerar a necessidade de reserva do espaço para o tráfego.
15. Em 10 de Março de 2011, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego mencionou no ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011 que, do ponto de vista do trânsito em Macau, para a execução dos planos a curto e a longo prazo, é necessária e viável a reserva das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior, sugerindo também a aplicação de medidas de acompanhamento correspondentes.
16. Para a reserva da Ponte N.º XX do Porto Interior como terreno destinado à construção de vias públicas e coordenar com o desenvolvimento do trânsito geral de Macau, é necessário o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM, para efeitos da sua gestão, uso e desenvolvimento.
17. Quer no Código Civil de 1966 (art.º 202.º, n.º 2), quer no Código Civil actualmente vigente (art.º 193.º), dispõe-se que as coisas que se encontram no domínio público são consideradas fora do comércio e não podem ser objecto de direitos privados ou apropriadas por particulares.
Por a Ponte N.º XX do Porto Interior encontrar-se no âmbito de domínio público, o seu direito real (incluindo o direito de superfície) não pode ser adquirido ou transferido por particulares.
O interessado não tem direito de superfície da Ponte N.º XX do Porto Interior, pelo que não pode arrogar-se o direito real das construções na Ponte N.º XX do Porto Interior.
18. Tomando como referência o art.º 21.º, n.º 1 e n.º 2 da Lei n.º 6/86/M, no caso de uso do terreno do domínio público por conveniência de interesse público, as concessões e licenças podem ser anuladas mediante actos fundamentados; a anulação da licença não confere ao interessado qualquer direito à indemnização, mas este pode levantar as benfeitorias que não afectam o interesse económico de Macau.
Nos termos do art.º 75.º da Lei de Terras, o ocupante não tem direito de levantar as benfeitorias introduzidas no terreno nem de ser indemnizados por elas, qualquer que seja o motivo do termo da ocupação, devendo, porém, ser reembolsado da importância da taxa correspondente ao tempo por que ainda teria direito a ocupar o terreno.
Nestes termos, após a caducidade da licença de ocupação a título precário, para o assunto de despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM, o interessado não tem direito à indemnização.
19. De acordo com o art.º 7.º da Lei Básica da RAEM, o art.º 41.º, al. o) e o art.º 174.º, n.º 1, al. c) da Lei de Terras, o Chefe do Executivo tem competência para ordenar o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM.
Quando chega o momento, o respectivo interessado deve proceder ao despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior no prazo indicado pelo Chefe do Executivo; senão, a autoridade administrativa pode tomar medidas necessárias, e os bens não removidos ou reclamados no prazo indicado serão considerados abandonados.

III. Análise do parecer por escrito apresentado pelo interessado
20. A A não tem direito de propriedade da Ponte N.º XX do Porto Interior ou dos edifícios nela construídos, também não tem direito real de qualquer natureza. (em relação à parte II do parecer por escrito)
20.1 Na Lei n.º 6/86/M, aplicada por analogia pela Lei n.º 1/1999 (Lei de Reunificação), têm-se os seguintes dispostos sobre a licença de ocupação a título precário:
“As licenças, enquanto se mantiverem, conferem aos seus titulares o direito de utilização exclusiva, para os fins e com os limites consignados no título constitutivo (art.º 13.º da Lei n.º 6/86/M);
As licenças são outorgadas pelo período de um ano, e o prazo das renovações sucessivas das licenças não pode exceder, para cada uma, um ano (art.º 14.º, n.º 1 e n.º 3 da Lei n.º 6/86/M);
Decorrido o prazo da licença as instalações desmontáveis devem ser removidas (art.º 17.º, n.º 2 da Lei n.º 6/86/M).”
20.2 Com base nisso, cada licença provisória só confere aos seus titulares o direito de utilização exclusiva pelo período de um ano, e este direito caduca com a expiração do prazo da licença. Decorrido o prazo da licença, o interessado deve desocupar-se do porto.
20.3 Além disso, a Capitania dos Portos emitiu apenas licenças de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior, isso significa que a autoridade administrativa nunca tinha admitido que o titular da licença de ocupação a título precário era o proprietário desta ponte e dos edifícios nela construídos.
20.4 É referido no acórdão n.º 71/2010 do TUI:
「Dão-se aqui por reproduzidas as considerações vertidas no mencionado Acórdão de 5 de Julho de 2006. Aí se disse, designadamente:
“Prescreve o art.º 7.º desta Lei (refere-se à Lei Básica):
“Os solos e os recursos naturais na Região Administrativa Especial de Macau são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos, de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento, bem como pelo seu arrendamento ou concessão a pessoas singulares ou colectivas para uso ou desenvolvimento. Os rendimentos daí resultantes ficam exclusivamente à disposição do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.”
Desta norma resulta que foi estabelecido pela Lei Básica o princípio de que a propriedade e a gestão dos solos e recursos naturais no âmbito da Região cabem respectivamente ao Estado e ao Governo da Região. No entanto, a fim de respeitar e proteger os poucos terrenos da propriedade privada já existentes em Macau, é admitida excepção a este princípio, isto é, continuar a reconhecer os direitos de propriedade privada de terrenos anteriormente existentes.
Há um requisito para a excepção, que consiste em que os terrenos de propriedade privada devem ser “reconhecidos, de acordo com a lei, antes do estabelecimento da RAEM.”
Uma vez que após o estabelecimento da Região, todos os terrenos situados no âmbito territorial da Região são de propriedade do Estado, excepto os que foram reconhecidos como propriedade privada nos termos da lei antes do estabelecimento da Região. Em consequência, não é possível constituir uma nova propriedade privada de terrenos depois da criação da Região, sob pena de violar a disposição do art.º 7.º da Lei Básica.
Se a acção de reconhecimento do direito de propriedade sobre terrenos fosse proposta por interessados apenas depois do estabelecimento da Região, os seus pedidos estariam manifestamente em desconformidade com o art.º 7.º da Lei Básica por que todos os terrenos não reconhecidos como de propriedade privada até ao estabelecimento da Região passam, a partir deste, a integrar na propriedade do Estado.
Mesmo que a acção fosse instaurada antes do estabelecimento da Região, tal como acontece com o presente processo, os referidos pedidos também não podem proceder se não houver sentença transitada até ao momento do estabelecimento da Região, o que equivale à falta de reconhecimento nos termos da lei e os pedidos de interessados violam a disposição do art.º 7.º da Lei Básica.
É a mesma a razão de fundo das duas situações. Desde que não fosse confirmada legalmente a natureza privada da propriedade de terrenos antes do estabelecimento da Região, jamais pode obter a confirmação depois da criação da Região, independentemente da qualificação doutrinal deste tipo de acção como constitutiva ou declarativa, sob pena de violação do princípio consagrado no art.º 7.º da Lei Básica, segundo o qual a propriedade dos terrenos na Região cabe ao Estado. Os tribunais não podem proferir sentença de reconhecimento do direito de propriedade privada sobre os terrenos, em desobediência ao disposto na referida norma, após o estabelecimento da Região, ou seja, a partir da entrada em vigor da Lei Básica.”」
20.5 É referido no sumário do Acórdão n.º 26/2000 do TSI:
“III – Bens do domínio público são o conjunto de coisas que pertencendo a uma pessoa colectiva de direito público de população e território, são submetidas por Lei, dado o fim de utilidade pública a que se encontram afectadas, a um regime jurídico especial caracterizado fundamentalmente pela sua incomercialidade, em ordem a preservar a produção dessa utilidade pública.
IV – Sendo os bens parte integrante do domínio público, estão fora do comércio jurídico, não podendo ser objecto de apropriação individual e insusceptíveis de ser adquiridos por uscapião.
V – A situação jurídica do utente privativo do domínio público, detentor da licença, é meramente de carácter obrigacional e nunca de natureza real, não lhe sendo lícito arvorar-se da qualidade de titular de um direito real.”
(Colectânea de Traduções dos Acórdãos do Tribunal de Segunda Instância da RAEM, TOMO I, 2000, p. 349)
20.6 Nestes termos, e com base no facto de a Ponte N.º XX do Porto Interior ser domínio público, a titular da anterior licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior – a A – não tem direito de propriedade da Ponte N.º XX do Porto Interior e dos edifícios nela construídos, e também não tem direito real de qualquer natureza.
21. A reclamação do despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e da sua reversão ao Governo da RAEM para efeitos de construção de vias públicas não violou os princípios da igualdade e da proporcionalidade. (em relação à parte III do parecer por escrito)
21.1 A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego disse no relatório n.º XXXX/DDPDT/2010: “…analisando os dados existentes na actual fase, ao longo de DBL (corredores exclusivos para autocarros), são estreitas as vias na Rua do Visconde Paço de Arcos e na Avenida de Demétrio Cinatti, e só pode construir um corredor exclusivo para autocarros num sentido. Perto do Silo do Porto Interior, por existir uma série de construções tais como instalações aduaneiras e as Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior, a faixa de rodagem tem apenas 3,35 metros de largura (vide as fotos anexas), pelo que na construção de DBL no futuro, será difícil que a referida faixa de rodagem serve para o desvio de tráfego, mas ao contrário, pode constituir um novo obstáculo de trânsito; por isso, a empresa de consultoria propõe a deslocação das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior acima referidas por uma distância de 4 metros em direcção ao Porto Interior, assim não só pode alargar a faixa de rodagem, mas também pode construir duas faixas de rodagem no sentido ao norte.”
21.2 A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego também indicou no ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011: “para a coordenação com a construção de corredores exclusivos para autocarros, é necessário reforçar as capacidades de trânsito e de desvio de tráfego das ruas entre as Portas do Cerco e a Barra; a Avenida de Demétrio Cinatti tem um efeito de desvio de tráfego na Rua do Visconde Paço de Arcos, actualmente a maior parte da Avenida de Demétrio Cinatti tem condição para o trânsito nos dois sentidos, mas a largura da faixa de rodagem antes da Ponte N.º XX do Porto Interior é inferior à largura normal, e não é ideal a condição de trânsito. Se poder resolver o supracitado problema, será mais conveniente a execução do supracitado plano de construção de corredores exclusivos para autocarros e para o funcionamento do trânsito no Porto Interior.”
21.3 O relatório e o ofício acima referidos já disseram expressamente que a faixa de rodagem ao lado das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior tem apenas 3,35 metros de largura, e para resolver o possível problema de trânsito causado pela construção de corredores exclusivos para autocarros, é necessária a reserva das referidas Pontes como terreno destinado à construção de vias públicas.
21.4 Devido à situação geográfica, é relativamente estreita a faixa de rodagem ao lado das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior, e tal condição objectiva já resultou na diferença entre estas Pontes e outras.
21.5 A autoridade administrativa solicita o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM, a fim de executar o plano de construção de corredores exclusivos para autocarros e satisfazer as necessidades do público. A decisão da autoridade administrativa tem por fim realizar o interesse público, e o meio aplicado é adequado considerando a sua finalidade, e é necessário para a sua realização.
21.6 Em fim, a autoridade administrativa não violou os princípios da igualdade e da proporcionalidade ao solicitar o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM para a construção de vias públicas.
22. Não existe desvio de poder nem foi violado o princípio da colaboração entre a Administração e os particulares. (em relação à parte IV do parecer por escrito)
22.1 É referido no Acórdão n.º 29/2003 do TUI: 「como se sabe, “o desvio de poder é o vício que consiste no exercício de um poder discricionário por um motivo principalmente determinante que não condiga com o fim que a lei visou ao conferir aquele poder” e “pressupõe uma discrepância entre o fim legal e o fim real (ou fim efectivamente prosseguido pela Administração)”. (Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 2002, pág. 394)
Conforme o mesmo autor, o desvio de poder comporta duas modalidades principais: uma, o desvio de poder por motivo de interesse público, quando a Administração visa alcançar um fim de interesse público, diverso daquele que a lei impõe; e a outra, desvio de poder por motivo de interesse privado, quando a Administração não prossegue um fim de interesse público, mas sim um fim de interesse privado.」
22.2 Como acima referido, para a construção de corredores exclusivos para autocarros, é necessária a reserva das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior como terreno destinado à construção de vias públicas, para evitar novos obstáculos ao trânsito. É viável e necessária a referida reserva.
22.3 O despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior é destinado à construção de corredores exclusivos para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, bem como a coordenação com a execução do planeamento de tráfego a curto e a longo prazo. Até agora, o supracitado objectivo não é alterado.
Os respectivos actos visam, sem dúvida, realizar o interesse público.
22.4 A autoridade administrativa tem suficientes fundamentos de facto e de direito para solicitar o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM.
Por isso, não se verifique neste caso o desvio de poder.
22.5 Para efeitos de reserva da Ponte N.º XX do Porto Interior, a Capitania dos Portos realizou, através do ofício n.º SATJXXXXXXXE, audiência escrita da A sobre o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a remoção dos bens desmontáveis.
22.6 O pedido do interessado, a Capitania dos Portos já forneceu, em forma de certificado, dados arquivados sobre a Ponte N.º XX do Porto Interior.
22.7 A Capitania dos Portos já notificou, mediante o ofício n.º SATJXXXXXXXC, o interessado da decisão feita pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas de indeferir o requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário do Ponte N.º XX do Porto Interior.
Consta do supracitado ofício o extracto da Informação n.º XX/DAPE-ATJ/2011.
22.8 No dia 13 de Janeiro de 2012, a Capitania dos Portos realizou, através do ofício n.º SATJXXXXXXXF, audiência escrita do interessado sobre o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM.
22.9 De acordo com os ofícios n.º SATJXXXXXXXE, n.º SATJXXXXXXXC, n.º SATJXXXXXXXF e o certificado emitidos pela Capitania dos Portos, o interessado pode ter conhecimento dos respectivos fundamentos de direito e de facto, e também tem suficientes oportunidades de pronunciar-se, pelo que não se verifica a violação do princípio da colaboração entre a Administração e os particulares.
22.10 Em resumo, não se verifica o desvio de poder na reclamação do despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e da sua reversão ao Governo da RAEM, e não foi violado o princípio da colaboração entre a Administração e os particulares.
23. A reclamação do despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e da sua reversão ao Governo da RAEM não viola as leis vigentes. (em relação à parte V do parecer por escrito)
23.1 Como acima referido no art.º 20.º, a Ponte N.º XX do Porto Interior encontra-se no âmbito do domínio público, a A não tem direito de propriedade da respectiva Ponte e dos edifícios nela construídos, e também não tem direito real de qualquer natureza.
23.2 A autoridade administrativa tem suficientes fundamentos de direito e de facto para solicitar ao interessado o despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM, tendo explicado expressamente ao interessado os referidos fundamentos e não padecendo de qualquer vício. Por isso, não se verifica qualquer vício de violação de princípios ou disposições legais aplicáveis.

IV. Propostas
24. Para a construção de corredores exclusivos para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, é necessário reservar a Ponte N.º XX do Porto Interior como via pública. Resumindo o acima referido, propõe-se que:
24.1 O Chefe do Executivo, ao abrigo dos dispostos no art.º 7.º da Lei Básica, e nos art.ºs 41.º, al. o) e 174.º, n.º 1, al. c) da Lei de Terras, dar a seguinte ordem:
24.1.1 A titular da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior – a A – deve desocupar-se da Ponte N.º XX do Porto Interior no prazo de 15 dias a contar desde a recepção da notificação, a fim de reverter este terreno ao Governo da RAEM, mas não tem direito a qualquer indemnização;
24.1.2 O interessado deve proceder à remoção dos bens deixados na Ponte N.º XX do Porto Interior no prazo mencionado no ponto 24.1.1;
24.2 No caso de o interessado não cumprir a ordem mencionada no ponto 24.1 no prazo indicado, pede-se ao Chefe do Executivo para autorizar o seguinte procedimento administrativo:

24.2.3 Em relação aos bens deixados na Ponte N.º XX do Porto Interior após o prazo acima referido, por não haver normas correspondentes na Lei n.º 6/86/M ou na Lei de Terras, deve-se aplicar por analogia o art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 6/93/M, de 15 de Fevereiro, ou seja que estes bens podem permanecer temporariamente no local indicado pela Capitania dos Portos depois de serem registados num auto; e caso não tenham sido reclamados os respectivos bens no prazo de 15 dias, serão considerados abandonados e perdidos;
24.2.4 Nos termos do art.º 144.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, ficam todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias, por conta do interessado;
…”

Retira-se do PA que a Administração deu conhecimento à interessada do seguinte, relativamente ao estudo prévio de arquitectura das pontes cais n.ºs XX e XX:
“Assunto: Estudo prévio de arquitectura das Pontes N.º XX-XX do Porto Interior
Arquivo n.º: XXX/2005/L

No uso dos poderes conferidos no despacho n.º X/SOTDIR/2000 publicado no Boletim Oficial da RAEM de 15 de Novembro de 2000 e segundo o despacho proferido pelo Subdirector da DSSOPT em 27 de Outubro, notifica-se a V. Exª. de que a DSSOPT já emitiu parecer de viabilidade do supracitado plano, com observância de:
1. Parecer n.º XXXX/ATJ/2006 da Capitania dos Portos.
2. Parecer n.º XXXX/DT/2006 do Corpo dos Bombeiros.
3. Parecer n.º XXXXXX/06DDI da Companhia de Electricidade de Macau, S.A.
4. Parecer a ser emitido pelo Departamento de Planeamento Urbanístico da DSSOPT.

Com os melhores cumprimentos

Director (substituto pelo Chefe do Departamento de Urbanização)
(Ass.- vide o original)”

A recorrente foi notificada do seguinte:
“Assunto: Requerimento de renovação da licença da Ponte N.º XX do Porto Interior – audiência escrita

Para o requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior apresentado pela vossa Companhia em 14 de Outubro de 2010, realiza-se, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo, audiência escrita da vossa Companhia:
1. A vossa Companhia obteve a licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior em 1994. A relação jurídica de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior pela vossa Companhia foi regulada pela Lei n.º 6/86/M (Domínio Público Hídrico) de 26 de Julho, vigente na altura.
De acordo com o anexo II da Lei n.º 1/1999 (Lei de Reunificação), a Lei n.º 6/86/M não foi adoptada pela legislação da RAEM, todavia, enquanto não for elaborada nova legislação, as questões nele reguladas são tratadas de acordo com os princípios contidos na Lei Básica da RAEM, tendo por referência as práticas anteriores.
2. Actualmente, não há provas de que a Ponte N.º XX do Porto Interior tornou-se bem particular em 1 de Julho de 1870 ou da sua posse por particular, nem há documentos comprovativos de que o anterior Governo de Macau confirmou segundo a Lei n.º 6/86/M que a Ponte N.º XX do Porto Interior era propriedade privada.
Por outro lado, o anterior Governo de Macau e o Governo da RAEM tiveram emitido, de forma contínua, licenças de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior.
De acordo com a Portaria n.º 122/89/M de 31 de Julho, a Ponte N.º XX do Porto Interior encontra-se no âmbito de domínio público hídrico.
Com base nos supracitados factos, a Ponte N.º XX do Porto Interior é reconhecida como domínio público.
3. Nos termos do art.º 7.º da Lei Básica da RAEM, os solos e os recursos naturais na Região Administrativa Especial de Macau são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos, de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento, bem como pelo seu arrendamento ou concessão a pessoas singulares ou colectivas para uso ou desenvolvimento. Os rendimentos daí resultantes ficam exclusivamente à disposição do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.
A Ponte N.º XX do Porto Interior é domínio público, pelo que é propriedade do Estado, e o Governo da RAEM é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento.
4. Em 15 de Dezembro de 2010, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego mencionou no relatório n.º XXXX/DDPDT/2010 a concepção de construção de corredores exclusivos para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, sugerindo aos respectivos serviços a reserva das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior como terreno destinado à construção de vias públicas, e nos planeamentos de desenvolvimento das construções próximas e de aproveitamento de terrenos, deve-se também considerar a necessidade de reserva do espaço para o tráfego.
5. Em 10 de Março de 2011, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego mencionou no ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011 que, do ponto de vista do trânsito em Macau, para a execução dos planos a curto e a longo prazo, é necessária e viável a reserva das Pontes N.º XX e N.º XX do Porto Interior, sugerindo também a aplicação de medidas de acompanhamento correspondentes.
6. Tomando como referência o art.º 20.º, n.º 1 da Lei n.º 6/86/M, se os terrenos dominiais forem considerados necessários à utilização pelo público sob a forma de uso comum ou se outro motivo de interesse público assim o exigir, as concessões e licenças podem ser anuladas através de actos fundamentados.
Com base na necessidade de utilização pública ou de outro interesse público, o Governo da RAEM também pode não renovar as licenças de ocupação a título precário do domínio público hídrico.
7. Assim, para a reserva da Ponte N.º XX do Porto Interior como terreno destinado à construção de vias públicas e coordenar com o desenvolvimento do trânsito geral de Macau, pode o Governo da RAEM não aprovar o requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior.
Se o Governo da RAEM não aprovar o requerimento de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte N.º XX do Porto Interior, a vossa Companhia perderá o direito de utilizar a referida Ponte, e tem de remover os bens desmontáveis na Ponte, para efeitos da sua reversão ao Governo da RAEM.
8. Quer no Código Civil de 1966 (art.º 202.º, n.º 2), quer no Código Civil actualmente vigente (art.º 193.º), dispõe-se que as coisas que se encontram no domínio público são consideradas fora do comércio e não podem ser objecto de direitos privados ou apropriada por particulares.
Por a Ponte N.º XX do Porto Interior encontrar-se no domínio público, o seu direito real (incluindo o direito de superfície) não pode ser adquirido ou transferido por particulares.
O interessado não tem direito de superfície da Ponte N.º XX do Porto Interior, pelo que não pode arrogar-se o direito real de construções na Ponte N.º XX do Porto Interior.
9. Tomando como referência o art.º 21.º, n.º 2 da Lei n.º 6/86/M, no caso de uso do terreno do domínio público por conveniência de interesse público, as concessões e licenças podem ser anuladas através de actos fundamentados; a anulação da licença não confere ao interessado qualquer direito à indemnização, mas este pode levantar as benfeitorias que não afectam o interesse económico de Macau.
Nos termos do art.º 75.º da Lei de Terras, o ocupante não tem direito de levantar as benfeitorias introduzidas no terreno nem de ser indemnizados por elas, qualquer que seja o motivo do termo da ocupação, devendo, porém, ser reembolsado da importância da taxa correspondente ao tempo por que ainda teria direito a ocupar o terreno.
Nestes termos, após a caducidade da licença de ocupação a título precário, para o assunto de despejo da Ponte N.º XX do Porto Interior e a sua reversão ao Governo da RAEM, o interessado não tem direito à indemnização.
A vossa Companhia pode entregar à Capitania dos Portos o seu parecer por escrito no prazo de 15 dias a contar da recepção do presente ofício.

A vossa Companhia pode consultar o processo da Ponte N.º XX do Porto Interior no Departamento de Assuntos Portuários e Embarcações da Capitania dos Portos nas horas de funcionamento.

Com os melhores cumprimentos
Director
(Ass.- vide o original)
Wong Soi Man”

O despacho que ordenou a desocupação ora posta em crise baseou-se nos seguintes relatório e propostas:
“Assunto: Despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e sua devolução ao Governo da RAEM.
Proposta N.º: XX/ATJ/2012
Data: 17/02/2012

Para o Director da Capitania dos Portos

Para o assunto de exigir que a original titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior – A – proceda ao despejo da Ponte-cais n.º XX e sua devolução ao Governo da RAEM, vem-se prestar o seguinte relatório e as sugestões.

I. Relatório
1. Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, n.º XXXXXXXX na planta cadastral.
Segundo a certidão de registo predial emitida pela Conservatória do Registo Predial em 29 de Agosto de 2011, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior não é descrito. (vide o anexo 1: Certidão de registo predial emitida pela Conservatória do Registo Predial em 29 de Agosto de 2011)
2. A última licença de ocupação a título precário (n.º XXX/2009) da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior expirou em 31 de Dezembro de 2010, e o seu titular é a A. (vide o anexo 2: Licença de ocupação a título precário n.º XXX/2009)
Depois, o Governo da RAEM não emitiu nova licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior a qualquer pessoa.
3. No dia 14 de Outubro de 2010, a A apresentou à Capitania dos Portos o pedido de renovação da licença de ocupação a título precário do ano 2011 da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
Para o supracitado pedido, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas proferiu em 5 de Julho de 2011 despacho na proposta n.º XX/DAPE-ATJ/2011 da Capitania dos Portos, não aprovando a renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, e notificando o antigo titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, ou seja a A para proceder, no prazo de 30 dias, à demolição dos objectos amovíveis na ponte-cais, de forma à restituição desta à posse do Governo da RAEM.
(vide o anexo 3: Proposta n.º XX/DAPE-ATJ/2011 da Capitania dos Portos)
4. A Capitania dos Portos já notificou os interessados do seguinte assunto através do ofício n.º SATJXXXXXXXC de 11 de Julho de 2011:
“De acordo com o despacho de 5 de Julho de 2011 proferido pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas na proposta n.º XX/DAPE-ATJ/2011 da Capitania dos Portos de Macau, notifica-se, designadamente:
1. O indeferimento do pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da ponte-cais n.º XX do Porto Interior;
2. O requerimento, ao antigo titular da licença de ocupação a título precário da ponte-cais n.º XX do Porto Interior, ou seja, a A, de proceder, no prazo de 30 dias, à demolição dos objectos amovíveis na ponte-cais, de forma à restituição desta à posse da Região Administrativa Especial de Macau.”
(vide o anexo 4: Ofício n.º SATJXXXXXXXC da Capitania dos Porto)
5. Porém, a A ainda não se desocupou da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
6. No dia 13 de Janeiro de 2012, a Capitania dos Portos procedeu à audiência escrita da A sobre o assunto de despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e da sua restituição à posse do Governo da RAEM através do ofício n.º SATJXXXXXXXF.
(vide o anexo 5: Ofício n.º SATJXXXXXXXF da Capitania dos Portos)
7. Para o assunto de audiência escrita referido no ofício n.º SATJXXXXXXXF, o advogado W de [Escritório de advogados], representando a A, apresentou à Capitania dos Portos o seu parecer por escrito no dia 26 de Janeiro de 2012.
(vide o anexo 6: Parecer por escrito do interessado)

II. Análise
8. Foi emitida à A, em 1994, a licença de ocupação da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
A relação jurídica da ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior pela companhia foi regulada pela Lei n.º 6/86/M de 26 de Julho (Lei do domínio público hídrico) que já entrou em vigor naquele tempo.
De acordo com o anexo 2 da Lei n.º 1/1999 (Lei de Reunificação), a Lei n.º 6/86/M não é adoptada como lei da Região Administrativa Especial de Macau. Todavia, enquanto não for elaborada nova legislação, pode a Região Administrativa Especial de Macau tratar as questões nela reguladas de acordo com os princípios contidos na Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, tendo por referência as práticas anteriores.
9. Não se encontra actualmente nenhum documento que comprove que a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior tinha sido uma propriedade privada ou possuída particularmente em 1 de Julho de 1870, nem documento do então Governo Português de Macau que comprovasse, de acordo com a Lei n.º 6/86/M, que a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior tinha sido uma propriedade privada.
Segundo a certidão de registo predial emitida pela Conservatória do Registo Predial em 29 de Agosto de 2011, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior não se encontra descrita na CRP.
10. Nos termos do art.º 7.º da Lei Básica da RAEM, os solos e os recursos naturais na Região Administrativa Especial de Macau são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos, de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento, bem como pelo seu arrendamento ou concessão a pessoas singulares ou colectivas para uso ou desenvolvimento. Os rendimentos daí resultantes ficam exclusivamente à disposição do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.
Por ser bem do domínio público a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, esta é propriedade do Estado. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão.
11. De acordo com a Portaria n.º 122/89/M de 31 de Julho, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior encontra-se no âmbito de domínio público hídrico.
Com base nisso, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior é reconhecida como domínio público.
12. Nos termos do art.º 13.º da Lei n.º 6/86/M, a licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior confere aos seus titulares o direito de utilização desta ponte-cais no prazo de validade da licença.
Com a expiração da última licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior (n.º XXX/2009) em 31 de Dezembro de 2010, o direito do seu antigo titular – a A – de utilizar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior já caducou.
Por isso, a partir do dia 1 de Janeiro de 2011, a A não tem o direito de usar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
13. Nos termos do art.º 17.º, n.º 2 da Lei n.º 6/86/M, após o termo de validade da última licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior (n.º XXX/2009) em 31 de Dezembro de 2010, a A deve desocupar-se da referida ponte-cais.
14. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego mencionou no relatório n.º XXXX/DDPDT/2010 de 15 de Dezembro de 2010 a concepção de construção de Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, sugerindo-se que os respectivos serviços reservassem os espaços das pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública, e que o desenvolvimento e plano dos edifícios na vizinhança tivessem de ter em conta a necessidade de reservar espaços para o trânsito. (vide o anexo 7: Relatório n.º XXXX/DDPDT/2010 da DSAT)
15. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego emitiu em 10 de Março de 2011 o ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011, referindo que, considerando a partir do ponto de vista do trânsito integral de Macau e para coordenar a execução dos planos recentes e a longo prazo, é necessário e viável reservar as pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública. O ofício também sugeriu que a Capitania dos Portos adoptasse respectivas medidas para a cooperação da realização do respectivo plano. (vide o anexo 8: Ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011 da DSAT)
16. Para reservar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior para via pública e coordenar com o desenvolvimento do trânsito integral de Macau, é necessário o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição à posse do Governo da RAEM, para efeitos da sua gestão, uso e desenvolvimento.
17. É previsto, tanto no Código Civil de 1996 (o art.º 202.º, n.º 2) como no Código Civil vigente (o art.º 193.º), que todas as coisas que se encontram no domínio público são consideradas fora do comércio e não podem ser objecto de direitos privados, nem apropriadas pessoalmente.
Por a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior encontrar-se no domínio público, os seus direitos reais (incluindo o direito de superfície) não podem ser adquiridos ou transmitidos pessoalmente.
Por o interessado não ter o direito de superfície sobre a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, ele não pode sustentar, para o Governo da RAEM, a posse do direito de construção nesta ponte-cais.
18. Nos termos do art.º 21.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 6/86/M, as concessões e as licenças podem ser extintas, mediante acto fundamentado, se os terrenos dominais forem considerados necessários à utilização pelo público sob a forma de uso comum ou se outro motivo de interesse público assim o exigir; a revogação das licenças não confere ao interessado direito a qualquer indemnização, podendo ser levantadas as benfeitorias que não afectem a utilidade económica do terreno.
Nos termos do art.º 75.º da vigente Lei de Terras, o ocupante não tem direito de levantar as benfeitorias introduzidas no terreno nem de ser indemnizado por elas, qualquer que seja o motivo do terreno da ocupação, devendo, porém, ser reembolsado da importância da taxa correspondente ao tempo por que ainda teria direito a ocupar o terreno.
Com base no disposto acima referido, o interessado não teria direito a indemnização se a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior for devolvida ao Governo da RAEM após a caducidade da licença de ocupação a título precário.
19. De acordo com o art.º 7.º da Lei Básica da RAEM, o art.º 41.º, al. o) e o art.º 174.º, n.º 1, al. c) da Lei de Terras, o Chefe do Executivo tem competência para ordenar o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM.
Quando chega o tempo, o respectivo interessado deve proceder ao despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior no prazo indicado pelo Chefe do Executivo; senão, a Administração Pública pode tomar medidas necessárias, e os bens não removidos ou reclamados no prazo indicado serão considerados abandonados.

III. Análise do parecer por escrito apresentado pelo interessado
20. A A não tem direito de propriedade da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e das edificações nela existentes, também não tem direito real de qualquer natureza. (em relação à parte II do parecer por escrito)
20.1 Na Lei n.º 6/86/M, aplicada por analogia pela Lei n.º 1/1999 (Lei de Reunificação), têm-se os seguintes dispostos sobre a licença de ocupação a título precário:
“As licenças, enquanto se mantiverem, conferem aos seus titulares o direito de utilização exclusiva, para os fins e com os limites consignados no título constitutivo (art.º 13.º da Lei n.º 6/86/M);
As licenças são outorgadas pelo período de um ano, e o prazo das renovações sucessivas das licenças não pode exceder, para cada uma, um ano (art.º 14.º, n.º 1 e n.º 3 da Lei n.º 6/86/M);
Decorrido o prazo da licença as instalações desmontáveis devem ser removidas (art.º 17.º, n.º 2 da Lei n.º 6/86/M).”
20.2 Com base nisso, cada licença provisória só confere aos seus titulares o direito de utilização exclusiva pelo período de um ano, e este direito caduca com a expiração do prazo da licença. Decorrido o prazo da licença, o interessado deve desocupar-se da ponte-cais.
20.3 Além disso, a Capitania dos Portos emitiu apenas licenças de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, isso significa que a autoridade administrativa nunca tinha admitido que o titular da licença de ocupação a título precário era o proprietário desta ponte-cais e das edificações nela existentes.
20.4 É referido no acórdão n.º 71/2010 do TUI:
「Dão-se aqui por reproduzidas as considerações vertidas no mencionado Acórdão de 5 de Julho de 2006. Aí se disse, designadamente:
“Prescreve o art.º 7.º desta Lei (refere-se à Lei Básica):
“Os solos e os recursos naturais na Região Administrativa Especial de Macau são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos, de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento, bem como pelo seu arrendamento ou concessão a pessoas singulares ou colectivas para uso ou desenvolvimento. Os rendimentos daí resultantes ficam exclusivamente à disposição do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.”
Desta norma resulta que foi estabelecido pela Lei Básica o princípio de que a propriedade e a gestão dos solos e recursos naturais no âmbito da Região cabem respectivamente ao Estado e ao Governo da Região. No entanto, a fim de respeitar e proteger os poucos terrenos da propriedade privada já existentes em Macau, é admitida excepção a este princípio, isto é, continuar a reconhecer os direitos de propriedade privada de terrenos anteriormente existentes.
Há um requisito para a excepção, que consiste em que os terrenos de propriedade privada devem ser “reconhecidos, de acordo com a lei, antes do estabelecimento da RAEM.”
Uma vez que após o estabelecimento da Região, todos os terrenos situados no âmbito territorial da Região são de propriedade do Estado, excepto os que foram reconhecidos como propriedade privada nos termos da lei antes do estabelecimento da Região. Em consequência, não é possível constituir uma nova propriedade privada de terrenos depois da criação da Região, sob pena de violar a disposição do art.º 7.º da Lei Básica.
Se a acção de reconhecimento do direito de propriedade sobre terrenos fosse proposta por interessados apenas depois do estabelecimento da Região, os seus pedidos estariam manifestamente em desconformidade com o art.º 7.º da Lei Básica por que todos os terrenos não reconhecidos como de propriedade privada até ao estabelecimento da Região passam, a partir deste, a integrar na propriedade do Estado.
Mesmo que a acção fosse instaurada antes do estabelecimento da Região, tal como acontece com o presente processo, os referidos pedidos também não podem proceder se não houver sentença transitada até ao momento do estabelecimento da Região, o que equivale à falta de reconhecimento nos termos da lei e os pedidos de interessados violam a disposição do art.º 7.º da Lei Básica.
É a mesma a razão de fundo das duas situações. Desde que não fosse confirmada legalmente a natureza privada da propriedade de terrenos antes do estabelecimento da Região, jamais pode obter a confirmação depois da criação da Região, independentemente da qualificação doutrinal deste tipo de acção como constitutiva ou declarativa, sob pena de violação do princípio consagrado no art.º 7.º da Lei Básica, segundo o qual a propriedade dos terrenos na Região cabe ao Estado. Os tribunais não podem proferir sentença de reconhecimento do direito de propriedade privada sobre os terrenos, em desobediência ao disposto na referida norma, após o estabelecimento da Região, ou seja, a partir da entrada em vigor da Lei Básica.”」
20.5 É referido no sumário do Acórdão n.º 26/2000 do TSI:
“III – Bens do domínio público são o conjunto de coisas que pertencendo a uma pessoa colectiva de direito público de população e território, são submetidas por Lei, dado o fim de utilidade pública a que se encontram afectadas, a um regime jurídico especial caracterizado fundamentalmente pela sua incomercialidade, em ordem a preservar a produção dessa utilidade pública.
IV – Sendo os bens parte integrante do domínio público, estão fora do comércio jurídico, não podendo ser objecto de apropriação individual e insusceptíveis de ser adquiridos por usucapião.
V – A situação jurídica do utente privativo do domínio público, detentor da licença, é meramente de carácter obrigacional e nunca de natureza real, não lhe sendo lícito arvorar-se da qualidade de titular de um direito real.”
(Colectânea de Traduções dos Acórdãos do Tribunal de Segunda Instância da RAEM, TOMO I, 2000, p. 349)
20.6 Nestes termos, e com base no facto de a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior ser domínio público, o antigo titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior – a A – não tem direito de propriedade da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e das edificações nela existentes, e também não tem direito real de qualquer natureza.
21. O despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM para via pública não violam os princípios da igualdade e da proporcionalidade. (em relação à parte III do parecer por escrito)
21.1 A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego disse no relatório n.º XXXX/DDPDT/2010: “…analisando os dados existentes na actual fase, ao longo de DBL (corredores exclusivos para autocarros), são estreitas as vias na Rua do Visconde Paço de Arcos e na Avenida de Demétrio Cinatti, e só pode construir um corredor exclusivo para autocarros num sentido. Perto do Silo do Porto Interior, por existir uma série de construções tais como instalações aduaneiras e as Pontes-Cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior, a faixa de rodagem tem apenas 3,35 metros de largura (vide as fotos anexas), pelo que na construção de DBL no futuro, será difícil que a referida faixa de rodagem serve para o desvio de tráfego, mas ao contrário, pode constituir um novo obstáculo de trânsito; por isso, a empresa de consultoria propõe a deslocação das Pontes-Cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior acima referidas por uma distância de 4 metros em direcção ao Porto Interior, assim não só pode alargar a faixa de rodagem, mas também pode construir duas faixas de rodagem no sentido ao norte.”
21.2 A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego também indicou no ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011: “para coordenar a construção de corredores exclusivos para autocarros, é necessário reforçar as capacidades de trânsito e de desvio de tráfego das ruas entre as Portas do Cerco e a Barra; a Avenida de Demétrio Cinatti tem um efeito de desvio de tráfego na Rua do Visconde Paço de Arcos, actualmente a maior parte da Avenida de Demétrio Cinatti tem condição para o trânsito nos dois sentidos, mas a largura da faixa de rodagem à frente da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior é inferior à largura normal, e não é ideal a condição de trânsito. Se poder resolver o supracitado problema, será mais conveniente a execução do supracitado plano de construção de corredores exclusivos para autocarros e para o funcionamento do trânsito no Porto Interior.”
21.3 O relatório e o ofício acima referidos já disseram expressamente que a faixa de rodagem ao lado das pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior tem apenas 3,35 metros de largura, e para resolver o possível problema de trânsito causado pela construção de corredores exclusivos para autocarros, é necessário reservar as referidas pontes-cais para via pública.
21.4 Devido à situação geográfica, é relativamente estreita a faixa de rodagem ao lado das pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior, e tal condição objectiva já resultou na diferença entre estas pontes e as outras.
21.5 A Administração Pública solicita o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM, a fim de executar o plano de construção de corredores exclusivos para autocarros e satisfazer as necessidades do público. A decisão da Administração Pública tem por fim realizar o interesse público, e o meio aplicado é adequado considerando a sua finalidade, e é necessário para a sua realização.
21.6 Em fim, a Administração Pública não violou os princípios da igualdade e da proporcionalidade ao solicitar o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM para via pública.
22. Não existe desvio de poder nem foi violado o princípio da colaboração entre a Administração e os particulares. (em relação à parte IV do parecer por escrito)
22.1 É referido no Acórdão n.º 29/2003 do TUI: 「como se sabe, “o desvio de poder é o vício que consiste no exercício de um poder discricionário por um motivo principalmente determinante que não condiga com o fim que a lei visou ao conferir aquele poder” e “pressupõe uma discrepância entre o fim legal e o fim real (ou fim efectivamente prosseguido pela Administração”. (Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Volume II, 2002, pág. 394)
Conforme o mesmo autor, o desvio de poder comporta duas modalidades principais: uma, o desvio de poder por motivo de interesse público, quando a Administração visa alcançar um fim de interesse público, diverso daquele que a lei impõe; e a outra, desvio de poder por motivo de interesse privado, quando a Administração não prossegue um fim de interesse público, mas sim um fim de interesse privado.」
22.2 Como acima referido, para a construção de corredores exclusivos para autocarros, é viável e necessário reservar as pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública, a fim de evitar novos obstáculos ao trânsito.
22.3 O despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior é destinado à construção de Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, bem como coordenação com a execução dos planos recentes e a longo prazo do trânsito em Macau. Até agora, o supracitado objectivo não é alterado.
Os respectivos actos visam, sem dúvida, realizar o interesse público.
22.4 A Administração Pública tem suficientes fundamentos de facto e de direito para solicitar o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua devolução ao Governo da RAEM.
Por isso, não se verifica neste caso o desvio de poder.
22.5 Para efeitos da reserva da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior para via pública, a Capitania dos Portos procedeu, através do ofício n.º SATJXXXXXXXE, à audiência escrita da A sobre o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a remoção dos bens desmontáveis. (vide o anexo 9: Ofício n.º SATJXXXXXXXE)
22.6 O pedido do interessado, a Capitania dos Portos já forneceu, em forma de certificado, dados arquivados sobre a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior. (vide o anexo 10: Certificados emitidos pela Capitania dos Portos nos dias 1 e 4 de Agosto de 2011)
22.7 A Capitania dos Portos já notificou, mediante o ofício n.º SATJXXXXXXXC, o interessado da decisão feita pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas de indeferir o seu pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
Consta do supracitado ofício o extracto da proposta n.º XX/DAPE-ATJ/2011 da Capitania dos Portos.
22.8 No dia 13 de Janeiro de 2012, a Capitania dos Portos procedeu, através do ofício n.º SATJXXXXXXXF, à audiência escrita do interessado sobre o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM.
22.9 Dos ofícios n.º SATJXXXXXXXE, n.º SATJXXXXXXXC, n.º SATJXXXXXXXF e dos certificados emitidos pela Capitania dos Portos, o interessado pode ter conhecimento dos respectivos fundamentos de direito e de facto, e também tem suficientes oportunidades de pronunciar-se, pelo que não se verifica a violação do princípio da colaboração entre a Administração e os particulares.
22.10 Em resumo, não se verifica o desvio de poder na solicitação do despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e da sua restituição ao Governo da RAEM, e não foi violado o princípio da colaboração entre a Administração e os particulares.
23. O despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM não violam as leis vigentes. (em relação à parte V do parecer por escrito)
23.1 Como é acima referido no ponto 20, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior encontra-se no domínio público, a A não tem direito de propriedade da respectiva Ponte-Cais e das edificações nela existentes, e também não tem direito real de qualquer natureza.
23.2 A Administração Pública tem suficientes fundamentos de direito e de facto para solicitar ao interessado o despejo da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior e a sua restituição ao Governo da RAEM, tendo explicado expressamente ao interessado os referidos fundamentos e não padecendo de qualquer vício. Por isso, não se verifica qualquer vício de violação de princípios ou disposições legais aplicáveis.

IV. Propostas
24. Para a construção de Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, é necessário reservar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior para via pública. Pelos expostos, propõe-se no seguinte:
24.1 Ao abrigo dos dispostos no art.º 7.º da Lei Básica da RAEM, e nos artigos 41.º, al. o) e 174.º, n.º 1, al. c) da Lei de Terras, o Chefe do Executivo deve dar a seguinte ordem:
24.1.1. A titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior – a A – deve desocupar-se da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior no prazo de 15 dias a contar da recepção da notificação, a fim de reverter este terreno ao Governo da RAEM, mas não tem direito a qualquer indemnização;
24.1.2. O interessado deve remover todos os objectos existentes na Ponte-cais n.º XX do Porto Interior no prazo referido no ponto 24.1.1;
24.2 No caso de o interessado não cumprir a ordem mencionada no ponto 24.1 no prazo indicado, pede-se ao Chefe do Executivo para autorizar os seguintes procedimentos administrativos:
24.2.1 A Capitania dos Portos e outros serviços públicos (incluindo Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, Polícia Judiciário, Corpo de Polícia de Segurança Pública, Serviços de Alfândega, Corpo de Bombeiros, Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, Instituto para os Assuntos Cívico e Municipais, Instituto de Acção Social) executam a ordem de recuperação da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, cujas medidas concretas incluem rodear a ponte-cais por uma vedação; se for necessário, as respectivas medidas podem ser executadas por terceiro (empreiteiro) através da aquisição de serviços;
24.2.2 A Polícia Judiciária, o Corpo de Polícia de Segurança Pública, os Serviços de Alfândega e o Corpo de Bombeiros devem designar pessoal para ajudar a execução da ordem de recuperação da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, incluindo desalojar as pessoas que não quiserem sair do local e que impedirem o trabalho da Administração Pública, proteger a segurança dos trabalhadores no local, guarnecer a Ponte-cais n.º XX até a sua recuperação completa, e efectuar acções de vistoria periódicas ou indeterminadas.
24.2.3 Em relação aos objectos deixados na Ponte-cais n.º XX do Porto Interior após o prazo acima referido, por não haver normas correspondentes na Lei n.º 6/86/M ou na Lei de Terras, deve-se aplicar por analogia o art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 6/93/M, de 15 de Fevereiro, ou seja que estes objectos podem permanecer temporariamente no local indicado pela Capitania dos Portos depois de serem registados num auto; e caso não tenham sido reclamados os respectivos objectos no prazo de 15 dias, serão considerados abandonados e perdidos;
24.2.4 Nos termos do art.º 144.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, ficam todas as despesas, incluindo indemnizações e sanções pecuniárias, por conta do interessado;
24.3 Nos termos do art.º 139.º do Código do Procedimento Administrativo, a Capitania dos Portos deve notificar o interessado dos conteúdos nos pontos 24.1, 24.2.3 e 24.2.4;
24.4 Após a recuperação da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, a Capitania dos Portos deve, em conformidade com as necessidades de planeamento e gestão da respectiva zona, entregar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior ao serviço ou entidade correspondente.

Para despacho superior.

Chefe do Departamento de Assuntos Portuários e Embarcações
(Ass- vide o original)
Lei Veng Seng

Chefe do Departamento de Apoio Técnico Marítimo
(Ass.- vide o original)
Ip Va Hung

Chefia funcional do Centro de Apoio Técnico e Jurídico
(Ass.- vide o original)
Kuok Kin”

Sobre o pedido de renovação de licença que foi indeferido foi emitido o seguinte parecer, acolhido na decisão:
“Assunto: Pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior
Proposta N.º: XX/DAPE-ATJ/2011
Data: 07/06/2011

Para o Director da Capitania dos Portos:

Com referência ao pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, apresenta-se o relatório, designadamente:

Parte I Relatório
1. Foi emitida à A (registo comercial n.º XXXX SO), em 1994, a licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior. A licença é válida pelo período de um ano e é renovável cada ano.
A Capitania dos Portos emitiu em Dezembro de 2009 à A a última licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior (n.º XXX/2009), cujas informações se apresentam, designadamente:
- O titular da licença de ocupação a título precário: a A;
- Área ocupada: 310.00 metros quadrados;
- Actividades autorizadas pela licença: actividades de comércio e serviços;
- Período de validade: de 1 de Janeiro de 2010 a 31 de Dezembro de 2010
(vide anexo 1 e anexo 2)
A Ponte-cais n.º XX do Porto Interior é composta por um edifício de dois andares e uma plataforma de madeira. A loja localizada no rés-do-chão e no sul da ponte-cais é “XXX Hai Lan”. Encontra-se geralmente nos fundeadouros da ponte-cais embarcações de pesca.
2. A A requereu, em 14 de Outubro de 2010, à Capitania dos Portos, a renovação da licença de ocupação a título precário do ano 2011 da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior. (vide o anexo 3)
3. Tal como sugeriu o ponto 6 do relatório n.º XXXX/DDPDT/2010 de 15 de Dezembro de 2010 da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego: notifica-se aos respectivos serviços competentes a concepção dos Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, e sugere-se que os respectivos serviços reservassem os espaços das ponte-cais n.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública, e que o desenvolvimento e plano dos edifícios na vizinhança tivessem de ter em conta a necessidade de reservar espaços para o trânsito. (vide o anexo 4)
4. Depois, em 25 de Fevereiro de 2011, realizou-se, entre os representantes da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro e Capitania dos Portos, uma discussão sobre as questões na concepção de Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra que têm relação com as ponte-cais n.º XX e N.º XX do Porto Interior. Por estas duas ponte-cais serem bens do domínio público sem registos prediais, e serem ocupadas, a título precário, pelo titular da licença, entende-se viável que sejam reservadas as mesmas a fim da via pública.
5. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego emitiu em 10 de Março de 2011 o ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011 à Capitania dos Portos, cujo ponto 5 referiu que, considerando a partir do ponto de vista do trânsito integral de Macau e para coordenar a execução dos planos recentes e a longo prazo, é necessário e viável reservar as ponte-cais n.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública. O ofício também sugeriu que a Capitania dos Portos adoptasse respectivas medidas para a cooperação da realização do respectivo plano. (vide o anexo 5)
6. Para o efeito de reservar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior para via pública, não se pode deferir o pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior. Além disso, deve o antigo titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, isto é, a A proceder à demolição dos objectos amovíveis na ponte-cais, de forma à restituição desta à posse da Região Administrativo Especial de Macau.
Tendo em conta a especialidade deste caso, a Capitania dos Portos procedeu à audiência escrita da A através do ofício n.º SATJXXXXXXXE de 1 de Abril de 2011. Na respectiva audiência escrita, foi indicado que:
(1) A Ponte-cais n.º XX do Porto Interior trata-se do bem do domínio público;
(2) O interessado não tem o direito de superfície sobre a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, por isso, ele não pode sustentar, para o Governo da RAEM, a posse do direito de construção nesta ponte-cais;
(3) O interessado não teria direito a indemnização se a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior for devolvida ao Governo da RAEM após a caducidade da licença de ocupação a título precário.
(vide o anexo 6)
7. O Sr. Advogado G de [Escritório de advogados] apresentou, em 15 de Abril de 2011 e em representação da A, o parecer escrito para a Capitania dos Portos. (vide o anexo 7)

Parte II Análise
8. Foi emitida à A, em 1994, a licença de ocupação da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior. A relação jurídica da ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior pela companhia foi regulada pela Lei n.º 6/86/M de 26 de Julho (Lei do domínio público hídrico) que já entrou em vigor naquele tempo.
De acordo com o anexo 2 da Lei n.º 1/1999 (Lei de Reunificação), a Lei n.º 6/86/M não é adoptada como lei da Região Administrativa Especial de Macau. Todavia, enquanto não for elaborada nova legislação, pode a Região Administrativa Especial de Macau tratar as questões nela reguladas de acordo com os princípios contidos na Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, tendo por referência as práticas anteriores.
9. Não se encontra actualmente nenhum documento que comprove que a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior tinha sido uma propriedade privada ou possuída particularmente em 1 de Julho de 1870, nem documento do então Governo Português de Macau que comprovasse, de acordo com a Lei n.º 6/86/M, que a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior tinha sido uma propriedade privada.
Por outro lado, o então Governo Português de Macau e o presente Governo da RAEM têm emitido licenças de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
Nos termos da Portaria n.º 122/89/M de 31 de Julho, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior localiza-se no domínio público hídrico.
Com base nos factos acima referidos, considera-se bem do domínio público a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
10. Nos termos do art.º 7.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau da República popular da China, os solos e os recursos naturais na Região Administrativa Especial de Macau são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos, de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão, uso e desenvolvimento, bem como pelo seu arrendamento ou concessão a pessoas singulares ou colectivas para uso ou desenvolvimento. Os rendimentos daí resultantes ficam exclusivamente à disposição do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.
Por ser bem do domínio público a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, esta é propriedade do Estado. O Governo da Região Administrativa Especial de Macau é responsável pela sua gestão.
11. A Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego referiu no relatório n.º XXXX/DDPDT/2010 de 15 de Dezembro de 2010 a concepção dos Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, e sugeriu que os respectivos serviços reservassem os espaços das pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública, e que o desenvolvimento e plano dos edifícios na vizinhança tivessem de ter em conta a necessidade de reservar espaços para o trânsito.
12. No seu ofício n.º XXXXXXX/XXXX/DPT/2011 de 10 de Março de 2011, a Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego referiu que, considerando a partir do ponto de vista do trânsito integral de Macau e para coordenar a execução dos planos recentes e a longo prazo, é necessário e viável reservar as pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública.
13. Nos termos do art.º 20.º, n.º 1 da Lei n.º 6/86/M, as concessões e as licenças podem ser extintas, mediante acto fundamentado, se os terrenos dominais forem considerados necessários à utilização pelo público sob a forma de uso comum ou se outro motivo de interesse público assim o exigir.
Pelo que, com base nas necessidades do uso comum ou de outro interesse público, o Governo da RAEM pode não autorizar a renovação da licença de ocupação a título precário do bem no domínio público hídrico.
14. Nestes termos, para o efeito de reservar a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior como via pública em cooperação com o desenvolvimento de trânsito integral de Macau, é óbvia que o Governo da RAEM não pode deferir o pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior.
Se o Governo da RAEM indefira o pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, a A perderia o direito de utilização desta por a caducidade daquela licença. Caso assim, a A tenha de proceder à demolição dos objectos amovíveis na ponte-cais, de forma à restituição desta à posse da Região Administrativa Especial de Macau.
15. É previsto, tanto no Código Civil de 1996 (o art.º 202.º, n.º 2) como no Código Civil vigente (o art.º 193.º), que todas as coisas que se encontram no domínio público são consideradas fora do comércio e não podem ser objecto de direitos privados, nem apropriados pessoalmente.
Por encontrar-se no domínio público a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, os seus direitos reais (incluindo o direito de superfície) não podem ser adquiridos ou transmitidos pessoalmente.
Por o interessado não ter o direito de superfície sobre a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, ele não pode sustentar, para o Governo da RAEM, a posse do direito de construção nesta ponte-cais.
16. Nos termos do art.º 20.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 6/86/M, as concessões e as licenças podem ser extintas, mediante acto fundamentado, se os terrenos dominais forem considerados necessários à utilização pelo público sob a forma de uso comum ou se outro motivo de interesse público assim o exigir; a revogação das licenças não confere ao interessado direito a qualquer indemnização, podendo ser levantadas as benfeitorias que não afectem a utilidade económica do terreno.
Nos termos do art.º 75.º da vigente Lei de Terras, o ocupante não tem direito de levantar as benfeitorias introduzidas no terreno nem de ser indemnizado por elas, qualquer que seja o motivo do termo da ocupação, devendo, porém, ser reembolsado da importância da taxa correspondente ao tempo por que ainda teria direito a ocupar o terreno.
Com base no disposto acima referido, o interessado não teria direito a indemnização se a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior for devolvida ao Governo da RAEM após a caducidade da licença de ocupação a título precário.
17. Quanto à resposta escrita apresentada em 15 de Abril de 2011 pelo Sr. Advogado G em representação da A, entendemos que:
(1) Em relação a que “…não pode dizer que o depoente ocupa a título precário a Ponte-cais n.º XX” referido no ponto 2 da resposta.
Segundo as informações da Capitania dos Portos, tanto a A como o antigo utente ocuparam, a título precário, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior usando a licença de ocupação a título precário. Por isso, tal perspectiva acima referida não é insustentável.
(2) Quanto a que se referiu nos pontos 3 e 4 da resposta, “Em 1993 estabeleceu-se a companhia do depoente. Sendo um dos grandes accionistas da companhia, C injectou a Ponte-cais n.º XX no bem social da depoente. Ao longo dos anos, seja qual for a situação económica, o depoente tem explorado esta ponte-cais e lá construiu um prédio permanente de dois andares.”
C foi o titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior. Porém, seja qual for a relação entre aquele e a A, estes são dois indivíduos independentes, e também dois titulares diferentes de licença de ocupação quanto ao assunto de ocupação a título precário do domínio público hídrico. Tal companhia sucedeu, em 1994, a C, no direito à ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, devendo aquela considera de forma plena as naturezas jurídicas da respectiva ponte-cais e dos edifícios nela construídos.
(3) Quanto ao plano de aproveitamento do porto interior referido nos pontos 5, 6 e 7 da resposta escrita
O Plano de Reordenamento do Porto Interior, aprovado pela Portaria n.º 218/90/M, na redacção dada pela Portaria n.º 171/95/M e Ordem Executiva n.º 5/2002, determina um planeamento global dos fins a que as pontes-cais se destinam. Todavia, tal Plano de Reordenamento do Porto Interior não concede a ninguém o direito à ocupação permanente das pontes-cais a título precário.
(4) Quanto ao estudo prévio do edifício e às obras de alteração/legalização referidos nos pontos 8, 9 e 10 da resposta escrita.
Tal estudo prévio não é autorizado oficialmente.
Nenhuma obra de beneficiação realizada no terreno de domínio público ocupado a título precário não altera as naturezas jurídicas deste e dos edifícios nele construídos.
(5) Quanto a que se referiu na resposta, “o depoente já pagou a taxa de renovação do ano 2011”.
A Capitania dos Portos cobra, de acordo com a lei, a taxa de ocupação apenas aquando da emissão da licença de ocupação a título precário. Relativamente à Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, a Capitania dos Portos nunca requereu que a A pagasse a taxa de ocupação a título precário, nem que esta companhia pagou tal taxa.
(6) Quanto a que “o depoente pediu que fosse reconsiderada a decisão de devolução da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior ou que lhe fosse concedida outra parcela de terreno…” referido na resposta escrita.
A Ponte-cais n.º XX do Porto Interior trata-se do bem do domínio público. Com base nas necessidades da abertura dos Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra, a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior pode ser devolvida ao Governo da RAEM para outro plano de aproveitamento após a caducidade da licença de ocupação a título precário.
Quanto à concessão de outra parcela de terreno ao depoimento, não há fundamentos de direito correspondentes a ser citados.
(7) Conclusão
Quanto às opiniões importantes referidas na audiência escrita, como “a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior trata-se do bem do domínio público” e “por o interessado não ter o direito de superfície sobre a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior, ele não pode sustentar, para o Governo da RAEM, a posse do direito de construção nesta ponte-cais” e “o interessado não teria direito a indemnização se a Ponte-cais n.º XX do Porto Interior for devolvida ao Governo da RAEM após a caducidade da licença de ocupação a título precário”, estas não foram contraditas com fundamentos de direito e de facto na resposta escrita.
Faltam fundamentos de direito ou de facto aos pedidos e alegações referidos na resposta escrita.

Parte III Sugestão
18. É necessário reservar os espaços das pontes-cais N.º XX e N.º XX do Porto Interior para via pública para o efeito dos Corredores Exclusivos para Autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra. Atentas as alegações e análises acima referidas, é de sugerir:
18.1 O indeferimento do pedido de renovação da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior;
18.2 O requerimento, ao antigo titular da licença de ocupação a título precário da Ponte-cais n.º XX do Porto Interior; ou seja, a A, de proceder, no prazo de 30 dias, à demolição dos objectos amovíveis na ponte-cais, de forma à restituição desta à posse da Região Administrativa Especial de Macau.

Para despacho superior.

Chefe do Departamento de Assuntos Portuários e Embarcações
(Ass- vide o original)
Lei Veng Seng

Chefia funcional do Centro de Apoio Técnico e Jurídico
(Ass.- vide o original)
Kuok Kin”

3. Direito
Na óptica da recorrente, o Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância padece de erro de julgamento consubstanciado na violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade, justiça e razoabilidade.

3.1. Antes de mais, é de salientar que o acto administrativo impugnado nos presentes autos é a decisão do Senhor Chefe do Executivo proferido em 13 de Março de 2012 que ordenou a desocupação da ponte-cais n.º XX, a remoção dos bens que nela ainda permaneciam bem como a devolução do terreno ao Governo da RAEM.
Conforme a factualidade provada, a recorrente foi desde Outubro de 1993 titular da licença de ocupação a título precário da Ponte cais n.º XX até 31/12/2010. E por despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas em 5 de Julho de 2011, foi-lhe indeferida a renovação da licença de ocupação a título precário, decisão esta da qual foi interposto recurso contencioso, tendo sido proferida decisão já transitada em desfavor da ora recorrente.
Foi em consequência da não renovação da licença de ocupação a título precário que a ora entidade recorrida determinou a desocupação por parte da recorrente da ponte-cais n.º XX.
E tal acto do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 5 de Julho de 2011, que não renovou a licença de ocupação a título precário, foi já o objecto de impugnação contenciosa por parte da ora recorrente, sendo que o Tribunal de Segunda Instância decidiu no seu Processo n.º 569/2011 negar provimento ao recurso, com manutenção do acto administrativo impugnado, arresto este que veio a ser depois confirmado pelo Tribunal de Última Instância, por seu Acórdão proferido em 14 de Novembro de 2012 no Processo n.º 65/2012.
É de reparar que se encontram conexas as matérias tecidas no presente recurso e nos referidos processos em que se discutiu a não renovação da licença de ocupação, onde o Tribunal de Última Instância foi também chamado a pronunciar-se sobre a alegada violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça, pelo que convêm transcrever a seguinte abordagem sobre a questão, que vale também para o presente caso:
“5. Princípios da igualdade e da proporcionalidade
Na tese da recorrente, o acto recorrido viola o princípio da igualdade porque a decisão de indeferimento da renovação da licença de ocupação não se estendeu aos ocupantes das restantes pontes-cais do Porto Interior.
E, ainda na opinião da recorrente, o acto recorrido viola os princípios da proporcionalidade e da justiça porque o interesse público impõe que as mesmas regras e critérios devem ser aplicados a todos que tenham direitos conflituantes com o interesse público (no caso da construção de uma via pública). Além disso, como a construção demorará vários meses, não se vê razão para o indeferimento de renovação da licença temporária por um ano.
Estamos no domínio do exercício de poderes discricionários.
Quanto à primeira questão, o acórdão recorrido aceita que só quanto às pontes-cais XX e XX se coloca a questão da sua remoção.
Mas desde que a recorrente não prova – e efectivamente não prova, cabendo-lhe o ónus da prova - que as outras pontes-cais estão na mesma situação da ponte da recorrente, não só em termos de localização em relação à via pública, mas também em termos jurídicos, isto é que ocupam, igualmente, domínio público mediante licenças precárias, está logo afastada a violação do princípio da igualdade, visto que só tem de ser tratado de forma igual o que é igual.
Quanto às violações dos princípios da proporcionalidade e da justiça, não compete ao Tribunal imiscuir-se na concreta planificação das obras da Administração. Se esta entende que não deve renovar uma licença de ocupação de espaço público, que sempre foi precária, por causa de uma obra que pretende levar a cabo, está fora de causa ir o Tribunal avaliar se a planificação e a execução da obra é compatível com a renovação da licença por mais um ano. Não só porque não é esta a função dos tribunais, como porque é da experiência comum que, nesta matéria, todos os cuidados são poucos, já que, muitas vezes, os interessados lançam mão de todos os meios, uns legais – como aconteceu, no caso, com a tentativa da recorrente de suspender a eficácia do acto administrativo - e outros nem tanto, para impedir a desocupação de instalações. Ora, a projecção de uma obra viária implica, seguramente, o lançamento de concurso público para execução de empreitada, e quando se dá a adjudicação o terreno da obra tem de estar disponível, para ela poder ser executada. É, por isso, totalmente compreensível, e obedece a uma política de cautelas, a desocupação atempada de espaço para lançamento do procedimento administrativo conducente à execução de uma obra viária. Não se vislumbra qualquer violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça.
De resto, como dissemos, por exemplo, no acórdão de 9 de Maio de 2012, no Processo n.º 13/2012, “Não se têm suscitado dúvidas tanto na doutrina como na jurisprudência, que os tribunais podem fiscalizar o respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade. A dúvida está em saber em que medida deverão os tribunais intervir nesta matéria.
DAVID DUARTE1, referindo-se à proporcionalidade em sentido estrito, «que engloba a técnica do erro manifesto de apreciação, técnica jurisdicional francesa que compreende, em termos avaliativos, para além do erro na qualificação dos factos, a utilização de um critério decisório proporcional que se revela numa decisão desequilibrada entre o contexto e a finalidade. O erro manifesto de apreciação, na vertente de controlo da adequação da decisão aos factos … é, como meio de controlo do conteúdo da decisão, um dos degraus mais elevados da intervenção do juiz na discricionariedade administrativa. E, por isso, só é utilizável na medida da evidência comum da desproporção2» (o sublinhado é nosso).
Nas mesmas águas navega MARIA DA GLÓRIA F. P. DIAS GARCIA3 defendendo que «em face da fluidez dos princípios (da proporcionalidade, da igualdade, da justiça), só são justiciáveis as decisões que, de um modo intolerável, os violem4» (o sublinhado é nosso)”.
O CPAC, no seu artigo. 21.º, n.º 1, alínea d), a respeito dos fundamentos do recurso contencioso refere-se ao «erro manifesto ou a total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários».
Em suma, não procede a arguição das mencionadas violações.”

3.2. Quanto ao princípio da igualdade, alega a recorrente que no presente processo nada aponta para que em frente à ponte-cais n.º XX exista algum estrangulamento ou condicionante que justifique a não renovação da licença de ocupação e o seu despejoe e dos elementos constantes nos autos resulta que a localização (alinhamento e largura da via) da ponte-cais n.º XX é exactamente igual à das pontes-cais n.ºs XX e XX, cujas licenças de ocupação têm sido no entanto anualmente renovadas. Daí que se retira que em circunstâncias factuais iguais a Administração teve uma actuação diferente, em claro prejuízo da recorrente.
Volta a recorrente a colocar questão sobre a não renovação da licença de ocupação relativa à ponte-cais n.º XX.
No entanto, a questão foi já definitivamente decidida no Processo n.º 65/2012 do Tribunal de Última Instância, pelo que não se pode discutir de novo no presente recurso.

Ao comando do princípio da igualdade, a Administração deve tratar igualmente as situações iguais e trata desigualmente o que é diferente.
Só há violação do princípio da igualdade se tratar de modo desigual as situações iguais. Se as situações forem diferentes, o tratamento desigual não viola o princípio da igualdade.
No caso vertente, o que decorre da factualidade provada é que “As diferentes pontes cais encontram-se de um modo geral alinhadas entre si, mas existem à frente de cada uma delas, estrangulamentos diferentes subordinados a condicionantes diversas”, o que demonstra que são diferentes as situações das pontes-cais em causa.
Pretende a recorrente demonstrar, com as fotografias juntas com o requerimento de 04/10/2012, que a localização (alinhamento e largura da via) da ponte-cais n.º XX é exactamente igual à das pontes-cais n.ºs XX e XX.
Ora, tratando-se da matéria relacionada com o julgamento de facto, temos entendido que o Tribunal de Última Instância, em recurso jurisdicional, não pode censurar a convicção formada pelas instâncias quanto à prova; mas pode reconhecer e declarar que há obstáculo legal a que tal convicção se tivesse formado, quando tenham sido violadas normas ou princípios jurídicos no julgamento da matéria de fato.
E o Tribunal de Última Instância não tem competência para apreciar o julgamento na matéria de facto quando se alegam violações que decorrem da mera livre apreciação das provas, quando não está em causa qualquer julgamento em violação de meio de prova plena.5
No caso ora em apreciação, das referidas fotografias juntas aos autos não se pode tirar conclusão no sentido de considerar exactamente iguais as situações geográficas em que se encontram as pontes-cais n.ºs XX, XX e XX.
Não obstante que as diferentes pontes cais se encontram de um modo geral alinhadas entre si, certo é que “existem à frente de cada uma delas, estrangulamentos diferentes subordinados a condicionantes diversas”.
Tal como afirma, e bem, o tribunal recorrido, “uma coisa é o alinhamento que até pode ser o mesmo e outra é o espaço disponível para a faixa de rodagem e ainda que esse elemento fosse o mesmo sempre a localização de umas e outras pontes é diferente”.
E resulta dos elementos constantes dos autos que foi com vista à construção de corredores exclusivos para autocarros entre as Portas do Cerco e a Barra que se justificava a necessidade de reservar a ponte-cais n.º XX (bem como a N.º XX) como terreno destinado à construção de vias públicas, tendo em conta a largura da faixa de rodagem existente no local.
As provas produzidas nos autos não apontam para o contrário daquilo que foi dado como provado nos autos.
Por outro lado, não se vislumbra nos autos que, em relação a outras pontes-cais, nomeadamente n.ºs XX e XX, foi indeferida a renovação das licenças de ocupação a título precário, tendo até a recorrente afirmado que as respectivas licenças de ocupação foram renovadas.
Daí que evidencia a desigualdade das situações jurídicas da ponte-cais n.º XX e das restantes.
Uma vez concluído pela desigualdade das situações comparáveis entre si, não se pode exigir o tratamento igual por parte da Administração.
Improcede o argumento da recorrente.

3.3. No que concerne à violação dos princípios da proporcionalidade, justiça e razoabilidade, alega a recorrente que não resulta de nenhum elemento junto aos autos, e nem sequer tal foi abordado pela entidade administrativa ao longo de todo o procedimento, que a ocupação da ponte-cais n.º XX a curto e médio prazo impede o andamento do projecto de construção da via de circulação de transportes públicos, ou se a imediata desocupação da ponte cais em causa se reputa essencial para efeitos do andamento de tal projecto. E decorridos 4 anos desde a não renovação da licença e 2 anos desde a ordem de desocupação, não foi dado início à implementação do aludido corredor exclusivo de autocarros, pelo que não se compreende em que medida se reputou necessária, adequada, justo e razoável a não renovação da licença da ponte cais n.º XX e seu consequente despejo.
Mais uma vez põe em crise a não renovação da licença de ocupação, mas em vão.
A ordem de desocupação impugnada nos presentes autos foi dada nos termos dos art.ºs 41.º, al. o) e 174.º n.º 1, al. c) da Lei de Terras, então vigente.
Ao comando desta última norma, o despejo será ordenado por despacho do Chefe do Executivo “quando se verifique qualquer dos seguintes factos: a)…; b) …; c) Não desocupação do terreno no momento em que devem operar-se os efeitos da denúncia ou não renovação do contrato”.
E sabe-se que a ocupação a título precário dos terrenos se faz por emissão da licença, que se baseia em contrato de arrendamento que pode ser denunciado a todo o tempo por qualquer das partes e a licença de ocupação é outorgada pelo período de um ano e considera-se caducada no caso de não ser requerida a sua renovação no prazo legal (art.ºs 3.º, 31.º, 69.º e seguintes da Lei de Terras).
Daí que, face à não renovação da licença de ocupação dum terreno, o senhor Chefe do Executivo deve ordenar o seu despejo.
Trata-se dum acto administrativo vinculado, não tendo o Senhor Chefe do Executivo qualquer margem dentro da qual possa exercer uma liberdade de decisão. Perante a não renovação da licença, o Chefe do Executivo deve emitir a ordem de despejo.
Assim sendo, fica prejudicada a apreciação sobre a alegada violação dos princípios indicados pela recorrente, todos vigentes no domínio do exercício de poderes discricionários.

Mesmo que assim não se entender, afigura-se-nos que não se descortina como foram violados tais princípios.
Ora, admitindo-se os interesses particulares da recorrente que pretendia continuar a ocupar o terreno em causa e exercer as suas actividades, que foram postos em crise pela ordem de desocupação, não se pode olvidar que os interesses públicos que pretende prosseguir a Administração com a prática do acto administrativo impugnado prevalecem sempre, tendo em consideração a finalidade visada pela desocupação da ponte-cais n.º XX.
A ordem despejo impugnada visa precisamente a reposição da legalidade da situação após a não renovação da licença de ocupação.
E dos elementos constantes dos autos resulta que o despejo da ponte-cais se mostra mesmo necessário para a execução do projecto planeado pela Administração.
Por outro lado, não cabe ao Tribunal imiscuir-se na concreta planificação das obras da Administração, que tem a competência exclusiva em gerir todo o procedimento administraivo que vai desde o estudo e a elaboração do projecto de construção de corredores exclusivos para autocarros e de vias públicas até à execução das obras com vista à implementação do mesmo projecto.
Quanto ao decurso do tempo alegado pela recorrente sem que tenha sido dado início ao andamento do projecto de construção, não se pode ignorar que a recorrente reagiu contra a não renovação da licença e a ordem de despejo, tendo interposto recurso para o Tribunal de Segunda Instância, e depois para o Tribunal de Última, submetendo a questão de desocupação da ponte-cais à apreciação dos tribunais.
E é de experiência comum que a execução das obras pressupõe a disponibilidade do terreno, que se deve encontrar já desocupado, questão esta que não foi ainda definitivamente resolvida, para além de outras que naturalmente existem antes da construção de corredores exclusivos para autocarros e de vias públicas.
O lapso do tempo que decorreu desde a não renovação da licença e a emissão da ordem de despejo não serve para imputar à Administação a violação dos princípios da proporcionalidade, da adequação, da justiça e da razoabilidade.
É de concluir pela sem razão da recorrente.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, com a taxa de justiça fixada em 8 UC.

Macau, 13 de Fevereiro de 2015

   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Vítor Manuel Carvalho Coelho

1 DAVID DUARTE, ob. cit., p. 323.
2 O mesmo autor, ob. cit., p. 323, nota 205, a propósito da questão de saber qual a medida da desproporcionalidade que uma decisão deve ter para poder ser controlada pelo tribunal, cita uma decisão judicial britânica de 1945 (Associated Provincial Picture House Ltd. v. Wednesbury Corporation), que criou um standard aplicável à medida da intervenção judicial, estabelecendo que “if an authority`s decision was so unreasonable that no reasonable authority could ever have como to it, then the courts can interfere”.
3 Ob. cit., p. 642.
4 No mesmo sentido, M. ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. cit., p. 256 e 257 e J.C. VIEIRA DE ANDRADE, O Dever da Fundamentação Expressa de Actos Administrativos, Livraria Almedina, Coimbra, 1991, p. 137.
5 Cfr. Acórdão do TUI, de 27 de Novembro de 2002, 2 de Junho de 2004, 24 de Março de 2004, 29 de Junho de 2005 e 14 de Dezembro de 2012, Processos n.ºs 12/2002, 17/2003, 5/2004, 3/2005 e 61/2012.
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Processo n.º 25/2014