打印全文
Tribunal Administrativo da Região Administrativa Especial de Macau
Recurso Contencioso Administrativo n.º 1062/13-ADM



*
Processo n.º:1062/13-ADM
*
SENTENÇA
*
  A, ora recorrente, melhor identificada nos autos, vem interpor o presente recurso contencioso da anulação do despacho sancionatório do Chefe do Departamento de Trânsito do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), ora entidade recorrida, com o n.º XXXXXXXXX datado de 07 de Novembro de 2013, que determinou à recorrente o pagamento da multa no valor de MOP300.00 (trezentas patacas) por violação do art.º 48.º, n.º 1, alínea 2) da Lei n.º 3/2007, Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), pedindo a anulação do despacho por violação da lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito e do princípio da proporcionalidade.
*
  Regularmente citado, a Entidade Recorrida veio contestar, defendendo a legalidade do acto recorrido e propugnando pela improcedência do presente recurso.
*
  Foi junto aos autos elementos sobre a largura da faixa de rodagem da Rua de Sai On, na Taipa e a demarcação das linhas contínuas junto das bermas, solicitado à Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego e ao Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (vide fls. 65 a fls. 68).
*
  Devidamente notificadas, apenas a Recorrente apresentou alegações facultativas.
*
  O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do invocado vício de violação da lei, por erro nos pressupostos de facto, devendo assim ser dado provimento ao presente recurso contencioso.
*
  O Tribunal é competente em razão da matéria e hierarquia.
  O Processo é próprio e não há nulidades.
  A recorrente e a entidade recorrida dispõem de personalidade e capacidade judiciárias e são partes legítimas.
  Não há nulidades, excepções dilatórias e questões prévias de que cumpre conhecer e que obstam ao conhecimento do mérito da causa.
***
I. Factos
  Dos autos e do P.A. anexo resulta a seguinte factualidade pertinente:
  A Recorrente é proprietária do veículo automóvel ligeiro de passageiros, com a matrícula MO-XX-XX.
  No dia 20 de Setembro de 2013 pelas 22H24, o veículo acima mencionada encontrava-se estacionado na faixa de rodagem da Rua de Sai On, na Taipa, e por causa desta a recorrente foi acusada pela violação do estipulado no art.º 48.º, n.º 1, alínea 2) da LTR, por estacionamento de forma a impedir a circulação de outros veículos (vide folha única do P.A. e fls. 22 dos autos).
  Na mesma data, não existia linha longitudinal amarela contínua junto da berma do local do incidente (vide fls. 23 dos autos).
  A Rua de Sai On, na Taipa, é uma estrada com um total de 7.07 metros de largura, dividida por uma linha longitudinal descontínua em duas partes nos dois sentidos, com cerca de 3,47 metros a 3,60 metros de largura cada. (vide fls. 68 dos autos).
  Pelo despacho datado de 07/11/2013, a entidade recorrida decidiu sancionar a recorrente pela violação do estipulado no art.º 48.º, n.º 1, alínea 2), e n.º 2 da LTR, por estacionamento nos locais em que impeça a circulação de outros veículos, com aplicação da multa de MOP300,00 (vide fls. 1 do P.A.).
  Em 17 de Dezembro de 2013, o recorrente enviou o petitório dos presentes autos à secretaria deste Tribunal através da via telecópia (FAX) e apresentou o respectivo original no dia 18 de Dezembro de 2013 (vide fls. 2 dos autos).
*
II. Fundamentação
  Cumpre agora decidir.
  Argumentou a recorrente que na data do incidente, não existia qualquer linha ou sinalização vertical de proibição de estacionamento junto da berma onde se encontrava estacionado o seu veículo automóvel ligeiro e na verdade, havia uma linha contínua amarela interrompida na via que confronta com a Rua de Sai On e encontrava-se uma linha contínua amarela na via no outro sentido da mesma rua, tudo fazendo crer na licitude do acto de estacionamento junto do local em causa. Por outro lado, a largura da rua permite a formação de mais de duas filas de trânsito mesmo estando estacionado um veículo automóvel, não constituindo assim obstáculo à circulação de demais veículos nos dois sentidos.
  Claramente o argumento prende-se apenas e precisamente com a interpretação da norma alegadamente violada, isto é, o estacionamento do veículo da recorrente no local do incidente (via de trânsito) fosse admissível na data do incidente1 e tivesse ou não impedido a formação de duas filas de trânsito, dado que a Rua de Sai On tem duas vias de trânsito nos dois sentidos (cfr. fls. 23 dos autos).
  Anota-se que as duas vias de trânsito nos dois sentidos dividem-se por uma linha longitudinal descontínua, com cerca de 3,47 metros a 3,60 metros de largura cada.
  Não se logrou comprovar pela entidade recorrida a demarcação de qualquer linha contínua amarela na via de trânsito onde se estava estacionado o veículo da recorrente na altura do incidente.
  Face ao estipulado da primeira parte da art.º 46, n.º 3, alínea 1) da Lei n.º 3/2007, de 7 de Maio, parece ser admissível o estacionamento de veículo na faixa de rodagem em causa, perante a falta de qualquer demarcação ou sinalização de proibição de paragem ou estacionamento.
  De acordo com o previsto no n.º 14 do art.º 2 da Lei n.º 3/2007, a via de trânsito destina-se à circulação de uma única fila de veículos. Isto é, as duas vias de trânsito nos dois sentidos da Rua de Sai On implicam-se que estas se destinam à circulação de duas filas de veículos.
  Mesmo que não existisse qualquer demarcação ou sinalização de proibição de paragem ou estacionamento de veículo, é óbvio que a paragem ou estacionamento de veículo em qualquer faixa de rodagem com uma única via de trânsito num sentido constituiria obstáculo inevitável à formação de mais uma via para trânsito ou veículos.
  A mesma situação acontece em caso de faixas de rodagem com duas vias de trânsito nos dois sentidos, atento que uma via de trânsito serve sempre para a circulação de uma fila de veículos.
  Na verdade, com dados apurados relativa à largura da faixa de rodagem da Rua de Sai On, o estacionamento de veículo automóvel com a dimensão/largura normal tal como o veículo da recorrente obrigará inevitávelmente qualquer veículo automóvel em circulação da mesma via atravessar o eixo da faixa de rodagem e ocupar a via afecta ao outro sentido, quando este venha a ultrapassar o veículo estacionando, e em sequência, a via de trânsito no outro sentido estaria também delimitada.
  Com efeito, não se mostra possível a formação de mais uma fila de trânsito livre e segura para a circulação de veículos nos dois sentidos em face do estacionamento de veículo automóvel no local do incidente, pela atravessa e ocupação da via de trânsito no outro sentido.
  Por outro lado, não existe parâmetro legal estipulado para a via ou fila de trânsito, ficando assim de fora das considerações do legislador nesta norma proibitiva da alínea 2) do n.º 1 do art.º 48.º da Lei 3/2007. Não é prático ao considerar-se que a formação de via de trânsito se determina pela largura média de veículo automóvel, dado que não se pode eliminar a hipótese de circulação de outro veículo com dimensão enorme.
  Desde modo, não se pode acolher o entendimento da recorrente de que o estacionamento do seu veículo automóvel no local do incidente permite a formação de mais duas filas de trânsito e não obsta à circulação de demais veículos nos dois sentidos, atento que estas duas filas de trânsito eventualmente se formam apenas com a tolerância dos demais utilizadores da faixa de rodagem da Rua de Sai On.
  Além disso, quer o período temporal a que a infracção foi cometida quer a fluidez de tréfego, não são elementos pertinentes para se retirar uma conclusão diversa a que acima se referiu.
  Quanto à fundamentação da decisão recorrida, salvo o devido respeito pelo entendimento diverso, é verdade que não se especificou em concreto se o estacionamento do veículo automóvel ligeiro da recorrente estava ou não impedir a formação de duas filas de trânsito. Todavia, tal com se disse, o facto que a faixa de rodagem em causa consiste apenas duas vias de trânsito nos dois sentidos, demonstra a impossibilidade de circulação de mais uma fila de veículos no sentido paralelo ao veículo estacionado, desde já, fica a circulação de demais veículos nos dois sentidos impedida. Outrossim, não se pode resultar das alegações feitas na petição inicial que a recorrente tivesse sido misturada com os fundamentos expostos na decisão recorrida, tendo ela manifestado os motivos de desconcordância com a decisão recorrida nas vertentes jurídico e factual.
  Para concluir, não se logrou comprovar pela recorrente o vício da violação do princípio da proporcionalidade, para além de formular uma mera alegação abstracta sem detalhe em concreto.
  Nesta conformidade, decide improceder os vícios assacados à decisão recorrida da violação da lei e do princípio da proporcionalidade.
***
III. Decisão
  Por tudo o que fica expendido e justificado, o Tribunal julga improcedente o presente recurso contencioso e absolve a entidade recorrida dos pedidos.
  Custas pela recorrente com taxa de justiça de 4UC.
  Registe e notifique.
*
10 de Outubro de 2014
Juiz de Direito
Leong Sio Kun

1 Não obstante das fotografias juntas aos autos e do esclarecimento prestado pelos DSAT (cfr. fls. 55 a 56 e 65 dos autos), não se pode verificar a demarcação da linha contínua amarela na faixa de rodagem na altura do incidente, donde estava estacionado o veículo da recorrente e foi assim a recorrente sancionada pela violação da proibição de estacionamento.

1062/13-ADM 1/7