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Processo nº 755/2012
(Recurso Contencioso)

Relator: João Gil de Oliveira
Data: 18/Junho/2015
   
   
   Assuntos:

- Declaração unilateral de nulidade de acto administrativo na sequência de prática de crime de corrupção por ex-Secretário do Governo
- Usurpação de poder
- Ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental; Da ofensa do direito de propriedade da 1.ª Recorrente
- Denegação do direito de defesa
- Erro nos pressupostos de direito por desrespeito dos limites do caso julgado
- Erro de direito na aplicação do artigo 122.°, n.º 2, alínea c) do CPA
- Erro nos pressupostos de facto
- Erro nos pressupostos de facto e de direito ao afirmar-se que o ex-Secretário agiu no exercício de funções públicas
- Erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à alegada postergação do interesse público
- Ofensa dos princípios da protecção da confiança, da proporcionalidade e da adequação, por défice de ponderação no quadro do disposto pelo n.º 3 do artigo 123.° do CPA
-Violação dos princípios da Justiça, boa-fé, proporcionalidade e adequação
- Ponderação do interesse público
- Vício de forma, por insuficiência de fundamentação
- Falta de audiência prévia
- Nexo de causalidade entre os factos da condenação e a declaração do acto nulo
    
    SUMÁRIO :
    
1. Consideram-se abrangidos na parte final da alínea c) do art. 122º, n.º 2, do CPA - mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao «objecto» do acto administrativo - também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática, ou seja, serão nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime, estando nessas circunstâncias, por exemplo, os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção.
2. Se é verdade que a declaração de nulidade do contrato só judicialmente pode ser declarada, já não assim quando se declara a nulidade de um acto que autorizou a transmissão de um contrato de concessão, estando apenas em causa a titularidade do contratante particular. Nesta perspectiva, no fundo, o que se põe em causa com a declaração da nulidade apontada é o acto que autoriza a substituição do concessionário e já não o conteúdo das concessões, perdendo assim sentido a invalidação unilateral e subjectiva da Administração a impor-se à outra parte contratual.
3. Não se pode considerar que um contrato de concessão administrativa seja reconduzível a um contrato com uma proximidade ao dos contratos com objecto passível de um contrato privado, em contraponto com os contratos com objecto passível de acto administrativo, na medida em que se definem os termos da colaboração dos particulares na prossecução de tarefas que caberá à Administração prosseguir, no caso, relativamente ao desenvolvimento e empreendimento de um projecto de construção em terreno da RAEM.
4. Falece razão à recorrente ao pretender ter havido usurpação de poder, por a Administração não poder unilateralmente ter proferido declaração de nulidade do acto praticado, nem sequer alegando-se a existência de uma nulidade sequencial contratual. Tendo em conta a razão de ser da figura da invalidade derivada, percebe-se que não pode aceitar-se o princípio segundo o qual a invalidação de qualquer acto prévio a um contrato gera sempre e em qualquer caso a invalidade do próprio contrato.
5. Mesmo os direitos reais não deixam de sofrer limitações legais e se se concluir que a concessão assume tal natureza, de acordo com o seu regime, não deixa de poder ser limitada, não se podendo confundir institutos como a reversão, ou a invalidade de um pressuposto da atribuição de uma concessão com o fenómeno do confisco.

6. Do regime das concessões dos terrenos se retira, não obstante os traços que apontam para a sua natureza real, não obstante o direito do concessionário poder ser um direito real disciplinado em lei especial, ou seja, na Lei de Terras e diplomas complementares, daí não resulta qualquer perpetuidade do direito, podendo a transitoriedade do direito ser apanágio de certos direitos reais.
    7. É verdade que só pode ser punido quem foi julgado no respectivo processo-crime, o que resulta dos princípios estruturantes do Processo Penal, do princípio da legalidade e do acusatório. Mas já nada impede que se retirem efeitos colaterais de uma dada decisão condenatória num outro processo ou procedimento de natureza administrativa, na certeza de que aí não pode ser negada a possibilidade de defesa da parte interessada em contraditar aquela decisão.
    8. Nos termos do art. 578º do CPC “A condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer acções civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infracção.” Pelo que, perante uma condenação transitada em julgado e que serviu de pressuposto à declaração de nulidade de um acto por parte da Administração, cabia ao particular interessado ilidir essa presunção a fim de fazer reverter em sede de recurso contencioso tal declaração.
    
    9. Essa presunção é invocável em relação a terceiros, isto é, em relação aos sujeitos de acção de natureza civil ou administrativa em que se discutam relações jurídicas dependentes ou relacionadas com a prática da infracção que não tenham intervindo no processo penal.
10. Não obstante a prova parecer apontar no sentido de que os membros do júri não foram pressionados e que a proposta da recorrente até era a melhor, isso não esgota todas as possibilidades e não exclui que não houvesse um benefício através de uma qualquer outra via no sentido de se criarem as condições para que a recorrente se viesse a posicionar em condições de indicar a melhor proposta, em termos de preço e em termos de plano urbanístico.
11. Não se pode dizer que foi postergado o interesse público ou que este não foi devidamente ponderado, na medida em que o interesse público que releva na actividade administrativa é aquele que é determinado, em função de sãos critérios, no respeito pela legalidade, considerados fundamentais para a existência, conservação e desenvolvimento da sociedade, traduzindo o interesse público a ideia dominante de todas normas jurídico-administrativas, assentando aquele interesse numa ordem social pacífica, na conservação da dignidade e da honra do ser humano, na possibilidade de manutenção da posse, da propriedade e do trato jurídico, na possibilidade da educação e da cultura, em suma, na criação ou manutenção daquelas relações que respeitam a situações jurídicas materiais fundamentais.
12. É legítimo que a Administração não se queira basear em condutas julgadas já como criminosas, bem ou mal, mas transitadas, restando aos particulares prejudicados os meios postos ao seu dispor no sentido de lhes garantir a tutela efectiva dos seus direitos, mas que não passam necessariamente pela reposição de um acto sentenciado como viciado e criminoso, para mais, quando aqui não se comprova que ele não tenha sido cometido.
13. Os eventuais efeitos putativos do acto nulo situam-se ainda ao nível de alguma juricidade remanescente do acto e não se devem confundir com as consequências e transformações operadas no mundo dos factos que, por via da invalidade fatal do acto, não podem desaparecer, por um passo de mágica. Dizer que os actos nulos não produzem efeitos é um corolário da noção de nulidade, mas, como pura abstracção que é, não atende às realidades.
14. Não há violação do princípio da proporcionalidade, da adequação e da justiça, quando prevalece a prossecução do interesse público, quando perante os diferentes interesses em jogo prevalece o de maior monta, o que assenta no primado da lei, na transparência das decisões administrativas expurgadas de actuações criminosas, perpassadas por actos de corrupção, não havendo interesse, ainda que de carácter público, derivado do desenvolvimento dos negócios, que se sobreponha àquelas preocupações.
15. O acto recorrido não violou os princípios gerais da actuação da Administração, tal como estabelecidos nos artigos 3.° a 9.° do CPA, percebendo-se perfeitamente qual a motivação subjacente à actuação da entidade recorrida, sobrelevando uma transparência governativa, um estrito rigor pela legalidade, isenção de actuação, valores supremos que devem pautar uma sociedade politicamente organizada estruturada e pautada por regras de Direito. Valores que não deixam de se divisar como fundamentais e como estruturantes, o que se impõe ao Governo, desde logo, no art. 65º da Lei Básica, se impõe aos agentes económicos, art. 103º da mesma LB. Mas mesmo que porventura pudesse ser discutível qual o interesse público prevalecente, se o da transparência e o da legalidade, se o da confiança e segurança no investimento, qualquer eventual diferença ou desproporção não se assume com uma evidência clara que impusesse a intervenção dos Tribunais nesse domínio.
16. Perante a vinculação do acto praticado, no sentido de se projectarem os efeitos da condenação criminal noutros actos e com efeitos na esfera de terceiros, não se vê que, no processo administrativo, a interessada pudesse operar uma revisão ou reversão da decisão condenatória proferida. E mesmo na configuração da relevância da comprovação de ausência de uma causalidade adequada entre o crime e o acto, não o logrando fazer, o seu desiderato não deixará de soçobrar.


O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira








Processo n.º 755/2012
(Recurso Contencioso)

Data : 18 de Junho de 2015

Recorrentes: - A Ltd.

Entidade Recorrida: Chefe do Executivo da R.A.E.M.

    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
A LTD., sociedade de responsabilidade limitada, constituída e registada nas Ilhas Virgens Britânicas, onde tem a sua sede em XXX Building, XXX Street, XXX Town, Tortole (a "1.ª Recorrente"), - uma 2º recorrente, B, foi entretanto considerada parte ilegítima no presente processo e a entidade recorrida foi absolvida da instância, tal como a contra-interessada RAEM também foi oportunamente considerada parte ilegítima e também ela absolvida da instância -
vem recorrer contenciosamente do
despacho do Exmo Senhor Chefe do Executivo, de 8 de Agosto de 2012, (a "Entidade Recorrida"), exarado sob a Informação n.º 192/DSODEP/2012, de 7 de Agosto de 2012, que declarou a nulidade dos actos do Chefe do Executivo, de 17 de Março de 2006, através dos quais foram homologados os Pareceres da Comissão de Terras n.º 23/2006, 24/2006, 25/2006, 26/2006 e 27/2006, todos de 16 de Março de 2006,
Alegando em síntese conclusiva:
A. As Recorrentes têm legitimidade para interpor o presente recurso, a 1ª por ser, enquanto titular de posição jurídica substantiva, a destinatária do acto recorrido e, a 2.a, por ter um interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso, uma vez que o acto recorrido produziu efeitos externos lesivos na sua esfera jurídica dos seus direitos e interesses legalmente protegidos;
B. As Recorrentes impugnam, entre outros, os factos constantes dos pontos n.os 4 a 7, 12, 15 a 25, 29, 32, 33, 34, 35, 48, 49 do Relatório n.o 31/DJUDEP/2012, de 1 de Agosto que faz parte integrante da Informação n.º 192/DSODEP/2012 sob a qual foi exarado o acto recorrido;
C. O entendimento professado no acto recorrido de que os contratos administrativos não têm autonomia fora do procedimento onde nasceram por força do princípio da equiparação, previsto no n.o 1 do artigo 172.º do CPA, e que a declaração de nulidade do acto que homologou os pareceres que foram favoráveis à transmissão dos direitos resultantes dos contratos de concessão implica necessariamente a nulidade de tais contratos, concluindo que a Administração tem poderes para declarar tal nulidade sem necessidade de recorrer aos Tribunais, viola o n.o 1 do artigo 172.º e o n.o 1 do artigo 173.º, ambos do CPA, bem como o parágrafo (3) do n.º 2 do artigo 30.º da Lei n.o 9/1999, de 20 de Dezembro;
D. Para além dos actos administrativos de autorização da transmissão dos Lotes e da revisão da concessão, há um contrato de concessão (inicialmente, cinco contratos) entre a RAEM e a 1.ª Recorrente que permanece eficaz, até que um tribunal declare eventualmente a sua invalidade, uma vez que o artigo 173.º do CPA atribui aos tribunais a reserva exclusiva para a apreciação de questões de validade dos contratos administrativos, não tendo a Administração autoridade para se pronunciar sobre tal matéria;
E. Incorre em erro o acto impugnado ao remeter o caso concreto para o n.o 1 do artigo 172.º do CPA, o qual diz respeito às chamadas invalidades derivadas dos contratos administrativos, porquanto os actos ora declarados nulos não são actos autonomizáveis de que haja dependido a celebração dos contratos de concessão, por arrendamento, dos Lotes;
F. Não se está perante uma invalidade derivada do contrato administrativo, mas tão só e apenas, a verificar-se, uma invalidade intrínseca do contrato relacionada com a declaração negocial da Administração, contida nos actos ora declarados nulos, cuja validade poderá apenas ser discutida em sede judicial, no âmbito de acção sobre contratos administrativos;
G. Ainda que se estivesse perante um verdadeiro acto administrativo (de efeito permissivo ou autorizativo) que, simultaneamente, ex lege, contribui para a formação do contrato, então, sempre se manteria a nulidade do acto impugnado ao pretender declarar nulo(s) o(s) contrato(s);
H. Confunde a Entidade Recorrida o regime de invalidades a aplicar por via do artigo 172.º do CPA, com a determinação, constante do artigo 173.º do mesmo Código, do órgão com competência (exclusiva) para uma pronúncia de autoridade sobre a matéria, sendo, nos termos desses artigos, a declaração de nulidade dos contratos apenas alcançada através da propositura, com ganho de causa, de uma acção judicial com tal pedido, como corroborado pelo n.o 2 do artigo 113.º do CPAC;
I. Pela lógica jurídico-administrativa, é indispensável que a declaração de nulidade se consolide na ordem jurídica (quer através da não impugnação do acto recorrido ou da sua improcedência) previamente à decisão judicial a proferir em sede de acção sobre contratos administrativos;
J. Padece, assim, o acto recorrido, de usurpação de poder, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, ao determinar, no ponto 37 do Relatório, a consequente nulidade de contratos administrativos em causa, quanto tal matéria é da exclusiva jurisdição dos Tribunais de Macau, e, como tal, é nulo;
K. O direito do concessionário por arrendamento de terrenos do domínio privado da RAEM tem natureza de direito real e não de direito meramente obrigacional, conferindo o contrato de concessão poderes de construção e transformação de obras ou edifícios sobre os terrenos concessionados, correspondendo tais poderes a um verdadeiro direito de propriedade, como determina o artigo 1.º do Decreto-Lei n.o 51/83/M, de 26 de Dezembro, e tendo o concessionário o direito de transmitir a propriedade das construções, nos termos da Lei de Terras;
L. O acto recorrido viola frontalmente o direito de propriedade da 1.ª Recorrente resultante do contrato de concessão, por arrendamento, dos Lotes, o qual é um direito fundamental consagrado e protegido pelos artigos 6.º e 103.º da Lei Básica de Macau e, como tal, é nulo, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA;
M. O acto impugnado visa despojar a destinatária, a ora 1ª Recorrente, dos seus direitos de conteúdo patrimonial, relativos aos Lotes, benfeitorias e construções já aí efectuadas, sem qualquer compensação pelo seu valor real, o que não deixa de corresponder, assim, a um verdadeiro confisco - o que é incompatível com o artigo 103.º da Lei Básica, invocando-se, à cautela, o vício de violação de lei por confisco e a consequente nulidade do acto impugnado;
N. A decisão impugnada é materialmente sancionatória, não se tratando, pois, de repor a legalidade objectiva e própria do conteúdo do acto administrativo declarado nulo ou das formalidades do procedimento a ele conducentes, mas de infligir uma punição à 1ª Recorrente, em termos extremamente gravosos, no quadro de uma sentença proferida num processo-crime a que é estranha e no qual lhe não foi dado defender-se;
O. Não tendo sido assegurado direito de defesa à 1ª Recorrente (o qual não é satisfeito pelo simples exercício de audiência nos termos gerais), o presente acto é nulo, nos termos da alínea d) do n.o 2 do artigo 122.º do CPA, por ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, reconhecido pelo artigo 29.º da Lei Básica (extensível aos procedimentos administrativos que desemboquem em actos administrativos de cariz sancionatório);
P. O acto recorrido limitou-se a dar como certos e incontestáveis os factos descritos no Acórdão do TUI de 31 de Maio de 2012, proferido no âmbito do processo-crime n.º 37/2011, não tendo havido, quanto a essa matéria, qualquer fase de actividade instrutória específica do procedimento administrativo conducente à emissão do acto ora impugnado;
Q. A 1ª Recorrente não foi parte do processo-crime em causa, não tendo tido qualquer possibilidade de se defender ou de contrapor os factos que, relacionados com o seu processo de selecção para aquisição dos Lotes, ali foram imputados ao ex-Secretário e que foram invocados apenas do ponto de vista da responsabilidade criminal daquele;
R. A força de caso julgado cobre apenas a resposta dada à pretensão do autor e não o raciocínio lógico que a sentença percorreu até chegar a essa resposta, sendo pacífico que os factos dados como provados na sentença não podem considerar-se cobertos pela eficácia externa do caso julgado;
S. Ao dar como certos os factos constantes do Acórdão do TUI num processocrime em que a 1ª Recorrente não foi parte e ao aplicá-los automaticamente ao procedimento administrativo, o acto recorrido viola os limites objectivos do caso julgado, o que consubstancia um vício de violação de lei;
T. Os alegados actos que constituíram crime foram praticados pelo então Secretário muito antes e fora do procedimento administrativo onde foram praticados pelo Chefe do Executivo os actos agora declarados nulos, não havendo, no caso em apreço, coincidência entre o acto declarado nulo e o acto objecto de crime, como também não há coincidência entre o autor do acto declarado nulo e o autor do alegado crime;
U. A alínea c) do n.o 2 do artigo 122.º do CPA aponta claramente para a identidade e coincidência entre o acto administrativo nulo e o acto que constitui crime, e necessariamente, para a identidade entre o autor do acto administrativo nulo e o autor do crime;
V. Se o que está em causa é um acto administrativo cuja prática ou conteúdo são de alguma forma influenciados pela prática de um crime a que o autor do acto é totalmente alheio, as repercussões jurídicas do crime no acto administrativo sob escrutínio, a existirem, hão-de achar-se nos institutos do erro de facto - no caso de o autor do acto final ser dolosamente induzido numa percepção errónea da realidade por conduta criminosa -, ou, mesmo, da violação do princípio da imparcialidade na sua dimensão objectiva associada a deveres positivos e negativos de ponderação de interesses - no caso de o autor do acto final ser criminosa mas inconscientemente induzido à ponderação de elementos de facto ou de direito que a previsão da norma atributiva da competência em exercício não o autoriza a ponderar;
W. Quer no caso de «erro de facto» quer no de «violação do princípio da imparcialidade na sua dimensão objectiva», ainda que se tenha que reconhecer que o acto administrativo que padecesse das referidas patologias quedaria inválido por «vício de violação de lei», a verdade é que a sanção que o ordenamento jurídico reserva para tal invalidade é a sanção geral da «anulabilidade» do acto administrativo viciado (e não a sanção excepcional da «nulidade»), a qual há muito que se consolidou na ordem jurídica e, como tal, é insusceptível de anulação por ter terminado o prazo para a respectiva impugnação contenciosa ou revogação, nos termos do artigo 25.º do CPAC e dos artigos 125.º e 130.º do CPA;
X. Ao contrário do que é sustentado nos relatórios de suporte ao Despacho recorrido, não é a mera verificação de que a montante da prática de um acto administrativo existe um acto - acessório, preparatório ou instrumental que envolva a prática de um crime, para automaticamente se poder fulminar com a nulidade o acto final do procedimento em causa;
Y. A verdade é que no caso concreto está por demonstrar, seja na sentença do TUI, seja no acto recorrido (que ilegalmente preteriu o ónus de tal apreciação) que a outorga das autorizações declaradas nulas não teria ocorrido sem a actuação corrupta do anterior Secretário, ou que as condições oferecidas pela 1ª Recorrente que estiveram na base da concessão das autorizações seriam diferentes no caso de a referida actuação criminosa não ter tido lugar;
Z. Também por esta via os actos de declaração de nulidade contidos no acto recorrido são inválidos e consequentemente anuláveis, por «erro de direito» na determinação da invalidade dos actos declarados nulos, gerador de vício de «violação de lei»;
AA. Como é natural, a aferição da validade dos actos autorizativos em causa no quadro de uma interpretação extensiva da previsão da alínea c) do n.o 2 do artigo 122.º do CPA tem de limitar-se à análise da idoneidade dos actos praticados dentro do próprio procedimento e depois de esse se ter iniciado, nomeadamente, no caso concreto, nos pareceres favoráveis da Comissão das Terras entre outros actos instrutórios ou preparatórios;
BB. O acto recorrido incorre, assim, em vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, porquanto não teve em conta (i) que a aplicação da alínea c) do n.o 2 do citado artigo 122.º exige, antes de mais, coincidência entre autores e actos do crime e do acto administrativo, ou, quando não haja coincidência dos actos, que o crime seja, no mínimo, relevante para a prática do acto final, e (ii) que, a padecerem de algum vício, mormente de «erro de facto» ou de «violação do princípio da imparcialidade na sua dimensão objectiva», quedando inválidos por «vício de violação de lei», a sanção que o ordenamento jurídico reserva para tal invalidade é a sanção geral da «anulabilidade» do acto administrativo viciado e não a sanção excepcional da «nulidade», o que os tornaria insusceptíveis de anulação dado que já terminou o prazo para a respectiva impugnação contenciosa;
CC. O acto recorrido baseia-se em factos que qualifica, na epígrafe do Ponto II, como "RELEVANTES", que percorrem todo esse documento e que serviram de pressupostos factuais para a tomada de decisão ora impugnada, os quais foram erroneamente dados como ocorrendo no caso concreto, porquanto não é verdade que o processo de transmissão dos Lotes se tenha iniciado por vontade do então Secretário, nem é verdade que a l.a Recorrente tenha sido beneficiada em relação às outras duas concorrentes ou que as deliberações das Transmitentes e N não tenham sido livremente tomadas, incorrendo, assim, o acto recorrido em erro nos pressupostos de facto;
DD. Todos os actos e negociações quanto à escolha da transmissária decorreram antes de ser iniciado o procedimento administrativo com vista à formalização da transmissão, o qual apenas tem lugar por a concessão ser provisória, cabendo, assim, à Administração validar, nessa sede, a escolha da transmissária feita no âmbito da autonomia privada das partes, salvaguardando, o interesse público no âmbito do ordenamento do território de terrenos ainda não aproveitados;
EE. Neste procedimento administrativo, totalmente independente do processo de escolha e negociação privada entre as Transmitentes e a transmissária, houve uma apreciação autónoma da verificação dos requisitos legais e da inexistência de razões de oportunidade e conveniência que recomendasse parecer desfavorável à transmissão, motivo pelo qual a Comissão de Terras proferiu os Pareceres n.ºs 23 a 27/2006 favoráveis à transmissão e o Chefe do Executivo homologou os mesmos;
FF. Mistura indevidamente o acto recorrido a fase do exercício da autonomia privada através da prática de negócios jurídicos cuja pretensa invalidade só poderia ser decidida por um tribunal e o procedimento administrativo que, repete-se, só se inicia com um pedido de autorização apresentado já após a escolha da transmissária;
GG. Padece, assim, o acto recorrido, nesta parte, de erro de direito quando, para chegar à conclusão de que o processo de selecção da proposta vencedora inquinou irremediavelmente o consequente procedimento de transmissão dos Lotes, a Entidade Recorrida pressupõe necessariamente que tal processo de escolha da transmissária constitui uma fase do procedimento administrativo;
HH. Nos termos da legislação em vigor, mais concretamente, do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 13/92/M, de 2 de Março, a representação da RAEM nas Assembleias Gerais das sociedades de que é sócia deverá caber, quando não aos delegados ou administradores, a um representante designado pela tutela - logo, a única competência que o então Secretário tinha era de designar um representante para representar a RAEM nessas Assembleias Gerais, o que, no caso em apreço, fez, tendo indicado a Dra. C para as reuniões ocorridas em 31 de Maio, 16 de Junho e 5 de Agosto de 2005, nas quais se discutiram os assuntos relacionados com a transmissão dos Lotes;
II. O acto recorrido incorre, ainda, em erro sobre os pressupostos de facto e de direito, quando afirma, nomeadamente, que o Secretário "interveio nesse processo ilícito enquanto titular de um cargo público", "na qualidade de representante do sócio RAEM" ou que "as funções desempenhadas pelo exSecretário, embora no âmbito de sociedades privadas, deviam corresponder à concretização do interesse público", quando aquele não interveio e quando, por lei, não lhe cabia qualquer competência para representar a RAEM enquanto sócia das Transmitentes;
JJ. São, mais uma vez, erróneos os factos em que se motiva o acto recorrido, na parte onde alega que o interesse público terá sido, em concreto, postergado, não tendo sido "objectivamente prosseguido por força da interferência do ex-Secretário", porquanto não se registou qualquer postergação do interesse público, quer (i) no processo de selecção da transmissária, pois a Comissão de Apreciação de Propostas concluiu que a proposta da 1.ª Recorrente era a melhor, não só em termos de preço, mas também ao nível das soluções urbanísticas e arquitectónicas apresentadas, quer (ii) no procedimento administrativo;
KK. O procedimento administrativo prosseguiu a sua tramitação normal na DSSOPT, tendo todas as informações e pareceres sido produzidos em conformidade com a Lei de Terras e na prossecução do interesse público, tendo todas as deliberações de aprovação de cada um dos Pareceres da Comissão de Terras sido tomadas por unanimidade dos seus sete membros, com ponderação autónoma da sua oportunidade e conveniência para o interesse público, não constando que qualquer deles se não houvesse pronunciado em consciência à luz de um exame objectivo da oportunidade e conveniência das condições propostas e da verificação dos pressupostos legais;
LL. O alegado acto preparatório do então Secretário limitou-se a concordar com a posição tomada e confirmada por três funcionários da DSSOPT, incluindo o seu Director, quanto ao prosseguimento e termos em que deveria o procedimento avançar, não tendo sido esse o acto que determinou esse prosseguimento e os seus termos, como erroneamente afirma o acto recorrido;
MM. Incorre o acto recorrido em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, quando invoca que houve postergação do interesse público, o que é erróneo, porquanto, quer o processo de selecção da sociedade transmissária, quer o procedimento administrativo de autorização da transmissão dos Lotes se nortearam, exclusiva e objectivamente, por critérios de legalidade e interesse público;
NN. O acto recorrido incorre, também, em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto, ao afirmar que o acto preparatório do então Secretário determinou se o processo deveria prosseguir ou não e em que termos, que esse acto se limitou a aceitar as negociações previamente estabelecidas e que não foi feita, no procedimento administrativo, uma apreciação ponderada do pedido de acordo com os critérios definidos na Lei de Terras;
OO. Incorre ainda em vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito ao fundamentar a declaração de nulidade dos actos do Chefe do Executivo com base na ligação hierárquica abstracta entre a DSSOPT e o Secretário para as Obras Públicas, sem demonstrar de que forma tal relação de hierarquia terá influenciado, em concreto, a actuação de todos os subordinados envolvidos no procedimento administrativo;
PP. Os actos objecto da declaração de nulidade e os que se lhe seguiram na tramitação do processo administrativo de transmissão dos Lotes e subsequentes revisões, produziram efeitos a todos os níveis, quer jurídico, quer factual ou económico, na esfera jurídica das Recorrentes e da de terceiros, que, de harmonia com os princípios gerais de Direito, não podem ser pura e simplesmente destruídos pela aplicação cega de um parágrafo da lei;
QQ. O acto recorrido ignorou tais efeitos ao declarar incondicionalmente a nulidade dos actos em causa, sem atender aos efeitos de facto e, pelo decurso do tempo, jurídicos que, como visto, merecem a tutela do Direito, incluindo, entre outros, o investimento e obras realizadas nos Lotes e as promessas de compra e venda de 302 futuras fracções autónomas dos imóveis do projecto em desenvolvimento;
RR. A interpretação lata, extensiva que a Administração faz da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, a ser aplicável ao caso, teria, ainda assim, de ser relativizada e balizada por limites de proporcionalidade, adequação e justiça, com protecção dos direitos de terceiros de boa-fé, como previsto no n.° 3 do artigo 123.º do CPA, os quais se mostram largamente ultrapassados pelo Despacho recorrido;
SS. Ao ignorar-se esta possibilidade em abono de uma pretensa «vinculação absoluta», viola-se por défice de ponderação o n.o 3 do artigo 123.º do CPA e ofendem-se também os referidos princípios e, ainda, o da protecção da confiança e segurança jurídicas e do interesse e defesa dos direitos dos particulares, no caso, abrangendo os promitentes-compradores, incluindo a 2.a Recorrente, empreiteiros com contratos de empreitada em curso, investidores de Hong Kong, através de uma sociedade cotada em bolsa e alheia ao modo como a operação em que investiu a posteriori se havia concretizado;
TT. A destruição total das situações constituídas à sombra do acto nulo corresponde a uma decisão da Administração que colide com direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos de particulares, em manifesto excesso da proporcionalidade, justiça e adequação por que se deve reger a sua actuação, nos termos dos princípios consignados no n.o 2 do artigo 5.º do CPA;
UU. Toda a actuação da Administração, incluindo a revisão da concessão operada em 2011, a percepção do imposto de selo devido pelas promessas de compra e venda, a aprovação dos projectos de arquitectura e engenharia e a emissão de licenças de obra, até à prolação do acto recorrido, reforçou a confiança da 1ª Recorrente (e da ZQ, sua sócia única), bem como de particulares, incluindo a 2.a Recorrente, e grandes investidores nos direitos concedidos por via do contrato de concessão;
W. Havendo colisão entre interesses públicos, o subjacente à prática do acto e os que cabem à Administração, em geral, prosseguir (no qual, necessariamente, se inclui o dever de protecção e respeito pelos direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos dos particulares e administrados, entre os quais, o direito de propriedade privada), cabia a esta ter agido através da ponderação e harmonização desses interesses, aplicando a lei com salvaguarda dos inegáveis efeitos de facto, entretanto, produzidos no decurso de um período superior a 6 anos, no respeito dos tais direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos - o acto recorrido viola, deste modo, os princípios gerais da actuação da Administração, tal como estabelecidos nos artigos 3.º a 9.º do CPA;
WW. Todas as afirmações que seriam essenciais para demonstrar a incidência da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, bem como a actuação do exSecretário com efeitos invalidatórios das declarações negociais de direito privado e de actos do procedimento administrativo, são sempre feitas em abstracto, em termos que lhes retiram toda a aptidão para delinear os factos que seriam juridicamente relevantes, padecendo, assim, o acto recorrido de insuficiência de fundamentação e, como tal, violando a alínea e) do n.º 1 do artigo 113.º e o artigo 114.º do CPA;
XX. O indeferimento das diligências de prova requeridas pela 1.ª Recorrente em sede de audiência escrita é infundado e corresponde à violação do seu direito de audiência, expressamente consagrado no n.o 3 do artigo 94.º do CPA, padecendo, assim, o acto recorrido de vício de forma por falta de audiência completa dos interessados.
YY. A 2.a Recorrente dá por reproduzida na íntegra, para os devidos efeitos legais, toda a fundamentação aduzida nos artigos precedentes e invoca, mutatis mutandis, os mesmos vícios do acto recorrido conforme alegados pela 1.ª Recorrente na presente petição de recurso, em particular os constantes do ponto 3.8 e do ponto 3.9 supra.

NESTES TERMOS e nos mais de Direito que V. Ex.as mui douta e certamente não deixarão de suprir, por todas as razões acima expostas e em face da violação dos normativos supra invocados, requerem:
i. a declaração de nulidade do acto recorrido, por:
(a) usurpação de poder; e
(b) por ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental, nas suas vertentes de:

• ofensa do direito de propriedade da 1.ª Recorrente; e de
• denegação do seu direito de defesa;
ou, caso assim não se entenda,

ii. a anulação do acto recorrido, nas suas vertentes de:
(a) vícios de violacão de lei, por:

• erro nos pressupostos de direito, por desrespeito dos limites do caso julgado;
• erro de direito na aplicação do artigo 122.º, n.o 2, alínea c) do CPA;
• erro nos pressupostos de facto:
• quanto à alegada intenção do ex-Secretário de vender os Lotes;
• quanto ao alegado benefício da l.ª Recorrente em detrimento das restantes duas concorrentes e da alegada intervenção do então Secretário nas deliberações das Transmitentes;
• erro de direito, segundo o qual o processo de escolha da transmissária constituiria uma fase do procedimento administrativo;
• erro nos pressupostos de facto e de direito, ao afirmar que o ex-Secretário agiu no exercício de funções públicas;
• erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à alegada postergação do interesse público;
• erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à alegada relevância do acto preparatório do ex-Secretário no procedimento administrativo;
• ofensa dos Princípios da Protecção, da Confiança, da Proporcionalidade e da Adequação, por défice de ponderação no quadro do disposto pelo n.o 3 do artigo 123.º do CPA; e,
• violação dos Princípios da Justiça, Boa-Fé, Proporcionalidade e Adequação; (b) vícios de forma,por:
• insuficiência de fundamentação; e,
• falta de audiência prévia.

O Exmo Senhor Chefe do Executivo contesta, dizendo, em suma:

(I) A 2ª Recorrente B não tem legitimidade para interpor o presente recurso contencioso, porque alegou que é promitente-comprador de fracção autónoma do prédio a construir no terreno concedido à 1ª Recorrente A Ltd.. E como é referido, a 2ª Recorrente B tem o direito obrigacional, ou seja uma relação jurídica de obrigações constituída com a 1ª Recorrente A Ltd., obviamente sem oponibilidade a terceiros, incluindo a autoridade administrativa.
(II) No sentido jurídico, a 2ª Recorrente B não adquiriu os direitos decorrentes da transmissão da concessão dos respectivos terrenos, não gozando de qualquer direito real ou outro direito dos terrenos.
(III) Por outro lado, mesmo que julgue-se procedente o presente recurso contencioso (claro que isso não acontecerá por o acto recorrido não padecer de qualquer vício), a 2ª Recorrente B não tem interesse directo e pessoal, porque o acto recorrido é a declaração de nulidade da autorização de transmissão e alteração da concessão dos 5 terrenos em causa, porém, a 2ª Recorrente não é concessionário ou transmissário destes 5 terrenos, nem titular dos direitos decorrentes da concessão dos terrenos, pelo que a 2ª Recorrente não tem qualquer interesse directo, pessoal ou legítimo no provimento do presente recurso contencioso, tendo apenas interesse indirecto – ou seja que a 1ª Recorrente pode continuar o cumprimento das obrigações, construir os prédios e vender a fracção autónoma à 2ª Recorrente; no entanto, isso também não é definitivo! Pode ainda a 1ª Recorrente, com base em certas razões, não continuar a construir os prédios, ou vender as fracções autónomas a outrem (por a 2ª Recorrente não ter registo predial provisório) e não cumprir as obrigações do contrato-promessa.
(IV) A 2ª Recorrente B não tem qualquer direito lesado pelo acto recorrido, ou interesses legalmente protegidos, nem qualquer interesse directo, pessoal e legítimo quando o acto recorrido for declarado nulo ou anulado, pelo que não tem legitimidade para interpor o presente recurso contencioso.
(V) Ao abrigo do disposto no art.º 1.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, em remissão para os artigos 230.º, n.º 1, al. d), 412.º, n.º 1 e 413.º. al. e) do Código de Processo Civil, deve-se rejeitar o recurso da 2ª Recorrente B.
(VI) O acto administrativo recorrido não padece dos vícios indicadas nas petições iniciais das 1ª e 2ª Recorrentes.
(VII) O acto administrativo recorrido só declara nulos os 5 actos administrativos, feitos pelo Chefe do Executivo em 17 de Março de 2006, que padeceram do vício de nulidade, não declarando nulos os respectivos contratos de concessão.
(VIII) Ademais, os 5 actos administrativos declarados nulos pelo acto recorrido são actos-precontratuais independentes dos contratos de concessão, ou seja independentes dos contratos de concessão titulados pelos despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º48/2006 a n.º 52/2006, a natureza destes actos administrativos declarados nulos é semelhante à da adjudicação no processo de aquisição de serviços e obras, que é independente do contrato administrativo posteriormente celebrado com o concessionário.
(IX) Nos termos do art.º 123.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo: “a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal.” Pelo que compete ao Chefe do Executivo declarar nulos os referidos 5 actos administrativos que padecem do vício de nulidade.
(X) Por isso, o acto administrativo recorrido não padece do vício de usurpação de poder.
(XI) O acto administrativo recorrido não padece do vício de “ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental” porque:
(XII) O acto recorrido não ofendeu o direito de propriedade da Recorrente porque os direitos da 1ª Recorrente A Ltd. indicados pela respectiva Recorrente nos pontos 49 a 61 da petição inicial foram, de acordo com os factos provados no acórdão n.º 37/2011 do TUI, adquiridos através de actos administrativos que padeceram do vício de nulidade por constituir crime (de corrupção passiva). Tais direitos adquiridos através da prática de crimes não são protegidos pelo regime jurídico da RAEM.
(XIII) Ao abrigo do disposto no art.º 4.º do Código do Procedimento Administrativo, todas as actividades da autoridade administrativa visam prosseguir o interesse público. Assim, os actos que se deviam do “princípio da prossecução do interesse público” e que se aproveitam dos poderes funcionais para obter interesses particulares são proibidos pela lei. A corrupção passiva para acto ilícito por um funcionário é punida pelo art.º 337.º do CPM com pena de prisão de 1 a 8 anos, e nos termos do art.º 122.º, n.º 2, al. c) do Código do Procedimento Administrativo, são nulos os actos que constituam um crime, e não produzem qualquer efeito jurídico.
(XIV) Por isso, não é difícil entender que os direitos adquiridos pela 1ª Recorrente através de actos administrativos que padeceram do vício de nulidade por constituir crime não obtiveram a reserva de qualquer efeito jurídico, porque isso é proibido pela lei.
(XV) Além disso, o conteúdo do ponto 63 da petição inicial da Recorrente não é verdade, porque o acto recorrido não inclui conteúdo de “confisco” do preço pago pela 1ª Recorrente na transmissão de concessão, isso pode ser provado pelo acima referido no ponto 11 da presente contestação. Ademais, no processo de autorização da transmissão e alteração de concessão de 17 de Março de 2006, a 1ª Recorrente não foi solicitada para pagar nem pagou efectivamente qualquer prémio ao Governo da RAEM (cfr. despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 48/2006 a n.º 52/2006), e quem cobrou o prémio que a 1ª Recorrente alegou pagar era as transmitentes, ou seja as 5 sociedades «D – Sociedade de Fomento Predial, Limitada», «E – Sociedade de Fomento Predial, Limitada», «F Sociedade de Fomento Predial, Limitada», «G – Sociedade de Fomento Predial, Limitada» e «H – Sociedade de Fomento Predial, Limitada», em vez do Governo da RAEM. Assim, não é difícil entender porque é que o acto recorrido não tratou o referido prémio, mas é de reiterar que “não tratou” não significa “confisco”.
(XVI) Em relação ao direito de propriedade da 2ª Recorrente B, como é referido nos pontos 4 a 9 da presente contestação, a 2ª Recorrente alegou que é promitente-comprador de fracção autónoma do prédio a construir no terreno concedido à 1ª Recorrente A Ltd.. Pelo que a 2ª Recorrente B tem apenas o direito obrigacional, ou seja uma relação jurídica das obrigações constituída com a 1ª Recorrente A Ltd., e no sentido jurídico, a 2ª Recorrente B não adquiriu os direitos decorrentes da transmissão da concessão dos respectivos terrenos, não gozando de qualquer direito real ou outro direito dos terrenos.
(XVII) Quanto ao contrato-promessa celebrado entre as 1ª e 2ª Recorrentes, pode a 2ª Recorrente, querendo, invocar os seus direitos contra a 1ª Recorrente segundo as legislações vigentes, designadamente o art.º 436.º do Código Civil de Macau.
(XVIII) O acto administrativo recorrido também não negou o direito de defesa da Recorrente. Antes do presente acto administrativo recorrido, o Chefe do Executivo já realizou, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo, audiência escrita dos interessados incluindo a 1ª Recorrente A Ltd., e esta emitiu seu parecer em escrito em 29 de Junho de 2012.
(XIX) O acto administrativo recorrido foi feito com base nos factos provados e na decisão no acórdão n.º 37/2011 do TUI, e se os indivíduos envolvidos no crime de corrupção activa foram absolvidos não é importante para o referido acto administrativo.
(XX) O acto administrativo recorrido não padece do vício de “violação de lei” porque:
(XXI) Em relação ao conteúdo nos pontos 75 a 81 da petição inicial da Recorrente, de acordo com o art.º 578.º do Código de Processo Civil, aplicado pelo art.º 1.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, bem como o art.º 31.º da presente contestação, é obviamente improcedente o recurso interposto pela Recorrente, pelo que o acto administrativo recorrido não padece do vício de “erro nos pressupostos de direito”.
(XXII) O acto administrativo recorrido tem como pressuposto de facto os factos provados no acórdão n.º 37/2011 do TUI, e os factos provados no acórdão n.º 37/2011 do TUI são suficientes para provar que a interferência ilegal do ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas I foi importante e decisiva para a selecção da proposta vencedora, e afectou o posterior processo de transmissão da concessão de terrenos, fazendo com que o acto final deste processo (o acto administrativo que foi declarado nulo pelo acto administrativo recorrido) padecesse do vício de nulidade.
(XXIII) “No sentido jurídico, nos termos do art.º 143.º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho, os direitos resultantes da transmissão da concessão dos 5 terrenos em causa só têm efeito após a autorização da RAEM, por outra palavra, o objectivo a alcançar com a corrupção passiva do ex-Secretário I para a prática de acto ilícito é necessariamente a transmissão dos direitos derivados da concessão dos 5 terrenos em causa ao objecto da sua promessa. Isso foi provado nos factos provados no acórdão n.º 37/2011 do TUI, designadamente nos pontos 84 a 88. Por a referida decisão foi transitada em julgado, os respectivos factos estão definitivamente provados para sempre e erga omnes.
(XXIV) Com base nisso, o conteúdo nos pontos 75 a 125 da petição inicial da Recorrente é obviamente não importante para verificar se o ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas I interferiu ilegalmente na selecção de proposta vencedora, se afectou o posterior processo de transmissão da concessão de terrenos, e se fez com que o acto final deste processo padecesse do vício de nulidade.
(XXV) Apesar de a autorização da transmissão de direitos e a alteração da concessão não serem realizadas pelo ex-Secretário I mas pelo Chefe do Executivo, a decisão feita por este fundamentou-se no processo anterior com pressupostos e motivos de crime.
(XXVI) Como referem Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho na página 710 do «Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado», deve-se incluir no âmbito da alínea c) do n.º 2 do art.º 122.º do Código do Procedimento Administrativo “todos os actos que envolvam a prática dum crime, mesmo que o seu objecto não gere responsabilidade criminal. Assim, são nulos os actos que assentam em pressupostos ou motivos criminosos ou cuja finalidade constitua um crime (v.g. actos praticados por corrupção)”.
(XXVII) Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e J. Pacheco de Amorim têm o mesmo entendimento na página 645 do «Código do Procedimento Administrativo Comentado», 2ª edição, “consideramos abrangidos na parte final desta alínea c) – mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao “objecto” do acto administrativo – também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime. Por exemplo, (…) actos que sejam praticados por corrupção.”
(XXVIII) Por isso, o acto administrativo recorrido também não padece do vício de “erro de direito na aplicação do art.º 122.º, n.º 2, al. c) do Código do Procedimento Administrativo”.
(XXIX) O acto administrativo recorrido não padece dos vícios de “erro nos pressupostos de facto”, “erro de direito” e “erro nos pressupostos de direito” indicados nos pontos 126 a 229 da petição inicial, e têm-se as razões expostas nos pontos 36 a 42, e 31 da presente contestação. E o conteúdo nos pontos 126 a 229 da petição inicial da Recorrente é obviamente não importante para verificar se o ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas I interferiu ilegalmente na selecção de proposta vencedora, se afectou o posterior processo de transmissão da concessão de terrenos, e se fez com que o acto final deste processo padecesse do vício de nulidade.
(XXX) O acto administrativo recorrido não padece do vício de “violação dos princípios de protecção de confiança e paz jurídica, de protecção dos direitos patrimoniais e da adequação” indicado nos pontos 230 a 249 da petição inicial da Recorrente, tendo as razões expostas nos pontos 19 a 28 da presente contestação.
(XXXI) O acto administrativo recorrido não padece do vício de “violação dos princípios de protecção de justiça, da boa fé e da adequação” indicado nos pontos 250 a 275 da petição inicial da Recorrente, tendo além das razões expostas nos pontos 19 a 28 da presente contestação, mas também as seguintes: o acto administrativo recorrido observou o princípio de protecção de justiça, porque o regime jurídico da RAEM não permite “actos de corrupção passiva” por tais actos poderem prejudicar gravemente a confiança pública no governo e afectar gravemente o ambiente comercial da leal concorrência, bem como afastar os investidores legais. Por isso, o regime jurídico da RAEM pune os “actos de corrupção passiva” com o direito penal, e através do art.º 122.º, n.º 2, al. c) do Código do Procedimento Administrativo, considera nulos os actos administrativos resultantes de crimes, pelo que estes actos não produzem qualquer efeito jurídico. Assim, se sejam reservados os direitos adquiridos pela 1ª Recorrente através do acto administrativo que padece do vício de nulidade por causa do crime de corrupção passiva, faz-se sentir a injustiça de lei, e em consequência, e abala-se a confiança pública na lei. Ademais, ninguém deve esperar a aquisição de direitos e interesses através de actos criminosos, isso também é o princípio da boa fé constante do art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo. Pelo que o acto administrativo recorrido não violou “os princípios de protecção de justiça, da boa fé e da adequação” ao declarar nulo o acto administrativo resultante de crime.
(XXXII) O acto administrativo recorrido não padece do vício de “insuficiência de fundamentação” indicado nos pontos 276 a 283 da petição inicial da Recorrente, porque o acto administrativo recorrido foi feito na Informação n.º 192/DSODEP/2012, e absorveu os fundamentos de facto e de direito constantes desta Informação. Em contrário à petição inicial da Recorrente, a referida Informação explica de forma explícita e detalhada os respectivos fundamentos de facto e de direito.
(XXXIII) O acto administrativo recorrido também não padece do vício de “falta de audiência prévia” indicado nos pontos 284 a 290 da petição inicial da Recorrente, porque como é referido no ponto 30 da presente contestação, antes do presente acto administrativo recorrido, o Chefe do Executivo já realizou, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo, audiência escrita dos interessados incluindo a 1ª Recorrente A Ltd., e esta emitiu seu parecer em escrito em 29 de Junho de 2012.
(XXXIV) De acordo com o art.º 86.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, o órgão competente deve procurar averiguar os factos “cujo conhecimento seja conveniente para a justa e rápida decisão do procedimento” em vez de todos os factos; o que permite que o órgão administrativo procure a máxima eficácia instrutória com os mínimos meios materiais e humanos.
(XXXV) O acto administrativo recorrido assentou nos factos provados e na decisão no acórdão n.º 37/2011 de 31 de Maio de 2012 do TUI, e tal decisão foi transitada em julgado, pelo que os respectivos factos estão definitivamente provados para sempre e erga omnes.
(XXXVI) Por isso, nos termos do art.º 86.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo e com base no princípio da economia processual, o órgão administrativo não precisa proceder à diligência complementar solicitada pela Recorrente, porque o acórdão n.º 37/2011 de 31 de Maio de 2012 do TUI já averiguou os assuntos solicitados pela Recorrente.

Pelo exposto, pede a este Tribunal para se
­ Rejeitar o recurso interposto pela 2ª Recorrente B e julgar improcedente o recurso da 1ª Recorrente, bem como rejeitar o presente recurso contencioso e manter o acto recorrido; ou
­ Julgar improcedentes os recursos interpostos pelas 1ª e 2ª Recorrentes, rejeitar o presente recurso contencioso e manter o acto recorrido.

    A recorrente ofereceu as seguintes alegações facultativas, tendo concluído nos seguintes termos:
    A. A Recorrente dá aqui por integralmente reproduzido, para os devidos efeitos, o teor da sua petição de recurso - com excepção da matéria atinente à 2.ª Recorrente, que entretanto desistiu do Recurso -, incluindo as Conclusões formuladas a final.
    B. A matéria de facto alegada pela Recorrente na petição de recurso não foi impugnada na Contestação apresentada pela Entidade Recorrida, não se mostra em manifesta oposição com a Defesa considerada no seu conjunto e não resulta contraditada pelos documentos que constituem o processo administrativo instrutor, pelo que deve ter-se por provada, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 54.º do CPAC.
    C. Assim, deverão dar-se por provados, para os devidos efeitos, os factos alegados, designadamente, nos artigos 50 a 77, 129 a 137, 140 a 151, 155 a 159, 166,170, 176, 188 a 201, 205 a 225, 235, 236, 238, 239, 251 a 253 e 257 da petição de recurso.
    D. Em qualquer caso, a grande maioria dos factos alegados nos artigos indicados no parágrafo anterior resultam provados da prova documental junta com a petição de recurso, dos documentos que compõem o processo instrutor e dos depoimentos testemunhais produzidos em sede de audiência de julgamento, designadamente dos depoimentos prestados pelas testemunhas J, K, L e M, conforme demonstrado nos pontos 32 a 54 das presentes Alegações.
    E. O acto recorrido é nulo, por vício de usurpação de poder, nos termos dos artigos 122.º, n.º 2, alínea a), do CPA, uma vez que procedeu à declaração da nulidade dos contratos administrativos de revisão da concessão, violando, dessa forma, a reserva de competência exclusiva dos tribunais prevista no artigo 173.º do mesmo Código.
    F. O acto recorrido é nulo por violação do direito de propriedade da Recorrente, nos termos do artigo 122.2, n.º 2, alínea d), do CPA, na medida em que declarou a nulidade dos contratos de concessão que conferiam à Recorrente o direito de propriedade sobre os Lotes, sem que curasse de determinar a forma como reverteriam para a mesma os preços pagos pelos Terrenos e o valor das benfeitorias realizadas nos mesmos, valores esses que a Recorrente não recebeu até à presente data,
    G. Sendo certo que, neste momento, a Recorrente está numa situação em que, por força da nulidade dos contratos administrativos, à qual não deu causa e a qual não foi declarada por um tribunal, se viu despojada dos Lotes, sem que lhe tenha sido restituído o preço pago pelos mesmos, o que apenas se pode entender como uma grosseira violação do seu direito de propriedade.
    H. O acto recorrido é, ainda, nulo porque, sendo materialmente um acto de natureza sancionatória e assentando em factos dados por provados num processo crime no qual a Recorrente não teve qualquer participação e não pôde, por isso, defender-se, violou o direito de defesa da Recorrente e, assim, o conteúdo essencial de um direito fundamental - cf. artigo 122.º, n.º 2, alínea d), do CPA.
    I. O acto recorrido, ao dar como certos e incontestáveis os factos constantes do Acórdão do TUI n.º 37/2011, no qual a Recorrente não participou, em qualquer qualidade, violou os limites externos do caso julgado, o que consubstancia um vício de lei e resulta na sua anulabilidade - cf. artigo 124.º do CPA.
    J. O acto recorrido procedeu a uma errada interpretação e aplicação do artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do CPA, uma vez que ficou por demonstrar que "entre o crime praticado e o sentido da decisão adoptada há uma conexão causal relevante idónea, por si só, a fazê-la desviar-se do fim que necessariamente tem de prosseguir - a realização do interesse público", pelo que é anulável, nos termos do artigo 124.º do CPA.
    K. A prova dos factos alegados na petição de recurso determina, necessariamente, e sem mais, a inveracidade dos factos elencados no Ponto II. do acto recorrido, de onde resulta também, necessariamente, a invalidade do acto recorrido por erro nos pressupostos de factos e a sua consequente anulabilidade cf. artigo 124.º do CPA.
    L. O acto recorrido enferma de erro nos pressupostos de direito na parte em que fundamenta a relevância dos factos criminosos praticados pelo ex-Secretário para a prática do acto recorrido com a suposta - e errada - circunstância de o processo de escolha da transmissária constituir uma fase do procedimento administrativo, pelo que é anulável, nos termos do artigo 124º do CPA.
    M. À data dos factos, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas dispunha apenas de competência para nomear a representante da RAEM nas Assembleias Gerais da N, pelo que quaisquer outros actos praticados pelo ex-Secretário em relação às sociedades Transmitentes e/ou ao processo de consulta para escolha da sociedade transmissária não foram praticados no exercício de funções públicas, pelo que se impõe concluir que o acto recorrido padece, na parte em que afirma o contrário - designadamente, nos pontos 12 e 15 do seu relatório, de manifesto erro de Direito, pelo que é anulável nos termos do artigo 124.º do CPA.
    N. O acto recorrido incorre, ainda, em erro sobre os pressupostos de facto e de direito quanto à alegada existência de postergação do interesse público, uma vez que, conforme demonstrado na petição de recurso e nas presentes Alegações, quer o processo de selecção da sociedade transmissária, quer o procedimento administrativo de autorização da transmissão dos Lotes se nortearam, exclusiva e objectivamente, por critérios de legalidade e interesse público - pelo que é anulável nos termos do artigo 124.º do CPA -,
    O. Sendo certo que sempre ficaram por demonstrar os factos concretos em que supostamente se traduziriam as insinuações constantes, designadamente, dos pontos 32 e 34 do acto recorrido.
    P. O acto recorrido, ao não proceder à devida ponderação dos interesses, públicos e privados, em conflito, e ao decidir com base numa pretensa "vinculação absoluta", violou o disposto no artigo 123.º, n.º 3, do CPA, bem como os princípios da boa fé, da confiança e da proporcionalidade, conforme demonstrado na petição de recurso e nas presentes Alegações, o que resulta na sua anulabilidade nos termos do artigo 124.º do CPA.
    Q. Todas as afirmações que seriam essenciais para demonstrar a incidência da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, bem como a actuação do ex-Secretário com efeitos invalidatórios das declarações negociais de direito privado e de actos do procedimento administrativo, são sempre feitas em abstracto, em termos que lhes retiram toda a aptidão para delinear os factos que seriam juridicamente relevantes, padecendo, assim, o acto recorrido de insuficiência de fundamentação e, como tal, violando a alínea e) do n.º 1 do artigo 113.º e o artigo 114.º do CPA, sendo por isso anulável nos termos do artigo 124.º do CPA.
    R. O indeferimento das diligências de prova requeridas pela Recorrente em sede de audiência escrita é infundado e corresponde à violação do seu direito de audiência, expressamente consagrado no n.º 3 do artigo 94.º do CPA, padecendo, assim, o acto recorrido de vício de forma por falta de audiência completa dos interessados.
    Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis, deverá o presente recurso contencioso ser julgado procedente, por provado, decidindo-se conforme peticionado, a final, na petição de recurso, com as devidas consequências legais.
    
    A recorrente juntou aos autos douto parecer, para onde se remete, nos termos do qual se formularam as seguintes conclusões:
    1.ª - O acto administrativo recorrido, da autoria do Chefe de Executivo de Macau, datado de 8 de Agosto de 2012, enferma de vícios que determinam, nuns casos, a respectiva nulidade e, noutros casos, a respectiva anulabilidade.
    2.ª - O referido acto é nulo por usurpação de poder, na medida em que declara a nulidade de um contrato administrativo, competência que a lei reserva em exclusivo aos tribunais.
    3.ª - A nulidade do acto resulta ainda do facto de no procedimento de formação daquele mesmo acto - que corresponde à aplicação de uma medida punitiva, com um recorte claramente sancionatório - se ter verificado um cenário de denegação do direito de defesa ao titular do contrato e, consequentemente, a ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental.
    4.ª - O acto do Chefe do Executivo padece do vício de erro de direito na interpretação e aplicação do disposto no artigo 123.°, n.º 2, alínea c), do CPA, pois não só aquele acto não constitui um crime, como não pode dizer-se que o mesmo é determinado pela prática de um crime: a determinação da nulidade em consequência de um crime pressupõe uma relação de causalidade adequada entre crime e resultado que está manifestamente ausente no caso em análise.
    5.ª - Ainda que, por hipótese especulativa, houvesse fundamento para considerar nulo o acto, impunha-se a ponderação do disposto no n.º 3 do artigo 123.º do CPA, que visa, precisamente, atenuar a radicalidade do regime da nulidade e permite engendrar uma solução mais conforme com os princípios da boa-fé, da protecção da confiança e da proporcionalidade; ora, o acto do Chefe Executivo demite-se de fazer esta ponderação, optando pela solução mais radical e igualmente mais fácil num cenário que exigia uma solução forçosamente ponderada, que equacionasse todos os interesses, públicos e privados, relevantes concretamente em causa.
    
    Por sua vez, o Exmo Senhor Chefe do Executivo, entidade recorrida, também apresentou alegações facultativas, dizendo, em síntese:
    I - A Entidade recorrida dá aqui como integralmente reproduzidas para todos os efeitos as suas conclusões formuladas na contestação por si apresentada;
    II - Não é às partes que cabe definir os factos dados como provados;
    III - O acto recorrido não padece de qualquer dos vícios alegados pela Recorrente;
    IV - É clara e inequívoca a existência da conexão causal especialmente relevante entre os actos criminosos e os actos declarados nulos, a que se refere o douto Parecer junto pela Recorrente;
    V - A recorrente foi ouvida em audiência prévia não tendo esta sido preterida ao contrário do que alega.
    Termos em que e nos demais de Direito deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se o acto recorrido, com o que será feita Justiça.
    
    O Exmo Senhor Procurador Adjunto ofereceu o seguinte douto parecer:
    É objecto do presente recurso o despacho do Chefe do Executivo de 8/8/12 que de c1 arou a nulidade, nos termos das disposições da al. c) do n° 2 do art° 122° e do n.º 2 do art° 123° do CPA, dos actos da mesma entidade de 17/3/06 que homologaram pareceres da Comissão de Terras n.ºs 23/24/25/26 e 27/2006, todos de 16/3/06, pareceres esses favoráveis à transmissão dos direitos resultantes dos contratos de concessão dos lotes 1c), 2, 3, 4 e 5, a favor da sociedade recorrente, "A, Ltd.", e à revisão dos referidos contratos de concessão, bem como às minutas dos contratos a eles anexos e que foram publicados no B.O. da RAEM, n° 14, II Série, de 6/4/2006, por despachos do S.T.O.P. com os n.ºs 48/49/50/51 e 52 de 2006.
    Se bem analisamos o cobnteúdo das alegações da recorrente, com "revisita" do expendido no petitório inicial, para que não deixou de remeter, almeja aquela a declaração de nulidade de tal acto, por ocorrência de usurpação de poder e ofensa do conteúdo essencial dos direitos de propriedade e de defesa, do mesmo passo que, assim se não entendendo, pretende a anulação respectiva, seja por violação de lei errada interpretação do conteúdo da al. c) do n° 2 do art° 122°, CPA, ofensa dos limites externos do caso julgado, erro nos pressupostos de facto e de direito, atropelo dos princípios da protecção da confiança, proporcionalidade, adequação, justiça e boa fé - seja de forma insuficiência da fundamentação e falta de audiência prévia.
    Analisando :
    a) - Pese embora se reconheça argúcia na argumentação, derivada, designadamente, do conteúdo do douto parecer junto com as alegações, a verdade é que, ao contrário do pretendido pela recorrente, se nos afigura que os actos declarados nulos pelo acto recorrido são autonomizáveis dos contratos administrativos subsequentes, não configurando declaração negocial da Administração, não detendo natureza contratual e não tendo, efectivamente, o acto controvertido procedido à declaração de nulidade daqueles contratos.
    Consequentemente, não se destinando os actos declarados nulos a interpretar eventuais cláusulas contatuais ou pronunciando-se sobre a respectiva validade, mal se perceberá a esgrima com o disposto no n.º 1 do art. 173° CPA, a configurar a almejada ocorrência de usurpação de poder.
    b) - Assentando a suposta afronta do direito de propriedade da recorrente nas mesmas permissa inverídicas, isto é, em suposta declaração de nulidade dos contratos de concessão, toma-se evidente que, também a este nível, a resposta não poderá ser outra senão a de que os interesses a que a recorrente se reporta, tais sejam, designadamente, os preços pagos pelos lotes e o valor das benfeitorias entretanto realizadas, não hão-de reportar-se ou decorrer directamente dos actos declarados nulos, mas de condições contratuais entretanto assumidas, não directamente envolvidas pelos actos em questão, sendo certo que não tendo o Governo da RAEM recebido qualquer quantia como pagamento do preço dos lotes, mal se vê como possa, validamente, poder falar-se em "confisco".
    c) - Depois, tanto quanto apreendemos, entende a recorrente que o acto sob escrutínio é materialmente um acto de natureza sancionatória e, porque assente em factos dados como provados em processo crime (proc. 37/2011 do TUI) no qual não teve possibilidade de intervir a qualquer título, ter-se-ia ofendido o conteúdo essencial do seu direito de defesa.
    Não faz qualquer sentido.
    A declaração de nulidade do acto em crise não constitui qualquer sanção para o interessado no procedimento administrativo.
    Pese embora decorrente da condenação crime em questão - em que a recorrente não teve intervenção, a qualquer título, hão sendo, pois, caso de equacionar a sua defesa a esse nível - , no despacho que agora nos ocupa, a Administração limitou-se, em boa verdade, na interpretação que efectuou do conteúdo da al. c) do n.º 2 do art° 122°, CPA, a considerar que a condenação penal definitiva do corrupto passivo prova que os actos administrativos em questão foram inquinados por corrupção, declarando, pois, a nulidade "ope legis ", sendo que, em tal procedimento, aqui sim, a recorrente era parte interessada, não deixando, como tal, de ser ouvida em audiência prévia, remetendo-se, neste passo para o conteúdo do douto acórdão do TUI de 25/7/12, no âmbito do proc. 48/2012, onde, em caso similar, se entendeu que, sendo a declaração de nulidade dos despachos, em tais circunstâncias, acto vinculado, sem qualquer vertente discricionária, a própria falta daquela audiência se degrada em formalidade não essencial, não produzindo anulação do acto administrativo, razão por que não se vê que o, indeferimento das diligências de provas requeridas, por inúteis, dilatórias e sem contributo relevante para a tomada de decisão, possa inquinar o acto por qualquer vício relevante, já que, cremos, não existia a mais ténue possibilidade de a interessada exercer qualquer tipo de influência na decisão a proferir pela Administração.
    d) - Entende, já em sede de almejada anulabilidade, a recorrente que os actos declarados nulos pelo acto recorrido não são actos que envolvam a prática de um crime, não se encontrando demonstrada a conexão causal entre os actos praticados pelo corruptor passivo e aqueles outros declarados nulos, não sofrendo estes de qualquer invalidade ou ilegalidade, pelo que será sido empreendida errónea' interpretação e aplicação do disposto na al. c) do 2 do art° 122°, CPA
    Não cremos.
    É certo que o objecto dos despachos declarados nulos não constitui, em si mesmo, crime.
    Contudo, não poderá considerar-se que a norma contempla apenas as situações em que o acto administrativo preencha, em si mesmo, um tipo penal, mas todas as situações em que aquele acto envolva, pela sua preparação, execução, motivação ou finalidade, a prática de um crime, sendo, portanto "alvejados", não só os actos cujo conteúdo constitua crime, mas também aqueles cuja prática envolva o cometimento do mesmo.
    E, não se apele à falta de conexão causal entre os actos penalmente delituosos comprovados, praticados perlo ex-STOP e os actos declarados nulos: para além de tal asserção afrontar, de algum modo, o decidido na matéria, com trânsito, pelo TUI no âmbito penal, tal prova flui, abundantemente, quer do procedimento, nos termos sustentados pela entidade recorrida nas suas alegações, a que a prova produzida já no domínio do presente processo, "maxime" o depoimento da testemunha J, só tendeu a confirmar.
    "Ora, tendo o corrupto passivo sido condenado judicialmente, por sentença transitada em julgado, pela prática de acto ilícito, está definitivamente provado - para sempre e erga omnes - que o despacho .... se baseou em parecer que foi obtido por acto de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, porque tais factos se provaram naquela sentença" (ac. ,já citado do TUI, proc. 48/2012), mal se vendo, em tais parâmetros, onde possa ocorrer a pretendida violação dos limites externos do caso julgado, tomando-se, assim, inócua a tentativa da recorrente em escrutinar, pela via administrativa, a legalidade intrínseca, quer dos pareceres da Comissão de Terras, quer das homologações dos mesmos pela entidade aqui recorrida. Com o devido respeito, dando de barato tal circunstância, não é disso que aqui se trata : independentemente da validade intrínseca desses actos, o que ressalta é que os mesmos resultaram de procedimento administrativo em que, pelas instâncias competentes, foi detectada intervenção criminosa no procedimento, intervenção essa determinante e decisiva nas medidas adoptadas e, daí que se veja como razoável e adequada a conclusão de que o acto final dele resultante se encontrar maculado pelo crime.
    Desta perspectiva resulta também que, como é óbvio, para tal conclusão, não careceria o "perpetrador" dos ilícitos criminais ter efectivamente praticado acto administrativo "strictu sensu" : o que releva, ressaltando, aliás, do douto acórdão do TUI, é que o mesmo, ilicitamente e com intuito de proveito próprio, interveio, por variadas formas e oportunidades, junto da DSSOPT, por forma a condicionar decisivamente os pareceres da Comissão de Terras e, por via destes, as homologações da concessão pelo Chefe do Executivo, tanto bastando para a "mácula" inerente do despacho final.
    Se, analisada em concreto, a actuação do ex S.T.O.P. no âmbito do procedimento puramente administrativo, a mesma conduziria à ocorrência de vício de poder ou qualquer outro, tendo como forma de invalidade a anulabilidade ou nulidade dos actos correspondentes, é questão puramente espúria para o que agora nos ocupa, sendo certo, porém que, com os dados disponíveis, decorrentes do acórdão a que nos vimos reportando, a conclusão, a tal nível, não poderia deixar de ser, com os mesmos fundamentos legais, a da nulidade desses actos por corresponderem a objecto de crime.
    e) - Pretextando supostos erros nos pressupostos de facto e de direito, atinentes à intervenção (ou falta dela) do ex-STOP no procedimento (intenção da venda: dos lotes; beneficio da recorrente, em detrimento das outras duas concorrentes; intervenção nas deliberações dos transmitentes e no processo de negociação prévia ; escolha da transmissária ; prossecução do interesse público, quiçá à revelia daquele; influência na elaboração e sentido das decisões favoráveis à decisão da transmissão), pretende a recorrente que o acto em crise errou ao ter efectuado indevida análise do conteúdo dessa intervenção, em concreto nos actos alvos da declaração de nulidade, adiantando circunstâncias que, no seu critério, determinariam tal conclusão.
    Contudo, analisado o conteúdo do acto alvo de escrutínio, facilmente se colhe ter-se o mesmo estribado na circunstância de, no âmbito do acórdão proferido no proc. 37/2011 do TUI, ter resultado provado que " ... o processo de selecção da sociedade transmissária dos direitos resultantes da concessão provisória, por arrendamentos, dos terrenos ... , foi viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas, enquanto titular de um órgão da Administração", acrescentando-se que " ... o procedimento administrativo de transmissão dos referidos direitos foi conformado pelo negócio resultante daquele processo de selecção e, consequentemente, viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas".
    Ora, não se descortina que tais asserções, a partir do conteúdo do acórdão penal do TUI e, mesmo, da prova produzida nesta sede, não corresponda à realidade dos factos, pelo que, em boa verdade, haverá que ter tal segmento argumentativo como inócuo, designadamente face à interpretação que se empreende do conteúdo da al. c) do n° 2 do art° 122°, CPA.
    f) - Quanto aos princípios, não se contesta que os actos declarados nulos possam, por via directa ou mediata, ter produzido efeitos na esfera jurídica da recorrente, ou de terceiros.
    Simplesmente, atenta a natureza da situação, não se antevê que outro ou outros actos pudessem ter sido praticados pela Administração, face à natureza puramente vinculativa do decidido.
    Os direitos e legítimos interesses e expectativas da recorrente, bem como se outros de boa-fé, não deixarão, concerteza de poder ser acautelados por outras vias que não a presente, pelo que se não topa a afronta de qualquer dos princípios enunciados.
    g) - Finalmente, no que tange à projectada insuficiência da fundamentação, começa a recorrente por avançar que tal resultaria do facto de não se ter expresso em que medida o interesse público foi prejudicado, quando, no seu critério, a sua proposta terá sido a melhor, não se antevendo que critérios da Lei de Terras se não terão verificado "quando o procedimento administrativo seguiu toda a tramitação normal prevista na lei", acrescentando, depois, a falta de demonstração do nexo causal entre o crime praticado e o sentido da decisão adoptada.
    Bom, conviremos que uma coisa é a fundamentação do acto e outra, bem diversa, a concordância, ou falta dela, relativamente aos fundamentos aduzidos. Tendo-se já tratado destes, é daquela que haverá que cuidar, neste sector.
    A declaração de nulidade adiantada pelo acto recorrido encontra-se fundada nos precisos termos da subsunção legal empreendida, ou seja, através do externado claramente se entende que aquela decisão foi tomada tendo em conta, designadamente, o disposto na al. c) do n.º 1 do art. 122° CPA, por se ter considerado que os actos declarados nulos derivavam da prática de crime, tomando-se, a este nível, caricato esgrimir com o facto de o douto acórdão do TUI não poder servir de fundamento à decisão recorrida, quando, como se viu, é a própria lei a reportar-se ao "objecto de crime" como fonte de nulidade, atenta a interpretação que da norma se faz.
    A consubstanciação de tal asserção fundou-se, pois, e bem, precisamente no conteúdo do decidido no âmbito do proc. 37/2011 do TUI, donde ressalta, à saciedade, ter sido considerada criminosa a conduta do ex S.T.O.P. relativamente a vários procedimentos administrativos, entre os quais se enquadra o que originou os actos de concessão declarados nulos no âmbito do presente recurso, razões por que o externado pela decisão ora em crise se apresenta como claro, suficiente e congruente, ficando um cidadão médio em perfeitas condições de apreender as razões de facto e de direito em que se estribou o decidido, o que não deixou de suceder com a recorrente.
    Face ao exposto, não se vislumbrando a ocorrência de qualquer dos vícios assacados, ou de qualquer outro de que cumpra conhecer, somos a entender não merecer provimento o recurso.
    Foram colhidos os vistos legais.
    
II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito.
III - FACTOS
Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:
1. Desde 15 de Novembro de 1999 que as sociedades D - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, E - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, F - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, G - Sociedade de Fomento Predial, Limitada e H - Sociedade de Fomento Predial, Limitada ("as transmitentes") eram titulares dos direitos resultantes das concessões, por arrendamento, respectivamente, do Lote 1c, Lote 2, Lote 3, Lote 4 e Lote 5, situados na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da Cabrita, descritos na Conservatória do Registo Predial sob os n.ºs XXXXX, XXXXX, XXXXX, XXXXX e XXXXX (os "Lotes"). 
2. Por requerimento de 16 de Fevereiro de 2006, as transmitentes requereram junto da Direcção dos Serviços de Solos e Obras Públicas a transmissão dos direitos resultantes dos contratos de concessão, por arrendamento, dos Lotes a favor da recorrente A.
3. O procedimento administrativo iniciado com tal requerimento seguiu os seus trâmites normais, tendo a Comissão de Terras, reunida em sessão de 16 de Março de 2006, emitido os Pareceres n.ºs 23 a 27/2006, favoráveis à transmissão requerida, bem como à revisão da concessão e às minutas de contratos a eles anexas, e que vieram a ser homologados por Despachos do Chefe do Executivo, de 17 de Março de 2006 - tudo conforme os Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48 a 52/2006, publicados no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006.
4. Em 13 de Fevereiro de 2009, a recorrente A formalizou um pedido de nova revisão do contrato de concessão dos Lotes e solicitou a prorrogação do prazo de aproveitamento dos Lotes até Dezembro de 2015.
5. O procedimento seguiu a sua tramitação, tendo sido enviado o processo à Comissão de Terras, que emitiu parecer favorável ao deferimento do pedido, o qual foi homologado por Despacho do Chefe do Executivo, de 9 de Março de 2011 - tudo conforme Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 15/2011, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 13, II Série, de 30 de Março de 2011.
6. Posteriormente, a recorrente A foi notificada, por ofício de 15 de Junho de 2012 para, em sede de audiência prévia, se pronunciar quanto à intenção de declaração de nulidade dos Despachos do Chefe do Executivo, de 17 de Março de 2006, que homologaram os pareceres da Comissão de Terras favoráveis à transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos Lotes à ora 1.ª Recorrente, à revisão da concessão e à respectiva minuta do contrato a celebrar, o que fez por exposição de 28 de Junho de 2012.
7. Nessa sequência, foi a 1.ª recorrente notificada do Despacho do Chefe do Executivo de 8 de Agosto de 2012, exarado sob a Informação n.º 192/DSODEP/2012, de 7 de Agosto de 2012, que declarou a nulidade dos supra mencionados actos do Chefe do Executivo, de 17 de Março de 2006 - o acto recorrido - conforme melhor consta da cópia que ora se junta como Doc. n.º 1 e aqui dá por reproduzido.
8. Para além da notificação efectuada à 1.ª recorrente, em 15 de Agosto de 2012, o despacho recorrido foi, ainda, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 33, II Série, de 15 de Agosto de 2012, pelo despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 38/2012.
9. A notificação à recorrente A foi feita nos seguintes termos:
“Assunto : Notificação da decisão de declaração de nulidade dos actos do Chefe do Executivo que autorizaram a transmissão dos direitos resultantes do contrato de concessão do lote 1c, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5, situados na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, a favor da sociedade "A Ltd.". Processos n.º 6452.04, 6453.04, 6454.04 e 6455.04 e 6456.04.
1. Fica essa sociedade notificada que, por despacho do Chefe do Executivo, de 8 de Agosto de 2012, exarado sob a Informação n.º192/DSODEP/2012, de 7 de Agosto de 2012, foi declarada a nulidade, nos termos das disposições da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.° e do n.º 2 do artigo 123.°, ambos do Código do Procedimento Administrativo, dos seguintes actos:
1) O acto do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006 que homologou o Parecer da Comissão de Terras n.º 23/2006, de 16 de Março de 2006, no qual a mesma tinha emitido parecer favorável à transmissão dos direitos resultantes do contrato de concessão do lote 1c a favor da sociedade "A Ltd." e à revisão do referido contrato de concessão, bem como à minuta do contrato a ele anexa, e que foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006, pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 48/2006;
2) O acto do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006 que homologou o Parecer da Comissão de Terras n.º 24/2006, de 16 de Março de 2006, no qual a mesma tinha emitido parecer favorável à transmissão dos direitos resultantes do contrato de concessão do lote 2 a favor da sociedade "A Ltd." e à revisão do referido contrato de concessão, bem como à minuta do contrato a ele anexa, e que foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006, pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 49/2006;
3) O acto do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006 que homologou o Parecer da Comissão de Terras n.º 25/2006, de 16 de Março de 2006, no qual a mesma tinha emitido parecer favorável à transmissão dos direitos resultantes do contrato de concessão do lote 3 a favor da sociedade "A Ltd." e à revisão do referido contrato de concessão, bem como à minuta do contrato a ele anexa, e que foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006, pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 50/2006;
4) O acto do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006 que homologou o Parecer da Comissão de Terras n.º 26/2006, de 16 de Março de 2006, no qual a mesma tinha emitido parecer favorável à transmissão dos direitos resultantes do contrato de concessão do lote 4 a favor da sociedade "A Ltd." e à revisão do referido contrato de concessão, bem como à minuta do contrato a ele anexa, e que foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006, pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 51/2006;
5) O acto do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006 que homologou o Parecer n.º 27/2006 da Comissão de Terras, de 16 de Março de 2006, no qual a mesma tinha emitido parecer favorável à transmissão dos direitos resultantes do contrato de concessão do lote 5 a favor da sociedade "A Ltd." e à revisão do referido contrato de concessão, bem como à minuta do contrato a ele anexa, e que foi publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006, pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 52/2006.
2. Mais se comunica que, desta decisão, se assim o entenderem, cabe reclamação, nos termos dos artigos 148.° e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, para o Chefe do Executivo, no prazo de 15 dias a contar da publicação do acto no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau, e recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância.”

9. Neste último despacho refere-se, nos considerandos, que "ficou provado segundo o acórdão n.º 37/2011 do Tribunal de Última Instância, que o processo de selecção da sociedade transmissária dos direitos resultantes da concessão provisória, por arrendamento, dos terrenos designados por lote «c1», lote «2», lote «3», lote «4» e lote «5», com as áreas de 4 012 m2, 13 425 m2, 18 707 m2, 8 750 m2 e 33 895 m2, situados na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, descritos na Conservatória do Registo Predial sob os n.ºs XXXXX, XXXXX, XXXXX, XXXXX e XXXXX, foi viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas, enquanto titular de um órgão da Administração" e, ainda, "que o procedimento administrativo de transmissão dos referidos direitos foi conformado pelo negócio resultante daquele processo de selecção e, consequentemente, viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas".
11. A 2.ª Recorrente celebrou, em 14 de Maio de 2012, com a 1.ª Recorrente um contrato-promessa de compra e venda por via do qual prometeu comprar, e esta prometeu vender, uma fracção autónoma, provisoriamente designada por moradia "B" do 13.º andar do Bloco 7 do projecto imobiliário denominado "O a construir nos Lotes, pelo preço de HKD21.950.000,00 (vinte e um milhões novecentos e cinquenta mil dólares de Hong Kong) - conforme melhor consta da cópia do respectivo contrato que ora se junta como Doc. n.º 2 e aqui dá por reproduzido.
12. Nos termos das alíneas a) e b) da cláusula 3.ª do referido contrato-promessa, a 2.ª Recorrente pagou, a título de sinal, duas prestações de igual valor no total de HKD 2.195.000,00 (dois milhões cento e noventa e cinco mil dólares de Hong Kong) conforme melhor consta da cópia dos respectivos recibos que ora se juntam como Docs. Nºs. 3 e 4 e aqui dão por reproduzidos.
13. Em 13 de Junho de 2012, a 2.ª Recorrente procedeu ao pagamento do respectivo imposto de selo, no valor total de MOP649.168,00 (seiscentas e quarenta e nove mil cento e sessenta e oito patacas), nos termos da Lei n.º 17/88/M, de 27 de Junho, junto da Direcção dos Serviços de Finanças - conforme melhor consta da cópia da respectiva guia de pagamento M/2 que ora se junta como Doc. n.º 5 e aqui dá por reproduzido.
14. Após a publicação de notícias na comunicação social local que antecederam a declaração de nulidade, as recorrentes acordaram, em 9 de Agosto, a prorrogação do prazo para pagamento da 3.ª prestação, no montante de HKD1.097.500,00 (um milhão noventa e sete mil e quinhentos dólares de Hong Kong), cujo termo estava previsto ocorrer em 11 de Agosto de 2012, até 7 de Novembro próximo - conforme melhor consta da cópia do respectivo aditamento ao contrato que ora se junta como Doc. n.º 6 e aqui dá por reproduzido.

15. O despacho proferido, o parecer em que assenta e respectivas informações em que se louvam, tal como resultam do PA são do seguinte teor:

“Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes
Parecer:
Ao Exm.º Sr. Secretário:
 Concordo com o conteúdo e a proposta da Informação.
 À consideração superior.

Directora Substª.,
Ass.) P
Aos 7/8/2012

À Directora, Substª.,
Concordo com o conteúdo da presente Informação, propondo que sejam acompanhados os pontos 7.1 e 7.2 conforme propostos.
À consideração superior.
A Chefe do Departamento de Gestão de Solos
Ass.) R
Aos 7/8/2012
Despacho:
 Visto. Concordo com a proposta do Secretário Q
 Concordo
 Em 08/08/2012
Ass.) vd. original




Ao Exm.º Sr. Chefe do Executivo:
Concordo com o parecer e proposta constante da Informação, submetendo à consideração de V. Ex.ª.

O Secretário para os Transportes e Obras Públicas Ass.) Q
Aos 7/8/2012

Assunto: Contratos de transmissão e de revisão relativos à concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos com a área de 4.012 m2, de 13.425m2, de 18.707m2, de 8.750m2 e de 33.895m2 situados na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, respectivamente designados por lote 1c, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5, regidos pelos despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48, 49, 50, 51 e 52/2006. (Proc. n.ºs 6452.04 a 6456.04) Informação n.º192/DSODEP/2012 de 7/8/2012

1. Através dos despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48 a 52/2006 publicados no B.O n.º14, II série, de 6/4/2006, são regidos os contratos de transmissões onerosas a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos terrenos situados na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da Cabrita, designados por lote 1c, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5. (documento anexo 1 – Despacho)
2. Por outro lado, de acordo com o acórdão n.º 37/2011 proferido em 31/5/2012 pelo Tribunal de Última Instância, confirmou-se que o procedimento de selecção para o concurso incorreu de vício devido à intervenção criminosa do ex-secretário. (documento anexo 2 – acórdão n.º37/2011 do Tribunal de Segunda Instância)
3. Pelo que foi elaborada a Informação n.º149/DSODEP/2012, de 12 de Junho e proposta a realização do procedimento no sentido de declarar nulo o acto feito pelo Chefe do Executivo relativo à sua homologação feita em 17/3/2006 sobre os pareceres n.ºs 23 a 27 da Comissão de Terras, de 16 de Junho. Segundo os supracitados pareceres, foi emitido o parecer favorável face ao disposto na minuta de contrato anexa, quanto às transmissões a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos lotes 1c, 2, 3, 4 e 5 e, à alteração de respectiva concessão. (documento anexo 3 – Informação n.º 149/DSODEP/2012)
4. Na respectiva informação mais se propôs ainda a realização de audiência prévia dos interessados, a fim de ouvir opinião das empresas intervenientes.
5. Nos termos do art.º 93º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, foram notificadas as empresas abaixo indicadas para audiência e pronúncia, cujas respostas são do teor seguinte:
- a Sociedade do S, através do ofício datado de 20/6/2012, referiu que não se opõe (anexo 4):
- a Sociedade de T, através do ofício datado de 27/6/2012, referiu que não se opõe (anexo 5);
- a Sociedade A Ltd. na qualidade da detentora dos terrenos supracitados, através do requerimento datado de 29/6/2012, manifestou a sua posição (anexo 6):
- a Sociedade de Fomento Predial D, Lda., e a Sociedade de Investimento U, Lda., não se pronunciaram sobre isso.
6. Todas essas respostas foram remetidas ao Departamento Jurídico, e nos termos do art.º 98º do Código do Procedimento Administrativo, foi elaborada a Informação n.º
31/DJUDEP/2012, de 1 de Agosto onde consta o relatório sobre a audiência dos interessadas. (anexo 7), do teor seguinte:
“De acordo com o art.º 98º do Código do Procedimento Administrativo, face à intenção de decisão para declarar nulo o acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou os pareceres n.ºs 23 a 27 da Comissão de Terras, de 16 de Junho, foram elaboradas as informações sobre audiência das interessadas. Segundo os supracitados pareceres, foi emitido o parecer favorável face ao disposto na minuta de contrato anexa, quanto às transmissões a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos lotes 1c, 2, 3, 4 e 5, situados na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, e à alteração de respectiva concessão.
1. Nos termos do art.º 94º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, foram notificadas as respectivas empresas para audiência prévia a fim de pronunciar-se. A Sociedade do S, através do ofício datado de 20/6/2012, referiu que não se opõe; a Sociedade de T, através do ofício datado de 27/6/2012, referiu que não se opõe; a Sociedade de Fomento Predial D, Lda., e a Sociedade de Investimento U, Lda. não deram resposta; a Sociedade A Ltd., como detentora dos terrenos supracitados, através do requerimento datado de 29/6/2012, manifestou a sua posição.
2. Essas respostas já foram remetidas ao Departamento Jurídico, a fim de se elaborar o relatório final e fazer proposta sobre a decisão.

II Factos relevantes

3. Indicou o mandatário da Sociedade A Ltd. que, em 16/6/2005, os sócios das respectivas empresas tinham deliberado por unanimidade a consulta junto de três empresas dotadas de experiência e capacidade no âmbito de grandes empreendimentos, a fim de apresentar proposta com finalidade de obter os terrenos.
4. Tal deliberação não foi feita livremente, mas sim, tal como indicada pelo acórdão proferido em 31/5/2012 pelo Tribunal de Última Instância nos autos nº37/2011, que foi feita sob a intervenção e indicação do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas.
5. De facto, durante 2004, o ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas já pretendia vender os lotes 1c, 2, 3, 4 e 5 situados no cruzamento entre a Estrada da Ponta da Cabrita a Avenida de Wai Long, na ilha da Taipa que tinham sido concedidos respectivamente à Sociedades de Fomento Predial E, Lda., à Sociedade de Fomento Predial F, Lda., à Sociedade de Fomento Predial G, Lda., à Sociedade de Fomento Predial H, Lda., e à Sociedade de Fomento Predial D, Lda.
6. De acordo com os autos n.º 37/2011 (acórdão proferido em 31/5/2012 pelo Tribunal de Última Instância), confirmou-se que sob a indicação e influência dada pelo ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas I, na deliberação realizada em 16/6/2005, as ditas empresas concessionárias deliberaram enviar carta de convite às três empresas para adjudicação da transmissão dos direitos resultantes da concessão por arrendamento, dos terrenos supracitados.
7. Por outro lado, em 5/8/2005, sob influência do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, as supracitadas cinco empresas deliberaram vender os tais terrenos à Sociedade A, e de acordo com os factos provados nos referidos autos do Tribunal de Última Instância, a proposta vencedora do concurso por convite foi beneficiada pela Administração, tendo tido conhecimento do concurso largos meses antes das duas restantes que tiveram apenas 10 dias para preparar e apresentar a proposta.
8. Quanto ao ponto referido no art.º 11º, n.º4, al. k) das alegações, ao contrário de que declarou a empresa na contestação, em relação à decisão de declaração de nulidade eventualmente a tomar, nos autos o que não tem importância se o V é acusado ou não pela prática do crime de corrupção activa, uma vez que quer o crime de corrupção activa quer o crime de corrupção passiva, ambos são independentes, podendo existir isoladamente.
9. O facto de o arguido V não ter sido condenado ainda da prática do crime de corrupção activa não se reveste de relevância nos autos, mesmo que o arguido for julgado inocente, o acto de autorização de transmissão dos tais terrenos ainda padeceu de vício, por se ter envolvido em prática de crime de corrupção passiva, e o respectivo acórdão já transitou em julgado, pelo que, inevitavelmente, o respectivo acto padeceu de vício devido ao referido crime.
10. O Tribunal de Última Instância, em 25/4/2012, no acórdão sobre os autos de recurso n.º11/2011, proferiu também a respectiva opinião, que aqui foi feita a sua reprodução seguinte: “O que interessa é que está definitivamente assente que na base do acto administrativo está a prática de um crime de corrupção, pelo qual foi condenado o corrupto passivo. Isso inquina irremediavelmente o despacho 6 de Julho de 2006. Para este efeito, pouco importa quem foi o corruptor activo ou se veio a ser condenado……”

III O acto praticado nos termos do direito privado não se reveste de relevância
11. Segundo o entendimento de A, a questão de invalidade do acto administrativo só pode dirigir-se contra o acto praticado no procedimento administrativo que esteja implicado na autorização de transmissões dos ditos cinco terrenos, de tal modo a considerar que a influência dada pelo ex-secretário I pouco importa ao procedimento de transmissões, independentemente de que se a influência deste antecipou-se ao acto de transmissões, ou de exercício do direito de autonomia no direito privado pela RAEM em nome do sócio de tais empresas.
12. Contudo, isso pode ser rejeitado com base nos dois motivos:
- Dado que resulta dos factos provados o crime praticado pela subversão das regras jurídicas aplicáveis e o que fez com que uma empresa conseguisse obter a concessão, causando a que tanto o processo de selecção quanto o procedimento administrativo subsequente relativo à autorização das transmissões de cinco terrenos, também padecessem de vício.
- Também foi devido a que o ex-secretário para os Transporte e Obras Públicas, na qualidade de titular do cargo público, tinha intervindo nesse processo ilícito.
13. Mesmo que tal como alegado pelo defensor que pretende nos levar a crer que o acto imputável do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas foi feito antes de se ter deduzido o pedido de transmissão sem qualquer eficácia no respectivo procedimento administrativo, na realidade, isso não se reveste de importância.
14. Embora a Lei n.º 6/80/M de 5 de Julho, daqui em diante designada simplesmente por Lei de Terras, dispõe no seu art.º 56º, n.º2º, al. c) que o concurso público é dispensado na transmissão de situações resultantes de concessão anterior, de facto, a transmissão depende de autorização prévia feita pelo Chefe do Executivo, uma vez que o uso dos respectivos terrenos ainda não era concluído, a sua concessão é de carácter provisória.
15. Mesmo que vulgarmente se considere que no processo de selecção de empresa concessionária (concurso ou ajuste directo) para aquisição dos direitos resultantes de concessão dos terrenos, podem as empresas intervenientes escolher livremente, processo esse já foi viciado pelo tal representante da RAEM, na qualidade de sócio, titular do cargo público responsável pela garantia de interesses públicos.
16. De facto, mesmo no âmbito de empresa privada, as funções exercidas pelo ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas também devem pôr em prática a salvaguarda pela RAEM dos interesses públicos nas supracitadas empresas.
17. Como membro do governo da REAM, o então secretário para os Transportes e Obras Públicas, utilizou os seus poderes e influência, tomando decisão através da empresa que detinha 80% do capital o governo, a fim de obter interesses patrimoniais, mas não pôr em prática a salvaguarda dos interesses públicos que deve fazer a RAEM.
18. Na realidade, I interveio no respectivo processo exercendo o seu direito de execução enquanto era secretário para os Transportes e Obras Públicas, mas a sua intervenção não foi feita em outro nome (no âmbito de direito privado) tal como indicada na contestação, e esse facto já ficou provado no acórdão do Tribunal de Última Instância, que aqui se reproduz: “Em conclusão, a proposta vencedora ganhou, porque, devido à influência do arguido foram subvertidas as regras jurídicas aplicáveis. Estamos, assim, também perante um acto do arguido contrário aos deveres do seu cargo.”
19. Assim sendo, ficou provado que o processo de selecção de empresa concessionária padeceu de vício devido à intervenção ilícita do ex-secretário, e essa intervenção mostrava-se importante e decisiva à proposta vencedora a ganhar no concurso, daí pode-se retirar necessariamente uma conclusão que a prática de crime de corrupção passiva causou inevitavelmente a que o processo de transmissão subsequente também padecesse de vício.

IV São nulos os actos cuja objecto constitua crime

20. Ao contrário de que indicou a empresa no ponto 17 e seguintes da sua contestação, o crime da prática de acto ilícito após corrupção passiva reveste-se importante, face ao acto final de homologação feito pelo Chefe do Executivo.
21. Sem dúvida o acto de autorização das transmissões praticado pelo Chefe do Executivo não constituiu qualquer crime, mas o certo é que esse acto de homologação foi feito com base no procedimento administrativo de negociação particular acordado pela intervenção ilícita do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas.
22. Pelo que, o acto de homologação do Chefe do Executivo admitiu todos os fundamentos constantes dos pareceres emitidos pela Comissão de Terras, enquanto os respectivos pareceres invocaram as informações e pareceres elaboradas na fase de instrução do procedimento, como aquela Direcção é subordinada da Secretaria para os Transportes e Obras Públicas, o ex-secretário tinha perfeito conhecimento que ele iria directamente intervir no respectivo procedimento.
23. De facto, foi o ex-secretário quem previamente autorizou a abertura de processo e determinou se devia e como continuar o respectivo procedimento administrativo. No respectivo processo, a tarefa de abertura de processo só se limitou a admitir as negociações fixadas previamente entre as empresas transmissárias e empresas concessionárias ao abrigo do ex-secretário, mas não procedeu à apreciação conforme critérios estabelecidos na Lei de Terras.
24. Por outro lado, de acordo com as condições de transmissão, tais negociações mostravam-se importantes no respectivo procedimento.
25. Com base nisso, a intervenção ilícita do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas mostrava-se importante e decisiva à proposta vencedora a ganhar no concurso, fazendo com que o processo de transmissão de terras também padecesse de vício. Assim sendo, da intervenção ilícita resultou necessariamente conclusão que a prática do crime de corrupção passiva viciou inevitavelmente o processo de transmissão subsequente, levando a que o acto final do procedimento também padecesse de vício.

V e VI É nulo o acto que carece de qualquer elemento essencial: finalidade de acto e sujeito de acto

26. Mais alegou a interessada que dado o acto praticado pelo Chefe do Executivo não constituiu crime, não se devendo, consoante apenas o sentido das palavras, invocar o disposto no art.º 122º, n.º2, al. c) do Código do Procedimento Administrativo, aplicando automaticamente a sanção de nulidade do acto.
27. Isto é, de acordo com o entendimento da empresa contestante, o crime praticado pelo ex-secretário só se envolveu na deliberação feita pelas empresas transmissárias, mas não afectou o acto final feito pelo Chefe do Executivo.
28. Essa ideia não tem nenhum fundamento, se se aceita o acto final que é inválido, mas não quer saber em qual pressuposto e conteúdo foi feito o acto, então a base jurídica de Macau será prejudicada e o que faz com que a estrutura normativa da RAEM apresente uma situação deformada intolerável.
29. Tal como indicado pela empresa A, indubitavelmente, a autorização das transmissões dos direitos e a alteração de concessão não foram feitas pelo ex-secretário, mas sim pelo Chefe do Executivo, mas essa decisão foi feita com base nos procedimentos anteriores com pressupostos e motivos criminosos.
30. Segundo o Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, fls. 710, de Lino Ribeiro e José de Pinho, o disposto no art.º 122º, n.º2, al. c) “também se deve incluir no âmbito da aliena todos os actos que envolvam a prática dum crime, mesmo que o seu objecto não gere responsabilidade criminal. Assim, são nulos os actos que assentam em pressupostos ou motivos criminosos ou cuja finalidade constitua um crime (v.g. actos praticados por corrupção)”.
31. De acordo com Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, também têm o mesmo entendimento no Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª Edição, fls. 645, que “consideram abrangidos na parte final desta alínea c) – mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao “Objecto” do acto administrativo – também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime. Por exemplo, (…) os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção.”
32. Embora o despacho de homologação feito pelo Chefe do Executivo, em sentido restrito, não constitua crime, na realidade, todos os fundamentos em que se baseia o referido despacho, fundam-se na prática de corrupção passiva pelo ex-secretário e da qual dependem. Assim sendo, o despacho, sob a intervenção do ex-secretário, totalmente desviou-se dos interesses públicos, levando a que os interesses não conseguissem realizar concretamente.
33. Pelo que, mesmo que a respectiva decisão ainda seja adequada e correcta em termo abstracto, dado que o acto preparativo padeceu de vício absoluto e se apresentava inválido, inevitavelmente essa invalidade estendeu-se até ao acto final, causando a que este se tornasse uma decisão ilegal.
34. Face ao exposto, o processo de transmissão de terrenos incorreu em vício devido à intervenção ilícita do ex-secretário, e essa intervenção não só tem a ver com a parte primeira do referido processo tal como indicada pela empresa contestante, mas sim ultrapassou todo o processo.
35. De acordo com os pareceres da Comissão de Terras, tanto a abertura do processo e quanto a intenção de decisão constante da Informação n.º045/DSODEP/2006, de 2 de Fevereiro, tudo isso teve em consideração as “negociações fixadas previamente” com a empresa A (vd. pareceres da Comissão de Terras, ponto 5)

VII Declaração de nulidade dos contratos de revisão de concessão, de autorização das transmissões dos direitos resultantes da concessão

36. A empresa contestante alegou peremptoriamente no ponto 42 e seguintes da contestação que, mesmo que se declare nulo o respectivo acto, a invalidade não deve estender-se automaticamente até aos contratos celebrados entre empresas transmissárias, A Ltd. e o governo da RAEM. Contudo, essa alegação não tem fundamento, uma vez que, nos termos do princípio de equidade previsto no art.º 172º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo, esses contratos não podem ser independentes do processo do qual eram resultantes.
37. Pelo que, ao declarar nulo o acto de homologação dos pareceres da Comissão de Terras que concorda em transmitir à empresa A, Ltd., os direitos resultantes da concessão dos terrenos, é causada necessariamente a nulidade dos respectivos contratos de revisão de concessão, uma vez que da nulidade do despacho de autorização resulta a nulidade dos contratos.
38. Por outro lado, ao contrário de que foi alegado no ponto 55 do Título VII, caso o superior hierárquico declare nulo o acto de homologação dos pareceres da Comissão de Terras, a Administração já não precisa de intentar acção junto do Tribunal, a fim de obter os resultados por si alegados.
39. É de salientar que não estamos perante um acto administrativo que pura e simplesmente manifesta opinião, mas sim a Administração está a exercer o direito absoluto vinculado, uma vez que perante a forma da invalidade mais grave tem que declarar nulo o acto.

VIII Protecção ao terceiro de boa fé

40. Alegou a empresa contestante no ponto 61 e seguintes que, “revertam às empresas concessionárias os direitos resultantes da concessão”. Contudo, esse acto significa que a autoridade administrativa altera subitamente a decisão de transmissão dos direitos resultantes da concessão anteriormente autorizada.
41. Essa ideia carece de fundamento, uma vez que no presente processo, a Administração não usou o poder discricionário para tomar a decisão, mas sim o poder vinculado para declarar nulo o acto, quer dizer, perante a existência duma invalidade absoluta já confirmada, a Administração tem que praticar um mero acto vinculado.
42. De acordo com o art.º 123º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo, o acto pode ser declarado nulo a todo o tempo em regime da nulidade, e com o decorrer do tempo e/ou, através de ratificação, de reforma ou de conversão, o acto nulo também não pode ser sanado.
43. O acto nulo tem uma das características seguinte: não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade.
44. Quanto à protecção ao terceiro de boa fé, ou seja aos indivíduos quem já celebraram o contrato-promessa de compra e venda das fracções a construir, após publicado o despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011, é de salientar que:
45. Em princípio, o promitente-comprador é terceiro de boa fé, uma vez que o crime que impulsiona as transmissões de concessão, não tem nada a ver com esses indivíduos.
46. Pode-se confirmar os prejuízos sofridos por esses indivíduos, que podem ser indemnizados pelo dobro do sinal pago, só que isso cabe à parte que não cause o incumprimento formular pedido junto ao promitente-vendedor.
47. Tal como alegado pela empresa contestante, deve a Administração cumprir os princípios da legalidade, da segurança jurídica, de defesa da confiança, de proporcionalidade e de boa fé.
48. Temos que cumprir o princípio da legalidade, sabemos que o Direito é pressuposto, fundamento e âmbito da actividade administrativa, pelo que, não se pode colocar no mesmo plano isso e aquele crime que já se infiltrou no procedimento da autorização de transmissão da concessão.
49. A Administração não pode apresentar solução pelos interesses ilícitos obtidos através do crime.
50. Por fim, não se realizou a medida complementar exigida pela contestante, uma vez que consideramos que tal medida não é útil mas serve de demorar tempo e também não mostrava qualquer importância à decisão a tomar pelo superior hierárquico.
51. Quanto às transmissões dos terrenos e aos seus interesses de uso, evidentemente são resultantes do despacho da autorização de transmissões.
52. Por outro lado, a empresa contestante não provou nem indicou como os documentos exigidos podem ajudar a alterar a decisão da Administração, no sentido de tomar uma decisão que lhe se mostra favorável.
53. Face ao acima exposto, segundo a resposta dada pela contestante na audiência de interessado, não tendo a mesma apresentado esclarecimento e fundamento que pudessem ajudar a alterar a decisão nos autos, pelo que, deve a Administração manter a sua intenção de decisão, no sentido de declarar nulo o acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou os pareceres n.º 23/2006, 24/2006, 25/2006, 26/2006 e 27/2006 emitidos em 16 de Março pela Comissão de Terras. Segundo os supracitados pareceres, foi emitido o parecer favorável face às transmissões a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos lotes 1c, 2, 3, 4 e 5, situados na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, à alteração dos respectivos contratos de concessão, e à minuta de contratos anexa a esses pareceres.”
7. Pelo acima exposto, atentos os factos e fundamentos jurídicos constantes da supracitada Informação n.º31/DJUDEP/2012, propõe-se o seguinte:
7.1 Nos termos dos art.º 122º, n.º2, al. c) e 123º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo, declara-se nulos os actos seguintes:
7.1.1 O acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 23/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras. Segundo o supracitado parecer, foi emitido o parecer favorável face à transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “1c”, à alteração do respectivo contrato de concessão e à minuta do contrato anexa a esse parecer. O referido acto foi publicado, através do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 48/2006, no B.O n.º14, II série, de 6/4/2006;
7.1.2 O acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 24/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras. Segundo o supracitado parecer, foi emitido o parecer favorável face à transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “2”, à alteração do respectivo contrato de concessão e à minuta do contrato anexa a esse parecer. O referido acto foi publicado, através do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 49/2006, no B.O n.º14, II série, de 6/4/2006;
7.1.3 O acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 25/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras. Segundo o supracitado parecer, foi emitido o parecer favorável face à transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “3”, à alteração do respectivo contrato de concessão e à minuta do contrato anexa a esse parecer. O referido acto foi publicado, através do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 50/2006, no B.O n.º14, II série, de 6/4/2006;
7.1.4 O acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 26/2006, emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras. Segundo o supracitado parecer, foi emitido o parecer favorável face à transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “4”, à alteração do respectivo contrato de concessão e à minuta do contrato anexa a esse parecer. O referido acto foi publicado, através do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 51/2006, no B.O n.º14, II série, de 6/4/2006;
7.1.5 O acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 27/2006, emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras. Segundo o supracitado parecer, foi emitido o parecer favorável face à transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “5”, à alteração do respectivo contrato de concessão e à minuta do contrato anexa a esse parecer. O referido acto foi publicado, através do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 52/2006, no B.O n.º14, II série, de 6/4/2006.
  7.2 Se se concordar com a proposta indicada no ponto 7.1, a respectiva decisão deve ser publicada no Boletim Oficial da RAEM, notificando-se a interessada ao abrigo do art.º 68º do Código do Procedimento Administrativo.
  À consideração superior.
O Técnico Superior,
Ass.) W

***

Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes
Parecer:
Ao Exm.º Sr. Secretário:
 Concordo com o conteúdo da presente Informação e a proposta feita pela Subdirectora P.
 À consideração superior.

O Director,
Ass.) vd. original
Aos 12/6/2012

Ao Director dos Serviços,
Concordo com o conteúdo da presente Informação, propondo que sejam autorizados e acompanhados os pontos 27.1 e 27.2 conforme propostos.
À consideração superior.
O Subdirector
Ass.) vd. original
Aos 12/6/2012
Despacho:
CONCORDO
 Em 12/6/2012
Ass.) vd. original




Ao Exm.º Sr. Chefe do Executivo:
Concordo com o parecer e proposta constante da Informação, submetendo à consideração de V. Ex.ª.

O Secretário para os Transportes e Obras Públicas Ass.) Q
Aos 12/6/2012

Assunto: Declaração de nulidade das transmissões e das alterações do contrato relativas à concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos com a área de 4.012 m2, de 13.425m2, de 18.707m2, de 8.750m2 e de 33.895m2 sitos na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, respectivamente designados por lote 1c, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5, regidos pelos despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48, 49, 50, 51 e 52/2006. (Proc. n.ºs 6452.04 a 6456.04)
Informação n.º149/DSODEP/2012 de 12/6/2012
Antecedentes
1. Por despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48, 49, 50, 51 e 52/2006, publicados no B.O da RAEM n.º14, II série, de 6 de Abril de 2006, foi regida a transmissão onerosa a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos situados na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, designados respectivamente por lotes “1c”, “2”, “3”, “4” e “5”. (anexo 1)
2. Quanto ao pormenor dos dados dos supracitados terrenos é do seguinte: (vd. documento 3 anexo à presente Informação, cláusula primeira, n.º1, al.) 1) a 5) do contrato de revisão da concessão de terrenos regido pelo despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011)
2.1 Lote «1C», com a área de 4 012 m2, titulado pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 48/2006, descrito na CRP sob o n.º XXXXX e cujo direito resultante da concessão se encontra inscrito a favor da sociedade A Ltd. sob o n.º 130835G, assinalado na planta n.º 177/1989, emitida em 9 de Março de 2011, pela DSCC pelas seguintes parcelas de terreno: «1C1» com 2 812 m2, «1C2» com 493 m2, «1C3» com 268 m2, «1C4» com 321 m2 e «1C5» com 118 m2.
2.2 Lote «2», com a área de 13 425 m2, titulado pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 49/2006, descrito na CRP sob o n.º XXXXX e cujo direito resultante da concessão se encontra inscrito a favor da sociedade A Ltd. sob o n.º XXXXXX assinalado na planta acima identificada pelas parcelas de terreno: «2a», com 11 941 m2, «2b» com 1 044 m2, «2c» com 436 m2 e «2d» com 4 m2.
2.3 Lote «3», com a área de 18 707 m2, titulado pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 50/2006, descrito na CRP sob o n.º XXXXX e cujo direito resultante da concessão se encontra inscrito a favor da sociedade A Ltd. sob o n.º XXXXXX, assinalado na referida planta com o número «3».
2.4 Lote «4», com a área de 8 750 m2, titulado pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 51/2006, descrito na CRP sob o n.º XXXXX e cujo direito resultante da concessão se encontra inscrito a favor da sociedade A Ltd. sob os n.º XXXXXX assinalado na mencionada planta pelas seguintes parcelas de terreno: «4a» com 7 265 m2, «4b» com 1 394 m2, «4c» com 14 m2 e «4d» com 77 m2.
2.5 Lote «5», com a área de 33 895 m2 titulado pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 52/2006, descrito na CRP sob o n.º XXXXX e cujo direito resultante da concessão se encontra inscrito a favor da sociedade A Ltd. sob o n.º XXXXXX, assinalado na mesma planta pelas seguintes parcelas de terreno: «5a1» com 17 694 m2, «5a2» com 2 353 m2, «5a3» com 2 494 m2, «5b1» com 7 863 m2, «5b2» com 1 570 m2, «5b3» com 1 133 m2, «5b4» com 280 m2, «5b5» com 178 m2, «5b6» com 14 m2, «5b7» com 104 m2, «5b8» com 165 m2, «Ca» com 43 m2 e «Cb» com 4 m2.
3. Os aludidos lotes faziam parte integrante de um terreno com a área inicial de 1 914 050 m2, concedido à S-Sociedade do S, SARL, através de escritura de 14 de Dezembro de 1990, exarada de fls. 59 e seguintes do livro n.º 281 da Direcção dos Serviços de Finanças, cujo contrato foi revisto pelos Despachos n.º 5/SATOP/94, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 5, II Série, de 2 de Fevereiro de 1994, n.º 82/SATOP/95, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 26, II Série, de 28 de Junho de 1995, n.º 52/SATOP/96, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 16, II Série, de 17 de Abril de 1996 e n.º 34/SATOP/97, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 11, II Série, de 12 de Março de 1997, tendo este sido alterado pelo Despacho n.º 53/SATOP/97, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 17, II Série, de 23 de Abril de 1997.(anexo 2)
4. Atentos o plano de aproveitamento dos cinco lotes submetido pela concessionária “A” e o pedido de revisão do contrato de concessão dos lotes por si formulado, por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 15/2011 publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º13, II Série, de 30 de Março de 2011, foi regida a revisão de concessão dos referidos cinco lotes, tendo a concessionária devolvido nove parcelas de terreno com a área total de 1 282 m2 e sido concedidas simultaneamente, por arrendamento, oito parcelas de terreno com a área total de 5 204 m2, para unificar as concessões anteriores e formar um único terreno com a área total de 82 711 m2 destinado à construção de um complexo residencial, em regime de propriedade horizontal. (anexo 3)
5. De acordo com os dados de registo predial descarregados da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça, os supracitados cinco lotes foram registados a favor de “A” sem qualquer hipoteca e o respectivo despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011 relativo à revisão de concessão de terrenos, encontra-se inscrito sob o número XXXXX, averbamentos 1 e 2. (anexo 4)

Decisão do Tribunal de Última Instância
6. Por acórdão proferido em 31 de Maio de 2012 no Processo n.º 37/2011 pelo Tribunal de Última Instância da RAEM ora transitado em julgado, nos termos dos factos indicados nos pontos 39 a 91 da Acusação dados por provados, o ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas foi condenado pela prática do crime de corrupção passiva para acto ilícito, p. e p. pelo art.º 337º, n.º1 do Código Penal, por ter recebido benefícios patrimoniais no sentido de assegurar que a empresa “A” conseguisse obter as transmissões onerosas dos lotes “1c”, “2”, “3”, “4” e “5” sitos no cruzamento entre a Estrada da Ponta da Cabrita e a Avenida de Wai Long, na ilha da Taipa (em frente do aeroporto internacional de Macau). (anexo 5)
7. Com base no supracitado acórdão e para os devidos efeitos, através do ofício n.º167/2012/TUI, de 4 de Junho de 2012, o Tribunal de Última Instância remeteu o respectivo acórdão ao Chefe do Executivo. (anexo 6)

Nulidade do acto de homologação feito pelo Chefe do Executivo
8. Os efeitos acima referidos visam declarar nulos os actos seguintes praticados pelo Chefe do Executivo:
8.1 O acto praticado em 17 de Março de 2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 23/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras e a minuta do contrato anexo a esse parecer. (anexo 7). Segundo o supracitado parecer, foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “1c”, e a alteração do respectivo contrato de concessão;
8.2 O acto praticado em 17 de Março de 2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 24/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras e a minuta do contrato anexa a esse parecer (anexo 8). Segundo o supracitado parecer, foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “2”, e a alteração do respectivo contrato de concessão;
8.3 O acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 25/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras e a minuta do contrato anexa a esse parecer. (anexo 9). Segundo o supracitado parecer, foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “3”, e a alteração do respectivo contrato de concessão;
8.4 O acto praticado em 17 de Março de 2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 26/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras e a minuta do contrato anexa a esse parecer. (anexo 10). Segundo o supracitado parecer, foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “4”, e a alteração do respectivo contrato de concessão;
8.5 O acto praticado em 17 de Março de 2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 27/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras e a minuta do contrato anexa a esse parecer. (anexo 11). Segundo o supracitado parecer, foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do lote “5”, e a alteração do respectivo contrato de concessão;
9. Segundo os supracitados pareceres, foram autorizadas as transmissões dos respectivos terrenos e a alteração da concessão, e a respectiva situação jurídica foi regida pelos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas seguintes, publicados no Boletim Oficial da RAEM n.º14, II série, de 6 de Abril de 2006:
9.1 Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º48/2006;
9.2 Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º49/2006;
9.3 Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º50/2006;
9.4 Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º51/2006;
9.5 Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º52/2006;
10. O Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo D.L n.º57/99/M, de 11 de Outubro, dispõe nos seus art.ºs 122º e 123º, quanto ao regime de nulidade do acto administrativo.
11. Nos termos do art.º 122º, n.2 do referido código, “são, designadamente, actos nulos…… c) os actos cujo objecto seja impossível, ininteligível ou constitua um crime”. Além disso, nos termos do art.º 123º, n.2 do referido código, “a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal”.
12. Quanto à referida situação, tal como invocada pelo acórdão do Tribunal de Última Instância proferido anteriormente nos autos de processo comum n.º53/2008, são nulos não só os actos administrativos cujo objecto constitua crime, mas também os actos administrativos cujo acto preparativo envolva-se em crime.
13. Isto corresponde ao entendimento por maior parte da jurisprudência, bem como ao acórdão do Tribunal de Última Instância proferido em 25 de Abril de 2012 nos autos n.º11/2012.
14. O Tribunal de Última Instância já confirmou (acórdão nos autos n.º37/2011) que as supracitadas transmissões estiveram envolvidas nos actos ilícitos praticados pelo ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, nos termos dos art.ºs 122º, n.º2, al. c) e 123º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo, são nulos os actos praticados pelo Chefe do Executivo que homologou os pareceres da Comissão de Terras e as minutas dos contratos anexas a esses pareceres.
15. Pelo que, confirmou-se que o procedimento de transmissões padeceu de vício devido à intervenção ilícita do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas. Essa intervenção era importante para a decisão, resultando daí que o acto final proferido pelo Chefe do Executivo também padeceu de vício por causa do crime acima referido.
16. Embora seja adequado e correcto o acto final praticado pelo Chefe do Executivo, o vício absoluto de que sofreu o acto preparativo causou o vício de invalidade do acto final.
17. A nulidade deve ser declarada pelo agente quem praticou o acto, ou seja o Chefe do Executivo, e publicada no Boletim Oficial da RAEM.
18. Pelo que, independentemente da natureza dos contratos regida pelos despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, supõe-se que os respectivos contratos são contratos administrativos, nos termos do princípio de equidade previsto no art.º 172º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo, a nulidade dos actos do Chefe do Executivo causará a nulidade dos respectivos contratos.
19. Assim sendo, quando esteja nulo ou anulável o acto administrativo de que depende a celebração do contrato administrativo, este também é nulo ou anulável.
20. No presente caso, uma vez que a concessão é de natureza provisória, nos termos do art.º 143º, n.º1 e 2 da Lei de Terras, as transmissões de situações resultantes da concessão são nulas e de nenhum efeito se não forem autorizadas previamente pela entidade competente que tinha autorizado a concessão.
21. Contudo, devido à ocorrência do facto do crime de corrupção passiva, que conduziu à autorização das situações de transmissões resultantes da concessão dos cinco terrenos, e esse facto ocorreu na fase de preparação dos respectivos contratos, daí resultando necessariamente invalidade dos contratos, passando a serem nulos.

Resultados de nulidade do acto de homologação feito pelo Chefe do Executivo
22. O objecto dos despachos do secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48/2006, 49/2006, 50/2006, 51/2006 e 52/2006 inclui a autorização das transmissões onerosas a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos respectivos terrenos e a alteração dos respectivos contratos de concessão. Quando forem declarados nulos os tais despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, os direitos resultantes da concessão dos terrenos reverterão às originais concessionárias, ou seja:
22.1 O lote “1c” reverte à Sociedade de Fomento Predial D, Lda;
22.2 O lote “2” reverte à Sociedade de Fomento Predial E, Lda;
22.3 O lote “3” reverte à Sociedade de Fomento Predial F, Lda;
22.4 O lote “4” reverte à Sociedade de Fomento Predial G, Lda;
22.5 O lote “5” reverte à Sociedade de Fomento Predial H, Lda;
23. De acordo com os dados de registo comercial descarregados da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça, para além da Sociedade de Fomento Predial D, Lda. que era concessionária original do lote “1c”, as restantes quatro sociedades já extinguiram-se devido à dissolução por deliberação dos sócios e ao encerramento da liquidação. (anexo 12)
24. O Código Comercial dispõe no seu art.º 325º, n.3 que “verificando-se, depois de registado o encerramento da liquidação, a existência de bens da sociedade que não foram partilhados, compete a qualquer um dos sócios referidos no número anterior propor aos restantes a partilha adicional, que será feita nos termos por todos acordados.”
25. Em relação à eventual influência causada à alteração de concessão dos terrenos regida pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011, na sequência da declaração de nulidade do acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou os pareceres emitidos em 16 de Março pela Comissão de Terras onde foram autorizadas as transmissões a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão dos lotes 1c, 2, 3, 4 e 5, bem como a alteração dos respectivos contratos de concessão, e a minuta de contrato anexa, esta Direcção submeterá oportunamente as informações à consideração superior.

Procedimento de audiência
26. Embora a nulidade do acto seja resultante do exercício do direito vinculado, tendo em consideração a complexidade do caso, pode-se ter divergência quanto à interpretação e à aplicação da norma, assim se propõe a realização de audiência prévia dos interessados ao abrigo dos art.º 93º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, a fim de eliminar a eventual divergência.

Conclusão
27. Face ao acima exposto, propõe-se que seja submetida a presente Informação à consideração superior, no sentido de tomar em consideração os seguintes:
27.1 Procedimento da declaração pelo Chefe do Executivo da nulidade dos actos seguintes ao abrigo dos art.º 122º, n.º2, al. c), e 123º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo:
27.1.1 Nulidade do acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 23/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras onde foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão do lote “1c”, bem como a alteração do respectivo contrato de concessão e a minuta do contrato anexa, revertendo os ditos direitos à sua concessionária original;
27.1.2 Nulidade do acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 24/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras onde foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão do lote “2”, bem como a alteração do respectivo contrato de concessão e a minuta do contrato anexa, revertendo os referidos direitos à sua concessionária original;
27.1.3 Nulidade do acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 25/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras onde foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão do lote “3”, bem como a alteração do respectivo contrato de concessão, e a minuta do contrato anexa, revertendo os referidos direitos à sua concessionária original;
27.1.4 Nulidade do acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 26/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras onde foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão do lote “4”, bem como a alteração do respectivo contrato de concessão e a minuta do contrato anexa, revertendo os referidos direitos à sua concessionária original;
27.1.5 Nulidade do acto praticado em 17/3/2006 pelo Chefe do Executivo que homologou o parecer n.º 27/2006 emitido em 16 de Março pela Comissão de Terras onde foram autorizadas a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão do lote “5”, bem como a alteração do respectivo contrato de concessão e a minuta do contrato anexa, revertendo os referidos direitos à sua concessionária original;
27.2 Antes de se tomar a decisão sobre a proposta, nos termos do art.º 93º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, propõe-se que, face à intenção de decisão indicada nos supracitados pontos 27.1.1 a 27.1.5, seja realizada a audiência dos interessados abaixo indicados:
27.2.1 Sociedade “A, Ltd.”, ora concessionária dos lotes “1c”, “2”, “3”, “4” e “5”;
27.2.2 Sociedade de Fomento Predial D, Lda., original concessionária do lote “1c”;
27.2.3 Sócios das originais concessionárias já dissolvidas e extintas dos lotes “2”, “3”, “4” e “5”.

À consideração Superior.
A Chefe do Departamento,
Ass.) C (foi-me feita tradução oral)

O Chefe do Departamento de Gestão de solos, Subst.º
Ass.) X

O Técnico,
Ass.) W”

16. Posteriormente foi tomada pela Administração a posição reflectida na seguinte decisão e seus fundamentos:

“Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes
Parecer:
Ao Exm.º Sr. Secretário:
 Concordo com o conteúdo e a proposta da Informação.
 À consideração superior.

O Directora,
Ass.) ZP
Aos 4/9/2012

Ao Director dos Serviços,
Concordo com o conteúdo da presente Informação, propondo que sejam acompanhados os pontos 8.1 e 8.2 conforme propostos.
À consideração superior.

A Chefe do Departamento de Gestão de Solos
Ass.) R
Aos 4/9/2012
Despacho:
 Visto. Concordo com a proposta do Secretário Q.
 Concordo
 Em 4/9/2012
Ass.) vd. original


     Ao DSODEP. c/c: SOTSDA
Ass.) vd. original
O Director dos Serviços,
4/9/2012

Ao Exm.º Sr. Chefe do Executivo:
Concordo com o parecer e proposta constante da Informação, submetendo à consideração de V. Ex.ª.

O Secretário para os Transportes e Obras Públicas Ass.) Q
Aos 4/9/2012

Assunto: Revisão do contrato de concessão, por arrendamento, dum terreno com área de 82.711 m2, situado na ilha da Taipa, na Estrada da Ponta da Cabrita, regido pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011. (Proc. n.º 6452.03)
Informação n.º223/DSODEP/2012 de 4/9/2012

Antecedentes
1. Por despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48 a 52/2006, publicados no B.O da RAEM n.º14, II série, de 6 de Abril de 2006, foi autorizada a transmissão onerosa a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos situados na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da Cabrita, designados respectivamente por lotes “1c”, “2”, “3”, “4” e “5”, com as áreas de 4 012 m2, 13 425 m2, 18 707 m2, 8 750 m2 e 33 895 m2, descritos na CRP sob o n.ºs XXXXX, XXXXX, XXXXX, XXXXX e XXXXX. A supracitada concessão foi regida pela escritura pública celebrada em 14 de Dezembro de 1990 e revista pelos Despachos n.ºs 5/SATOP/94, 82/SATOP/95, 52/SATOP/96 e 34/SATOP/97 bem como alterada pelo Despacho n.º 53/SATOP/97. (anexo 1)
2. Posteriormente, por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 15/2011 publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º13, II Série, de 30 de Março de 2011, foram autorizadas a revisão da concessão dos referidos cinco lotes, a reversão de nove lotes e a concessão de oito lotes, para efeitos de unificação e de aproveitamento em conjunto. Atenta a supracitada alteração, o terreno passa a ter a área total de 82 711 m2. (anexo 2)
3. Por acórdão do Tribunal de Última Instância n.º 37/2011, ficou provado que incorreu de vício, o procedimento de selecção de empresa concessionária, quanto à transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos situados na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da cabrita, designados respectivamente por lotes “1c”, “2”, “3”, “4” e “5”, com as áreas de 4 012 m2, 13 425 m2, 18 707 m2, 8 750 m2 e 33 895 m2, descritos na CRP sob o n.ºs XXXXX, XXXXX, XXXXX, XXXXX e XXXXX, devido à intervenção ilícita do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, na qualidade de titular do órgão da Administração.
4. Dado que o procedimento administrativo de transmissão dos supracitados direitos teve como base a negociação derivada do referido processo de selecção, incorrendo também de vício devido à intervenção ilícita do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas.
5. Sendo assim, por despacho do Chefe do Executivo de 8 de Agosto de 2012, exarado na Informação n.º192/DSODEP/2012, nos termos do art.º 122º, n.º2, al. c) e 123º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo, foi declarado nulo o acto proferido por si em 17/3/2006 que respectivamente homologou os pareceres n.ºs 23/2006, 24/2006, 25/2006, 26/2006, e 27/2006 emitidos em 16 de Março de 2006 pela Comissão de Terras. Segundo os supracitados pareceres, foi emitido o parecer favorável face à transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos lotes “1c”, “2”, “3”, “4” e “5”, à alteração do respectivo contrato de concessão e à minuta do contrato anexa a esses pareceres. (anexo 3)
6. Por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 38/2012, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 33, II Série, de 15 de Agosto de 2012, já foi publicada ao público a decisão da declaração de nulidade. (anexo 4)

Situação actual
7. Para efeito de acompanhar os efeitos da declaração de nulidade dos supracitados actos feita pelo Chefe do Executivo e publicada no Despacho do Secretário para os Transporte e Obras Públicas n.º38/2012, pela presente Direcção foi feita uma análise do despacho com parecer jurídico seguinte:
A. O Chefe do Executivo, em 8 de Agosto de 2012, proferiu o despacho declarando nele nulo o acto por si praticado em 17 de Março de 2006, produzindo efeitos o despacho face à concessão alterada por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 13, II Série, de 30 de Março de 2011.
1) Por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º38/2012 publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 33, II Série, de 15 de Agosto de 2012, já foi publicada ao público a declaração de nulidade do acto.
2) Pelo que, cumpre agora analisar qual o resultado que a declaração de nulidade causa à concessão alterada pelo despacho do secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011 publicado no Boletim Oficial de Macau n.º13, II Série, de 30 de Março de 2011.
3) Na realidade, dado que o acto de nulidade não produz quaisquer efeitos jurídicos (art.º123º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo), caso seja nulo e não produza quaisquer efeitos jurídicos o acto administrativo de ter autorizado a transmissão a favor da sociedade A Ltd., dos direitos resultantes da concessão, tudo isso já parece que não aconteceu, e nos termos do princípio de equidade previsto no art.º 172º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo, o contrato de transmissão dos direitos subsequente também é nulo. Daí se pode concluir que os direitos resultantes da concessão nunca chegam a ser transmitidos ao âmbito de direitos e de deveres da Sociedade A, Ltd..
4) Dado que a sociedade A, Ltd., requerente de alteração de concessão não é detentora de direito dos referidos cinco terrenos, temos que aprofundar como é que os factos podiam influenciar o acto praticado em 9 de Março de 2011 pelo Chefe do Executivo, que homologou o parecer da Comissão de Terras, no sentido de determinar a validade do acto de autorização do pedido de alteração de concessão.
5) Quer dizer, o Chefe do Executivo praticou o supracitado acto no intuito de produzir efeitos jurídicos dos cinco terrenos, enquanto nos pressupostos a Sociedade A Ltd. era detentora dos direitos resultantes da concessão, o que tem que verificar é se o acto continua a ser válido perante a situação em que os direitos nunca existem.
6) A resposta é necessariamente negativa.
7) O que tem que apurar é qual o fundamento que conduziu à nulidade do acto do Chefe do Executivo e sua consequência.
8) Em primeiro lugar, temos que analisar o elemento necessário de que dispõe o acto administrativo (o acto do Chefe do Executivo de 3 de Setembro de 2011)
9) A doutrina mais comum divide o acto administrativo em vários elementos construtivos: elemento subjectivo, elemento formal, elemento objectivo e elemento funcional1.
10) Para simplificar o conteúdo do parecer jurídico, aqui só se põe ênfase no elemento objectivo do acto administrativo, uma vez que já anteriormente consideramos que lhe falta um dos elementos (objecto) e o que fez com que o acto praticado em 9 de Março de 2011 pelo Chefe o Executivo incorresse de vício.
11) O acto administrativo tem como elemento objectivo o seu conteúdo e objecto, ou objecto directo e indirecto tal como designado por alguns juristas.
12) O conteúdo ou objecto directo do acto administrativo é formado pelos efeitos jurídicos por si constituídos ou declarados, sendo uma decisão essencial tomada pela Administração (tal como nomeação, punição, emissão de licença, suspensão e concessão, etc.), enquanto o seu objecto ou objecto indirecto é formado pela coisa extrínseca que efectivamente existe (tal como o ser humano, a coisa e a relação jurídica, etc.), resultando dela o efeito jurídico do acto administrativo.
13) Quanto a essa noção, in casu, no acto de autorização de concessão, o conteúdo do acto do Chefe do Executivo é a decisão de autorização de alteração de concessão tomada com base nas condições constantes da minuta do contrato, e o seu objecto (indirecto) é os cinco terrenos e os direitos para com esses terrenos.
14) A declaração de nulidade do acto praticado em 17 de Março de 2006 pelo Chefe do Executivo que homologou os pareceres n.ºs 23 a 27/2006 emitidos em 16 de Março de 2006 pela Comissão de Terras, fez com que a Sociedade A, Ltd. deixasse de ser detentora dos direitos resultantes da concessão desses cinco terrenos, conduzindo à invalidade do objecto indirecto do acto de autorização de alteração de concessão praticado em 9 de Março de 2011 pelo Chefe do Executivo.
15) Uma vez que, quando a sociedade A, Ltd., ora requerente nos autos não é detentora dos direitos, face ao seu pedido, já não se pode proceder à revisão da concessão do terreno que sobre o qual a requerente não tem direito.
16) Nos termos do art.º 122º, n.º2, al. c) do Código do Procedimento Administrativo, é acto nulo o acto cujo objecto seja impossível.
17) Por outro lado, a “impossibilidade do objecto indirecto” significa ou causa a que o acto administrativo carece de objecto indirecto.
18) Nos termos do art.122º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo: “São nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais… ”, pelo que, se se considere que o objecto do acto administrativo é um dos elementos essenciais previstos neste artigo, podemos entender assim que se pode declarar nulo o acto do Chefe do Executivo, uma vez que o acto padece de vício de nulidade por falta de objecto.
19) Para os efeitos do referido dispositivo, nos termos do art.º 110º do mesmo código (conceito de acto administrativo), os elementos essenciais do acto administrativo devem ser interpretados como elementos constituintes do acto administrativo, e o certo é que o objecto desse acto é um dos elementos essenciais englobados na definição de acto administrativo.
20) Segundo alguma doutrina, os elementos essenciais referem-se a que “todos aqueles que se ligam a momentos ou aspectos legalmente decisivos e graves dos actos administrativos”. “são nulos todos os actos administrativos que carecem de elementos essenciais”, e “no caso concreto, é dependente de tipo do acto ou de gravidade de vício que possa afectar o acto”.2
21) Por outro lado, há jurisprudência que entende que a contrariedade de elementos essenciais do acto administrativo tem a ver com o tipo do acto ou a gravidade de vício que afecte a estabilidade dos elementos essenciais (ou seja o seu sujeito, vontade, objecto e finalidade pública) (vd. acórdãos proferidos em 21/3/2002 e 14/5/2002 nos autos de recurso n.ºs 221/02 e 47825 pelo Supremo Tribunal Administrativo)
22) Com base nisso, podemos retirar a conclusão que, devido a que o acto praticado em 9 de Março de 2011 pelo Chefe do Executivo carece de um elemento essencial – falta de objecto (a sociedade A, Ltd, não é detentora dos direitos resultantes da concessão dos terrenos “1c”, “2”, “3”, “4” e “5”), é nulo o referido acto, ao abrigo do art.º 122º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo.
23) Nos termos do princípio da equidade previsto no art.º 172º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo, quando esteja nulo ou anulável o acto administrativo de que depende a celebração do contrato administrativo, o contrato também é nulo ou anulável, razão pela qual, da nulidade do supracitado acto também resulta nulidade do contrato de alteração de concessão regido pelo Despacho do secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011.
B Consequência da eventual declaração de nulidade do acto: desocupação do terreno e restituição do prémio devido à alteração de concessão através do despacho do secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011
1) Nos termos do art.º 282º, n.º1 do Código Civil, tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
2) No momento em que se declare nulo o acto de autorização de alteração da concessão por arrendamento, dos cinco terrenos situado na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da Cabrita, respectivamente designados por lote 1c, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5, regidos pelo despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011, deve a sociedade A, Ltd, desocupar do terreno, livre de ónus ou encargos.
3) Uma vez que o prémio de MOP642.161.305,00 devido à alteração de concessão regida pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011, já foi pago integralmente pela sociedade A, Ltd., da nulidade do contrato resultará o pedido da obrigação de restituição da prestação indevida, ou seja obrigação de restituição.
4) De acordo com o princípio da justiça equitativa: “É permitido dar a cada um o que lhe é devido”, a obrigação de restituição de aquisição indevida é um dos princípios normais de todo o sistema jurídico.
5) Pelo que, após a desocupação do terreno da sociedade A, Ltd., deve o governo da RAREM restituir o montante devido à alteração de concessão.

8. Pelo exposto, nos termos dos pareceres jurídicos e dos fundamentos acima referidos, submete-se à consideração superior a presente Informação para ter em conta os seguintes:
8.1 Realização do procedimento no sentido de declarar nulo o acto feito em 9 de Março de 2011 pelo Chefe do Executivo relativo à sua homologação do parecer da Comissão de Terras n.º41/2011, de 3 de Março de 2011, ao abrigo do art.º 122º, n.ºs 1 e 2, al. c) e 123º, n.º2 do Código do Procedimento Administrativo; através do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º15/2011, o referido acto de homologação foi publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 13, II Série, de 30 de Março de 2011. Segundo o supracitado parecer, foi emitido pela Comissão de Terras o parecer favorável, face ao pedido de revisão do contrato de concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos designados por lote “1c”, lote “2”, lote “3”, lote “4” e lote “5”, com as áreas de 4 012 m2, 13 425 m2, 18 707 m2, 8 750 m2 e 33 895 m2, situados na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da Cabrita, e ao pedido de reversão de nove terrenos e de concessão de oito terrenos para finalidade de unificação e de aproveitamento em conjunto, e à minuta do contrato anexa ao parecer.
8.2 Antes de se tomar a decisão sobre a proposta, nos termos do art.º 93º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, propõe-se que, face à intenção da decisão supracitada, seja realizada a audiência da concessionária A, Ltd..
À consideração Superior.

O Chefe do Departamento, Substº.,
Ass.) Y

O Técnico,
Ass.) X”
IV – FUNDAMENTOS
1. Questões a apreciar
Dada a extensão e complexidade das questões suscitadas pela recorrente, vamos seguir a metodologia e a cronologia adoptadas nas suas alegações de recurso, analisando ponto por ponto os argumentos expendidos.
Assim:
- Introdução
- Usurpação de poder
- Ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental; Da ofensa do direito de propriedade da 1.ª Recorrente
- Denegação do direito de defesa
- Do erro nos pressupostos de direito por desrespeito dos limites do caso julgado
- Erro de direito na aplicação do artigo 122.°, n.º 2, alínea c) do CPA
- Erro nos pressupostos de facto
- Erro nos pressupostos de facto e de direito ao afirmar-se que o ex-Secretário agiu no exercício de funções públicas
- Erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à alegada postergação do interesse público
- Ofensa dos princípios da protecção da confiança, da proporcionalidade e da adequação, por défice de ponderação no quadro do disposto pelo n.º 3 do artigo 123.° do CPA
- Violação dos princípios da Justiça, boa-fé, proporcionalidade e adequação
- Ponderação do interesse público
- Vício de forma, por insuficiência de fundamentação
- Falta de audiência prévia
     - Nexo de causalidade entre os factos da condenação e a declaração do acto nulo


2. Introdução
A recorrente inicia as suas alegações facultativas com uma máxima de douto parecer junto aos autos, salientando: “Uma coisa é haver crime do titular de um cargo público e outra, bem diferente, é haver nulidade de um acto por envolver a prática de um crime”.

Mas a isso não deixamos de contrapor as palavras do TUI, citando o próprio co-autor do parecer, o ilustre Professor Pedro Gonçalves: “E MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM [Código do Procedimento Administrativo, Coimbra, Almedina, 2.ª edição, 1997, p. 645]escrevem: “Consideramos abrangidos na parte final desta alínea c) – mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao «objecto» do acto administrativo – também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime.
Estão nessas circunstâncias, por exemplo, os actos que se fundem em documentos administrativamente falsificados (actas ou convocatórias forjadas, etc.) ou os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção”.
Pois bem, tendo-se baseado o despacho de (…)em parecer que foi obtido por acto de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, considera-se que ele estava, efectivamente, ferido de nulidade “
3. Usurpação de poder - pontos 36, 37, 38 e 39 do Relatório
3.1. … Discorda a recorrente do entendimento da entidade recorrida, vertido nos pontos 36 a 39 do Relatório, de que os contratos administrativos não têm autonomia fora do procedimento onde nasceram por força do princípio da equiparação, previsto no n.º 1 do artigo 172.° do Código do Procedimento Administrativo ("CPA"), e que a declaração de nulidade do acto que homologou os pareceres que foram favoráveis à transmissão dos direitos resultantes dos contratos de concessão implica necessariamente a nulidade de tais contratos, concluindo que a Administração tem poderes para declarar tal nulidade sem necessidade de recorrer aos Tribunais.
… Padece, assim, em sua opinião, o acto recorrido, de usurpação de poder, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, ao determinar, no ponto 37 do Relatório, a consequente nulidade de contratos administrativos em causa, quanto tal matéria é da exclusiva jurisdição dos Tribunais de Macau, pelo que o acto recorrido seria nulo.

3.2. Vejamos as linhas-força das razões expendidas:
- Tal entendimento viola o próprio n.º 1 do artigo 172.º e o n.º 1 do artigo 173.º, ambos do CPA, bem como o parágrafo (3) do n.º 2 do artigo 30.° da Lei n.º 9/1999, de 20 de Dezembro.
- Há um contrato (inicialmente, cinco contratos) entre a RAEM e a 1.ª Recorrente - no(s) qual(is) as Transmitentes também intervieram que permanece eficaz, permanece, e permanecerá, eficaz, até que um tribunal declare eventualmente a sua invalidade, uma vez que a Administração, nos termos da lei, não tem autoridade para se pronunciar sobre a validade ou invalidade de contratos administrativos, pois o artigo 173.º do CPA atribui aos tribunais a reserva exclusiva para a apreciação de questões de validade dos contratos administrativos, independentemente da fonte dessa invalidade, completados na sua génese com a publicação dos Despachos n.ºs 48 a 52/2006, no Boletim Oficial da RAEM n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006
- Incorre em erro o acto impugnado ao remeter o caso concreto para o n.º 1 do artigo 172.º do CPA, o qual diz respeito às chamadas invalidades derivadas dos contratos administrativos.
- Os actos declarados nulos são, isso sim, a própria declaração negocial da Administração, enquanto parte num contrato administrativo, de aceitação do transmissário proposto pelas transmitentes e de aceitação da alteração dos termos dos contratos anteriormente celebrados, tal como estabelecido nos artigos 107.º e 143.º da Lei de Terras.
- Os actos declarados nulos não são actos unilaterais, nem encerram e determinam, em si, a situação jurídica da 1.ª Recorrente, não se estando, assim, perante uma invalidade derivada do contrato administrativo, mas tão só e apenas, a verificar-se, uma invalidade intrínseca do contrato relacionada com a declaração negocial da Administração, contida nos actos ora declarados nulos, cuja validade poderá apenas, como se disse, ser discutida em sede judicial, no âmbito de acção sobre contratos administrativos.
- O artigo 172.º do CPA apenas determina qual o regime das invalidades a aplicar aos contratos administrativos (se o regime do CPA, se o regime do Código Civil), não conferindo, de forma alguma, jurisdição à Administração para dele conhecer, confundindo a Entidade Recorrida, o regime de invalidades a aplicar por via do artigo 172.º do CPA, com a determinação, constante do artigo 173.° do mesmo Código, do órgão com competência (exclusiva) para uma pronúncia de autoridade sobre a matéria, sendo, nos termos desses artigos, a declaração de nulidade dos contratos apenas alcançada através da propositura, com ganho de causa, de uma acção judicial com tal pedido.
- Tal entendimento é corroborado pelo n.º 2 do artigo 113.° do CPAC, no qual se determina a possibilidade de dedução inicial ou superveniente de pedido para anulação, declaração de nulidade ou de inexistência de acto administrativo relativo à formação ou execução do contrato administrativo em acção sobre contratos administrativos, na medida em que se o pedido de declaração de nulidade de um acto administrativo importasse automaticamente a nulidade do contrato que dele depende - como defende a entidade recorrida - então não seria necessário cumular tal pedido em acção sobre contratos administrativos, como determina o citado artigo 113.º
- Mesmo que o acto recorrido se venha a consolidar, contra o que se espera, sempre se diria que a Administração não se encontraria vinculada a promover a declaração de nulidade dos contratos, ao contrário do que afirma o acto recorrido - cfr. ponto 39 do Relatório.
- A própria Administração, ao proceder, em 4 de Setembro de 2012, à notificação da ora 1.ª Recorrente, por via do ofício da DSSOPT com a referência 0624/6452.04a6456.04/DSODEP/2012, para efeitos do exercício de audiência prévia em relação à intenção do Chefe do Executivo declarar nulo o seu acto de 9 de Março de 2011 de homologação do parecer da Comissão de Terras que propunha parecer favorável à revisão do contrato de concessão dos Lotes, acaba por reconhecer implicitamente que não se está perante uma nulidade derivada com os efeitos previstos no ponto 37 do Relatório, pois, se assim fosse, também os actos agora visados seriam, do mesmo modo, nulos e de nenhum efeito, sem necessidade de ulterior declaração adicional de nulidade - conforme melhor consta da cópia junta como Doc. n.º 7 que aqui se dá por reproduzido.
    
    3.3. A questão, como, aliás toda a argumentação jurídica da recorrente não deixa de ser doutíssima, mas não a podemos acompanhar.
    Quanto à invocada usurpação de poder, dir-se-á, como já se disse neste Tribunal, que “De natureza orgânica, este é um vício particularmente grave, na medida em que tem por fundamento uma violação do princípio da separação dos poderes que formam os pilares de um verdadeiro estado de direito democrático: legislativo, executivo e judicial.
Estará configurado o vício se a Administração pratica um acto incluído nas atribuições do poder legislativo ou judicial (sobre o assunto: F. Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, pag. 385 e sgs; M. Caetano, in Manual de Direito Administrativo, I, pag. 495; Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo, pag. 380/382; M. Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, pag. 555).”3
    Se invocamos esta passagem será para pôr a tónica na gravidade do vício que vem assacado ao acto e que até por isso se tem de evidenciar sem necessidade de grandes desenvolvimentos doutrinários.
    Estamos perante uma nulidade, bem ou mal conformada juridicamente pela Administração, mas o que importa por agora é atentar que na avaliação que foi feita, se concluiu que a transmissão do contrato de concessão na exploração dos ditos terrenos estava fulminado de nulidade, por ele tendo perpassado um crime de corrupção do então responsável e titular do Governo.
    Se a condenação por ele sofrida vai determinar a nulidade do acto, essa é outra questão de que não curaremos por ora, na certeza, adiantando desde já, que o TUI já tomou posição afirmativa clara sobre a questão e em várias acções que têm corrido por este tribunal já as partes têm defendido uma e outra coisa, ao sabor dos interesses e das suas conveniências, não estando em causa a legitimidade dessa flutuação, como ainda em recente caso aconteceu no Processo n.º 444/2013, desta instância.
    3.4. Partamos, pois, de que o que estava em causa era a consideração de um acto que se tinha ferido de nulidade.
    Ora, em lado algum, lobrigamos, preto no branco, norma no procedimento administrativo que inculque no sentido de que a nulidade e o seu reconhecimento só judicialmente possa ser actuado, exceptuando-se o regime particular de apreciação da invalidade dos contratos administrativos.
    Muito genericamente, como sabemos, o regime geral das nulidades assenta na possibilidade do seu conhecimento oficioso pelo tribunal, a todo o tempo, podendo ser invocada por qualquer pessoa que nisso tenha interesse, não precisando de um “dictat” judicial para que possa actuar. “É a característica do negócio que ab initio não produz, por força de um vício, os efeitos que lhe corresponderiam.”4

3.5. Descendo ao Direito Administrativo, não vemos nada de substancialmente diferente, bastando atentar no art. 123º do CPA:
   “1. O acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade.
   2. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada, também a todo o tempo, por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal.
   3. O disposto nos números anteriores não prejudica a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de actos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito.”
3.6. Descendo ainda ao nível dos contratos.
Pretende a recorrente que aqui a nulidade só judicialmente pode ser declarada.
Observemos as normas pertinentes.
Dispõe o artigo 172.º do CPA, sobre o regime de invalidade dos contratos:
“1. Os contratos administrativos são nulos ou anuláveis, nos termos do presente Código, quando forem nulos ou anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração.
2. São aplicáveis a todos os contratos administrativos as disposições do Código Civil relativas à falta e vícios da vontade.
3. Sem prejuízo do disposto no n.º 1, à invalidade dos contratos administrativos aplicam-se os regimes seguintes:
a) Quanto aos contratos administrativos com objecto passível de acto administrativo, o regime de invalidade do acto administrativo estabelecido no presente Código;
b) Quanto aos contratos administrativos com objecto passível de contrato de direito privado, o regime de invalidade do negócio jurídico previsto no Código Civil.”

E o art. 173.º: “1. Os actos administrativos que interpretem cláusulas contratuais ou que se pronunciem sobre a respectiva validade não são definitivos e executórios, pelo que na falta de acordo do co-contratante, a Administração só pode obter os efeitos pretendidos através de acção a propor no tribunal competente.
2. O disposto no número anterior não prejudica a aplicação das disposições gerais da lei civil relativas aos contratos bilaterais, a menos que tais preceitos tenham sido afastados por vontade expressa dos contratantes.”

Por seu lado, o art. 113º do CPAC estabelece:
“1. A acção sobre contratos administrativos tem por finalidade dirimir os litígios sobre interpretação, validade ou execução dos contratos, incluindo a efectivação de responsabilidade civil contratual.
2. O conhecimento da acção sobre contratos administrativos não impede o recurso contencioso de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato.
3. O pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato pode ser deduzido, inicial ou supervenientemente, em acção sobre contratos administrativos quando aquele pedido e os formulados nos termos do n.º 1 estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência ou quando a procedência de todos os pedidos dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas normas jurídicas ou cláusulas contratuais.”
Da conjugação destas normas pretende a recorrente retirar a impossibilidade de efectivar unilateralmente a nulidade do acto com repercussão directa sobre um contrato, já que a declaração unilateral da nulidade nunca podia atingir a declaração contratual da contraparte que até pode nem concordar com a leitura feita pela pretendente da nulidade.

3.7. Defende-se em douto parecer junto aos autos:
    
    “Ao arrepio do que vale para os contratos entre privados, a lei investe a Administração, em ordem à prossecução dinâmica do interesse público, numa série de poderes ou prerrogativas exorbitantes do direito comum, que lhe conferem o poder de conformar a relação contratual por forma unilateral e impositiva, mediante a prática de actos unilaterais dotados de força executiva e, pontualmente, até, de força executória (isto é passíveis de execução coerciva, com dispensa, para o efeito, do recurso à via judicial), conforme sucede, designadamente, com os actos em que se precipitam os poderes de direcção e de fiscalização do modo de execução das prestações, de modificação unilateral do respectivo conteúdo, de aplicação de sanções contratuais ou de resolução unilateral do contrato por razões de interesse público (artigo 167.º do CPA).
    
    Mas a opção pela atribuição de poderes ou prerrogativas exorbitantes à Administração Pública no exercício da sua actuação jurídico-administrativa de matriz contratual é, manifestamente, repudiada pelo legislador quando em causa está a interpretação de cláusulas contratuais e, bem assim, a respectiva validade.
    Nestes casos, como decorre expressamente do preceito atrás assinalado, os actos da Administração são reduzidos à expressão de simples ou meras declarações negociais, isto é, à condição de actos meramente opinativos, pelo que, na falta de acordo do co-contratante, a única alternativa viável que resta à Administração contratante, em ordem a obter a anulação ou declaração de nulidade dos contratos em causa é a acção sobre contratos administrativos, tal como prevista no artigo 113.º do Código de Processo Administrativo Contencioso (adiante designado, simplesmente, por CPAC), em que justamente se estabelece que «a acção sobre contratos administrativos tem por finalidade dirimir os litígios sobre interpretação, validade e execução dos contratos, incluindo a efectivação de responsabilidade civil contratual».
    Claro está que aí também se prevê, conforme, aliás, nem poderia deixar de ser, no artigo 113.°, n.º 2, que «o conhecimento da acção sobre contratos administrativos não impede recurso contencioso de actos administrativos relativos à formação e execução do contrato», o que deixa imediatamente entrever que a Administração, também no contexto da execução de contratos administrativos, se pode achar investida da capacidade para ditar actos administrativos em sentido estrito e que, nessas situações (mas apenas nessas situações), a forma adequada de reacção será, não já a acção sobre contratos administrativos, mas, antes e em contrapartida, o recurso contencioso de anulação de actos administrativos.
    
    Contudo, isso é o que sucede exclusivamente a propósito do exercício dos poderes de conformação unilateral da relação jurídica contratual administrativa, no âmbito da designada gestão administrativa do contrato; dito de outra forma, quando em causa está a manifestação daqueles poderes exorbitantes destinados a assegurar que, em ordem à garantia de prossecução actual e dinâmica do interesse público, a Administração pode, de forma imperativa e autoritária, dirigir e fiscalizar o modo de execução das prestações, modificar unilateralmente o seu conteúdo, infligir sanções contratuais e proceder à resolução do contrato, tudo em homenagem a superiores razões de interesse geral ou colectivo. Pois bem, é precisamente no exercício destes poderes de gestão administrativa do contrato e de conformação da relação contratual que a Administração Pública contratante põe em movimento a sua capacidade para praticar actos administrativos - os quais são recorríveis pela via do recurso contencioso.
    Ao invés, sempre que se trate da interpretação do sentido a emprestar a certas cláusulas contratuais não directamente correlacionadas com o exercício daqueles poderes ou, de igual modo, da pronúncia sobre questões atinentes à (in)validade de cláusulas contratuais (e dos próprios contratos globalmente considerados), é a própria lei a ter o cuidado de "degradar" a posição da Administração a um nível de absoluta paridade com a do seu co-contratante. De facto, nesse âmbito, a lei retira expressamente à Administração contratante o poder de dispor unilateralmente, por acto autoritário e impositivo, sobre o preenchimento (ou não), em cada caso, dos requisitos ou condições de legitimidade a que o contrato deve obediência em ordem a conformar-se com as regras e princípios postos pelo ordenamento jurídico, remetendo-a, nestas situações, imperativamente, para os tribunais administrativos, sempre que queira ou pretenda fazer valer a invalidade do contrato.
    (…)
    
    Deste modo, ainda que se possa admitir que se integra na esfera de disponibilidade do Chefe do Executivo o poder de proceder à revogação anulatória (revogação fundada em ilegalidade) dos actos autorizatórios prévios por si praticados com vista a dar luz verde à transmissão das situações resultantes de concessão anterior - independentemente, ao menos para já, de qualquer consideração adicional sobre a legitimidade substancial do exercício deste poder na hipótese concretamente em apreço, em face de uma adequada hermenêutica das disposições legais invocadas em ordem a legitimar a decisão adoptada -, já não se pode, de modo algum, transigir com a ideia de que se achava igualmente na sua esfera de disponibilidade determinar a declaração administrativa de nulidade do contrato de concessão, por arrendamento, que vinculava a RAEM à Recorrente.
    Na verdade, quando se faz menção à consagração de um princípio de equiparação entre acto e contrato no artigo 172.º do CPA, do que se cuida, unicamente, é de estabelecer uma regra de equiparação entre o regime de invalidade do contrato administrativo e o regime de invalidade do acto de que haja dependido a sua celebração: «os contratos administrativos são nulos ou anuláveis, nos termos do presente Código, quando forem nulos os anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração».
    
    No fundo, movemo-nos no contexto da invalidade derivada ou consequencial e o que o legislador pretendeu foi, apenas, estabelecer um princípio de comunicação ou de contágio automático entre a invalidade de que enferma o acto que esteve na base ou de que haja dependido o contrato e a invalidade de que este último irá igualmente enfermar (nulo será o contrato que haja dependido de um acto nulo; anulável será o contrato que haja dependido de um acto anulável).
    (…)
    Temos, assim, que o contrato administrativo é nulo se nulo for o ato administrativo de que dependeu a sua celebração. Todavia, o facto de a Administração ter competência para declarar a nulidade do ato administrativo não a investe do poder (que seria implícito) para declarar a nulidade do contrato administrativo: por um lado, não existem, em direito administrativo, competências implícitas por extensão; por outro lado, seja como for quanto a isso e porventura para afastar todas as eventuais dúvidas, o legislador retirou explicitamente uma tal competência da esfera de disponibilidade da Administração Pública contratante.”
    
3.8. Tudo estaria bem, não fora o caso de não estarmos perante um acto que decretou a invalidade do contrato.
Nem sequer em termos de uma invalidade sequencial se pode dizer que o contrato, em si, é posto em causa, mas apenas a titularidade do mesmo.
É verdade que a declaração de nulidade do contrato só judicialmente pode ser declarada e quando na acção sobre contratos administrativos se refere que o pedido de nulidade ali é formulado, como é óbvio, assim será quando tal pedido for formulado.
O regime da arguição das nulidades consagrado no art. 173º, n.º 1 do CPA é uma particularidade do regime substantivo das invalidades consagrado no art. 172º e onde, nos casos passíveis de contratos de direito privado, o regime a que a lei manda atender é o do Código Civil. O regime que decorre do art. 173º em relação à invocação das invalidades, sejam elas quais forem, é o da sua invocação em juízo.
Não cabe aqui a exegese da norma que reclama a invocação judicial, mesmo daquelas invalidades mais fortes. Imagine-se um contrato, iniludivelmente, ele próprio, celebrado sob coacção absoluta. Estaria obrigada a Administração a recorrer previamente aos tribunais para decretar essa invalidade? Apesar de se poder configurar de um rigor formal excessivo ver na norma do art. 173º essa obrigatoriedade, tanto mais que sempre estaríamos perante um vício da vontade, sendo o próprio CPA a remeter para as normas civilistas nesse domínio, face ao artigo 172º, n.º 2, o certo é que na vertente adjectiva a lei não distingue e talvez devesse distinguir. E se bem atentarmos, na génese da viciação do acto que autorizou a transferência da concessão, não deixa de estar o cometimento de um crime, também ele condicionante da viciação da vontade do titular do órgão contratante.
Aliás, o direito administrativo “não tem uma teoria geral da vontade administrativa; por outro lado, o contrato administrativo é, como o contrato civil, um acordo de vontades, não se distinguindo essencialmente dele nessa parte e pode, portanto, aplicar-se-lhe, no que à vontade respeita, as normas do Código Civil”.5
Mas, antes disto, importa prestar atenção ao acto recorrido e se bem atentarmos nele logo se verifica que o acto impugnado não é um acto que tenha modificado os contratos de concessão, antes se declara nulo acto anterior que homologara pareceres da Comissão de Terras, favoráveis à transmissão da concessão a favor da sociedade A, Lda.
Dir-se-á assim que só mediatamente os contratos de concessão são atingidos, no que respeita a uma das partes contratantes.
Nesta perspectiva, no fundo, o que se põe em causa com a declaração da nulidade apontada é o acto que autoriza a substituição do concessionário e já não o conteúdo das concessões, perdendo assim sentido a invalidação unilateral e subjectiva da Administração a impor-se à outra parte contratual que pode impressionar os puristas.
É verdade que a doutrina portuguesa, a partir de Marcello Caetano, no que aos contratos respeita, vem defendendo que a invalidade dos contratos administrativos só judicialmente se pode fazer valer. “Nada impede que as partes reconheçam os vícios de um contrato e, de comum acordo, o anulem, declarem nulo ou de nenhum efeito. Mas, não existindo esse acordo, terá a parte interessada que se dirigir aos tribunais administrativos a discutir a validade do contrato para pedir a respectiva anulação, ou declaração de nulidade”6
Não se pode considerar que um contrato de concessão administrativa seja reconduzível a um contrato com uma proximidade ao dos contratos com objecto passível de um contrato privado, em contraponto com os contratos com objecto passível de acto administrativo, na medida em que se definem os termos da colaboração dos particulares na prossecução de tarefas que caberá à Administração prosseguir, no caso, relativamente ao desenvolvimento e empreendimento de um projecto de construção em terreno da RAEM. Em termos tais que uma das partes, a concedente, não deixa de intervir aí dotada de jus imperii e o objecto e fins prosseguidos não deixam de assumir uma natureza própria de uma relação jurídica administrativa. Nestes contratos administrativos, os candidatos a concessionários não se colocam perante o projecto contratual num plano idêntico ao que se colocam os candidatos num procedimento adjudicatório de um contrato administrativo com objecto passível de contrato privado, não deixando de haver aqui uma relação de subordinação.
Quanto se vem dizendo, para melhor se perceber o que se pretende com o n.º 2 do artigo 173º do CPA. Para essa interpretação socorremo-nos da anotação expendida por Lino Ribeiro e Cândido de Pinho, enquanto dizem “O n.º 2 do artigo salvaguarda o respeito pelas «disposições gerais da lei civil relativas aos contratos bilaterais». As questões de interpretação e validade das cláusulas contratuais devem observar o disposto nas normas supletivas da lei civil. O âmbito de aplicação desta norma são os contratos administrativos com objecto passível de contrato privado. Os que sejam passíveis de acto administrativo ou as «cláusulas exorbitantes» daqueles têm que ser interpretados de acordo com a lei que prevê os efeitos jurídicos conformados pelo contrato.
Os contratos administrativos que correspondem a um modelo de direito privado (v.g. prestação de serviços, empreitadas) não podem afastar as normas imperativas que integram o regime desses contratos. As normas injuntivas desses contratos privados aplicam-se aos contratos administrativos, uma vez que os efeitos de direito que elas proíbem também não poderiam ser constituídos pela Administração no exercício da sua capacidade de gozo de direito privado. Por isso, o afastamento das disposições gerais da lei civil, a que se refere a última parte do n.º 2 deste artigo, respeita unicamente às normas supletivas.”7

3.9. Posto isto, mesmo a considerar-se, como se considera, inaplicável ao caso uma declaração unilateral de nulidade do contrato em presença por banda da Administração, o que se constata é que a declaração da nulidade do acto só mediatamente o atinge, visando-se antes a homologação de um parecer favorável à transferência do contrato de concessão de determinados terrenos.
Falece, pois, razão à recorrente ao pretender ter havido usurpação de poder, por a Administração não poder unilateralmente ter proferido tal declaração de nulidade do acto praticado. Vício este que, em bom rigor nem é um vício próprio do contrato administrativo.8

Não se olvida que a recorrente alude a uma nulidade sequencial da nulidade do acto que vai inquinar o contrato, tal como previsto no artigo 172º, n.º 1 do CPA, pretendendo ver algo mais que não está contido na norma.
Também a lei portuguesa - que aqui se refere em termos de Direito Comparado - acolhe claramente a invalidade derivada; de acordo com o n.º 1 do artigo 185.º do CPA os contratos são nulos ou anuláveis quando forem nulos ou anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração.
Como salienta Pedro Gonçalves, “um dos problemas mais difíceis nesta matéria diz respeito à identificação dos actos prévios cuja invalidação origina uma invalidade do contrato. Tendo em conta a razão de ser da figura da invalidade derivada, percebe-se que não pode aceitar-se o princípio segundo o qual a invalidação de qualquer prévio a um contrato gera sempre e em qualquer caso a invalidade do próprio contrato. Há, quanto a este ponto, a necessidade de ter em conta uma dupla restrição.
Em primeiro lugar, deve existir uma certa relação ou conexão entre o acto prévio e o contrato, em termos de o primeiro poder considerar-se causa e o segundo efeito: a celebração do contrato tem de depender daquele acto (CPA), que há-de, portanto fundar a celebração do contrato (ETAF): o caso mais evidente mas decerto não único, é o da decisão de adjudicação. Assim para que o efeito da invalidade derivada se produza não basta que seja invalidado um qualquer acto anterior ao contrato (e inserido no procedimento pré-contratual), sendo necessário que esteja em causa um acto ordenado ao contrato, acto do qual o contrato dependa ou que nele se funda.
Em segundo lugar, o acto ordenado no contrato há-de ser invalidado por causa de um vício de natureza material que impeça a Administração de praticar um novo acto com o mesmo conteúdo (sem repetir o vício). Se, no respeito pela sentença, a Administração pode praticar um acto com idêntico conteúdo, não há invalidade derivada.”9
A solução passa, segundo Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos por averiguar se a celebração do contrato dependeu do acto pré-contratual viciado, devendo utilizar-se os mesmos critérios aplicáveis para aferir a nulidade consequente dos actos administrativos, ou seja, tem que haver um nexo de imputação objectiva do próprio contrato ao acto pré-contratual ilegal, em termos tais que seja razoavelmente de supor que o contrato não teria sido celebrado, ou não teria sido celebrado com o mesmo co-contratante e/ou com os mesmos objecto e conteúdo, se o acto pré-contratual não tivesse incorrido na ilegalidade em que incorreu.10
É certo que o legislador se refere ao “objecto” do acto administrativo, mas como defendem Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim, estão abrangidos os actos “que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime”, estando nessas circunstâncias os que sejam “praticados mediante suborno ou por corrupção”[repete-se a citação para enfatizar a mensagem].11

Se se compreende que a maçã podre contamine toda a fruta que está no cesto, já não se compreende que o regime da expurgação aplicável tenha de ser o mesmo. Compreende-se que possa extrair a fruta quem a lá colocou unilateralmente, mas já o não poderá fazer em relação à fruta que também lá foi colocada por outro contratante. No fundo, o que está implícito na argumentação da recorrente, é que, em relação ao acto prévio, também a Administração não poderia unilateralmente declarar a nulidade do contrato. Compreende-se a insegurança que pode arrastar a admissibilidade de se fazerem desaparecer os pressupostos objectivos e subjectivos de um processo negocial, mas pensa-se que não há razão para desaplicar aí o regime geral da arguição dos vícios do acto administrativo, salvaguardada que fica sempre a via da responsabilidade civil a que haja eventualmente lugar.

3.10. A reflexão de Vieira de Andrade sobre as novas regras que no Direito Português se apartam do regime aqui vigente são bem elucidativas da interpretação que ora se acolhe:
«actos administrativos contratuais” não estão sujeitos, quanto à sua formação, ao regime da marcha do procedimento estabelecido pelo CPA – a não ser no caso da aplicação de sanções contratuais, que se rege pelas normas relativas à audiência prévia (artigo 308.º).
Esta opção legislativa reivindica a vantagem da clareza e consequente segurança do regime jurídico substantivo aplicável, mas apresenta o perigo de uma rigidificação e de um autoritarismo administrativo, que, em determinadas situações e tipos de contratos, se poderá revelar inadequado, desnecessário ou excessivo em função da finalidade da garantia da realização do interesse público visado pela decisão de contratar.

Por exemplo, não nos parece razoável que a lei, de forma global e indiferenciada, qualifique como acto administrativo a resolução unilateral de
quaisquer contratos, incluindo, para além dos casos de resolução por imperativo de interesse público, quer a resolução por incumprimento [que tradicionalmente é vista no direito administrativo, contra o nosso entendimento, como sanção contratual], quer ainda a resolução por alteração anormal e imprevisível das circunstâncias – e a razoabilidade é ainda menor quando se atribui a todos esses actos de resolução, para além de força de título executivo, força executória, permitindo a sua execução coactiva pelos meios administrativos sem recurso aos tribunais. Parecia-nos mais adequada a (…) de que, em regra, a Administração, ao intervir unilateralmente na execução dos contratos administrativos, o faz através de declarações negociais que, caso configurem poderes, correspondem ao exercício de direitos potestativos de génese contratual. Regra essa que só deveria ser afastada nos casos expressamente previstos ou naqueles em que, com base em critérios materiais, se devesse concluir que se tratava de verdadeiros actos administrativos, por envolverem necessariamente o exercício unilateral de poderes de autoridade […]
Um dos fundamentos legalmente previstos para a alteração do contrato é constituído, como vimos, “ por razões de interesse público, decorrentes de necessidades novas ou de uma nova ponderação das circunstâncias existentes” , que justifica o uso, pelo contraente público, do seu poder de modificação unilateral do contrato, através da prática de um acto administrativo. Este é um poder de conformação da relação contratual, que não deve confundir-se com o factum principis (fait du prince), relativo ao poder do Estado de causar indirectamente mas especificamente a modificação das circunstâncias contratuais por decisão de soberania político-legislativa (por via geral e abstracta ou através de uma lei-medida concreta) – este poder, que daria lugar normalmente a uma “ indemnização pelo sacrifício”, de natureza extracontratual, quando cause um prejuízo especial e anormal ao contraente privado, aparece, no entanto, equiparado pelo CCP a uma alteração das circunstâncias imputável ao contraente público, pelo menos quando o contraente público seja o próprio Estado, e, por essa via, tem efeitos semelhantes aos de uma modificação unilateral por razões de interesse público (artigo 314.º, nº 1/a). O co-contratante privado, em caso de modificação unilateral ou de alteração de circunstâncias imputável ao exercício de poderes do contraente público, tem direito à reposição do equilíbrio financeiro do contrato (artigo 314.º, n.º 1), que será efectivada, na falta de estipulação contratual de outros efeitos, “ através da prorrogação do prazo de execução das prestações ou da vigência do contrato, da revisão dos preços nele previstos (actualização), ou da assunção, por parte do contraente público, do dever de prestar à contraparte o valor correspondente ao decréscimo das receitas esperadas ou ao agravamento dos encargos previstos com a execução do contrato” (artigo 282.º, n.º 3).»12

Esta transcrição, algo extensa, apenas para demonstrar a possibilidade, ainda que discutível, no campo dos princípios, de a lei consagrar uma intervenção da entidade pública, movida por razões de interesse público, no sentido de agir, em certos casos, por via do acto administrativo em termos de repercussão sobre um dado contrato administrativo.
4. Ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental; da ofensa do direito de propriedade da 1.ª Recorrente - pontos 40 e 41 do Relatório
4.1. Alega a recorrente que por via dos contratos de concessão, por arrendamento, celebrados, a 1.ª Recorrente registou a seu favor, pela inscrição n.º XXXXX, a aquisição do direito resultante da concessão por arrendamento do prédio rústico descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º XXXXX (descrição que engloba actualmente os Lotes já anexados), mais dizendo que já ali fez obras e iniciou a construção do complexo habitacional e comercial planeado.
… Os poderes conferidos ao concessionário por arrendamento de terrenos do domínio privado da RAEM têm natureza de direito real e não de direito meramente obrigacional, correspondendo a um verdadeiro direito de propriedade, tal como determina o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 51/83/M, de 26 de Dezembro, podendo transmitir as construções levantadas em terreno concessionado.

… Ora, o direito de propriedade, nas suas várias vertentes, é protegido como direito fundamental nos artigos 6.º e 103.º da Lei Básica de Macau, pelo que o acto impugnado, ao despojar a destinatária, a ora 1.ª Recorrente, de direitos sobre os lotes e as benfeitorias e construções já aí efectuadas, sem curar de determinar como reverteriam para ela os preços que entretanto pagou e quem responderia pelo valor das benfeitorias, no valor de milhares de milhões de patacas, traduzir-se-ia em acto ferido de nulidade por confisco em violação de lei a consequente nulidade do acto impugnado.

4.2. Não tem razão a recorrente.
A recorrente parte da natureza jurídica do direito do concessionário para daí retirar, da realidade do seu direito, a intocabilidade do mesmo.
Permita-se-nos a singeleza das palavras, mas servem elas apenas para ilustrar o pensamento de que, não obstante a importância das categorias dogmáticas, o que releva é o regime aplicável às concessões por arrendamento em relação aos terrenos do domínio privado da RAEM e aos terrenos vagos, ou melhor, em relação aos terrenos que não integrem o seu domínio público.
Não é a integração numa determinada categoria que obsta à impossibilidade de uma limitação intrínseca ou extrínseca dos direitos dos particulares, sob pena de vermos, também, por exemplo, no arrendamento que, para certos autores, como Menezes Cordeiro e Oliveira Ascensão, assume natureza real, tal impossibilidade reconduzida dramaticamente a uma violação de um direito fundamental.
Com todo o respeito, mas esta linha argumentativa não faz qualquer sentido.

4.3. No nosso sistema jurídico o direito de propriedade assume as seguintes características:
- A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou morte (artigo 103º da LB);
- A par da propriedade privada amplamente admitida e caracterizadora de uma economia de mercado coexiste um sector público;
- O direito de propriedade (artigo 1229º) é caracterizado como o poder de gozo de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas pertencentes a proprietários dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas;
- O direito do proprietário comporta poderes indeterminados, limitados por restrições de direito público e de direito privado;
- O direito de propriedade é dotado de elasticidade, na medida em que, extinto um direito real menor que o limite, a propriedade readquire a sua plenitude;
- Perpetuidade do direito, o que implica não poder extinguir-se pelo não uso.
Mesmo os direitos reais não deixam de sofrer limitações legais e se se concluir que a concessão assume tal natureza, de acordo com o seu regime, não deixa de poder ser limitada, não se podendo confundir institutos como a reversão, ou a invalidade de um pressuposto da atribuição de uma concessão com o fenómeno do confisco, tal como insinuado pela recorrente.

4.4. É verdade que se encontram laivos de uma natureza real nas concessões por arrendamento de terrenos vagos em Macau, tendo-se até afirmado já que tal instituto revela particulares afinidades com o direito de superfície administrativa na modalidade do direito em superfície edificada de duração temporária. 13
O Dr. José Gonçalves Marques vai neste sentido, enquanto diz: "Em Macau, o direito de concessão por arrendamento de terrenos urbanos e de interesse urbano pertencentes ao domínio privado do Território de Macau confere poderes de construção e de transformação de obras ou edifícios, que se tornam propriedade do concessionário (Decreto-Lei n.º 51/83/M, de 26/12, art. 1.º). O concessionário, proprietário das construções, tem o direito de as alienar, de constituir a propriedade horizontal em edifícios aprovados com esse fim, e de alienar ou onerar as respectivas fracções autónomas. Pode ainda hipotecar não só o direito resultante da concessão que lhe dá o poder de construir sobre terreno alheio, mas também a propriedade dos edifícios (art. 1.º, 2 do cit. Dec.-Lei n.º 51/83/M). Assim, à semelhança do que acontece no direito de superfície, há um direito de propriedade sobre as construções emergente do poder de construir inerente ao direito de concessão por arrendamento, configurado como um verdadeiro direito real. Este direito de propriedade de construções constitui excepção ao princípio da especialidade, porque, sobre uma parte não desconexionada do solo - a obra -, passa a haver um direito real diferente do direito de propriedade que a pessoa colectiva RAEM tem sobre esse solo.".14
Na linha do pensamento do Prof. Menezes Cordeiro, direito real esse que revela particulares afinidades com o direito de superfície administrativa, na modalidade de direito em superfície edificada, de duração temporária,15 como se vê da compaginação dos aludidos dispositivos da Lei de Terras com os arts. 1417º e segs do Código Civil e com algumas das normas da Lei de Terras vigente ao tempo do contrato e do acto sub judice e expressamente reconhecida pelas partes contratantes como a aplicável ao contrato de concessão.
Na verdade, entre os poderes atribuídos ao concessionário, avultam os de "construção ou transformação do terreno" para os fins consignados no título constitutivo da concessão.
Os terrenos vagos, designadamente os "terrenos urbanos e de interesse urbano", integrados no domínio privado do Território de Macau, podem ser objecto da disposição, sendo a "concessão por arrendamento", da competência do respectivo Governador, [leia-se, Chefe do Executivo] uma das "formas da disposição" - arts. 1º, 6º, n.º 1, 7º, 9º, al. a), 29º, al. c), 30º, n.º 3 e 41º, n.º 1, al. b), da Lei de Terras - Lei 6/80/M, de 5 de Julho, alterada pela Lei 8/83/M, de 13 de Agosto.
A concessão por arrendamento, que será dada inicialmente a título provisório, converter-se-á em definitiva "se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento mínimo previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente" (art. 49º daquela Lei).
Com a celebração do contrato de "arrendamento" materializa-se a concessão provisória, cuja escritura será "outorgada perante o notário privativo da Direcção dos Serviços de Finanças", após o que se procederá à "inscrição do terreno na matriz predial" e ao registo da "concessão provisória" na Conservatória dos Registos, para poder produzir efeitos em relação a terceiros.
A renda, que é anual, embora susceptível de actualização, terá de ser fixada no contrato e dele deve constar, do mesmo modo, "o prazo do arrendamento", que, porém, não pode ser superior a vinte e cinco anos. Por seu turno, o "prazo das renovações sucessivas" nunca deverá exceder, para cada uma, dez anos.
O concessionário deve cumprir as prescrições legais e contratuais concernentes ao aproveitamento do terreno.
Quanto aos terrenos concedidos para a construção de prédios urbanos, o seu processo de aproveitamento é o que estiver definido no respectivo título de concessão, encontrando-se o concessionário sujeito a determinadas penalidades, em caso de inobservância dos prazos.
De acordo com o n.º1 do art. 50º igualmente do referido Diploma, tal "arrendamento" rege-se pelas disposições dessa "lei e diplomas complementares, pelas cláusulas dos respectivos contratos e, subsidiariamente, pela lei civil aplicável".

Com a entrada em vigor do novo Código Civil deixou de vigorar em Macau o Código Civil português, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de Novembro de 1966, e tornado extensivo a Macau pela Portaria n.º 22 869, de 4 de Setembro de 1967, bem como as disposições legais que o modificaram, ressalvando-se, porém, as disposições relativas à enfiteuse, que subsistem como normas subsidiariamente aplicáveis à concessão de terrenos por aforamento, de harmonia com o preceituado no n.º 1 do artigo 45.º da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho.
Do art. 1º, n.º 1 deste Decreto-Lei, resulta que "o direito resultante da concessão por arrendamento de terrenos urbanos e de interesse urbano" abrangia poderes de construção ou transformação, para os fins e com os limites consignados no respectivo título constitutivo, consentindo o n.º 2, que o concessionário, proprietário das construções efectuadas, pudesse transmitir essa propriedade, designadamente no regime de propriedade horizontal.

4.5. Deste regime se retira, não obstante estes traços que apontam para a natureza real, não obstante o direito do concessionário poder ser um direito real disciplinado em lei especial, ou seja, na Lei de Terras e diplomas complementares, daí não resulta qualquer perpetuidade do direito, podendo a transitoriedade do direito ser apanágio de certos direitos reais, como salienta o Prof. Oliveira Ascensão.16

Segundo a cláusula segunda do Despacho n.º 77/SATOP/92, BOM, de 6 de Julho 20/SAOPH/87, despacho originário da concessão, o arrendamento seria válido por 25 anos, o aproveitamento do terreno deveria operar-se no prazo de 36 meses (cláusula quinta), da cláusula sétima resultam limitações quanto à fruição de terras e materiais sobrantes, os encargos e as limitações ao uso e fruição da coisa são evidentes nas cláusulas nona, décima (prémio e caução), a transmissão tem de ser autorizada (cláusula décima primeira) e a própria rescisão está prevista nos termos da cláusula décima quarta.

Todas estas limitações que se apartam de um regime real do direito do concessionário, ainda que este estivesse equiparado, fosse a um foreiro, fosse a um arrendatário, não deixariam de actuar independentemente da natureza do direito que se venha a configurar.

Acresce que, tal como já acima frisámos, o que está em causa não é o contrato de concessão, antes um acto que autorizou a transmissão do concessionário.
Tal como num contrato aquisitivo de um direito real, quando esse contrato venha a ser fulminado de alguma invalidade, não é o direito real que é posto em causa nos poderes que confere, mas sim o modo de aquisição do direito.

4.6. A inviolabilidade do direito que a recorrente se arroga pressupõe que o direito se mostre adquirido, o que, como se sabe, quando de direitos reais se trata, a única forma indestrutível de aquisição originária passa pela prescrição aquisitiva, ou seja, a usucapião. Até lá o que temos são modos de aquisição derivada que não deixam de estar sujeitos ao regime das invalidades negociais ou dos actos administrativos, não se configurando aqui, repete-se, estarmos em presença de uma invalidade de um contrato administrativo.

Pelo que se conclui pela improcedência desta pretensa violação de um direito fundamental à propriedade privada, ou direito real privado, na exacta medida em que esse direito não se chegou a firmar na ordem jurídica.
5. Denegação do direito de defesa - pontos 9, 10, 18, 19, 25 e 33 do Relatório
5.1. Segundo o recorrente, a decisão impugnada é materialmente sancionatória. Com efeito, ela posiciona-se como o correspectivo de justiça ao cometimento de um crime do qual teria alegadamente beneficiado a 1.ª Recorrente.
… Esta sofre, assim, todos os efeitos negativos da privação de efeitos dos actos de 2006 ora anulados, para ela constitutivos de direitos, "ainda que em abstracto a decisão concreta fosse adequada e correcta".
… Não se trata, pois, de repor a legalidade objectiva e própria do conteúdo do acto administrativo declarado nulo ou das formalidades do procedimento a ele conducentes, mas de infligir uma punição à 1.ª Recorrente.
… Toda a factualidade sujeita a uma qualificação penalística é extraída do supra citado Acórdão do TUI proferido em processo no qual nem a 1.ª Recorrente, destinatária do acto administrativo impugnado, nem qualquer dos membros do seu órgão de administração foram partes.
… A 1.ª Recorrente estaria, pois, a ser punida, e punida em termos extremamente gravosos, no quadro de uma sentença proferida num processo-crime a que é estranha e no qual lhe não foi dado defender-se.
… É um postulado hoje generalizadamente aceite nas Ordens Jurídicas contemporâneas que o direito de defesa em processo penal - reconhecido pelo artigo 29.º da Lei Básica - se estende aos procedimentos administrativos que desemboquem em actos administrativos de cariz sancionatório.
… Não tendo sido assegurado direito de defesa à 1.ª Recorrente (o qual não é satisfeito pelo simples exercício de audiência nos termos gerais), o presente acto é nulo por ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA.
    
    5.2. Não tem razão a recorrente.
    Não está em causa o direito à audiência prévia e ao exercício do contraditório, mas apenas um pretenso direito à defesa por acto punitivo.
    Afigura-se-nos rebuscado o raciocínio da recorrente.
    Que se trata de um acto ablativo, sem dúvida. Pretender ver na declaração da nulidade de um acto a aplicação de uma pena e invocar um direito à defesa em matéria criminal já se nos afigura exagerado.
    Na pureza dos princípios, é verdade que só pode ser punido quem foi julgado no respectivo crime, o que resulta dos princípios estruturantes do Processo Penal do princípio da legalidade e do acusatório. Mas já nada impede que se retirem efeitos colaterais de uma dada decisão condenatória num outro processo ou procedimento de natureza administrativa, na certeza de que aí não pode ser negada a possibilidade de defesa da parte interessada em contraditar aquela decisão.
    
    5.3. A questão prende-se de alguma forma como os efeitos do caso julgado de uma decisão condenatória, importando atentar no disposto no art. 578º do CPC que estabelece:
    “A condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer acções civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infracção.”
    Por alguma razão, não obstante a pendência de outros processos denominados conexos em relação ao caso I que esteve na base da declaração de nulidade do acto sob apreciação, em relação aos sócios ou representantes da recorrente que - sendo que a recorrente, enquanto pessoa colectiva, nunca podia estar naquele processo, face ao art. 10º do Código Penal -, não se poupou a esforços, no âmbito deste recurso contencioso, em tentar ilidir aquela presunção, tanto assim que, não obstante as delongas que essa tentativa implicou, não deixou este Tribunal de deferir todas as diligências solicitadas, incluindo a expedição de uma carta rogatória a Portugal, com todos os custos inerentes para a celeridade da Justiça, em vista da satisfação desse desiderato.
    Não pode, pois, a recorrente invocar uma punição pela qual não teve oportunidade de se defender. E sobre a defesa no procedimento adiante curaremos.
    5.4. Tal como o TUI já afirmou, “Quer dizer, há que afastar as águas. A declaração de nulidade do despacho de 6 de Outubro de 2005 não constitui uma sanção para o interessado no procedimento administrativo, por ser ou deixar de ser corruptor activo.”17
    5.5. Por outro lado, o acautelamento dos interesses do Estado no âmbito do processo-crime pendente não impõe que a declaração de nulidade da homologação dos pareceres da Comissão de Terras aguarde pelo respectivo desfecho,18 sendo diferentes as razões em que se movem os interesses penais e os interesses administrativos.
    5.6. Por último, mas não menos importante, não há punição alguma de natureza criminal ou outra que resulte do processo-crime que esteve na base do acto que declarou nula a autorização de transferência da titularidade da concessão, pelo que a recorrente nele não interveio nem tinha que intervir.

6. Do erro nos pressupostos de direito por desrespeito dos limites do caso julgado - ponto 2 da Informação 192/DSODEP/2012 e pontos 4, 5, 7, 8, 9, 10, 12, 15, 17, 18, 29, 32 do Relatório
6.1. Alega a recorrente que toda a factualidade e fundamentação do acto recorrido assentam nos factos e conclusões constantes do acórdão do TUI de 31 de Maio de 2012, proferido no âmbito do processo-crime n.º 37/2011, em que era apenas arguido o ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas, I, e no qual este foi condenado por crimes de corrupção para a prática de facto ilícito.
… O acto recorrido limitou-se a dar como certos e incontestáveis os factos descritos no acórdão em causa, não tendo havido, quanto a essa matéria, qualquer fase de actividade instrutória específica do procedimento administrativo conducente à emissão do acto ora impugnado.
… A 1.ª recorrente não foi parte do processo-crime em causa, não tendo tido qualquer possibilidade de se defender ou de contrapor os factos que, relacionados com o seu processo de selecção para aquisição dos Lotes, ali foram imputados ao arguido e que foram invocados apenas do ponto de vista da responsabilidade criminal daquele.
… Certo é, porém, que, em face dos limites objectivos e subjectivos do caso julgado do aludido acórdão, a Administração não poderia simples e automaticamente extrair daquele - como fez o acto impugnado - os factos e os efeitos lesivos para a 1.ª recorrente, que não participou no processo judicial em causa.
… Pelo que, ao dar como certos os factos constantes do Acórdão do TUI num processo-crime em que a recorrente não foi parte e ao aplicá-los automaticamente ao procedimento administrativo, o acto recorrido viola os limites objectivos do caso julgado, o que consubstancia um vício de violação de lei, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais.

6.2. A esta questão já se respondeu no ponto precedente.
    O artigo 578º do CPC dá uma boa resposta à preocupação da recorrente e dele se retira que os pressupostos de facto que são subjacentes a uma decisão condenatória podem presuntivamente valer contra terceiros, desde que a estes seja dada oportunidade de o contraditarem, o que foi feito.
Sobre os efeitos positivos externos do caso julgado em processo penal, diz Germano Marques da Silva: "A problemática dos efeitos positivos do caso julgado pode, porém, ser colocada em termos mais amplos ( ... ). Trata-se de determinar em que medida a declaração na sentença da verificação ou não de certos factos constitutivos dos crimes tem eficácia noutros domínios do direito (civil, administrativo, laboral, fiscal, etc.). Uma vez que a lei penal nada nos diz sobre os efeitos do caso julgado e porque entendemos ser aplicável subsidiariamente a lei processual civil, temos que considerar que os efeitos do caso julgado são apenas os efeitos da decisão. Sendo assim, como nos parece ser, os factos considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além das contidas na decisão final, salvo expressa previsão da lei em contrário" 19
A reforma do processo civil operada em 1995/96 e que em boa parte o CPC de Macau acolheu, neste particular, retomou o regime constante do CPP 29, mas, por exigências decorrentes do princípio do contraditório, retirou à decisão penal condenatória a eficácia erga omnes que o artº. 153º CPP 29 lhe atribuía.
A definição da eficácia probatória extraprocessual legal da sentença penal condenatória ou absolutória transitada em julgado é feita pelo estabelecimento duma presunção ilidível da existência dos factos em que a condenação se tiver baseado, ou, simetricamente, em caso de absolvição, da inexistência dos factos imputados ao arguido.
Essa presunção é invocável em relação a terceiros, isto é, em relação aos sujeitos de acção de natureza civil ou administrativa em que se discutam relações jurídicas dependentes da ou relacionadas com a prática da infracção que não tenham intervindo no processo penal.20
    Não se verifica, pois, qualquer violação dos limites do caso julgado, até porque, para além das razões já invocadas, em direito processual penal não se pode falar de partes, de causa de pedir ou pedido, como acontece no processo civil.21

7. Erro de direito na aplicação do artigo 122.°, n.º 2, alínea c) do CPA
7.1. A este propósito alega a recorrente:
… No caso em apreço, foi declarada a nulidade dos actos do Chefe do Executivo, de 17 de Março de 2006, através dos quais foram homologados os Pareceres da Comissão de Terras n.ºs 23/2006, 24/2006, 25/2006, 26/2006 e 27/2006, todos de 16 de Março de 2006, no âmbito do procedimento administrativo de transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos Lotes, bem como a revisão da concessão e aprovação das novas minutas dos contratos.
… Isto não obstante os alegados actos que constituíram crime terem sido praticados pelo então Secretário para os Transportes e Obras Públicas muito antes e fora do procedimento administrativo onde foram praticados os actos agora declarados nulos.
… Assim, no caso em apreço, não há coincidência entre o acto declarado nulo e o acto objecto de crime, como não há coincidência entre o autor do acto declarado nulo e o autor do alegado crime.
… A alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA aponta claramente para a identidade e coincidência entre o acto administrativo nulo e o acto que constitui crime, e necessariamente, para a identidade entre o autor do acto administrativo nulo e o autor do crime - daí dizer acto cujo objecto constitua crime.
… Não havendo essa identidade de sujeitos e actos, não há que aplicar esse preceito legal, sendo indisputável que a declaração de nulidade dos actos autorizativos contidos no acto recorrido fundada na alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA assenta, no mínimo, numa interpretação extensiva do preceito.
… Assim, o sentido literal que directamente decorre do texto legal do preceito invocado não comporta a situação que determinou a declaração de nulidade dos referidos actos autorizativos. Com efeito, o preceito fulmina com a nulidade os actos administrativos cujo objecto constitua crime, o que manifestamente não sucedeu no caso concreto.
… Como é reconhecido na própria Informação que defendeu originariamente a nulidade dos actos autorizativos declarados nulos (a Informação n.º 149/DSODEP/2012, que submeteu os projectos de decisão a audiência prévia dos interessados), os «actos finais» do Chefe do Executivo «revelam-se adequados e correctos», isto é, tais actos não envolvem em si mesmo a prática de qualquer crime. E não envolvem a prática de um crime nem de um prisma subjectivo, pois que nenhum crime foi imputado ao Chefe do Executivo no âmbito destes procedimentos fosse por quem fosse, nem de um prisma objectivo, já que o objecto dos actos declarados nulos (i. e., o seu conteúdo ou, se se preferir, os efeitos jurídicos que os actos produziram) é objectivamente lícito e não está autonomamente tipificado como crime: trata-se de autorizar administrativamente a transmissão de um direito de conteúdo patrimonial da esfera jurídica de uma entidade privada para a esfera de outra no exercício de uma competência legalmente prevista, sendo que o objecto autorizativo destes actos nada tem em si de criminoso.
… Todavia, ainda que se reconheça que o objecto dos actos declarados nulos não constitui em si próprio um crime - o que conduz necessariamente à conclusão de que uma interpretação declarativa do artigo 122.°, n.º 2, alínea c) do CPA afastaria a nulidade dos actos autorizativos declarados nulos -, a verdade é que as decisões declarativas da nulidade ancoram-se numa interpretação extensiva do preceito, que supostamente avalizaria a nulidade dos actos finais do procedimento com fundamento no objecto criminoso de quaisquer actos preparatórios desses actos finais. E, por outro lado, essas decisões consideram que a actuação do antigo Secretário para os Transportes e Obras Públicas, no âmbito dos procedimentos de selecção da sociedade transmissária das concessões por arrendamento dos Lotes, configura uma actuação administrativa preparatória, acessória ou instrumental dos actos autorizativos finais praticados pelo Chefe do Executivo.
… A teleologia do preceito, a que se faz apelo para fundamentar a respectiva interpretação extensiva, visa tão-somente aclarar que são nulos não apenas os actos que constituam um crime em si mesmos, mas igualmente aqueles praticados por quem com a sua prática pretenda atingir um fim criminoso.
… Pode-se, portanto, afirmar com segurança, que apenas são reconduzíveis à previsão da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA os actos cuja prática envolva, na sua preparação ou execução, a prática de um crime pelo próprio autor do acto cuja nulidade se afirma.
… Diversamente, se o que está em causa é um acto administrativo cuja prática ou conteúdo são de alguma forma influenciados pela prática de um crime (como seria alegadamente o caso da situação em apreço) a que o autor do acto é totalmente alheio (como também é o caso), as repercussões jurídicas do crime no acto administrativo sob escrutínio, a existirem, hão-de achar-se nos institutos do erro de facto - no caso de o autor do acto final ser dolosamente induzido numa percepção errónea da realidade por conduta criminosa -, ou, mesmo, da violação do princípio da imparcialidade na sua dimensão objectiva associada a deveres positivos e negativos de ponderação de interesses - no caso de o autor do acto final ser criminosa mas inconscientemente induzido à ponderação de elementos de facto ou de direito que a previsão da norma atributiva da competência em exercício não o autoriza a ponderar.
… Em qualquer dos casos acima equacionados - «erro de facto» ou «violação do princípio da imparcialidade na sua dimensão objectiva» -, ainda que se tenha de reconhecer que o acto administrativo que padecesse das referidas patologias quedaria inválido por «vício de violação de lei», a verdade é que a sanção que o ordenamento jurídico reserva para tal invalidade é a sanção geral da «anulabilidade» do acto administrativo viciado e não a sanção excepcional da «nulidade».
… Resulta portanto claro, quanto ao caso em apreço, o erro jurídico em que incorreram os actos declarativos da nulidade contidos no Despacho recorrido: não sendo o autor dos actos declarados nulos criminalmente responsável, seja a que título for, pelos alegados «actos preparatórios» motivados por conduta criminosa que supostamente interferiram na prática dos actos autorizativos do Chefe do Executivo, a eventual invalidade de tais actos, a existir, não seria subsumível na previsão do artigo 122.º, n.º 2, alínea c) do CPA. Diversamente, teria tal invalidade de ser tratada no quadro do regime emprestado aos vícios de violação de lei acima referidos - «erro de facto» ou «violação do princípio da imparcialidade na sua dimensão objectiva» -, de onde resultaria que os actos autorizativos do Chefe do Executivo seriam meramente anuláveis.
… Ora, como já decorreram cerca seis anos desde a prática dos actos autorizativos em apreço, impõe-se concluir que os mesmos, ainda que se considerem inválidos, já há muito se terão consolidado na ordem jurídica por força do regime da anulabilidade que os torna insusceptíveis de anulação uma ver terminado o prazo para a respectiva impugnação contenciosa ou revogação - cfr. artigo 25.° do CPAC e artigos 125.º e 130.º do CPA.
… Em segundo lugar, e ao contrário do que é sustentado nos relatórios de suporte ao Despacho recorrido, não é a mera verificação de que a montante da prática de um acto administrativo existe um acto - acessório, preparatório ou instrumental - que envolva a prática de um crime, para automaticamente se poder fulminar com a nulidade o acto final do procedimento em causa.
… Em terceiro lugar, as informações de suporte ao despacho recorrido assumem acriticamente que a actuação criminosa do anterior Secretário, materializada no favorecimento da sociedade transmissária no procedimento de consulta desenvolvido pelas Transmitentes, releva no âmbito do procedimento administrativo tramitado para a outorga das autorizações, podendo ser reconduzida a uma espécie de «acto preparatório» dos actos administrativos que puseram termo ao procedimento. Nada mais errado.
… Não é juridicamente aceitável reconduzir a actuação criminosa do anterior Secretário para os Transportes e Obras Públicas a um «acto administrativo» endoprocedimental, mesmo que preparatório dos actos autorizativos finais que entretanto foram produzidos, de modo a sustentar que estes actos autorizativos são nulos por se terem baseado em actos antecedentes que envolviam a prática de um crime. Como é natural, a aferição da validade dos actos autorizativos em causa no quadro de uma interpretação extensiva da previsão da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA tem de limitar-se à análise da idoneidade dos actos praticados dentro do próprio procedimento e depois de esse se ter iniciado, nomeadamente, no caso concreto, nos pareceres favoráveis da Comissão de Terras, entre outros actos instrutórios ou preparatórios.

7.2. Entramos aqui numa das questões porventura mais sensíveis do presente recurso e se prende com a interpretação do artigo 122º, n.º 2, c) do CPA : “São, designadamente, actos nulos: (…) c) Os actos cujo objecto seja impossível, ininteligível ou constitua um crime;”

Trata-se, no entanto de questão já superiormente decidida pelo V.º TUI.

Sobre esta particular questão já este Colectivo se chegou a pronunciar, neste TSI, no processo n.º 731/2009, a propósito de invocada falta de audiência prévia em relação a um acto administrativo com contornos próximos do presente, ainda que com douto voto de vencido:
    « (…)
    Defendem ainda os recorrentes a tese de que o acto praticado pelo Exmo Senhor ex-Chefe do Executivo não constitui nem tem ligação com qualquer crime, pelo que não faz sentido considerar este acto nulo.
    Ou seja, tendo o crime incidido sobre um mero acto trâmite do procedimento de troca de terrenos, da autoria do então Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, o acto final do Senhor ex-Chefe do Executivo, objecto do presente ataque contencioso, resultaria inexoravelmente incólume.
Contrapõe a Administração no sentido de que, ainda que em abstracto a decisão primitiva e declarada nula fosse a adequada e correcta (na medida em que constituía um meio de a Administração adquirir prédios situados num "conjunto classificado"), a mesma sempre seria irremediavelmente ilegal, pois a invalidade por vício absoluto de um acto preparatório não pode deixar de se projectar no acto final.
Não cabe agora apreciar dos fundamentos da declaração de nulidade ou da falta deles.

Temos, porém, presente a anotação de Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho22, ,de que devem incluir-se no âmbito da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.° do CPA "todos os actos que envolvam a prática de um crime, mesmo que o seu objecto não gere responsabilidade criminal. Assim, são nulos os actos que assentam em pressupostos ou motivos criminosos ou cuja finalidade constitua um crime (v.g. actos praticados por corrupção)", entendimento partilhado por Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e J. Pacheco de Amorim,23 , ao considerarem abrangido "na parte final desta alínea c) - mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao "objecto" do acto administrativo - também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime. Estão nessas circunstâncias, por exemplo, (...) os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção".
    Não deixamos também de ter presente a autonomia da Administração e a preservação e prossecução do interesse público nas suas decisões.
    Mas também temos presente o disposto no artigo 578º do CPC que dispõe que a condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer acções cíveis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infracção.
    Isto apenas para acentuar que não podemos passar adiante sem que se respeitem as regras procedimentais devidas de forma a integrar todo o processo com todos os subsídios para a tomada de posição mais adequada que pode muito bem ser até aquela que foi tomada.
    (…)
    Parte-se assim do pressuposto de que sendo o acto efectivamente nulo apenas haveria que constatar essa nulidade, que como é sabido se impõe a todos independentemente de declaração expressa nesse sentido, pelo que a falta de audiência dos recorrentes se mostrava irrelevante visto não poder em caso algum alterar o sentido do acto, degradando-se esta formalidade, neste caso, em não essencial.
    Esta posição, reconhece-se, não deixa de ter até apoio nalguma Jurisprudência comparada.24
    Mas será assim?
    Desde logo em sede de actos vinculados aquele entendimento não é pacífico, contrapondo àquela decisão da Jurisprudência comparada, outras que vão em sentido contrário.
    Assim, “não basta, para concluir pelo carácter não invalidante da omissão de audiência imposta pelo art. 100º do CPA (audiência prévia) que o acto tenha sido proferido no exercício de poder vinculado.”25
    Em termos meramente comparados, é esta a posição do Pleno da secção do CA da STA.
    Não estando sós no entendimento da necessidade de audiência prévia na situação presente, a questão que, independentemente do mais, desde logo se coloca, é se estamos perante um caso de decisão absolutamente vinculada.
    Na certeza de que mesma a Jurisprudência que vai naquele sentido é clara enquanto afirma a inevitabilidade jurídica do acto impugnado.26
    Não se acompanha a posição que vai no sentido de considerar sequer que haja uma inevitabilidade no caso em apreço.
    Ainda antes disso, entendemos que a previsão da al. c) do n.º 1 do art. 122º do CPA já citado não abarca a situação sub judice.
    São nulos os actos cujo objecto constitua um crime.
    Qual é o acto? O do Exmo Senhor ex-Chefe do Executivo.
    Qual é o crime? Foi o da corrupção passiva de um ex Secretário que a montante recebeu dinheiro no âmbito do procedimento que conduziu à troca do terreno.
    Ora, é manifesto que o crime praticado está fora do objecto do acto impugnado.
    Que está relacionado, sem dúvida, mas este relacionamento parece ir para além da previsão normativa, mesmo na asserção mais ampla da doutrina já acima citada que atende a um envolvimento entre o autor do acto e o crime praticado.27
    Torna-se necessário que o que se decide em si constitua um crime, ou num entendimento mais amplo que esse envolvimento implique uma viciação do acto.
    (…)»
Como dissemos já, esta posição não veio a ser sufragada superiormente, pelo que se entende mais adequado ser de acolher a posição do TUI, ainda que não constituindo jurisprudência uniformizadora, tendo-se vertido ali, no Proc. 11/2012, de 25/4/2012, a seguinte argumentação, relativamente à interpretação do artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo, designadamente, de forma a apurar se um acto administrativo que tenha sido determinado por parecer motivado por acto de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, é nulo para efeitos da mencionada norma:
«O objecto do acto administrativo é a produção de efeitos jurídicos no caso concreto, é o efeito jurídico criado ou declarado. No caso dos autos, o objecto do despacho de 6 de Julho de 2006 que, homologando parecer da Comissão de Terras, aprovou a troca do direito de propriedade de dois prédios pertencentes a A e B, na zona do [Endereço (1)] e [Endereço (2)], pela concessão para arrendamento, de terrenos pertencentes à Região Administrativa Especial de Macau, situados na Penha, não constitui qualquer crime, pelo que, em termos literais, poderia parecer não ter aqui aplicação a alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo.
Contudo, a doutrina tem feito uma interpretação extensiva da norma, que é totalmente justificável. MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS sustentam que: “A expressão «actos administrativos que impliquem a prática de um crime» tem que ser objecto de interpretação extensiva: não estão em causa apenas as situações em que o acto administrativo em si preenche um tipo penal, mas todas aquelas em que o acto administrativo envolva, na sua preparação ou execução, a prática de um crime.
  Exemplos de actos administrativos que implicam a prática de crimes: um acto administrativo de conteúdo difamatório para o seu destinatário; um acto praticado sob extorsão; uma ordem dada por um superior a um subalterno para que exerça violência física injustificada sobre pessoas”. E MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM escrevem: “Consideramos abrangidos na parte final desta alínea c) – mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao «objecto» do acto administrativo – também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime.
  Estão nessas circunstâncias, por exemplo, os actos que se fundem em documentos administrativamente falsificados (actas ou convocatórias forjadas, etc) ou os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção”. Pois bem, tendo-se o despacho de 6 de Julho de 2006 baseado em parecer, que foi obtido por acto de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, considera-se que ele estava, efectivamente, ferido de nulidade. (…) Prova da corrupção passiva
Por último, há que decidir se, tendo-se o acto recorrido – que declarou a nulidade de outro anterior – baseado em condenação judicial, transitada em julgado, do agente que foi passivamente corrompido, condenação essa que não abrangeu o corruptor activo, é para a Administração um acto vinculado, ou se existe no acto algum momento discricionário.
A mencionada condenação judicial apenas abrangeu o corrupto passivo visto que este tinha um foro próprio, tendo o corruptor activo sido, posteriormente, julgado por um Tribunal de 1.ª Instância.
Afigura-se-nos que no Acórdão recorrido se faz uma ténue, mas visível confusão, entre a questão de saber se a Administração devia considerar provada a prática do crime, com a questão da vinculação ou discricionariedade do acto administrativo de 28 de Maio de 2009.
Ora, tendo o corrupto passivo sido condenado judicialmente, por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, está definitivamente provado – para sempre e erga omnes - que o despacho de 6 de Julho de 2006 se baseou em parecer, que foi obtido por acto de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, porque tais factos se provaram naquela sentença.
É inteiramente irrelevante a questão de saber se o Acórdão de 22 de Abril de 2009, do Tribunal de Última Instância, que condenou ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas, vincula ou não A e B.
O que interessa é que está definitivamente assente que na base do acto administrativo está a prática de um crime de corrupção, pelo qual foi condenado o corrupto passivo. Isso inquina irremediavelmente o despacho 6 de Julho de 2006. Para este efeito, pouco importa quem foi o corruptor activo ou se veio a ser condenado, como efectivamente acabou por ser, embora, por estar em fuga, a respectiva condenação ainda não lhe foi notificada e, por isso, ainda não transitou em julgado (facto que é do conhecimento geral). Quer dizer, há que afastar as águas. A falta de audiência do interessado não constitui uma sanção para este, por ser ou deixar de ser corruptor activo. Mas, para a Administração, a condenação judicial definitiva, do corrupto passivo, prova que o acto administrativo foi inquinado por corrupção, independentemente de quem foi o corruptor activo que, no limite, poderia até não ser o interessado no procedimento administrativo. Face à interpretação que atrás fizemos do artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo, a declaração de nulidade do despacho 6 de Julho de 2006 era, para a Administração, um acto vinculado.»
    Esta posição consentânea com o decidido nos processos n.º 48/2012 do TUI e n.º 663/2009 do TSI foi aliás propugnada pela própria entidade recorrida no âmbito do Acórdão proferido no processo n.º 731/2009, onde se consignou: ”Seria profundamente chocante aceitar que um acto criminoso pudesse tornar-se num acto administrativo válido pela simples circunstância de o tribunal não ter emitido nenhum juízo de ilicitude administrativa ou pelo facto de a ilicitude penal não extravasar para o âmbito administrativo", tendo ainda considerado que, "Se assim fosse, dificilmente poderia um orgão administrativo aplicar a parte final da alínea c) do n.º. 2 do Artigo 122º do CPA".

7.3. O acto administrativo tem como pressuposto de facto a realidade dada como provada e vertida no Proc. n.º 37/2011 do TUI, (cfr. artigos 47º, 48º, 49º, 50º, 64º, 70º a 74º, 83º a 88º ), aí se dando como assente a conduta ilícita do ex-Secretário para a selecção da proposta vencedora e para a transmissão da concessão, viciando o acto que autorizou a substituição do concedente que recebeu suborno de vinte milhões para esse efeito.
      - Na verdade, o acto administrativo recorrido tem como pressuposto de facto os factos provados naquele acórdão n.º 37/2011 do TUI, designadamente:
“47
Em meados do ano de 2004, o arguido I referiu a J que ele pretendia vender os terrenos designados por lote 1C, lote 2, lote 3, lote 4, lote 5, sitos na ilha da Taipa, no cruzamento entre a Estrada da Ponta da Cabrita a Avenida Wai Long, concedidos respectivamente às “D — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, “E — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, “F — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, “G — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” e “H — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, e indicou J para contratar “Z Hong Kong” para realizar a avaliação de preço dos referidos terrenos.
48
Em fins do ano de 2004, tendo tomado conhecimento de que a “D — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, “E — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, “F — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, “G — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” e “H — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” pretendiam vender os aludidos terrenos, ZA e ZB decidiram adquiri-los.
49
Para adquirir com sucesso os aludidos terrenos, ZA e ZB decidiram aproveitar os poderes e as influências do arguido I como Secretário para os Transportes e Obras Públicas, para este interferir nos procedimentos administrativos das referidas empresas relativos aos procedimentos da realização do concurso público e da avaliação de propostas.
50
Para isso, mediante a apresentação de ZC, comerciante de Macau, ZA e ZB conseguiram contactar com o arguido I e acabaram por combinar com o arguido I que iria este interferir, com seus poderes e influência, nos procedimentos da venda dos aludidos terrenos, para que ZA e ZB pudessem adquirir os referidos cinco terrenos, enquanto ZA e ZB iriam pagar ao arguido I um montante de HKD$20.000.000,00 como retribuição.
64
Em 24 de Junho de 2005, ZA e ZB combinaram que ZB iria comprar, em nome da “ZD Limited”, 29,99% das acções da “A Limited” registada na Ilha Virgens Britânicas enquanto ZE, subordinada de ZB, ficaria com os restantes 70,01% das acções daquela empresa em nome da “ZF Limited”, sendo nomeada como a administradora da “A Limited”.
70
Porém, devido à interferência do arguido I que queria adjudicar a venda à “A Limited”, a Comissão de Apreciação de Propostas chegou a propor, com base num alegado princípio de “aproveitamento dos actos já praticados”, adjudicar directamente a transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos terrenos à “A Limited” representada pela “ZG Ltd.”, que apresentou a proposta de preço mais alto.
71
Em 5 de Agosto de 2005, a “N — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” convocou assembleia de sócios, decidindo transferir os direitos de arrendatário sobre os supramencionados lotes 1C, 2, 3, 4 e 5 localizados no cruzamento entre a Estrada da Ponta da Cabrita e a Avenida Wai Long da Taipa para a “A Limited”, representada pela “ZG Ltd.”.
72
Em 28 de Setembro de 2005, para pagar ao arguido I a aludida retribuição no valor de HKD20.000.000,00, ZA e ZB combinaram o seguinte: ZB mandou a sua subordinada ZE, em representação da “A Limited”, assinar um acordo sobre a prestação de serviço de consultadoria com ZH, subordinado de ZB e titular da “ZI Investment Trading Co. Limited”, cujo teor é: a “ZI Investment Trading Co. Limited” presta à “A Limited” serviços de consultadoria sobre o projecto de planeamento, a concepção e a elaboração do desenho dos aludidos cinco terrenos, pelo montante de HKD20.000.000,00, quantia essa, de facto, foi a retribuição a pagar ao arguido I.
73
De facto, a “ZI Investment Trading Co. Limited” nunca prestou à “A Limited” quaisquer serviços de consultadoria sobre o projecto de planeamento, a concepção e a elaboração do desenho dos aludidos cinco terrenos.
74
Em 15 de Outubro de 2005, a “A Limited” assinou respectivamente com a “D — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, a “E — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, a “F — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, a “G — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” e a “H — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” os contratos-promessa da transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos aludidos cinco terrenos.
83
Em 5 de Janeiro de 2006, ZA comprou, em nome da “ZJ Limited”, todas as acções da “A Limited” detidas pela “ZF Limited” de que ZB é o titular (ou seja, 70,01% das acções) e tornou-se o administrador dessa empresa.
84
Em 17 de Fevereiro de 2006, a “D — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, a “E — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, a “F — Sociedade de Fomento Predial, Limitada”, a “G — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” e a “H — Sociedade de Fomento Predial, Limitada” pediram à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes a autorização da transmissão da concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos respectivamente designados por lote 1C, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5, sitos na Ilha de Taipa no cruzamento entre a Estrada da Ponta da Cabrita e a Avenida Wai Long favor da “A Limited”.
85
Em 2 de Março de 2006, o Departamento de Gestão de Solos da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes elaborou a Informação n.º 045/DSODEP/2006, na qual propôs deferimento ao pedido de transmissão da concessão, por arrendamento, dos cinco terrenos respectivamente designados por lote 1C, lote 2, lote 3, lote 4 e lote 5, sitos na Ilha de Taipa no cruzamento entre a Estrada da Ponta da Cabrita e a Avenida Wai Long a favor da “A Limited”.
86
No dia seguinte, o arguido I proferiu despacho de concordância na aludida Informação.
87
Visto que o arguido I já autorizou a aludida Informação elaborada pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, a Comissão de Terras deliberou, em 16 de Março de 2006, não se opor ao deferimento ao pedido de transmissão dos referidos cinco terrenos.
88
……, o arguido I propôs ao Chefe do Executivo o aludido pedido de transmissão da concessão dos cinco terrenos a favor da “A Limited” e tal pedido acabou por ser autorizado pelo G -
7.4. Isto constitui um crime que influencia e determina directamente a prática do acto que se veio a declarar nulo. O acto que autorizou a transmissão, dir-se-á, não é, em si, um crime - não o deixando de ser o acto que é seu pressuposto e que integra a própria configuração típica do crime, “prática de acto mediante suborno”-, mas foi indubitavelmente praticado em função do cometimento de um crime de corrupção, perspectivando-se aqui a intervenção do Secretário que vai estar na génese e conformar, a jusante a decisão do Chefe do Executivo.
    Sobre a projecção dos efeitos do caso julgado em sede penal, sobre a validade de um acto administrativo que se tenha verificado ser ilegal, é entendimento pacífico das instâncias jurisdicionais da RAEM, maxime do TUI, que a existência de crime de corrupção para a prática de acto ilícito prova de forma definitiva também a ilegalidade do próprio acto determinado por esse crime.
    Mostra-se inequívoco que o conteúdo do Acórdão do TUI n.º 36/2007 é absolutamente idóneo a enformar e dar corpo à ilegalidade do acto que autorizou a referida transmissão.
    
    7.5. Sobre o dispositivo do artigo 122º, n.º 2, c) do CPA é também hoje pacífico na doutrina comparada que esta norma legal integra também os actos que sejam praticados mediante corrupção.
    Assim, consideram os autores já acima referidos que se incluem na categoria de actos administrativos nulos por a sua prática envolver o cometimento de crime, "por exemplo, os actos que se fundem em documentos administrativamente falsificados (actas ou convocatórias forjadas, etc.) ou os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção."
    Sobre o regime e efeitos da nulidade, dispõe o artigo 123º, n.º. 1 do CPA que "O acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade."
    Assim, sendo patente que (i) o acto foi praticado na sequência e por causa de um crime de corrupção e (ii) ficou provado erga omnes (nas palavras do próprio TUI) ter existido a referida corrupção e a correspondente ilegalidade do acto, o acto que aprovou a transmissão da concessão é nulo ope legis, sem necessidade de declaração judicial autónoma para o efeito.
    
    7.6. Claro que sempre se pode alvitrar que o acto administrativo impugnado, mesmo sem o acto de corrupção, não deixaria de ser praticado. Bom, sobre isso, o que podemos dizer é que não se sabe e, portanto, trabalhar sobre uma possibilidade é mera especulação.
    Esta nulidade projecta-se de forma absoluta sobre todos os actos a jusante do referido acto de aprovação.
    Importa distinguir entre actos a jusante e o contrato de concessão a montante, atento o disposto no artigo 172º, n.º 1 do CPA, "Os contratos administrativos são nulos (...) quando forem nulos (...) os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração", o que corresponde à consagração legal do chamado "princípio da invalidade derivada ou consequencial", ao abrigo do qual os contratos administrativos serão inválidos (nulos ou anuláveis) na medida em que sejam inválidos (nulos ou anuláveis) os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração 28
    Também, no caso, as águas só ficam inquinadas depois da fonte poluidora, isto é, só a relação jurídica contaminada com a prática do crime deve ser expurgada.

7.7. Por força do disposto no art.º 143º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras) de 5 de Julho, aplicável ao tempo, a substituição da parte no processo e a transmissão de situações resultantes da concessão dependem de prévia autorização da entidade competente para o deferimento da concessão, donde os direitos resultantes da transmissão da concessão dos 5 terrenos em causa só terem efeito após a autorização da RAEM, ou seja, o objectivo a alcançar com a corrupção passiva do ex-Secretário I para a prática de acto ilícito é necessariamente a transmissão dos direitos derivados da concessão dos 5 terrenos em causa.
Apesar de a autorização da transmissão de direitos e a alteração da concessão não serem realizadas pelo ex-Secretário I, mas sim pelo Chefe do Executivo, a decisão feita por este fundamentou-se no processo anterior com pressupostos e motivos de crime.
Como referem Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho, deve-se incluir no âmbito da alínea c) do n.º 2 do art.º 122.º do Código do Procedimento Administrativo “todos os actos que envolvam a prática dum crime, mesmo que o seu objecto não gere responsabilidade criminal. Assim, são nulos os actos que assentam em pressupostos ou motivos criminosos ou cuja finalidade constitua um crime (v.g. actos praticados por corrupção) ”.29
Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e J. Pacheco de Amorim têm o mesmo entendimento (vd. referência supra).30

7.8. No mesmo sentido a jurisprudência de Macau (cfr. Acórdãos n.º 11/2012 e n.º 48/2012 do TUI, e Acórdão n.º 663/2009 do TSI).
    
    7.9. Assim, sendo inequívoco que o acto de que dependeria a aprovação da transferência do concessionário - o acto de aprovação do mesmo - é nulo nos termos que se expuseram supra, é igualmente claro que esse acto vai se não fulminar o conteúdo do contrato de concessão, paralisa-o no que respeita ao titular que foi ilicitamente autorizado a encabeçá-lo e a exercer os direitos dele advenientes, como é a situação da recorrente.
    
8. Erro nos pressupostos de facto
Põe a recorrente em causa os pressupostos de facto considerados "RELEVANTES" para a tomada de posição em causa.
Que não correspondem à verdade, tendo sido erroneamente dados como ocorrendo no caso concreto.
Vejamos, então:
8.1. Da alegada intenção do ex-Secretário de vender os Lotes
… Depois de o acto recorrido afirmar, no ponto 5 do Relatório, que "corria o ano de 2004 quando o então SOPT manifestou intenção de vender os terrenos concedidos” às transmitentes, dando a entender que todo o processo de venda dos Lotes se iniciou por vontade daquele, não seria verdade que o processo de transmissão dos Lotes se tenha iniciado por vontade do então Secretário.N
… As transmitentes, bem como a N - Sociedade de Fomento Predial, Limitada ("N"), sociedade encarregue da gestão colectiva dos Lotes, eram sociedades comerciais por quotas de responsabilidade limitada, constituídas em 1995, tendo, todas e cada uma delas, por sócios o então Território de Macau, a T, S.A.R.L. ("T"), a S - Sociedade do S, S.A.R.L. ("S") e a ZK, Limitada ("ZK"), que detinham, respectivamente, 88%, 5%, 5% e 2% do capital social de cada uma daquelas sociedades - conforme certidões comerciais que se juntam como Docs. n.ºs. 8 a 13 e se dão por integralmente reproduzidas.
… A decisão de transmissão dos direitos resultantes da concessão às transmitentes, da então concessionária, a S, deveu-se à necessidade de equilibrar as contas, então negativas, daquela, sendo do conhecimento público que os Lotes estavam destinados a ser, mais tarde e de novo, vendidos a terceiros para desenvolvimento imobiliário, com vista ao financiamento do futuro aeroporto.
… Depois de relatar a evolução dos acontecimentos que conduziu à transmissão da titularidade dos terrenos, conclui que a transmissão dos direitos resultantes da concessão por arrendamento às transmitentes verificou-se por escritura pública de 15 de Novembro de 1999, data em que I não era sequer Secretário-Adjunto do Governador do então Território de Macau e que a intenção de venda dos Lotes era muito anterior a 2004 e já estava projectada desde a sua aquisição por parte das Transmitentes e, como tal, partiu da vontade das suas sócias, como forma de solucionar a grave situação financeira em que se encontravam, e não por vontade própria do então Secretário.

8.2. Sobre esta alegação, o que podemos dizer?
De importante, três coisas: uma, é a de que do ponto 5, 6 e 7 do Relatório acima transcrito não resulta exactamente o que a recorrente afirma; daí resulta que, em 2004, as transmitentes já eram detentoras da concessão; a segunda, é a da irrelevância desses factos; por último, todo o historial que levou à transmissão dos terrenos concedidos à S não destrói o facto vertido no sentido de que o ex- Secretário tinha a intenção de autorizar a transmissão da concessão à Sociedade A.
    Já havia uma intenção de venda, até antes de 1999, dos direitos resultantes das concessões a terceiros, intenção essa, como é óbvia, que não era a do Eng.º I, o que resulta bem patente do depoimento do Eng.º J. (cfr. fls. 1214).
9. Do alegado benefício da 1.ª Recorrente em detrimento das restantes duas concorrentes
9.1. Alega-se que diz ainda o acto recorrido, entre outros, nos pontos 6, 12 ou 18 que "a proposta vencedora do concurso por convite foi beneficiada pela Administração, tendo tido conhecimento do concurso largos meses antes das duas restantes, que apenas tiveram 10 dias para preparar e apresentar a proposta", ou que o "crime praticado determinou o acesso à concessão de uma sociedade, através da subversão das regras jurídicas aplicáveis, que desde logo inquinaram o processo de escolha da sociedade transmissária".
… No entanto, não se aceita, nem é verdade que a 1.ª Recorrente tenha sido beneficiada em relação às outras duas concorrentes ou que o processo de escolha da transmissária tenha sido, de alguma forma, inquinado.
… Isto porque foi decidido nas Assembleias Gerais das Transmitentes e da N de 16 de Junho de 2005 proceder ao convite a três empresas para apresentarem uma proposta para aquisição do conjunto dos direitos resultantes da concessão por arrendamento dos Lotes - conforme melhor consta das cópias que ora se juntam como Doc. n.º 16 e aqui dão por reproduzidas.
… Essas três empresas eram mediadoras imobiliárias de renome internacional, sendo que a ZG ("ZG") e a ZL se apresentariam sozinhas a concurso, enquanto a ZM seria, desde logo, acompanhada pela T, e receberam as cartas com o convite para o referido concurso no próprio dia 16 de Junho de 2005 - conforme cópias das mesmas que ora se juntam como Doc. n.º 17 e aqui dão por reproduzidas.
… Já era do conhecimento público a intenção das transmitentes de vender os Lotes, pois a sua situação financeira negativa era notória e, num meio pequeno como Macau, já se sabia que aquelas tinham encomendado Relatórios de Avaliação desses terrenos com esse propósito.
… A ZG e a ZL foram, antes da data em que receberem as cartas para o concurso, antecipadamente contactadas pela N sobre o seu eventual interesse no recebimento dos convites, de forma a dar-lhes tempo para sondarem potenciais interessados, uma vez que as convidadas são apenas reputadas empresas internacionais de intermediação imobiliária.
… Tal como a ZL, a ZG encetou, de imediato e ainda antes de receber o convite, contactos com vários empresários do ramo do investimento e da construção imobiliários, incluindo a 1ª Recorrente, de modo a ter tempo de fazer a selecção e a preparar a proposta.
… A sondagem prévia foi, no entanto, desnecessária, para a outra convidada, a T (associada à ZM), que era, nem mais, sócia das Transmitentes e tinha estado directamente envolvida nos processos deliberativos de avaliação e transmissão dos Lotes.
… Ao contrário do decidido para as mediadoras ZG e ZL, foi deliberado nas aludidas reuniões das Transmitentes vincular a ZM à T, ou seja, enquanto que as primeiras tinham a liberdade de escolher os investidores proponentes, a ZM ficou, desde logo, associada a uma das sócias das sociedades vendedoras.
… A T sabia da grave situação financeira das transmitentes; a T teve acesso a todos projectos e estudos arquitectónicos feitos anteriormente para os Lotes; a T teve acesso aos Relatórios de Avaliação feitos pela Z; a T esteve presente em todas as Assembleias Gerais relacionadas com tal transmissão, tendo inclusivamente votado a seu favor como candidata para participar no concurso.
… Para além disso, também outra sócia das transmitentes, a ZK, foi indirectamente beneficiada noutra situação relacionada com a projectada operação de re-transmissão dos lotes de terreno adquiridos à S, através da adjudicação directa do Lote 1b à sociedade ZN S.A. ("ZN"), que pertence ao mesmo grupo da ZK, e que partilham o mesmo administrador, o Sr. ZS, tal como consta das Actas das Assembleias Gerais de 16 de Junho de 2005 cfr. Doc. n.º 16.

9.2. Analisando todas as provas produzidas nos autos, não se mostra abalado o facto essencial que se traduz no benefício da A em relação às restantes concorrentes.
Sem embargo da prova quanto às consultas por parte das transmitentes e à intervenção que as outras candidatas tiveram no processo de candidatura à transferência da concessão, esse benefício mostra-se comprovado na actuação do ex-Secretário que não deixou de receber prebendas à custa desse mesmo benefício ilegítimo.
Ainda que das testemunhas arroladas e ouvidas no processo, não tenha emergido um testemunho no sentido do atravessamento claro e directo do Secretário nos procedimentos instrutores junto dos órgãos técnicos chamados a pronunciar-se sobre o processo de transferência em curso, o certo é que é iniludível o papel do ex- Secretário na decisão que veio a ser tomada, tal como resulta do que vem provado no acórdão do TUI n.º 37/2011.
Não se deixa de referir, contudo, que, não obstante a comprovação do conhecimento do processo de transferência por parte de outros candidatos, não se sabe exactamente o momento em que a A teve conhecimento desse processo, a fim de se poder tomar posição sobre um conhecimento privilegiado dessa transmissão contratual
Acresce que o art. 56º, n.º 1, c) da Lei de Terras, então vigente, dispensava o concurso na transmissão das concessões, pelo que perde relevo o papel e os procedimentos encetados por outras candidatas à assunção da posição de transmissárias na concessão.
Faz-se prova de que foi o próprio Secretário que mandou fazer uma consulta a outras empresas.
A prova parece apontar, reconhece-se, no sentido de que os membros do júri não foram pressionados e que a proposta da recorrente até era a melhor, tendo sido até nesse sentido a proposta da Sra Dra K, mas isso não esgota todas as possibilidades e não exclui que não houvesse um benefício através de uma qualquer outra via no sentido de se criarem as condições para que a 1ª recorrente se viesse a posicionar em termos de indicar a melhor proposta, em termos de preço e em termos de plano urbanístico.
A resposta do Eng. J ao art. 157º é, a este propósito, bem esclarecedora: “O Secretário intervinha através de representantes da RAEM.A testemunha teve directivas do Secretário relativamente ao processo de transmissão. Dava as instruções antes das Assembleias. O Secretário não interveio na decisão do júri, tendo dado instruções para que se votasse favoravelmente essa decisão na Assembleia Geral.”
A prova que se nos apresenta é a prova oferecida pela recorrente, no sentido do afastamento da ilicitude do parecer que autorizou a transferência; só que essa prova não cobre todo o domínio de intervenção e de possibilidade de influência nas tomadas de decisão junto de outros sócios das transmitentes, tanto mais que uma das sócias das sociedades transmitentes, a T, já tinha manifestado a vontade de adquirir por ajuste directo os referidos lotes e talvez por isso mesmo se tenha partido para a consulta a três empresas, uma delas, a ZM, associada àquela.
Em suma, a prova apresentada não é de molde a infirmar a prova produzida no julgamento que decorreu no TUI, no sentido da comprovação da ilicitude da actuação que subjaz ao acto declarado nulo que pode ter passado ainda pelo desempenho e actuação de outros intervenientes.

9.3. De qualquer modo não deixaremos aqui de sublinhar que importa distinguir duas realidades. Uma, é a comprovação do crime de corrupção, com decisão transitada em julgado e quanto a ela não há qualquer erro nos pressupostos de facto. Foi em face dessa decisão condenatória que o acto de transmissão das concessões foi declarado nulo e não se pode transformar este processo num caso de recurso extraordinário de revisão de sentença penal, desde logo, por falta de legitimidade da interessada, ora recorrente, falecendo sempre os respectivos pressupostos dessa revisão. Outra realidade é a factualidade que subjaz àquele crime e que ora se visa pôr em crise, alegando-se que ela não corresponde à verdade, pelo que não pode ser oponível a quem não esteve naquele processo.
Cremos que o que releva aqui, para efeitos de extracção das devidas consequências, em nome até da unidade e harmonia do sistema e melhor interpretação do sentido e alcance do art. 122, n.º 2, c) é a primeira daquelas vertentes, não se compreendendo facilmente que os tribunais dissessem que um governante está preso porque é corrupto e a Administração ignorasse esse facto, ou até que outro tribunal viesse dizer que afinal não devia estar preso porque neste processo o crime não se comprovou.
Neste ponto já estamos a constatar a dificuldade e o melindre da situação que enfrentamos e desde logo nos confrontamos sobre qual a resposta a uma situação desta natureza. A situação passará a nosso ver pelo accionamento do instituto da responsabilidade civil se o lesado provar em sede própria os respectivos pressupostos, não estando uma acção deste teor talhada para esse efeito, não se podendo equiparar os meios probatórios do processo crime prosseguido pela entidade competente tendo em vista a perseguição e punição do crime com os de um recurso contencioso em que um interessado defende que esse crime não foi praticado.
Não obstante estas limitações, prossigamos com a análise da prova quanto ao apontado erro nos pressupostos de facto.
    Com isto estaremos a entrar no capítulo seguinte.
10. Da alegada intervenção do ex-Secretário nas deliberações das Transmitentes
10.1. … Os factos e imputações constantes dos pontos 4, 6 e 7 do Relatório seriam também erróneos, na medida em que não é verdade que a deliberação das Transmitentes de 31 de Maio de 2005 "não foi livremente determinada, tendo antes resultado da intervenção e determinação do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas",
ou que na "assembleia geral que teve lugar em 16 de Junho de 2005, conforme indicações e influência de I, na qualidade de Secretário para os Transportes e Obras Públicas, as concessionárias deliberaram emitir cartas convite a três empresas",
ou, ainda, que "em 5 de Agosto de 2005, por influência do então SOPT, I, as cinco sociedades deliberaram a venda dos terrenos à A".

   10.2. A alegada unanimidade, com excepção da posição da T, na medida em que interessada, não é incompatível com uma actuação prévia do Secretário em relação a essas decisões, toda a gente sabendo que as decisões importantes não se tomam no momento, antes existe todo um trabalho de “sapa” para que não haja surpresas, o que justifica, tantas vezes, os consensos e as unanimidades.
Com isto, não estamos a dizer que foi o que se verificou; apenas constatamos uma realidade que é possível ter-se verificado, pelo que o raciocínio desenvolvido pela recorrente não se mostra irrefutável.

11. Erro de direito segundo o qual o processo de escolha da transmissária constituiria uma fase do procedimento administrativo - pontos 21, 22, 23 e 24 do Relatório
11.1. É verdade que nos termos do artigo 56.º da Lei de Terras, está obrigatoriamente dispensado de concurso público a transmissão de situações resultantes de concessão anterior, como era o caso da transmissão à 1.ª recorrente.
… Logo, é a própria Lei de Terras que remete para o campo da autonomia privada a escolha da transmissária dessas situações, pelo que não seria verdade que quaisquer negociações particulares anteriores ao procedimento sejam importantes na conformação do procedimento, como alega o acto recorrido no ponto 24 do Relatório.
… Aliás, dos documentos constantes do procedimento administrativo nada aponta para a relevância das negociações estabelecidas entre as transmitentes e a 1.ª Recorrente, sendo apenas feitas meras referências genéricas "às negociações estabelecidas anteriormente", sem qualquer referência à consulta privada e à escolha em concreto da transmissária, a ora 1.ª recorrente, tal como se comprova da leitura dos considerandos n.º 3 dos Despachos nºs. 48 a 52/2006, bem como do ponto 5 dos Pareceres da Comissão de Terras n.os 23 a 27/2006.

11.2. Afigura-se contraditória esta argumentação. Então, se não eram necessárias essas “démarches”, o Secretário podia mais facilmente entregar a concessão a quem quisesse e não seria necessária tanta “mise en scéne”. O facto é que a partir do momento em que essas formalidades foram implementadas, elas não deixam de ser importantes. Nada há de estranho nesta afirmação, sendo perfeitamente compreensível no respectivo contexto procedimental.
Se as transmitentes eram sociedades comerciais, pessoas colectivas de direito privado, sem qualquer restrição de direito público, tendo decidido, no âmbito da sua autonomia privada, fazer um convite a três candidatas para a aquisição conjunta dos Lotes, importa não esquecer que esse convite não era livre, estando o resultado da adjudicação dependente da vontade da entidade pública, pelo que bem pode ter acontecido que esta interviesse no sentido de obter um determinado desfecho em que estava interessada.
O que as testemunhas em juízo comprovaram foram as suas percepções quanto a uma pretensa lisura do processo, mas o seu conhecimento, como se frisou já, não abrangeu toda a intervenção tendente à tomada das deliberações.
Diz-se que todos os actos e negociações quanto à escolha da transmissária decorreram antes de ser iniciado o procedimento administrativo com vista à formalização da transmissão, o qual apenas tem lugar por a concessão ser provisória, cabendo, assim, à Administração, validar, nessa sede, a escolha da transmissária feita no âmbito da autonomia privada das partes, salvaguardando o interesse público no âmbito do ordenamento da RAEM de terrenos ainda não aproveitados, mas importa reter que há todo um espaço e campo de actuação que precede aquela formalização.
Fica-se até sem saber se antes de 16 de Fevereiro de 2006, data de apresentação do pedido de autorização para a transmissão dos Lotes a favor da 1.ª recorrente, se houve ou não consultas junto dela, perspectivando aquela possibilidade.
Abstractamente considerando, o facto de nem a Comissão de Terras nem o Chefe do Executivo sofreram de qualquer alegada influência do ex-Secretário, tendo tomado, como consta do ponto 33 do Relatório, uma decisão "adequada e correcta, tal não exime a conduta ilícita que se deu como provada por parte deste último e nestes autos não aparece desmontada.
Afirma-se, tendenciosamente, que por não ter sido feita uma apreciação ponderada do pedido de autorização de acordo com os critérios definidos pela Lei de Terras, tal como referido no ponto 23 do Relatório, é errónea e gratuitamente ofensiva para os membros da Comissão de Terras e para o próprio Chefe do Executivo.
Há que separar as águas. Se o próprio ex-Secretário podia ter cometido corrupção para a prática de acto lícito - mas não foi isso que, em sede própria, se provou - é, por demais evidente que, perante a realidade que sobressaía, os restantes intervenientes no processo bem podem ter agido de boa-fé e com a melhor das intenções.
Aliás, perante a prova produzida no âmbito do presente processo, mais parecia que se estava a fazer a prova da lisura procedimental dos diferentes intervenientes no processo do que a não prova do cometimento do crime do ex-Secretário.

11.3. A pretensa mistura indevida (pontos 21 e 22 do Relatório) da fase do exercício da autonomia privada através da prática de negócios jurídicos cuja pretensa invalidade só poderia ser decidida por um tribunal e o procedimento administrativo que só se inicia com um pedido de autorização apresentado já após a escolha da transmissária, não se verifica, pois esse vício só seria passível de ser assacado ao acto se a actuação ora posta em crise tivesse sido regular e conforme a lei. Ora, não foi isso que se provou.
Não padece, assim, o acto recorrido, nesta parte, do apontado erro de direito.

12. Do erro nos pressupostos de facto e de direito ao afirmar-se que o ex-Secretário agiu no exercício de funções públicas
   12.1. A recorrente repete, à exaustão, que não se comprova que o então Secretário interveio, teve influência, participou ou determinou nas negociações no âmbito das sociedades privadas, das transmitentes, e que o fez no exercício de competências executivas, enquanto Secretário para as Obras Públicas e Transportes.
Mas não é verdade que assim foi de facto?
Não é verdade que a proposta de transmissão junto do Chefe do Executivo dele dependia? Que se provou, no referido processo-crime, que recebeu dinheiro por causa dessa “escolha”? Que foi nessa qualidade que interveio no processo? Que foi por isso que foi julgado e está a cumprir pena por essa razão? É tudo mentira? Pode ser. Se a recorrente tinha interesse na desmontagem dessa cabala, cabia demonstrá-lo e não o fez, pelo menos de uma forma convincente a fazer ruir a condenação imposta.

   12.2. Se o acto recorrido não aduz qualquer facto para comprovar as ilações e conclusões retiradas, nem tão pouco especifica em que se traduzem os conceitos genéricos e vagos como "intervenção" ou "influência", importa não esquecer que esses são os termos usados na decisão condenatória e como tal foram usados pela Administração, importa não esquecer que esses factos, ainda que conclusivos, não deixam de ser factos.
12.3. A Portaria n.º 89/96/M, de 1 de Abril, que delegava no Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas as competências próprias do então Governador de Macau, no que se referia às funções executivas relativas às Transmitentes e à N, caducou em 20 de Dezembro de 1999, por mudança dos titulares dos órgãos delegante e delegado, tal como estabelece a alínea b) do artigo 42.º do CPA.
… Diz a recorrente que, por esse motivo, certamente, não ficou provado no mencionado Acórdão do TUI que a tal Portaria tivesse delegado as competências executivas ali referidas no que veio a ser Secretário para as Obras Públicas e Transportes, depois de 20 de Dezembro de 1999, o ali arguido I, não tendo havido qualquer nova delegação de poderes neste sentido para o então Secretário, não fazia parte das funções ou competências deste representar a RAEM nas Assembleias Gerais das Transmitentes e da N.
… Nos termos da legislação em vigor, mais concretamente, do artigo 20.º do Decreto-Lei n.o 13/92/M, de 2 de Março, a representação da RAEM nas Assembleias Gerais das sociedades de que é sócia deverá caber, quando não aos delegados ou administradores, a um representante designado pela tutela.
… Logo, a única competência que o então Secretário tinha era a de designar um representante para representar a RAEM nessas Assembleias Gerais, o que, no caso em apreço, fez, tendo indicado a Dra. C para as reuniões ocorridas em 31 de Maio, 16 de Junho e 5 de Agosto de 2005, nas quais se discutiram os assuntos relacionados com a transmissão dos Lotes.
… Assim se explica o facto de o então Secretário nunca ter participado nessas Assembleias Gerais, nem tão pouco ter delegado competências, pois que, legalmente, ele não as tinha, podendo apenas designar, como designou, um representante para o efeito.

12.4. Desta exposição e quadro de actuação pretende a recorrente extrair que o ex- Secretário não teve intervenção ou influência nas deliberações das transmitentes ou no processo de negociação prévia ao procedimento administrativo de transmissão dos Lotes (pontos 4, 6, 7 do Relatório), que não teve qualquer participação, pelo que o acto recorrido incorre, ainda, em erro sobre os pressupostos de direito, quando afirma, nomeadamente, que o Secretário "interveio nesse processo ilícito enquanto titular de um cargo público" (ponto 12 do Relatório), "na qualidade de representante do sócio RAEM" (ponto 15), ou que "as funções desempenhadas pelo ex-Secretário, embora no âmbito de sociedades privadas, deviam corresponder à concretização do interesse público", quando, por lei, não lhe cabia qualquer competência para representar a RAEM enquanto sócia das Transmitentes.
Tudo isto está muito certo, mas tal como acima se afirmou e ora se reitera, só assim seria numa perspectiva de actuação legal e dentro dos quadros da licitude e da normalidade. Quando se envereda por condutas desviantes os trilhos que se pisam são ínvios e tortuosos, escapando às regras estipuladas para os procedimentos e comportamentos.

13. Do erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à alegada postergação do interesse público
    13.1. Argumenta-se que a entidade recorrida alega no acto recorrido (ponto 32, entre outros, do Relatório) que o interesse público terá sido, em concreto, postergado, não tendo sido "objectivamente prosseguido por força da interferência do ex-Secretário".
… Interferência essa que, ao ter ocorrido no processo de selecção da sociedade transmissária, terá contaminado o procedimento administrativo, percorrendo-o transversalmente - cfr. ponto 34 do Relatório.

13.2. Claro que a recorrente bem pode proclamar que o interesse público foi bem prosseguido, quando se pode até defender – já o temos ouvido dizer – que mais vale empreender, mesmo com 10% no bolso, do que nada fazer.
Esta linha argumentativa, salvo o devido respeito, não colhe, na medida em que o interesse público que releva na actividade administrativa é aquele que é determinado, em função de sãos critérios, no respeito pela legalidade, com a legitimidade soberana do povo e para o povo, considerados fundamentais para a existência, conservação e desenvolvimento da sociedade política (no sentido da civitas)31, ou noutro passo, o interesse público é a ideia dominante de todas as normas jurídico-administrativas,32 ou ainda, como diz Wolf, os interesses públicos assentam numa ordem social pacífica, na conservação da dignidade e da honra do ser humano, na possibilidade de manutenção da posse, da propriedade e do trato jurídico, na possibilidade da educação e da cultura, em suma na criação ou manutenção daquelas relações que respeitam a situações jurídicas materiais fundamentais.33
É isto compaginável com uma actuação administrativa assente no cometimento do crime de corrupção?
Bem podia o preço ser o melhor; o plano de urbanismo; todos os restantes itens; isentos os membros da Comissão; tudo isso não afasta a possibilidade do cometimento do crime, à margem das testemunhas que tiveram participação no procedimento e não deixaram de ser ouvidas neste processo.
Clamará a recorrente: então onde está o crime? Sem nos pronunciarmos até sobre a configuração da corrupção para acto lícito ou ilícito – e é este que se comprova - , o que importa realçar é que a prova desse crime não tem nem pode aqui ser feita.
É legítimo que a Administração não se queira basear em condutas julgadas já como criminosas, bem ou mal, mas transitadas, restando aos particulares prejudicados os meios postos ao seu dispor no sentido de lhes garantir a tutela efectiva dos seus direitos, mas que não passam necessariamente pela reposição de um acto sentenciado como viciado, para mais, quando aqui não se comprova que ele não tenha sido cometido.
É verdade que enquanto acto ablativo, competia à Administração comprovar os pressupostos da sua tomada de decisão. Não o deixou de fazer, ao invocar a condenação imposta. Cabia à recorrente infirmar esse facto, o que claramente não logrou fazer.

13.3. Perde assim sentido continuar a dizer, em relação ao ponto 22 do Relatório, que o facto de o Secretário para as Obras Públicas e Transportes ser o superior hierárquico daquela Direcção ou o facto de o então Secretário saber que iria ter intervenção no âmbito do procedimento administrativo através do qual foram transmitidos os direitos resultantes dos contratos de concessão, por arrendamento, dos Lotes à ora 1.ª Recorrente, ainda que aparentemente em nada tenha influenciado a elaboração e o sentido das decisões favoráveis a essa transmissão, que se foram formando nas várias informações e pareceres para onde remetem os pareceres da Comissão de Terras que vieram a ser homologados pela entidade recorrida, não se mostra determinante em relação ao acto final praticado, bem podendo a intervenção do Secretário ter-se situado a um nível não percepcionado pelos seus técnicos e coloboradores.
Como é óbvio nem se esperaria que tal acontecesse, na certeza de que se comprova, como assinala o Eng J, que o ex- Secretário lhe deu directivas relativamente ao processo de transmissão, embora não estivesse presente dava directivas aos gerentes, intervinha através dos representantes, dava instruções antes das Assembleias, deu instruções para que se votasse favoravelmente essa decisão na AG (cfr. fls 1215), donde transparece uma personalidade já não tão distante e passivo quanto à evolução do que se ia passando, como se pretende.
Como se assinala nas próprias alegações do recurso contencioso (art. 208º) “é o próprio acto recorrido que reconhece que a alegada intervenção criminosa do então Secretário se circunscreveu a uma fase de negociação privada antes de o procedimento administrativo se ter iniciado – leiam-se, a título de exemplo, os pontos 12 e 21 do Relatório.”
Procuram-se separar os capítulos, o ante e o post, e nesse ponto também não deixamos de divergir do entendimento que cria essa separação, não sendo crível que as “águas fétidas” não se misturassem, donde não se poder afirmar que a declaração de nulidade de um acto administrativo do Chefe do Executivo tinha como fundamento a mera relação hierárquica abstracta entre a DSSOPT e o Secretário para as Obras Públicas e Transportes.

13.4. Repetindo, por todas as razões que se vêm invocando, diverge-se ainda da posição que reduz a actuação do ex- Secretário, considerando-o um ente alheio ao que à sua volta se passava e ainda que a decisão tenha passado por "uma apreciação ponderada do pedido de acordo com os critérios definidos na Lei de Terras", por parte de um certo sector interveniente, resta desbravar um campo, qual buraco negro, que escapou aos intervenientes no procedimento e que dizem que tudo foi regular.
Como referimos, há elementos probatórios que nos escapam e que aqui não puderam nem devem ser valorados.
Mostra-se, pois, despicienda a análise procedimental ensaiada pela recorrente, na exacta medida em que daí não se desmonta a possibilidade de intervenção da actuação criminosa.

13.5. O procedimento administrativo iniciou-se com o requerimento datado de 16 de Fevereiro de 2006 feito pelas Transmitentes (e N), dirigido ao Director da DSSOPT e apresentado naquela Direcção no dia seguinte (17 de Fevereiro de 2006), com vista à transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, dos Lotes para a 1ª Recorrente, bem como a revisão e alteração aos contratos de concessão em causa.
Requerimento reencaminhado directamente para o Departamento de Gestão de Solos, responsável nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.o 29/97/M, de 7 de Julho, pela análise e preparação dos pedidos de alteração e revisão dos contratos de concessão, tendo a Técnica do Departamento de Gestão de Solos da DSSOPT, Dra. ZO (não ouvida nestes autos), elaborado e assinado em 2 de Março de 2006 a Informação n.º 045/DSODEP/2006.
Na sequência, a Chefe do Departamento de Gestão de Solos, a Eng.ª P não ouvida nestes autos), remeteu a Informação em causa ao Director dos Serviços, onde exarou a seguinte proposta: "Exmo. Sr. Director, Face ao pedido de transmissão de concessão formalizado pelos 5 concessionários dos lotes 1c, 2, 3, 4 e 5, situados na Est. XXX, em 17/02/2006 (Entr. 30871), em anexo 4, concordo com o informado e as condições contratuais propostas nas minutas em anexo 5, julga-se de autorizar, aprovar e seguir conforme pontos 11.1 a 11.4 desta informação. À consideração superior”.
Por sua vez, o Director da DSSOPT, Eng.º ZP, (não ouvido nestes autos) exarou, em 3 de Março de 2006, o seguinte parecer sobre essa Informação: "Exmo. Senhor Secretário, Concordo e proponho AUTORIZAÇÃO e APROVACÃO da MINUTA DO CONTRATO DE CONCESSÃO, e dar seguimento ao processo, conforme o indicado em 11.3 e 11.4. À consideração superior."
Se o então Secretário só nesta fase interveio, o qual, como se pretende, se limitou a concordar com a informacão vinda dos servicos, onde se determinava o prosseguimento do procedimento e em que termos, através da informação subscrita anteriormente pela Técnica Dra. ZO, pela Chefe de Departamento, Eng.a P e pelo Director da DSSOPT, Eng.º ZP, é matéria que não podemos considerar provada, como não provada a sua passividade sobre todo o procedimento subsequente, no que respeita à fase da aceitação das minutas pelas Transmitentes e transmissária, posteriormente junto da Comissão de Terras que interveio em conformidade com o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.o 60/99/M, de 18 de Outubro, para se pronunciar, o que fez em 16 de Março de 2006, por via dos Pareceres n.ºs 23 a 27/2006, um para cada Lote a transmitir e todos com conteúdo idêntico.

    13.6. Tais pareceres tiveram em conta o requerimento apresentado pelas transmitentes e os documentos a ele anexos, bem como a citada Informação n.o 045/DSODEP/2006, de 2 de Março, na qual se propunha a autorização da transmissão a favor da 1.ª recorrente e que foi alvo de parecer favorável do Director da DSSOPT, que, por sua vez, mereceu a concordância do então Secretário, mas isso não afasta absolutamente a possibilidade de intervenção e condicionamento.
Sobre a regularidade de actuação da Comissão de Terras e conformidade legal dos pareceres com os requisitos legais, não o pomos em dúvida, mas isso não basta para afastar a presunção que decorre do art. 578º do CPC a que já fizemos referência.
É bom que se vinque este aspecto, pois se fica com a sensação de que às objecções que sempre vamos levantando em relação a uma aparência de prova que a recorrente pretende concludente no sentido da sua tese – de que o acto foi limpo e foi praticado sem interferência da ex-Secretário – se pode exasperadamente dizer que nesta linha não é possível provar coisa alguma, não deixamos de dizer que é verdade, realmente, por vezes, é muito difícil comprovar certos factos, em particular, quando eles assumem uma carga negativa, em particular, quando se trata de ilidir uma presunção, já que a decisão condenatória oposta a terceiros faz presumir a veracidade dos factos típicos que enformam a condenação.
Se é certo, pois, que beneficiando os actos administrativos da presunção de validade, como efeito positivo do princípio da legalidade, na medida em que todo o acto administrativo, porque emana de uma autoridade e é exercício de um poder público regulado pela lei, presume-se legal até decisão em contrário de tribunal competente, decisão esta que não deixou de sobrevir com o acórdão do TUI, cabe agora ao particular interessado ilidir a presunção que dele emana.
Por conseguinte, ainda aqui, não incorre o acto recorrido em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, quando invoca que houve postergação do interesse público no ponto 32 do Relatório, o que não se demonstra ter sido erróneo, bem por erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à alegada relevância do acto preparatório do ex-Secretário no procedimento administrativo.

14. Da ofensa dos princípios da protecção da confiança, da proporcionalidade e da adequação, por défice de ponderação no quadro do disposto pelo n.º 3 do artigo 123.° do CPA.
14.1. …Pretende a recorrente que não se pode ignorar ou pretender ignorar que, no caso concreto, os actos objecto da declaração de nulidade e os que se lhe seguiram na tramitação do processo administrativo de transmissão dos Lotes e subsequentes revisões, produziram efeitos a todos os níveis, quer jurídico, quer factual ou económico, na esfera jurídica das Recorrentes e da de terceiros, que, de harmonia com os princípios gerais de Direito, não podem ser pura e simplesmente destruídos pela aplicação cega de um parágrafo da lei.
… Todavia, o acto recorrido ignorou tais efeitos ao declarar incondicionalmente a nulidade dos actos em causa, sem atender aos efeitos de facto e, pelo decurso do tempo, jurídicos que, como visto, merecem a tutela do Direito, sendo o caso do avultado investimento feito pela La Recorrente e sua sócia-única, ZQ Holdings Ltd. ("ZQ"), com sede em Hong Kong, onde se encontra cotada em bolsa, mais precisamente no Hong Kong Stock Exchange (código 0127), na aquisição dos Lotes, no pagamento das rendas e prémio da concessão e no desenvolvimento do projecto, mormente com o pagamento dos projectos de arquitectura e engenharia, das empreitadas e respectiva gestão e fiscalização, das obras realizadas nos Lotes conforme descrito supra, dos materiais e equipamentos, e de todos os serviços inerentes a um projecto desta natureza e dimensão, num montante que, aos dias de hoje, ascende a cerca de HKD 5.000.000.000 (cinco mil milhões de dólares de Hong Kong).
… Mais alega que também se produziram efeitos de facto em relação aos promitentes-compradores de 302 futuras fracções autónomas dos imóveis do Projecto em desenvolvimento, incluindo a 2.a Recorrente, os quais desembolsaram, à data, um montante global, a título de sinal e princípio de pagamento, de HKD383.853.056 (trezentos e oitenta e três milhões oitocentos e cinquenta e três mil e cinquenta e seis dólares de Hong Kong), acrescido do respectivo imposto de selo, já liquidado nos termos e prazos previstos na Lei n.o 17/88/M, de 27/06, e das comissões de agenciamento pagas aos respectivos promotores imobiliários.
… Promitentes-compradores esses, incluindo a 2.a Recorrente, que, do dia para a noite, sem que pudessem prever ou suspeitar de qualquer invalidadedo procedimento administrativo da concessão, por arrendamento, dos Lotes à 1.ª Recorrente, se vêem desprovidos, para além dos sinais, impostos, comissões e despesas pagas, da expectativa legítima de valorização dos direitos sobre os imóveis objecto da promessa e que, à presente data, se estima em cerca de 20% (vinte por cento).
… Foram celebrados vários contratos de empreitada, de prestação de serviços que estão em curso e cuja suspensão e eventual resolução causarão efeitos práticos, quer à 1.ª Recorrente quer às contra-partes nesses mesmos contratos, nomeadamente o contrato de empreitada-geral celebrado entre a 1.ª Recorrente e a Companhia de ZR (Macau), Limitada", em inglês, ZR (Macau) Company Limited, com o valor global de HKD2.743.000.000,00 (dois mil setecentos e quarenta e três milhões de dólares de Hong Kong), cuja execução se encontra actual e necessariamente suspensa sem prazo fixo.
… Acresce que, a reversão é na prática impossível, por já não existirem as sociedades Transmitentes e nem os dispersos sócios destas estariam em condições jurídicas de assumir atomisticamente de novo as concessões, devolver o preço recebido, pagar o valor elevadíssimo das benfeitorias, continuar as vultosas obras em curso, assumir as obrigações constituídas.
… Por esta razão, a interpretação lata, extensiva, que a Administração faz da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, a ser aplicável ao caso, teria, ainda assim, de ser relativizada e balizada por limites de proporcionalidade, adequação e justiça, com protecção dos direitos de terceiros de boa-fé - os quais se mostram, salvo o devido respeito, largamente ultrapassados pelo Despacho sob impugnação.

14.2. É verdade que o regime da nulidade previsto no n.o 1 do artigo 123.º do CPA determina que "o acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração".
No entanto, se tal acto não é, de imediato, impugnado pelos particulares ou declarado nulo pela Administração, o mesmo, com o decurso do tempo, produz efeitos de facto e, consequentemente, efeitos jurídicos na esfera dos particulares e até da própria Administração.
Daí que o n.º 3 do citado artigo 123.º preveja a possibilidade de se atribuir efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de actos nulos, por força do simples decurso de tempo.

14.3. Tivemos recentemente a oportunidade de tomar posição sobre os efeitos putativos do acto nulo, em recente processo, de 12/3/2015, deste TSI, aí se defendendo que os eventuais efeitos putativos do acto nulo se situam ainda ao nível de alguma juricidade remanescente do acto e não se confundem as consequências e transformações operadas no mundo dos factos que por via da invalidade fatal do acto, não podem desaparecer por um passo de mágica. Dizer que os actos nulos não produzem efeitos é um corolário da noção de nulidade mas, como pura abstracção que é, não atende às realidades. Tratava-se, no caso, de um concurso, em que se entendeu que a Administração não estava impedida de valorar a experiência, em termos meramente factuais, de uma empresa concorrente, prestada em termos de um serviço de interesse público, não obstante um determinado contrato estar eivado de uma nulidade, por ele tendo perpassado uma condenação de corrupção, tendo a própria Administração considerado esse contrato nulo e, dentro desse entendimento, celebrando um novo contrato com a mesma empresa.
    Respiga-se até a passagem colhida em Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim34, in Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª Edição, Almedina, página 655, ao alertarem para o facto de a ressalva de determinados efeitos quanto ao acto nulo dever ser feita com muitas cautelas, sem prejuízo da potencial atribuição de efeitos putativos ao acto nulo, apenas "nas circunstâncias de boa-fé, plausibilidade e estabilização no tempo, próprias da categoria dos efeitos putativos" - "não pode, nunca, é assacar-se efeitos putativos favoráveis ao particular em cuja conduta se funda a nulidade do acto, como nos casos de coacção ou crime, ou até, simplesmente, de dolo ou má-fé do interessado". Opinam aqueles autores, configurando uma nomeação de funcionários ou agentes putativos, que, não obstante a nulidade do acto, exercem pacificamente as suas funções durante largos anos e a questão que se coloca à da estabilização jurídica ou não dessa situação.
    Problema que não é novo no Direito Administrativo e já se colocava em sede funcionamento de uma nulidade do foro jus civilista contra o prazo prescricional mais longo, como, por exemplo, nos casos de usucapião.
    
    Essa reserva em relação aos efeitos putativos do acto nulo não abrange a realidade de facto que lhe está subjacente. É o que se depreende de certos autores, como, de forma muito clara, explica Luis Cabral Moncada:
    
    “ De acordo com o nº 1 do art. 134º do CPA, o acto nulo não produz quaisquer efeitos. Esta asserção quer dizer que do acto nulo não resultam efeitos e que, consequentemente, ele não vincula ninguém, Administração e particulares, mesmo antes de ter sido declarado como tal pelo tribunal ou pela Administração. Daí também se infere que o acto nulo não é revogável porque não haveria efeitos a revogar (…) Dizer que os actos nulos não produzem efeitos é um corolário da noção de nulidade mas, como pura abstracção que é, não atende às realidades, como já se tinha dito. Ora, o bom-senso aconselha-nos a olhar para as realidades mesmo que isso tenha consequências demolidoras no plano dogmático. É que se admitirmos, como devemos admitir, que do acto nulo resultam frequentemente efeitos o regime da nulidade aproxima-se muito do da anulabilidade pois que tais efeitos por inválidos devem ser destruídos em consequência de sentença judicial ou de decisão administrativa ou então mantidos em obediência a determinados valores.
    
    Perante isto de nada vale dizer que os efeitos do acto nulo não são jurídicos mas meramente materiais, assim permitindo salvar a pureza da construção dogmática da nulidade não lhe imputando efeitos jurídicos. Só que, mais uma vez, continuamos no plano puramente abstracto da metafísica. É que do ponto de vista do particular lesado a situação é rigorosamente idêntica; sejam os efeitos do acto jurídicos ou não eles lá estão. Suponhamos que o membro de uma corporação profissional foi expulso ou suspenso do exercício da sua actividade na sequência de uma decisão disciplinar tomada sem audiência prévia. Poderá o lesado continuar a sua actividade profissional como se nada fosse? Se entendermos que o acto é nulo, não há dúvida que sim.
    
    No entanto, os actos administrativos beneficiam de uma presunção de legalidade que o lesado terá de contrariar pelo que continuam a produzir efeitos jurídicos até que seja declarada a respectiva nulidade pelo tribunal ou pela Administração. No mesmo sentido vai a incerteza quanto à consequência do vício de que padece o acto. Será o acto nulo ou apenas anulável? Desta situação de incerteza beneficia também a Administração o que vai a favor da produtividade dos efeitos do acto. Certamente que ninguém pretenderá que o membro de uma corporação profissional expulso ou suspenso sem audiência prévia não tem nada a recear porque o acto é nulo. E, no entanto, os clientes já debandaram, o seu prestígio ficou afectado e deixou de poder pagar o telemóvel. Ficam muito caras as abstracções.
    
    Note-se ainda que o simples facto de o membro da corporação afectado por um acto nulo poder pedir uma indemnização à Administração com fundamento em responsabilidade civil por facto ilícito já evidencia à saciedade que daquele resultaram efeitos que urge reparar.
    
    Daqui se conclui que, ao fim e ao cabo, o regime da nulidade aproxima-se frequentemente do da anulabilidade pelo menos quando deparamos com efeitos jurídicos do acto nulo que é imperioso erradicar ou compensar. A tarefa do apagamento daqueles efeitos cabe aos tribunais ou à Administração consoante a nulidade seja declarada judicial ou oficiosamente.”35
    
    14.4. Aliás, são os próprios Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, já acima citados que advertem "A verdade é que também há (pode haver) efeitos putativos ligados a outros factores de estabilidade de relações sociais, como os da protecção da confiança, da boa-fé, do sum quique tribuere, da igualdade, do não locupletamento e até da realização do interesse público - princípios que podem, todos, ser chamados a colmatar situações de injustiça derivadas da aplicação do princípio da legalidade e da “absolutidade”"(nesta parte citando Marcelo Rebelo de Sousa)36.
    
     Doutrina esta que tem sido acolhida na Jurisprudência Comparada.37
    
    14.5. Posto isto, somos a tomar posição sobre a questão que se nos coloca.
    Uma coisa é sobrevirem alguns efeitos de um acto nulo, actos que não se podem apagar, com uma borracha por simples decretamento da nulidade; outra, a manutenção do vício da nulidade que, por natureza, juridicamente falando, não é sanável.
    As objecções que são levantadas situam-se ao nível do primeiro termo da equação. Sem dúvida que os prejuízos são enormes e os danos atingem pessoas, empresas, interesses económicos que nada têm que ver com o crime cometido.
    Em nome desses interesses e dos princípios que se levantam, é verdade, bem podia a Administração contratar, vestir de novo, salvar as expectativas criadas, aproveitar investimentos, etc, etc. Mas situamo-nos ao nível do poder fazer, não do ter que fazer, e não serão seguramente os tribunais que têm ou sabem dizer o que deve ser feito nesse domínio à Administração.
    A questão dos prejuízos, muito impressiva, pela magnitude da dimensão dos números e das pessoas atingidas é questão, custa reconhecê-lo, que nos ultrapassa e não é razão bastante para uma inversão das regras que conduzem à retirada da validade e consequente eficácia jurídica do acto nulo. Não podem deixar de ser equacionados à luz de uma disciplina dos riscos do negócio ou da responsabilidade civil por parte de quem lhes deu azo.

16. Da violação dos princípios da Justiça, boa-Fé, proporcionalidade e adequação
16.1. Insiste a recorrente dizendo que
… O acto recorrido não teve em conta os efeitos de facto já produzidos, como também não teve em conta os vários princípios a que a Administração está adstrita, na prossecução do dever de boa administração e na protecção dos vários interesses públicos que tem que gerir.
… Aos efeitos de facto já produzidos, acrescem todos os prejuízos que previsivelmente a l.a Recorrente e sua sócia-única, a ZQ, terão de assumir para com os promitentes-compradores, incluindo a 2.a Recorrente, e, bem assim, para com os empreiteiros e prestadores de serviços contratados, em que a suspensão dos trabalhos e resolução dos respectivos contratos acarretarão responsabilidades que, nesta fase, são incalculáveis, mas que se estimam no montante mínimo de HKD1.400.000.000 (mil e quatrocentos milhões de dólares de Hong Kong).
… Tal terá também um forte impacto no bom nome e prestígio da sociedade-mãe, a ZQ, a qual, sendo uma sociedade cotada em bolsa, terá necessariamente repercussões negativas nos seus milhares de investidores.
… Investidores esses que, após a concretização do investimento da ZQ na aquisição integral do capital social da 1ª Recorrente, e na expectativa legítima da valorização decorrente do desenvolvimento e conclusão do projecto (anunciado como um dos maiores projectos imobiliários de luxo de Macau), adquiriram acções daquela empresa na bolsa de Hong Kong - a quem cabe zelar e responder pelos interesses económicos desses accionistas.
… A Administração ainda em Março de 2011 reviu a concessão, aumentando áreas, arrecadou impostos, emitiu licenças, concedeu autorizações, criou todo um ambiente de confiança propício à implementação e desenvolvimento do projecto, incentivando investimentos interna e externamente.
… Assim, afigura-se óbvio o manifesto excesso da proporcionalidade, justiça e adequação por que se deve reger a sua actuação, nos termos dos princípios consignados no n.o 2 do artigo 5.º do CPA.

16.2. Sobre isto, resta remetermo-nos para o que já acima foi dito, sublinhando que a declaração da nulidade corresponde a um acto vinculado a que a Administração está adstrita, tal como sobejamente e à saciedade já foi afirmado pelo V.º TUI, pelo que a alegada violação do princípio da confiança por quebra dos investimentos e das expectativas de negócio não tem a virtualidade de sanar um acto nulo.
Restam os outros mecanismos que o Direito coloca à disposição dos interessados em vista do ressarcimento dos prejuízos e terão sido avultados, não se nega.
Não há violação do princípio da proporcionalidade, da adequação e da justiça, quando prevalece a prossecução do interesse público, quando perante os diferentes interesses em jogo prevalece o de maior monta, que assenta no primado da lei, na transparência das decisões administrativas expurgadas de actuações criminosas, perpassadas por actos de corrupção, não havendo interesse, ainda que de carácter público, derivado do desenvolvimento dos negócios, que se sobreponha àquelas preocupações.
Assim se entra no ponto seguinte.

17. Da ponderação do interesse público
17.1. É verdade que no processo de tomada de decisão, a Administração tem de ponderar não só o interesse público primordial que subjaz à prática do acto, mas também todos os outros interesses públicos que com ele possam colidir e vir a ser prejudicados.
Aceita-se que, havendo colisão entre esses interesses públicos, o subjacente à prática do acto e os que cabem à Administração, em geral, prosseguir, exige-se a esta que adopte em relação ao caso concreto as melhores soluções possíveis, do ponto de vista administrativo, técnico e financeiro.

17.2. … Põe-se em causa o que se denomina de erróneo e imponderado o entendimento expresso nos pontos 47 e 48 do Relatório, porquanto, na defesa cega da estrita legalidade, o mesmo, levado ao limite, como sucedeu no caso concreto, faz tábua rasa e necessariamente despreza os direitos subjectivos e interesses legalmente protegidos de terceiros de boa-fé, incluindo os da 2.a Recorrente, e, como tal, colide com os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, da proporcionalidade e da boa-fé ali invocados.

17.3. Vamo-nos repetir.
Não se acompanha este entendimento, considerando que o acto recorrido não violou os princípios gerais da actuação da Administração, tal como estabelecidos nos artigos 3.° a 9.° do CPA, percebendo-se perfeitamente qual a motivação subjacente à actuação da entidade recorrida, sobrelevando uma transparência governativa, um estrito rigor pela legalidade, isenção de actuação, valores supremos que devem pautar uma sociedade politicamente organizada estruturada e pautada por regras de Direito. Valores estes que não deixam de se divisar como fundamentais e como estruturantes, o que se impõe ao Governo, desde logo, no art. 65º da Lei Básica, se impõe aos agentes económicos, art. 103º da mesma LB. Mas mesmo que porventura pudesse ser discutível qual o interesse público prevalecente, se o da transparência e o da legalidade, se o da confiança e segurança no investimento, qualquer eventual diferença ou desproporção não se assume com uma evidência clara que impusesse a intervenção dos Tribunais nesse domínio.
Se um membro do Governo ou qualquer agente económico, com a sua conduta, causou prejuízos e danos a terceiros nos seus negócios e investimentos, há que apurar as responsabilidades cíveis, para além das criminais, em toda a sua extensão.

18. Vício de forma, por insuficiência de fundamentação
18.1. … Sustenta a recorrente, repetindo-se, que todas as afirmações que seriam essenciais para demonstrar a incidência da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, bem como a actuação do ex-Secretário com efeitos invalidatórios das declarações negociais de direito privado e de actos do procedimento administrativo, são sempre feitas em abstracto, em termos que lhes retiram toda a aptidão para delinear os factos que seriam juridicamente relevantes.
… Não se teriam indicado e concretizado as pessoas, agentes, influências, intervenções integrantes do ilícito subjacente ao acto declarado nulo.
… O acto recorrido padeceria, assim, de insuficiência de fundamentação e, como tal, viola a alínea e) do n.º 1 do artigo 113.° e o artigo 114.° do CPA.

18.2. Repete-se a recorrente e não nos vamos repetir nós. O acto está perfeitamente claro quanto às razões que motivaram a declaração de nulidade do acto anterior, ou seja, não pode subsistir um acto que teve na sua génese o cometimento de um crime, decisão transitada, que não se mostra desmentida nos presentes autos.

19. Falta de audiência prévia
19.1. …Nos termos do artigo 93.º e 94.º do CPA, foi a recorrente notificada, em 15 de Junho de 2012 para se pronunciar em sede de audiência escrita relativamente ao sentido da decisão da ora Entidade Recorrida de declarar nulos os actos de homologação dos Pareceres da Comissão de Terras n.ºs 23 a 27/2006, bem como para requerer diligências complementares e fornecer meios de prova.
… A 1ª Recorrente apresentou a sua resposta escrita no prazo concedido e requereu diligências de prova para suportar os factos que ali alegou, diligências que foram indeferidas com o fundamento de que as mesmas eram "inúteis e meramente dilatórias, não trazendo qualquer contributo relevante para a tomada de decisão superior" e porque a “Requerente não demonstra nem alega em que medida os documentos podem trazer à decisão um contributo passível de alterar a decisão da Administração a seu favor”.
… Por não ser verdade que tais diligências fossem inúteis ou dilatórias, sobretudo quando a matéria de facto foi dada como assente sem quaisquer diligências probatórias por parte da Administração, apenas com base no citado Acórdão do TUI relativo a um processo onde a 1ª Recorrente não foi parte, nem ouvida, sendo que esta tinha o direito de fazer prova em contrário e essa prova poderia vir a mudar o sentido da decisão.
… O argumento referido no ponto 51 do Relatório de que o interesse na transmissão e aproveitamento dos terrenos em questão resulta expressamente do despacho que autoriza essa transmissão para rejeitar a audição de uma testemunha seria totalmente contraditório com o que é antes dito quanto à alegada postergação do interesse público na prática do acto, sendo exactamente por isso que a diligência foi requerida.
    … Terá sido ainda esse juízo pré-concebido, como se reforça em sede de alegações facultativas, a impedir a Administração e, em particular, o Chefe do Executivo, enquanto autor do acto recorrido, de fazerem a ponderação devida e justa dos interesses (supostamente) em conflito, i.e., de um lado a prossecução do interesse público alegadamente subjacente à prática do acto recorrido, e, de outro, os direitos e interesses de terceiros - ou seja, de pessoas singulares e colectivas que nada tiveram que ver com a actuação de I e que nem sequer participaram no processo-crime no qual o mesmo foi condenado que foram severamente afectados pelo acto do Chefe do Executivo, em manifesto desrespeito, entre o mais, pelo regime previsto no artigo 123.º, n.º 3, do CPA.
… Tal indeferimento corresponde à violação do seu direito de audiência, expressamente consagrado no n.º 3 do artigo 94.º do CPA que determina que: "Na resposta, os interessados podem pronunciar-se sobre as questões que constituem objecto do procedimento, bem como requerer diligências complementares e juntar documentos", pelo que, consequentemente, padece o acto recorrido de vício de forma por falta de audiência completa dos interessados.

19.2. Também aqui não assiste razão à recorrente.
Face à posição já expendida da vinculação do acto praticado, no sentido de projectar os efeitos da condenação criminal noutros actos e com efeitos na esfera de terceiros, não se vê que no processo administrativo a recorrente pudesse operar uma revisão ou reversão da decisão condenatória proferida. E mesmo na configuração da relevância da comprovação de ausência de uma causalidade adequada entre o crime e o acto, não o logrando fazer, o seu desiderato não deixará de soçobrar.


19.3. O acto administrativo recorrido não padece do vício de “falta de audiência prévia” na medida em que no âmbito do procedimento administrativo desenvolvido se realizou, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo, audiência escrita dos interessados incluindo a 1ª Recorrente A Ltd., e esta emitiu seu parecer em 29 de Junho de 2012.
De acordo com o art.º 86.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, o órgão competente deve procurar averiguar os factos “cujo conhecimento seja conveniente para a justa e rápida decisão do procedimento”, o que não significa que se satisfaçam todos os pedidos de prova que venham a ser requeridos.
Sem o preconceito que a recorrente a cada passo pretende prevenir, na verdade, não se concretiza em que medida os elementos probatórios que se requeriam no PA (Processo Administrativo) podiam ter a virtualidade de inverter a factualidade em que assentou o pressuposto da declaração de nulidade proferida. Não se evidenciando, nem se demonstrando tal possibilidade, não deixamos de cair na inutilidade da sua produção.
O acto administrativo recorrido baseou-se nos factos provados e na decisão no acórdão n.º 37/2011 de 31 de Maio de 2012 do TUI, tendo tal decisão transitado em julgado, pelo que os respectivos factos estão definitivamente fixados, sendo elucidativo o que se escreveu no acórdão n.º 48/2012 do TUI, de 25/7/2012:
“Ora, tendo o corrupto passivo sido condenado judicialmente, por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, está definitivamente provado – para sempre e erga omnes - que o despacho de 6 de Outubro de 2005 se baseou em parecer, que foi obtido por acto de corrupção passiva para a prática de acto ilícito, porque tais factos se provaram naquela sentença. É inteiramente irrelevante a questão de saber se o Acórdão de 22 de Abril de 2009, do Tribunal de Última Instância, que condenou B, ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas, vincula ou não C, representante legal da ora recorrente.
O que interessa é que está definitivamente assente que na base do acto administrativo está a prática de um crime de corrupção, pelo qual foi condenado o corrupto passivo. Isso inquina irremediavelmente o despacho 6 de Outubro de 2005. Para este efeito, pouco importa quem foi o corruptor activo ou se veio a ser condenado, como efectivamente acabou por ser, embora, por estar em fuga, a respectiva condenação ainda não lhe foi notificada e, por isso, ainda não transitou em julgado (facto que é do conhecimento geral).
Quer dizer, há que afastar as águas. A declaração de nulidade do despacho de 6 de Outubro de 2005 não constitui uma sanção para o interessado no procedimento administrativo, por ser ou deixar de ser corruptor activo.
Mas, para a Administração, a condenação judicial definitiva, do corrupto passivo, prova que o acto administrativo foi inquinado por corrupção, independentemente de quem foi o corruptor activo que, no limite, poderia até não ser o interessado no procedimento administrativo atinente à declaração de nulidade do acto anterior.
Face à interpretação que atrás fizemos do artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo, a declaração de nulidade do despacho de 6 de Outubro de 2005 era, para a Administração, um acto vinculado.
Tendo nós concluído que, em caso de acto vinculado, a omissão da audiência do interessado se degrada em formalidade não essencial, pelo que não produz anulação do acto administrativo, importa tirar a conclusão final de que o despacho de 3 de Setembro de 2009 não enferma de vício de forma, por não ter sido precedido de audiência da interessada A.”




19.4. Ainda que não se acompanhe em toda a sua extensão a radicalidade desta pronúncia, no que toca aos efeitos da condenação perante terceiros, somos respeitosamente a seguir esta orientação jurisprudencial, pelo que, no que toca à prova dos pressupostos do acto, resta uma pequena margem de actuação aos particulares interessados, fazendo-se a distinção entre a esfera admistrativa e os efeitos da actuação administrativa na esfera dos particulares.
Mas ainda fica alguma margem e foi por essa razão que se admitiu a produção das provas nos presente recurso contencioso, na perspectiva de ilisão da já referida presunção.

    20. Do nexo de causalidade entre os factos da condenação e a declaração do acto nulo
    20.1. Trata-se de uma matéria que diremos fulcral e perpassa por toda a alegação da recorrente e respectivo douto parecer para onde se remete.
    … Basicamente, sustenta-se que à Administração e à entidade recorrida cabia demonstrar, tanto no procedimento administrativo que precedeu a prática do acto recorrido como nos presentes autos, as razões de facto e de Direito pelas quais, à luz dos parâmetros de validade dos actos administrativos, se verifica um nexo de causalidade entre os factos que presidiram à condenação do ex-Secretário e os actos declarados nulos pelo acto recorrido, o que manifestamente não foi feito, seja no âmbito do procedimento administrativo, seja no âmbito dos presentes autos.
    … A nulidade de um acto por envolver a prática de um crime "requer a realização de diligências probatórias qualificadas traduzidas num esforço de indagação igualmente qualificado, capaz de demonstrar que entre o crime praticado e o sentido da decisão adoptada há uma conexão causal relevante idónea, por si só, sendo ela discricionária, a fazê-la desviar-se do fim que necessariamente tem de prosseguir - a realização do interesse público".
    … Conclui o Autor, a propósito do presente caso: "Ora isso está muito longe de ficar demonstrado nos autos, especialmente na fundamentação da decisão (de 2.º grau) do Chefe do Executivo declarativa da nulidade dos actos que autorizaram a transmissão das concessões, pelo que sendo este um domínio avesso, por definição, a soluções regidas por um acrítico princípio de automaticidade, não resta senão concluir por erro de direito na interpretação e aplicação do artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do CPA" .
    
    20.2. A esta objecção fomos já respondendo, mas não se deixa de salientar que essa posição não deixa de ser uma interpretação possível, face ao disposto na letra do art. 122º, n.º 2, c) ao referir “acto que constitua crime”.
    Vamos ser directos e parcos em palavras, como não temos sido até aqui.
    Essa foi, em certa linha, também a nossa posição, na esteira do defendido por Marcello Caetano,38 posição que vimos superiormente revogada, tal como supra dissemos.
    Esse entendimento, mantido pela recorrente e remetendo para o douto parecer junto aos autos, também não exprime, com todo o respeito e salvo melhor interpretação, a posição manifestada na anotação ao artigo em obra co-autorada pelo co-subscritor do douto parecer ora junto, não deixando aquela posição de servir de fundamento à decisão judicial que tem vingado no ordenamento da RAEM.
    20.3. Matéria esta que não é líquida na Doutrina, colhendo-se aqui e ali diferentes posições,39 tal como acima já concretizado. Mas outros autores se podem apontar: é o caso de David Blanquer40 que parece ir no sentido de que o acto tanto pode ser simultâneo ao ilícito penal, como posterior à sua comissão, como sucede quando o acto é ditado como consequência da prática do delito, suposto sendo sempre que exista uma “sentencia penal firme”. Ou Navarro, (tb. já referido) segundo o qual seriam nulos os actos de conteúdo delitivo, abrangendo não só os casos em que o objecto do acto constitui crime, como também os actos viciados por um delito, “nos quais o elemento delitivo se situa no iter da produção do acto”.41

20.4. Por tudo o que ficou dito e especialmente em nome da harmonia do sistema, numa matéria tão sensível, somos a acatar este entendimento numa interpretação que aparentemente alarga o alcance literal da norma.
20.5. Não sem que se deixe de referir, em termos de apontamento de Direito Comparado, que o novo CPA, em Portugal, no art. 161º introduziu uma nova redacção, dizendo serem nulos, designadamente, os actos “cujo objeto ou conteúdo seja impossível, ininteligível ou constitua ou seja determinado pela prática de um crime;”, depois de se assinalar no respectivo preâmbulo “Por um lado, por razões de certeza e segurança, determina-se que a nulidade pressupõe a respectiva cominação legal expressa, eliminando-se a categoria das «nulidades por natureza», definidas através de conceitos indeterminados, que suscitariam dúvidas de interpretação.

Aí, sim, na parte final da norma, o legislador passou a ser claro, parecendo impor-se realmente a comprovação da causalidade que a ora recorrente entendia ser pertinente ao longo do procedimento e dos presentes autos.

Mas não é essa norma que vigora entre nós, pelo que subsiste a necessidade da melhor interpretação, que vai no sentido acima delineado.


20.6. Em face do exposto, não se deixa de concluir pela improcedência do presente recurso contencioso.


    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em julgar improcedente o presente recurso contencioso.
    Custas pela recorrente, com 30 UC de taxa de justiça.
    
               Macau, 18 de Junho de 2015
               João A. G. Gil de Oliveira
               Ho Wai Neng
               José Cândido de Pinho

Presente
Victor Manuel Carvalho Coelho,
1 Vd. Código do Procedimento Administrativo de Macau, Anotado e Comentado, fls. 603 a 618, de Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho.
2 Vd. Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª edição, fls. 642, de Mário Esteves de Oliveira
3 - Ac. TSI, de 11/10/2912, Proc. n.º 229/2012
4 - Castro Mendes, , Direito Civil, Teoria Geral, 1979, III, 671.
5 - Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves, Pacheco Amorim, CPA Comentado, 2ª ed., 846
6 - Man. Dto Adm., 10ª ed., 1972, I, 639; Mário Esteves de Oliveira e outros, ob. cit. 850; Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, 2002, 608, não obstante as perplexidades manifestadas; Pedro Gonçalves, O Contrato Administrativo, 2003, 145
7 - CPA de Macau, Anotado e Comentado, 1998, 979 ( ainda que no âmbito do CPA pré-vigente, mas sobre norma com a mesma redacção)
8 - Marcelo Rebelo de Sousa e Salgado de Matos, Contratos Públicos, Dto Adm. Geral, III, Dom Quixote, 2008, 128e 129

9 - O Contrato Administrativo, Almedina, 2003, 141
10 - Ob. cit., 128
11 - CPA Comentado, 2ª ed., 645
12 - As Formas Principais da Actividade Administrativa: Regulamento, Acto e Contrato Administrativo, http://www.estig.ipbeja.pt, 103 e segs; 109
13 – Ac. RL, de 21/5/1992, Proc. n.º 0043096.
14 - Lições de Direitos Reais ministradas ao 4.º ano jurídico da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, no ano lectivo de 1999/2000
15 - "Direitos Reais", 1979, vol. II, pags. 1010 a 1012 e 1024 a 1028
16 - Direito Civil, Direitos Reais, Coimbra Editora, 1993, 622
17 - Ac. TUI, de 25/7/2912, Proc. n.º 48/2012
18 - Parecer da PGR, de 14/4/2011, Parecer n.º CB00042010
19 - cfr. Curso de Processo Penal, Tomo III, Editorial Verbo, 3.ª Edição, 2009, 41 e 42.

20 - Ac. STJ, de 13/11/2003, Proc. n.º 03B2998
21 - Ac. STJ, secção, de 6/1/2000, Revista n.º 1065/99 - 7.ª Secção, Sumários do STJ 37ª-29 e ainda acórdão anteriormente citado
22 - Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, pág. 710
23 - Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª Edição, pág. 645
24 - Proc. 046825, do STA, de 1/2/2001
25 - Ac. STA de 09/02/1999, proc. 039379 e no mesmo sentido o Ac. do STA, proc. 041191, de 27/09/2000
26 - Ac. do STA, proc. 0974/08, de 25/02/2009
27 - cfr. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, ob. e lugar citados
28 - Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª Edição, Almedina, 845

29 - Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, FM, SAFP, 1998,710
30 - Código do Procedimento Administrativo Comentado», 2ª edição, 645
31 - Marcello Caetano, Man. Dto. Adm., 10ª ed., 182
32 - Marcello Caetano, ob. cit., 49
33 - Citado por Sérvulo Correia, estudos Sobre a Constituição, 3º, 662
34 - ob. cit., 655
35 - A Nulidade do Acto Administrativo, Jurismat: Revista Jurídica n.º 02 (2013) 128 a 130, http://recil.grupolusofona.pt/bitstream/handle
36 - Ob. cit., 655
37 Ac. STA, de 8/1/2009, Proc. n.º 0962/08
38 - Ob. cit., 512 e 513
39 - Vd., para além de Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim, ob. supra cit., Freitas do Amaral, Dto Adm., III, 334. Vd ainda Preâmbulo do DL442/91, sendo clara a opção do legislador perante a polémica existente
40 - Derecho Administrativo, 1º, El fin, los médios y el control, Valencia, 2010, 472
41 - DerechoAdministrativo, II, 147, citado por Santos Botelho, Pires Esteves, Cândido Pinho, CPA, 4ª ed., Almedina, 703
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755/2012 11/197