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Proc. nº 173/2016
Suspensão de Eficácia
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 07 de Abril de 2016
Descritores:
-Revogação de autorização
-Trabalhador não residente
-Prejuízo de difícil reparação

SUMÁRIO:

I. Cabe ao requerente a prova dos factos conducentes à demonstração do prejuízo de difícil reparação para a sua esfera previsto na alínea a), do nº1, do art. 121º do CPAC.

II. A falta deste requisito é suficiente para a improcedência da providência.





Proc. nº 173/2016

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A, casada, titular do BIRM nº 1XXXXX1 (8), residente na Rua de XX, edifício do XX, Bloco XX, XXº andar, XX, na Taipa, (Macau), requer a suspensão de eficácia do despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 5/02/2016, o qual manteve a decisão do GRH que revogou a autorização de contratação de um trabalhador não residente que anteriormente lhe havia sido concedida.
A requerente invoca para o efeito os requisitos do art. 121º, nº 1, do CPAC.
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Contestou a entidade requerida, sustentando que a requerente não conseguiu demonstrar os prejuízos de difícil reparação para a sua esfera.
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O digno Magistrado do MP, no seu parecer final, manifestou a opinião de que o pedido não merece ser deferido.
Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O Tribunal é competente em razão da matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do pedido.
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III – Os Factos
Julga-se assente a seguinte factualidade:
1. No ano de 2014, a recorrente A pediu, em nome próprio, ao GRH autorização para contratar um trabalhador não residente como adjunto familiar (Doc. n.º 2, p.i.).
2. Por volta de 5 de Março de 2015, B (adiante, designada simplesmente por C) começou, formalmente, a trabalhar para a recorrente (Doc. n.º 3, p.i.).
3. As tarefas rotineiras da referida adjunta familiar incluíam não só os trabalhos domésticos comuns, mas também a tarefa de cuidar da filha menor da recorrente, D, que ainda não frequentava escola (Doc. n.º 4, p.i.).
4. O cônjuge da recorrente, E, contratou, em nome próprio, uma outra empregada doméstica, chamada F, doravante designada por G, cujo trabalho tinha uma natureza mais ou menos igual à do trabalho de C, mas com a diferença de que G cuidava principalmente do filho da recorrente que tinha oito anos de idade (Doc. n.º 5, junto com a p.i.).
5. A adjunta familiar da recorrente, C, tinha trabalhado para a mãe da recorrente desde cerca de oitos anos atrás.
6. Antes da contratação de C, a recorrente tinha empregado outros adjuntos familiares.
7. C, por ser empenhada e afectuosa, era uma pessoa adequada para cuidar da filha pequena, pelo que a recorrente, em Março de 2015, contratou C para ajudar nos trabalhos de casa como adjunta familiar e tomar conta da sua filha.
8. Na verdade, a filha da recorrente estava sob a guarda da avó desde o seu nascimento, como na altura a avó já tinha empregado C como adjunta familiar, a filha da recorrente e C têm entre si relações bastante boas e próximas.
9. C tem imensa experiência enquanto adjunta familiar, e é uma pessoa bondosa, cuidadosa e afectuosa, além de amar muito a filha da recorrente.
10. A família da recorrente tem estado satisfeita com o desempenho de C, mantendo com ela relações estreitas e harmónicas e de cada vez que foi viajar C também viajava com ela. (Doc. n.º 6).
11. Actualmente, a recorrente e o seu cônjuge E estão a explorar centros de explicações, transporte (escolar) e educação respectivamente nos 11º, 12º e 17º andares do Edf. XX sito na Rua do XX, um dos quais denominado PLAY GROUP.
12. Conforme as informações prestadas pela Direcção dos Serviços de Finanças, o número de trabalhadores contratados pelo casal nos referidos estabelecimentos é de 71. Já se apresentaram na fase do recurso hierárquicos documentos pertinentes (Doc. n.º 7).
13. Agora, além de gerir os centros de explicações, transporte (escolar) e educação, a recorrente precisa ainda de elaborar manuais para o centro de educação e atender os pais dos alunos. Por esse motivo, a recorrente e o seu cônjuge estão muito ocupados, saem cedo de casa e voltam tarde todos os dias.
14. Em 7 de Outubro de 2015, nove agentes policiais da Secção de Informações do Comissariado Policial n.º 2, divididos em três grupos, realizaram uma acção de fiscalização nos centros de explicações, transporte (escolar) e educação explorados pela recorrente e seu cônjuge e localizados nos 11º, 12º e 17º andares do Edf. XX na Rua do XX.
15. Quando faziam fiscalização no 12º andar, os agentes policiais viram a adjunta familiar C, segurando nas mãos uma tigela amarela com o sinal do H, que pertencia à filha da recorrente e continha duas asas de frango, tomando também duas bananas.
16. Foi proferido, na sequência dessa acção de investigação, o despacho nº nº 48437/IMO/GRH/2016, de 17/12/2015 que revogou a autorização de contratação de um trabalhador não residente.
17. Foi interposto recurso hierárquico necessário para o ora requerido que, por despacho de 5/02/2016, decidiu o seguinte:
«Do Despacho n.º 48437/IMO/GRH/2015 de 17 de Dezembro de 2015, que revogou a autorização de contratação de 1 (um) trabalhador não residente, A interpôs recurso hierárquico necessário em 18 de Janeiro de 2016, pedindo que fosse recuperada a autorização de contratação de 1 (um) trabalhador não residente. Venho transcrever abaixo o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 5 de Fevereiro de 2016, proferido na nossa Informação n.º 03983/INF/GRH/16 de 3 de Fevereiro de 2016:
Mantém-se o decidido pelo despacho impugnado.
O referido despacho foi prolatado com base nos seguintes argumentos expostos na informação:
1. Pese embora a requerente tenha entregado justificação escrita e os documentos em falta, mostra-se infundada a justificação prestada pela requerente relativamente ao facto referido no ofício do CPSP n.º 989/SFRDI/2015P, segundo o qual, numa acção de fiscalização levada a cabo em 7 de Outubro de 2015 a um centro de explicações, o pessoal do CPSP detectou que a trabalhadora não residente (B) que a requerente foi autorizada a contratar para desempenhar trabalhos domésticos estava a trabalhar no centro de explicações. Verifica-se também desconformidade com o motivo exposto no requerimento de contratação de trabalhador não residente formulado a este Gabinete.
2. De acordo com os dados arquivados do Serviço de Migração, a respectiva trabalhadora não residente foi contratada pela requerente em 6 de Março de 2015. Mas os registos de movimentos bancários ora apresentados pela requerente resulta que a conta bancária da dita trabalhadora não residente tem apenas registos respeitantes a três meses, sendo que, no período de Abril a Setembro de 2015 e em Novembro de 2015, a requerente, ao arrepio do disposto no art.º 27.º da Lei n.º 21/2009, não pagou a remuneração mensal por meio de depósito à ordem da trabalhadora em instituição bancária da RAEM.
Em consonância com o art.º 25.º, n.º 2, al. a) do CPAC aprovado pelo DL n.º 110/99/M de 13 de Dezembro, e o art.º 36.º, al. 8), inciso (2) da Lei n.º 9/1999, deste acto administrativo, a requerente pode interpor recurso contencioso para o TSI no prazo de 30 dias.
O Coordenador Substituto I
Aos 12 de Fevereiro de 2016».
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IV – O direito
1 - O art. 121º do CPAC dispõe:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
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2 – Dos requisitos do nº1, do art. 121º do CPAC.
Tem sido entendido que os requisitos da providência previstos no art. 121º do CPAC são de verificação necessariamente cumulativa1, pelo que a falta de um deles importará o indeferimento da pretensão.
A regra geral citada apenas cederá, por excepção, nos casos em que em concreto concorra alguma das excepções previstas nos nºs 2 a 4 do art. 121º do CPAC.
Ora, na situação dos autos, porém, não estamos seguramente perante a situação do nº 2, nem do nº3.
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3 – Ora bem. A posição deste tribunal é no sentido de que a suspensão de eficácia ora peticionada, a decretar-se, não determinaria grave lesão do interesse público (al. b), do nº1), e no de que, ao menos de modo evidente, não se nos afigura a existência de fortes indícios de ilegalidade na interposição do recurso contencioso (al. c), nº1).
Mas, já nos parece que a requerente não conseguiu demonstrar o requisito da alínea a), do nº1, do citado artigo.
Efectivamente, ainda que o trabalhador não residente em causa estivesse efectivamente a trabalhar unicamente como empregada doméstica no lar da requerente – e não no centro de explicações de que esta é co-proprietária – não se vê como a revogação da autorização em apreço afecte de modo decisivo e definitivo a educação da filha daquela ou cause à requerente um prejuízo de difícil reparação.
Antes de mais nada, não é difícil conseguir outra empregada doméstica que substitua aquela. Assim, não entendemos como uma empregada de lar, por mais fiel, dedicada e afectuosa que se mostre para a filha da requerente seja considerada insubstituível. Não há família em Macau que, tendo possibilidades materiais para tanto, não consiga uma empregada doméstica (v.g., de nacionalidade filipina ou chinesa).
Certamente, com as qualidades que a requerente descreve na pessoa de C, a requerente estará descansada e tranquila na sua própria actividade profissional, por saber que no seu lar está alguém zelando pelas necessidades da sua filha.
Mas, nada, nem ninguém, pode garantir-nos que essa pessoa seja a única capaz de desempenhar tais funções de ama. É preciso admitir que, com o mesmo cuidado e zelo, apareça alguma outra que esteja disposta a desempenhar o mesmo papel cuidador da criança.
Aliás, estando a filha da requerente a frequentar o centro de que esta é proprietária, a dificuldade relativa à satisfação das necessidades de cuidados e educação dela atenuam-se, desde logo. Na verdade, parte dos problemas que a “perda” desta empregada implica fica logo resolvida pelo facto de a requerente estar junto da filha no centro, acompanhando-a com melhor e mais profícua proximidade, eventualmente apoiada por alguma especial empregada dessa mesma unidade de apoio educativo.
Admitimos, evidentemente, que a perda desta empregada causará algum transtorno à requerente. Será preciso contratar outra pessoa e também damos de barato que será necessária alguma sorte na selecção rápida de outra empregada que reúna idênticas capacidades e competências. Mas, sabido que não há duas pessoas iguais, também espera este tribunal que a requerente tenha rápido e pleno êxito na procura da solução que melhor se adeqúe aos seus intentos.
O que não podemos é aceitar que esse eventual incómodo seja de molde a preencher o requisito da alínea a), do nº1 do art. 121º: prejuízo de difícil reparação.
Ora, a prova dos requisitos de procedibilidade da providência recai sobre a requerente. Sendo assim, a falta de prova do requisito da alínea a), do nº1 do art. 121º do CPAC conduz à improcedência do pedido.
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em indeferir o presente pedido de suspensão de eficácia.
Custas pela requerente com taxa de justiça em 5 UC.
TSI, 07 de Abril de 2016

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José Cândido de Pinho Mai Man Ieng
_________________________ (Fui presente)
Tong Hio Fong
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Lai Kin Hong
1 Neste sentido, entre outros, Acs. do TUI de 2/06/2010, Proc. nº 13/2010 ou de 13/05/2009, Proc. nº 2/2009, TSI de 10/03/2011, Proc. nº 41/2011/A.
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