打印全文
Proc. nº 1077/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 21 de Abril de 2016
Descritores:
-Marcas
-Caducidade
-“Tempus regit actum”
-Recurso Judicial

SUMÁRIO:

I. Declarada administrativamente a caducidade de uma marca, nada obsta a que uma outra requerida por terceiro, com idêntica designação, possa ser registada, já que nesse caso a DSE apenas tem que conceder ou não conceder o registo de acordo com as circunstâncias fácticas e jurídicas existentes no momento em que decidir (“tempus regit actum”).

II. A tanto não obsta a circunstância de o titular da marca caducada ter interposto “recurso judicial” previsto no art. 275º do RJPI, já que ele não tem efeito suspensivo sobre a decisão administrativa.




Proc. nº 1077/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A LIMITADA, sociedade por quotas de responsabilidade limitada com sede na XXX, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º XXX, -----
interpôs recurso judicial no TJB (Proc. nº CV3-12-0043-CRJ) das decisões do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, Substituto, da Direcção dos Serviços de Economia, datadas de 1 de Agosto de 2012, -----
que autorizaram o registo das marcas N/25217 (XXX Tower), N/25220 (XXX International Hotel And Tower) e N/30440 (XXX), todas para a classe 43, a favor de B, pedindo a sua anulação.
*
Foi na oportunidade proferida sentença, a qual julgou parcialmente procedente o recurso judicial, anulando a decisão recorrida relativa à marca N/25217, e autorizando o registo das marcas N/25220 e N/30440 relativamente aos serviços nela descritos.
*
Contra essa sentença recorreu jurisdicionalmente B, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da decisão que confirmou o registo das marcas N/25217, N/25229 e N/30440, mas apenas parcialmente, tendo-se decidido que, atento o facto de que a marca N/18592 ter sido parcialmente declarada válida, e abrangendo esta última alguns serviços da especificação das marcas N/25217, N/25229 e N/30440, os mesmos não deveriam constar da especificação das marcas N/25217, N/25229 e N/30440.
B. Os serviços excluídos da especificação destas marcas foram: “fornecimentos de serviços de restauração; café; bar de café; casa de chá; bistros, refeitórios provisórios, self-service, snack bars e casa de sandes, buffet e fast food, estabelecimentos de comida confeccionada, padaria e serviços de catering.”
C. Sendo uma questão importante nestes autos, a da imitação descarada da marca do Recorrente, não é a essencial, porquanto a marca N/18592 não existia nem era válida à data em que foram proferidos os despachos recorridos.
D. Relativamente ao primeiro requisito da alínea b) do n.º 1 do artigo 215.º, a sentença assenta no pressuposto, errado, de que existe uma marca prévia registada, a marca N/18592.
E. A marca N/18592 foi cancelada por despacho administrativo proferido a 17 de Julho de 2012 publicado no Boletim Oficial nº 31 a 1 de Agosto de 2012, pelo que, quando a DSE proferiu a 1 de Agosto de 2012 os despachos de concessão das marcas N/25217, N/25229 e N/30440 ora recorridos, a marca N/18592 não existia validamente.
F. O presente processo, iniciado como Recurso Judicial, é um recurso de uma decisão administrativa proferida pela DSE, no qual apenas relevam os factos e circunstâncias existentes à data em que foi proferida a decisão i.e., a 1 de Agosto de 2012.
G. Se à data em que foram concedidas as marcas N/25217, N/25229 e N/30440, a marca N/18592 não existia, temos como óbvio que:
i) à data do despacho de concessão das marcas do Recorrente não existiam quaisquer direitos prévios;
ii) é logicamente impossível que as marcas N/25217, N/25229 e N/30440 preenchessem o requisito de imitação, pois não é possível imitar uma marca (N/18592) que não existe ...
H. Pelo contrário: a marca N/18592, ao ser concedida a 15 de Janeiro de 2015, violava, por imitação, os direitos prévios do Recorrente, registados a 1 de Agosto de 2012 (com a concessão das marcas N/25217, N/25229 e N/30440).
I. A alínea b) do n.º 1 do artigo 215.º tem de ser devidamente interpretada e lida na sua globalidade. Esta alínea propugna que deve ser recusado o registo a marca registranda i) que reproduza ou imite marca anteriormente registada (que já vimos não ser o caso, mas adiante) e ii) que tal reprodução “possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada.” (negrito nosso).
J. Não existe risco de que se confundam estas marcas N/25217, N/25229 e N/30440 com a N/18592, visto que nunca irá haver concorrência entre os serviços que o Recorrente ofereça e os fornecidos pela Recorrida pois são de tipologia diferente, para consumidores diferentes.
K. Os serviços de restauração do Recorrente são normalmente prestados num complexo XXX e não individualmente em restaurante, como no caso da Recorrida - o tipo de clientes é completamente diferente, sendo os estabelecimentos do Recorrente de luxo ou seis estrelas.
L. Como foi referido pelo Tribunal de Segunda Instância em acórdão proferido a 15 de Março de 2012 (no processo no. 98/2011) “(...) o universo de clientela entre uma e outra parte é qualitativamente diferente, sendo que a clientela dos produtos e serviços do A. (...)” [B, ora Recorrente] o “(...) atira para uma elite ligada aos serviços de luxo e alta qualidade”, além de que “(…) interrogamo-nos, onde é que pode haver concorrência entre os livros, o programa televisivo e os alegados contratos de licenciamento para um empreendimento imobiliário em negociação e actividade desenvolvida pela ré?” (negritos nossos).
M. A sentença proferida neste processo também refere que é na palavra Trump que está a capacidade distintiva das marcas N/25217, N/25229 e N/30440. E de onde resulta esta capacidade distintiva desta palavra? Da pessoa do Recorrente.
N. Estamos claramente perante um caso de capacidade distintiva adquirida no trato comercial (ou “secondary meaning”). Segundo a doutrina e jurisprudência “Um sinal originariamente sem capacidade distintiva pode adquirir um carácter distintivo pelo uso que dele foi feito. Fala-se, a este respeito de secondary meaning, querendo aludir-se ao particular fenómeno de conversão de um sinal originariamente privado de capacidade distintiva num sinal distintivo de produtos ou serviços, reconhecido como tal, no tráfico económico, através do seu significado secundário, por consequência do uso e de mutações semânticas ou simbólicas.” - cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Setembro de 2009, citando Luís Gonçalves (Direito de Marcas, 2ª ed., Almedina, 2003, pág. 98).
O. Em juízo e por várias vezes, os Tribunais de Macau concluíram, em audiência de julgamento, que tanto a firma da Recorrida como a marca N/18592 foram adoptadas pela Recorrida e pelos sócios como uma cópia do nome de B, tendo consciência dessa imitação e da pré-existência do nome de B (ora Recorrente).
P. Esses mesmos factos levaram o Tribunal de Segunda Instância (no processo 98/2011) a concluir que se estava claramente perante uma situação de má-fé da Recorrida e dos seus sócios - sucedendo, porém, que essa má-fé não constituía fundamento, face à lei em vigor, para o cancelamento da marca, ainda que obtida de má-fé.
Q. Contudo, se essa mesma má-fé, como foi oportunamente deliberado, não podia levar ao cancelamento da marca N/18592 ou da firma da Recorrida, deverá porém servir para que a ora Recorrida não venha aqui apresentar os argumentos contrários aos que invocou.
R. Ao afirmar, nomeadamente, que as marcas de B (que a Recorrida copiou na N/18592) induzem confusão (?!?!) com a marca da Recorrida (que esta por sua vez copiou do nome de B).
S. Agindo assim a Recorrida como nada se tivesse passado desde 2007, ano em que foram iniciadas as referidas acções, e como se B, ao registar as marcas N/25217, N/25220 e N/30440, procurasse imitar a Recorrida (!?!) e induzir em confusão os consumidores (quando foi essa, claramente, a pretensão da Recorrida, facto que ficou demonstrado em juízo).».
*
A recorrente “A Limitada” respondeu ao recurso, sem concluir, em termos que aqui damos por integralmente reproduzidos.
*
Cumpre decidir.
***
II – Os Factos
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
«A. Em 7 de Setembro de 2005, a recorrente apresentou à DSE o pedido de registo da marca N/18592, com o logótipo XXX, destinada a assinalar serviços de classe 42: serviços de hotéis e motéis; fornecimento de acomodações temporárias; fornecimento de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimento de serviços de salões de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearias, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios; cafés; bares de café; casas de chá; refeitórios pequenos; restaurantes temporários; cantinas de auto-serviço; “snack-bars” e refeitórios pequenos de sanduíches; restaurantes de auto-serviço e restaurantes de refeições rápidas; casas de mercearias finas; padarias; e serviços de “catering” para banquetes.
B. Por despacho de 5 de Janeiro de 2006, do chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da DSE, à recorrente foi concedida a autorização do registo da marca N/18592.
C. Tal despacho foi publicado em 2 de Fevereiro de 2006, no Boletim Oficial da R.A.E.M. n.º 5, II Série.
D. No processo n.º CV3-12-0041-CRJ do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, foi declarada caducada a parte da marca N/18592 da recorrente, respeitante aos serviços de hotéis e motéis; fornecimento de acomodações temporárias; fornecimento de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimento de serviços de salões de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearias, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios; casas de chá; cantinas de auto-serviço; restaurantes de auto-serviço; casas de mercearias finas e padarias.
E. Porém, foi reservada a seguinte parte da marca: cafés; bares de café; refeitórios pequenos; restaurantes temporários; “snack-bars”; restaurantes de refeições rápidas e refeitórios pequenos de sanduíches e serviços de “catering” para banquetes.
F. A aludida sentença transitou em julgado em 2 de Fevereiro de 2015.
G. Em 9 de Novembro de 2006, o interessado B apresentou à DSE o pedido de registo da marca N/25217, com o logótipo XXX TOWER, destinada a assinalar serviços de classe 43: serviços de hotel e alojamento; alojamento temporário; restaurantes; serviços de comida e bebida; cafés; “bistrot” e bares; “catering”; serviços de conferências e de funções e providenciar instalações para conferências e funções; serviços de pousadas para cuidados de saúde («health resort services»), nomeadamente providenciar comida e alojamento que se especializam na promoção da saúde e bem-estar gerais dos clientes.
H. Em 9 de Novembro de 2006, o interessado B apresentou à DSE o pedido de registo da marca N/25220, com o logótipo XXX INTERNATIONAL HOTEL AND TOWER, destinada a assinalar serviços de classe 43: serviços de hotel e alojamento; alojamento temporário; restaurantes; serviços de comida e bebida; cafés; «bistros» e bares; «catering»; serviços de conferências e de funções e providenciar instalações para conferências e funções; serviços de pousadas para cuidados de saúde («health resort services»), nomeadamente providenciar comida e alojamento que se especializam na promoção da saúde e bem-estar gerais dos clientes.
I. Em 6 de Agosto de 2007, o interessado B apresentou à DSE o pedido de registo da marca N/30440, com o logótipo B, destinada a assinalar serviços de classe 43: serviços de hotéis e motéis; fornecimento de acomodações temporárias; fornecimento de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios; cafés; bares de café; casas de chá; refeitórios pequenos; restaurantes temporários; cantinas de auto-serviço; “snack-bars” e refeitórios pequenos de sanduíches; restaurantes de auto-serviço e restaurantes de refeições rápidas; casas de mercearias finas; padarias e serviços de “catering”.
J. Pelos três despachos proferidos, em 1 de Agosto de 2012, pelo chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, foram deferidos os pedidos de registo das marcas N/25217, N/25220 e N/30440, formulados pelo interessado, constantes de fls. 65 a 67 do P.A. n.º N/25217, fls. 64 a 66 do P.A. n.º N/25220 e fls. 127 a 129 do P.A. n.º N/30440, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
K. Os referidos três despachos foram publicados em 5 de Setembro de 2012, no Boletim Oficial da R.A.E.M. n.º 36, II Série».
***
III – O Direito
1 – Introdução
Para bem se perceber o que se discute no presente processo, importa que nos detenhamos nos seus aspectos fácticos essenciais, agora organizados e sistematizados.
Enquadremos, então, a situação.
MARCA N/18592 XXX da interessada recorrida “A Limitada” (classe 42):
a) A Limitada requereu em 7/09/2005 o registo da marca N/18592 XXX, para artigos e produtos da classe 42;
b) Esta marca foi concedida por despacho de 5/01/2006, publicado no BO da RAEM em 2/02/2006;
c) Em 2/03/2009 B requereu a caducidade, pelo não uso, da referida marca;
d) No dia 17/07/2012 a DSE declarou a caducidade da marca N/18592;
e) Foi interposto recurso judicial (Proc. nº CV3-12-0041-CRJ) contra tal decisão da DSE;
f) Nesse processo foi proferida sentença datada de 9/01/2014, transitada em 2/02/2015, que manteve a caducidade parcial dessa marca N/18592 na parte respeitante aos serviços de hotéis e motéis; fornecimento de acomodações temporárias; fornecimento de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimento de serviços de salões de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearias, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios; casas de chá; cantinas de auto-serviço; restaurantes de auto-serviço; casas de mercearias finas e padarias.
-
MARCAS do interessado B:
1ª - N/25217 XXX TOWER (classe 43);
2ª - N/25220 XXX INTERNATIONAL HOTEL AND TOWER (classe 43);
3ª - N/30440 B (classe 43).
a) Quanto às duas primeiras, B requereu o registo à DSE no dia 9/11/2006, que foi concedido em 1/08/2012.
b) Quanto à terceira, requerido o respectivo registo em 6/08/2007, viria este a ser concedido também no dia 1/08/2012.
-
A empresa A Limitada recorreu judicialmente nos presentes autos das decisões administrativas de 1/08/2012 que concederam o registo às marcas N/25217, N/25220 e N/30440 por as entender confundíveis com a sua N/18592, face ao elemento comum a todas elas “XXX” e aos serviços a que se destinam, tendo em conta o disposto no art. 214º, nº2, al. b) e e), e 215º, ambos do RJPI.
A sentença objecto do presente recurso jurisdicional acompanhou de perto a tese da recorrente judicial A Limitada e por tal motivo julgou parcialmente o recurso e anulou parte da decisão recorrida, mantendo a concessão do registo das marcas em causa, N/25217, N/25220 e N/30440, limitando-a porém apenas aos serviços nela identificados e em relação aos quais não haveria risco de confusão com os serviços a que correspondia a marca da recorrente N/18592.
*
2 – Do recurso jurisdicional
O ora recorrente, B, entende em primeiro lugar que a sentença não pode manter-se, por uma razão essencial: à data da concessão do registo das suas marcas, a N/18592 da empresa A Limitada ainda não existia.
No seu modo de ver, a sentença partiu do pressuposto errado de que a marca N/18592 era anterior às suas. E isso não correspondia à verdade, visto ela ter sido cancelada por despacho administrativo de 17/07/2012, publicado no BO nº 31 de 1/08/2012.
Significaria isto, portanto, que não estaria verificado o requisito da imitação dos arts. 214º, nº1, al. a) e 215º do RJPI.
Tem razão.
A marca N/18592 fora extinta por caducidade total, declarada administrativamente em 17/07/2012, como acima se viu.
Efectivamente, a caducidade tem uma natureza extintiva; é uma forma de extinção de direitos por falta de exercício dentro de certo prazo (art. 291º, nº2). A caducidade é a sanção para o não exercício de direitos temporários ou de “direitos a prazo” (Oliveira Ascensão, Direito Civil-Teoria Geral, III, pág. 343-344; Rodrigues Bastos, Notas ao Código Civil, II, pág. 95).
A caducidade é, parafraseando um autor, é “a morte dos direitos; é o termo natural da eficácia dos direitos em virtude de ter chegado o seu limite máximo de duração” (Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, pág. 739).
É certo que desse despacho, publicado no BO de 1/08/2012, foi interposto “recurso judicial” que terminou com uma sentença datada de 9/01/2014, transitada em 2/02/2015, que manteve a caducidade parcial dessa marca N/18592.
Todavia, e como é sabido, o recurso judicial interposto de uma decisão administrativa em matéria de marcas não tem efeito suspensivo; é simplesmente devolutivo.
Isto significa que do despacho que declara a caducidade da marca é possível extrair desde logo todos e quaisquer efeitos.
Trata-se de um acto ablativo (definitivo em termos administrativos) que define o direito à marca – no caso, extinguindo-o – e que apenas pode ser sindicado nos tribunais em “recurso judicial” ao abrigo dos arts. 275º e sgs. do RJPI.
Aliás, e como este TSI já tem observado, este “recurso judicial”, face à matéria, ao conteúdo e origem decisora do seu objecto, apresenta a natureza de recurso contencioso (Ac. TSI, de 21/03/2002, Proc. nº 199/2001; ainda os acórdãos de 12/10/2006, nos Processos nºs 398/2006, 387/2006 e 351/2006; 7/06/2007, Proc. nº 516/2006).
Ora, assim como o recurso contencioso de actos administrativos, por via de regra, não tem efeito suspensivo, nos termos do art. 22º do CPAC, assim também este o não pode ter (não há regra que o determine, nem motivos que o justifiquem). Efeito que só eventualmente colheria através da providência cautelar de “suspensão de eficácia” a que se refere o art. 120º do CPTA, isto se for de entender aplicável ao caso esta providência.
Assim sendo, o facto de ter sido interposto “recurso judicial” contra a decisão da DSE de 17/07/2012 nenhum reflexo acarreta sobre a situação jurídica substantiva subjacente.
E daí que, também, se tenha que dizer que a Administração quando deferiu o pedido de concessão do registo das marcas do ora recorrente, o que aconteceu em 1/08/2012, já não tinha pela frente qualquer obstáculo legal ou jurídico que a impedisse de o fazer. Juridicamente a marca N/18592 tinha deixado de existir; estava “morta” e nenhum direito dela remanesceu na esfera do seu primitivo titular, a ora recorrida.
Quanto a este aspecto, tem o recorrente inteira razão: não pode dizer-se que em 1/08/2012 as marcas N/25217, N/25220 e N/30440 do ora recorrente imitavam a marca N/18592 da recorrida, porque extinta em 17/07/2012.
A DSE fez, pois, na altura o que lhe competia fazer, face ao princípio “tempus regit actum”.
Repare-se, a este respeito, que a sentença que decretou a caducidade parcial da marca de N/18592, só foi proferida no processo nº CV3-12-0041-CRJ em 9/01/2014, quase dois anos depois da concessão do registo das marcas do recorrente.
Como o nosso papel é neste momento avaliar da legalidade da sentença em crise e, consequentemente, dos actos sindicados nos autos à luz das circunstâncias de facto e de direito existentes ao tempo da prolação dos actos – e não ao tempo da solução judicial encontrada no Proc. nº CV3-12-0041-CRJ -, isso importará dizer que se não podia dar por violado o art. 214º, nº 1, al. a), e nº2, al. b), do RJPI (tb. art. 9º, nº1, al. c)) através daqueles despachos, ao contrário do que o asseverou a douta sentença aqui sob escrutínio.
Face a esta conclusão, entende este TSI que a sentença recorrida tinha que manter o registo de tais marcas N/25217, N/25220 e N/30440, não apenas parcialmente, mas em toda a dimensão inicial, tal como a DSE tinha decidido através dos referidos despachos de 1/08/2012, ou seja, para todos os produtos e serviços dentro da classe indicada para cada uma.
E assim sendo, como parece óbvio, fica prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão suscitada no recurso jurisdicional, nomeadamente a referente às alíneas b) e c), do art. 215º citado (afinidade de serviços ou produtos e erro ou confusão com marca anteriormente registada).

*
3 – Da má fé
Tinha o ora recorrente na sua contestação suscitado a má fé da aqui recorrida, matéria sobre a qual, porém, a sentença sob escrutínio não se debruçou.
No recurso jurisdicional, o recorrente insiste no assunto: a recorrente judicial tem vindo a agir com desfaçatez e má fé, pois afirma que as marcas do recorrente induzem confusão com a sua, apesar de bem saber - e de tal ter sido inclusive reconhecido em várias decisões jurisdicionais – ter sido ele quem fez uso indevido da sua marca N/18592 XXX, utilizando o seu nome.
Concordamos com as decisões judiciais a que o recorrente faz apelo nas suas alegações para reconhecer um aparente uso atrevido da marca XXX por parte da recorrida.
Todavia, essa é, quanto nos parece, mero fundamento para outro tipo de soluções que o tribunal pode fornecer, desde que accionados os mecanismos previstos no RJPI para casos destes.
O que conta para a má fé a que respeita o art. 385º do CPC é a má fé processual assente na verificação dos requisitos ali estabelecidos.
Ora, quanto a este aspecto, os autos não permitem concluir pela má fé ali prevista. Basta constatar que, tanto as decisões proferidas no âmbito do Proc. nº CV3-12-0041-CRJ, como até mesmo a produzida no âmbito dos presentes autos na 1ª instância, acabaram por reconhecer alguma razão à recorrida. Ou seja, independente do acerto de tais sentenças, elas acabam por fazer emergir uma certa “vexata quaestio”. Ou seja, se os tribunais quanto a este assunto não se têm posto de acordo, muito menos se pode achar que a recorrida tenha agido de má fé processual.
Assim, nenhumas consequências se podem extrair a este respeito contra a recorrida.
***
IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder provimento ao recurso jurisdicional, em consequência do que se revoga a sentença impugnada e se confirmam as decisões da DSE datadas de 1/08/2012 acima referidas.
Custas pela recorrida em ambas as instâncias.
Pelo incidente da má fé: taxa de justiça a cargo do recorrente em 2 UC (art. 15º do RCT).
TSI, 21 de Abril de 2016
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong



1077/2015 16