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Processo nº 587/2015
Data do Acórdão: 28ABR2016


Assuntos:

Anulação do contrato-promessa de compra e venda
Consentimento do cônjuge
Bem comum do casal


SUMÁRIO

Para alienar um bem integrado no património conjugal, é precisa a intervenção de ambos os cônjuges, sob pena de ilegitimidade conjugal, geradora da anulabilidade do negócio – artº 1554º/1 do CC.

Todavia, já não carece da intervenção de ambos ou do consentimento do outro cônjuge para prometer alienar um bem integrado no património conjugal, uma vez que até um terceiro pode fazê-lo, desde que o bem prometido alienar não seja indeterminável, a sua existência e alienação não sejam física ou legalmente possíveis e o negócio prometido não seja contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes – artº 273º do CC, a contrario.


O relator

Lai Kin Hong

Processo nº 587/2015


Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I

No âmbito dos autos de acção ordinária, registada sob o nº CV2-14-0062-CAO, que correm os seus termos no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, movida por A contra B e C, foi proferido pelo Juiz titular do processo o seguinte despacho de indeferimento liminar:

  O autor diz-se casado com a primeira ré no regime de bens da comunhão de adquiridos e diz ainda que a primeira ré prometeu vender à segunda ré um imóvel pertença da comunhão conjugal sem obter o consentimento do autor. Entende, por isso, que o contrato-promessa é anulável e pede que se declare tal anulabilidade contratual.
  Claramente esta é uma acção de anulação cuja causa de pedir é, nos termos do disposto no art. 417°, nº 4, constituída pelos factos concretos de onde decorre a anulabilidade contratual invocada: falta de consentimento para promessa de venda de um imóvel comum do casal.
  É, porém, evidente que a pretensão do autor não pode proceder. Os cônjuges não necessitam do consentimento do seu consorte para celebrar contratos-promessa de compra e venda prometendo vender imóveis da comunhão conjugal. E, por isso, não é anulável o contrato-promessa sub judice. Na verdade, segundo o denominado princípio da equiparação, ao contrato promessa aplicam-se as disposições do contrato prometido. Porém, com excepção das disposições relativas à forma e das que, pela sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa (art. 404°, n° 1 do CC). Ora, um dos cônjuges não pode, sem o consentimento do outro, alienar os imóveis da comunhão conjugal (art. 1548°, n° 1 do CC), mas nada impede que prometa alienar tais imóveis. Tal promessa implica que o promitente vendedor promete também que irá obter o necessário consentimento para celebração do contrato definitivo ou que irá colocar-se numa situação que dispense tal consentimento até à celebração do contrato prometido, ou porque o outro cônjuge também outorgará o contrato definitivo ou porque o casamento entretanto se extinguiu, cabendo ao promitente o imóvel prometido vender1. Na verdade, o cônjuge promitente-vendedor pode obter mais tarde, depois da promessa, o consentimento ou adquirir como bem próprio o bem comum prometido vender e, então, celebrar validamente a prometida venda. A razão de ser da proibição de venda sem consentimento é o efeito translativo da propriedade do contrato de compra e venda - só ambos os cônjuges podem transmitir o que pertence à comunhão conjugal e, por isso, ou o fazem os dois, ou o faz um com o consentimento do outro. Ora, tal efeito translativo não se verifica em relação ao contrato promessa, razão porque não é aplicável a este contrato aquela norma nem a respectiva sanção de anulabilidade contratual (art. 1554° do CC). A norma que exige o consentimento dos cônjuges para a venda de bens comuns não é aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, uma vez que a sua razão de ser reside no efeito translativo do contrato de compra e venda que o contrato-promessa não tem2,
  Assim sendo, como se julga que é, cabe concluir que deve ser indeferida liminarmente a petição inicial por ser evidente que não pode proceder.
  Pelo exposto, nos termos do disposto no art. 394°, nº 1, al. d) do Código de Processo Civil, indefere-se liminarmente a petição inicial.
  Custas pelo autor.
  Notifique.

Não se conformando com o indeferimento liminar, veio o Autor A recorrer da mesma concluindo e pedindo que:
錯誤錯誤適用法律
1. 被上訴的批示指出 “Claramente esta é uma accão de anulação cuja causa de pedir é, nos termos do disposto no art. 417º, nº4, constituída pelos factos concretos de onde decorre a anulabilidade contratual invocada: falta de consentimento para promessa de venda de um imóvel comum do casal.
É, porém, evidente que a pretensão do autor não pode proceder. Os cônjuges não necessitam do consentimento do seu consorte para celebrar contratos-promessa de compra e venda prometendo vender imóveis da comunhão conjugal. E, por isso, não é anulável o contrato-promessa sub judice. Na verdade, segundo o denominado princípio da equiparação, ao contrato promessa aplicam-se as disposições do contrato prometido. Porém, com excepção das disposições relativas à forma e das que, pela sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa(art. 404°, n° 1 do CC). Ora, um dos cônjuges não pode, sem o consentimento do outro, alienar os imóveis da comunhão conjugal (art. 1548°, nº 1 do CC), mas nada impede que prometa alienar tais imóveis. Tal promessa implica que o promitente vendedor promete também que irá obter o necessário consentimento para celebração do contrato definitivo ou que irá colocar-se numa situação que dispense tal consentimento até à celebração do contrato prometido, ou porque o outro cônjuge também outorgará o contrato definitivo ou porque o casamento entretanto se extinguiu, cabendo ao promitente o imóvel prometido vender. Na verdade, o cônjuge promitente-vendedor pode obter mais tarde, depois da promessa, o consentimento ou adquirir como bem próprio o bem comum prometido vender e, então, celebrar validamente a prometida venda, A razão de ser da proibição de venda sem consentimento é o efeito translativo da propriedade do contrato de compra e venda - só ambos os cônjuges podem transmitir o que pertence à comunhão conjugal e, por isso, ou o fazem os dois, ou o faz um com o consentimento do outro. Ora, tal efeito translativo não se verifica em relação ao contrato promessa, razão porque não é aplicável a este contrato aquela norma nem a respectiva sanção de anulabilidade contratual (art. 1554° do CC). A norma que exige o consentimento dos cônjuges para a venda de bens comuns não é aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, uma vez que a sua razão de ser reside no efeito translativo do contrato de compra e venda que o contrato-promessa não tem.
Assim sendo, como se julga que é, cabe concluir que deve ser indeferida liminarmente a petição inicial por ser evidente que não pode proceder.
Pelo exposto, nos termos do disposto no art. 394º, nº 1, al. d) do Código de Processo Civil, indefere-se liminarmente a petiçaõ inicial.
Custas pelo autor.”
2. 對於原審法院在法律適用的問題上,除給予應有之尊重外,上訴人不能認同。
3. 上訴人與第一被告B於1994年12月02日在廣東省珠海市香洲區人民政府登記結婚,當時上訴人與第一被告並沒有訂立任何婚前協定,根據中華人民共和國婚姻法規定,其財產制應為婚後取得共同財產制,結婚後亦沒有更改婚姻財產協定。
4. 由於上訴人與第一被告結婚時所採用之婚姻財產制度為婚後取得共同財產制,而且第一被告是在婚後購人本案所針對的單位之業權,依據澳門《民法典》第1603條以及第1607條之規定,“夫妻共同擁有任一方在取得共同財產制存續期內取得之財產,但被法律排除而不屬共同擁有之財產除外。”上述物業實屬上訴人與第一被告夫妻間之共同財產,上訴人針對該物業具有一半的業權。
5. 依據澳門《民法典》第1548條之規定,“僅在夫妻雙方同意下,方可將共同擁有之不動產或商業企業轉讓、在其上設定負擔、將其出租或在其上設定其他享益債權,但不影響商法規定之適用。”故第一被告在未經得上訴人同意的情況下,其不可以單方面出售上述之物業。
6. 然而,在未得到上訴人同意的情況下,第一被告於2013年5月30日,獨自與第二被告簽署一份預約買賣合同並已收取了港幣伍拾萬元(HK$500,000.00)的定金,將本案所針對的單位以港幣叁佰貳拾萬元(HK3,200,000.00)出售予第二被告。
7. 選擇締結預約合同的原因主要可分為兩大類:第一類是締約人希望即時締結合同,而且早已對合同的各種元素及條件達成協議,只是法律上的條件不具備或者客觀條件的不具備,締約人為了保障合同在將來得以締結,故此先行以預約合同構成約束,但該約束是確定的,當事人並非準備在訂立合同後還可隨時反悔。
8. 第二類是預約當事人在訂立預約的時候,完全有可能即時締結本約、無論客觀上或法律上均沒有影響當事人締結本約的事實。可是,當事人行使其自由意思,為了種種利益考量而選擇延遲締結本約,但又希望先行建立某種約束,於是便有臨時預約制度,且保留了反悔的權利。
9. 但無論是第一類或第二類原因所締結的預約合同所產生的唯一效力都是約束當事人在將來締結本約合同。當債務人沒有自願履行作出給付時,債權人既可依據《民法典》第820條規定請求特定執行,要求法律制實現約定給付,也可以依據《民法典》第436條2款規定選擇沒收定金或請求違約金。
10. 本案中第二被告針對上訴人已提起一訴訟(卷宗編號: CV1-13-0063-CAO),請求法院作出一判決以產生上訴人以及第一被告作出將物業出售予第二被告之意思表示之效力,並且宣布該物業之所有權由上訴人以及第一被告轉移予第二被告,以及定出第二被告提存有關給付之期間;及在同一判決中,要求判處上訴人以及第一被告向第二被告交付被抵押擔保之債務款項又或交付作為該物業所涉及之債務款項,並向第二被告交付已到期及未到期之利息,而該等利息係計至上述款項付清時為止;以及補充請求判處上訴人以及第一被告向第二被告作出償賠雙倍定金、印花稅、佣金及職業代理費以及法定利息。
11. 基於第二被告已針對上訴人提起一特定執行之訴,倘若該訴訟最終裁定第二被告勝訴,作出一判決以產生上訴人以及第一被告作出將物業出售予第二被告之意思表示之效力,並且宣布該物業之所有權由上訴人以及第一被告轉移予第二被告;或者判處上訴人以及第一被告向第二被告作出償賠雙倍定金、印花稅、佣金及職業代理費以及法定利息,上訴人的權利均將會受到侵害。
12. 結合澳門《民法典》第1554條第1款之規定,“對於違反第一千五百四十八條之規定而作出之行為,應夫妻中未給予同意之一方之聲請,得予以撤銷。”以及同條第2款規定“撤銷權得在聲請人知悉有關行為後六個月內行使,但不得在作出該行為後滿三年行使。”
13. 上訴人作為第一被告之配偶,且第一被告明顯在未取得上訴人同意下,獨自與第二被告簽署一份預約買賣屬上訴人與第一被告共同財產之合同。直至2014年05月18日,原告透過報紙才知悉有關的轉讓行為,上訴人與第一被告是本案所針對的單位之業權的共有人,擁有和第一被告相容的權利,故上訴人具有正當性提起本次訴訟,且知悉有關行為後六個月內,有權聲請針對第一被告與第二被告於2013年05月30日簽署一份預約買賣合同之行為予以撤銷。
14. 為保障及清晰業權人夫妻間之共同財產,故上訴人向法院要求宣告上述之買賣基於未得到上訴人同意的前提下,撤銷該預約買賣上述不動產之合同非屬明顯不成立的主張。
15. 此外,倘若待本案針對之的單位被裁定確定轉移予第二被告後,上訴人才有權提起聲請撤銷相關的買賣合同,明顯是與保障任何人均具有訴訟法院之權利以及落實訴訟經濟快捷原則相違背。
16. 基於上述規定及見解,由於本案情況不《民事訴訟法典》第139條l款d項規定,亦即上訴人並非現時明顯不應或根本無權以其未給予同意為由按照《民法典》第1554條的規定聲請撤銷相關的預約買賣合同,故此,上訴人第一請求及第二請求非屬明顯不能成立。原審法院不應以《民事訴訟法典》第139條1款d項為由,拒絕上訴人聲請撤銷相關預約買賣合同以及聲請撤銷針對該不動產在物業登記局內為確認第二被告之權利所作出的訴訟登記之請求。
17. 然而,原審法院卻以《民事訴訟法典》第139條l款d項之依據,作出批示並初端駁回上訴人之請求,這是錯誤適用法律規定。
綜上所述,和依據 法官閣下之高見,應裁定本上訴理由成立,繼而變更被上訴之合議庭裁判,因其沾有上述標題所指之瑕疵,並請求作出如下裁判:
- 裁定本上訴理由成立,並
- 廢止初端駁回上訴人之請求的批示;
繼以請求 法官閣下命令傳喚被告,如果被告想作出答辯,則在法定期限內作出答辯,否則,須承擔相應之法律後果,和命令作出隨後之程序直至本訴訟程序完結為止。
最後請求一如既往作出公正裁決。

Citadas quer para os termos da acção quer para os termos do recurso, nenhuma das Rés contestou ou contra-alegou.
II
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.

O Autor intentou a presente acção tendo alegado que o seu cônjuge, a 1ª Ré, prometeu vender a outrem um bem imóvel pertencente à comunhão conjugal sem o seu consentimento, pedindo que fosse determinada a anulação do contrato-promessa, com fundamento na anulabilidade da promessa por falta do seu consentimento e ao abrigo do disposto no artº 1554º/1 do CC.

A única questão levantada aqui é saber se a 1ª Ré, cônjuge do Autor, necessita do consentimento do seu consorte para celebrar o contrato-promessa de compra e venda do bem alegadamente integrado nos bens comuns do casal.

Ora, uma coisa é vender um bem, outra coisa é prometer vender o bem.

Para alienar um bem integrado no património conjugal, é precisa a intervenção de ambos os cônjuges, sob pena de ilegitimidade conjugal, geradora da anulabilidade do negócio – artº 1554º/1 do CC.

Todavia, para prometer alienar um bem integrado no património conjugal, até um terceiro pode fazê-lo, desde que o bem prometido alienar não seja indeterminável, a sua existência e alienação não sejam física ou legalmente possíveis e o negócio prometido não seja contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bons costumes – artº 273º do CC, a contrario.

Na esteira desse entendimento, mesmo que não seja titular de qualquer dos direitos reais sobre um bem integrado no património conjugal do casal, um terceiro pode prometer vender a outrem esse bem, desde que no momento da celebração do contrato de promessa, a aquisição do bem pelo promitente-vendedor para revender seja física e legalmente possível.

Obviamente, in casu a 1ª Ré marido pode celebrar validamente o contrato de promessa de compra e venda do imóvel, alegadamente pertencente a ambos os cônjuges por força do regime de bens do casal.

Ora bem, lido o despacho recorrido, verificamos que a questão já foi exaustivamente apreciada e correctissimamente decidida pelo Exmº Juiz a quo no despacho ora recorrido.

Conforme se vê na Douta decisão ora recorrida, foi demonstrada, com raciocínio inteligível e razões sensatas e convincentes, a improcedência manifesta do pedido do Autor, não se nos afigura outra solução melhor do que a de louvar aqui a decisão recorrida e, nos termos autorizados pelo artº 631º/5 do CPC, remeter para os Doutos fundamentos invocados na decisão recorrida, julgando improcedente o recurso da requerente e confirmando a decisão recorrida.

Resta decidir.
III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam negar provimento ao recurso interposto pelo Autor, mantendo na íntegra a decisão que indeferiu liminarmente a petição da acção.

Custas pelo recorrente.

Notifique.

RAEM, 28ABR2016

Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
1 No mesmo sentido, Chan Io Chao, Alberto, O Contrato-Promessa e o seu Regime, Tese do Curso de Mestrado de Direito em Ciências Jurídicas, pág. 23, 2007, inédito, podendo ser consultado na Biblioteca da Universidade de Macau.
2 No mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol I, 4ª edição. P. 378; Antunes Varela e Henrique Mesquita, Revista de Legislação e Jurisprudência, n° 3385, p. 296 e seguintes; Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal de 7/10/1993 e de 11/03/2011, n° 850/2001. C1. S1, in www.dgsi.pt. Chan Io Chao, Alberto, op. cit., pág. 25 e 26.
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Ac. 587/2015-11