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Processo n.º 268/2016 Data do acórdão: 2016-4-28 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– abuso de confiança em valor consideravelmente elevado
– medida da pena
S U M Á R I O
Na medida da pena relativa ao crime de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado, há que considerar as necessidades de prevenção geral deste delito.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 268/2016
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguida): A





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com o acórdão proferido em 26 de Fevereiro de 2016 a fls. 187 a 192v dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR3-15-0314-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que a condenou como autora material de um crime consumado de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado, p. e p. pelo art.º 199.º, n.os 1 e 4, alínea b), do Código Penal (CP), na pena de dois anos e dez meses de prisão efectiva, e, em cúmulo jurídico desta com a pena (de três meses e quinze dias) de prisão imposta no Processo Sumário n.º CR3-15-0121-PSM (pela prática, por ela, de um crime de reentrada ilegal), finalmente em três anos de prisão única efectiva, para além da condenação no pagamento, a favor da ofendida, de quatrocentos e oitenta mil dólares de Hong Kong de indemnização, com juros legais a contar da data dessa decisão até integral e efectivo pagamento, veio a arguida desse processo, chamada A, já aí melhor identificada, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para imputar, materialmente falando, a esse Tribunal sentenciador o excesso na medida da pena (devido à alegada violação do disposto nos art.os 40.º e 65.º do CP, por desconsideração sobretudo dos princípios da culpa e da proporcionalidade e de um conjunto de circunstâncias favoráveis a ela para efeitos da medida da pena) e erro na decisão de não suspensão da pena (ao arrepio do art.º 48.º, n.º 1, do CP), a fim de pedir que passasse a ser condenada finalmente em pena de duração inferior a dois anos, com também almejada suspensão da execução da mesma (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 205 a 207 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal a quo no sentido de improcedência da argumentação da recorrente (cfr. a resposta de fls. 216 a 218v).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 230 a 231v), pugnando também pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada nas páginas 2 a 3 do texto do acórdão ora recorrido (ora concretamente constante de fls. 187v a 188, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido) e sendo o objecto do recurso circunscrito tão-só à problemática da medida da pena (e da conexa questão de suspensão da pena), é de tomar tal factualidade provada como fundamentação fáctica da presente decisão de recurso, nos termos permitidos pelo art.º 631.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, ex vi do art.º 4.º do Código de Processo Penal.
Dessa factualidade provada, sabe-se, em especial, o seguinte:
– a conduta pela qual vinha condenada a recorrente nesta vez como autora de um crime de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado foi praticada em 26 de Maio de 2015, e causadora de um total de prejuízo pecuniário à ofendida em valor equivalente a quatrocentos e oitenta mil dólares de Hong Kong;
– em 27 de Junho de 2015, no Processo Sumário n.º CR3-15-0121-PSM, a recorrente foi condenada por um crime de reentrada ilegal, na pena de três meses e quinze dias de prisão, suspensa na sua execução por um ano e nove meses;
– a recorrente declarou ter a 3.ª classe da instrução primária, trabalhar como dona de uma loja de venda de vestuário, com cerca de dez mil renminbis de rendimento mensal, e ter a mãe a seu cargo.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Pois bem, quanto à questão do excesso na medida da pena, realiza o presente Tribunal ad quem que vistas todas as circunstâncias fácticas já apuradas pelo Tribunal a quo e descritas como provadas no texto da decisão recorrida (sobretudo a circunstância de o prejuízo total pecuniário, em quatrocentos e oitenta mil dólares de Hong Kong, causado à ofendida no crime de abuso de confiança, exceder em larga medida o montante de cento e cinquenta mil patacas atendido pelo Legislador do CP para efeitos de definição do conceito legal de “valor consideravelmente elevado”), e à luz dos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, 65.º, n.os 1 e 2, e 71.º, n.os 1 e 2, do CP, a pena de dois anos e dez meses de prisão para o crime de abuso de confiança e a pena única (saída do cúmulo jurídico desta com a pena então imposta no Processo Sumário n.º CR3-15-0121-PSM) de três anos de prisão, como tal já achadas pelo Tribunal a quo dentro das respectivas molduras penais aplicáveis (a saber: a de um a oito anos de prisão para o crime de abuso de confiança, e a do cúmulo jurídico de dois anos e dez meses a três anos, um mês e quinze dias de prisão) não se mostram desequilibradas nem desproporcionais nem tão-pouco violadoras do princípio da culpa, pelo que têm que ser respeitadas nesta Instância ad quem.
Por fim, no tocante ao pedido de suspensão da pena, também se apresenta o recurso votado ao insucesso, porquanto considerando as inegavelmente elevadas necessidades de prevenção geral do delito de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado, em função naturalmente da “grandeza” do montante de prejuízo pecuniário de quatrocentos e oitenta mil dólares de Hong Kong causado à ofendida, não se pode acreditar, em sede do art.º 48.º, n.º 1, do CP, que a simples censura dos factos e a ameaça da prisão já consigam realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, na vertente da prevenção geral.
Há, pois, que naufragar o recurso, sem mais indagação por ociosa.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pela arguida recorrente, com quatro UC de taxa de justiça.
Comunique a presente decisão à ofendida e ao Processo Sumário n.º CR3-15-0121-PSM.
Macau, 28 de Abril de 2016.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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