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Processo n.º 32/2016. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para a Economia e Finanças.
Assunto: Hotéis de cinco estrelas. Serviços principais e complementares. Imposto de turismo. Actividade vinculada. Princípio da boa-fé.
Data da Sessão: 22 de Junho de 2016.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
I – Nos hotéis de cinco estrelas constituem serviços principais o alojamento e as refeições, sendo complementares os restantes aí prestados.
II – O preço dos serviços complementares a que se refere a conclusão I são tributados em imposto de turismo, com excepção dos referentes a telecomunicações e lavandarias, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Regulamento do Imposto de Turismo, aprovado pela Lei n.º 19/96/M, de 19 de Agosto.
III – No âmbito da actividade vinculada da Administração não é operante o princípio da boa-fé.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
  
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho de 25 de Fevereiro de 2015, do Secretário para a Economia e Finanças, que, indeferindo recurso hierárquico, manteve a decisão do Subdirector da Direcção dos Serviços de Finanças, que indeferiu reclamação relativa ao acto de liquidação oficiosa do Imposto de Turismo, atinente ao período de 1 de Janeiro a 31 de Dezembro de 2010.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 4 de Fevereiro de 2016, negou provimento ao recurso.
Inconformado, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), alegando que:
- O acórdão recorrido violou o disposto no artigo 1.º do Regulamento do Imposto de Turismo (doravante designado por RIT) (e os princípios da legalidade e da tipicidade), ao apenas exceptuar da incidência do imposto de turismo o preço de serviços complementares referentes a telecomunicações e lavandarias;
- O acto recorrido violou o princípio da boa-fé ao ter alterado radicalmente a sua interpretação jurídica do artigo 1.º do RIT.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II – Os factos
O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
1 - A recorrente recebeu, em 23 de Junho de 2014, uma notificação do acto de liquidação de IT, proferido ao abrigo dos n.ºs 1 e 2 do artigo 8.º do RIT, mediante o qual foi apurada uma colecta de MOP2.303.244,00 Patacas (dois milhões, trezentas e três mil, duzentas e quarenta e quatro Patacas) relativo ao estabelecimento “Hotel Mundo de Estrelas”, com o cadastro n.º XXXXXX.
2 - A liquidação supra identificada reporta-se a 12 meses do ano de 2010, ou seja, a um período de tributação que engloba os meses de Janeiro a Dezembro desse ano, e respeita a diversos serviços alegadamente prestados pela recorrente no âmbito da actividade hoteleira que desenvolve.
3 - Por não concordar com a liquidação, a recorrente apresentou reclamação dirigida à Exma. Sr.ª Directora dos Serviços de Finanças a 8 de Julho de 2014, conforme constará do processo administrativo.
4 - Em 28 de Julho de 2014, atendendo a que o prazo de cobrança voluntária do imposto liquidado terminava 30 dias após a recepção da referida notificação, a recorrente procedeu, sob reserva, ao pagamento da respectiva colecta.
5 - Na mesma data foi a recorrente notificada do despacho de indeferimento da reclamação dirigida à Exma. Sr.ª Directora dos Serviços de Finanças tendo, a 21 de Agosto de 2014, nos termos do n.º 3 do artigo 2.º da Lei 12/2003, interposto recurso hierárquico necessário dirigido ao Chefe do Executivo.
6 - Foi no âmbito desse recurso hierárquico lavrada a seguinte Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014, de 16.07.14:
«A recorrente, inconformada com a decisão, alega que o acto administrativo padece do vício de falta de fundamentação, por ofensa dos artigos 113º, 114.º, 115.º do CPA, do vício de violação de lei, por ofensa ao disposto nos artigos 1.º, 2.º e 5.º do RIT, e aos Princípios da boa fé, da legalidade e da tipicidade, previstos nos artigos 8.º CPA e 71.º alínea 3) da Lei Básica, solicitando, nos termos dos artigos 124.º e 125.º do CPA seja revogado o acto da Senhora Directora dos Serviços de Finanças, de 18.07.14, que indeferiu o pedido de anulação do acto de liquidação de Imposto de Turismo relativo ao ano de 2010, formulado pela ora recorrente em sede de reclamação, por verificação dos vícios alegados.
Vício de violação de lei - falta de fundamentação
Vem a ora recorrente reafirmar “O acto recorrido pronuncia-se sobre a liquidação de IT relativa a um período que engloba 12 meses de prestação de serviços sujeitos a tributação, sem que seja possível à recorrente determinara conformidade legal desse acto, através da análise dos elementos necessários para que a liquidação do imposto se considere devidamente fundamentada, e que dizem respeito ao cálculo do imposto em causa, ou seja, não procede o acto recorrido à discriminação de quais os serviços concretamente prestados (e respectivo preço) que foram considerados para efeitos de liquidação, e qual o momento da ocorrência da prestação desses serviços que foi considerado nessa decisão.”
Considerando a recorrente que “Esta situação, que no caso de um imposto de prestação anual se poderia considerar regular, porquanto a matéria colectável resulta do somatório de um total de rendimentos que se geram num determinado ano fiscal, não pode verificar-se num imposto como o IT, onde a soma dos rendimentos que constituem a matéria colectável são de verificação mensal, por forma a poder ser paga a colecta devida até ao termo do mês subsequente àquele em que os serviços foram prestados (cfr. artigo 12.º do Regulamento do Imposto de Turismo, doravante designado, abreviadamente, por “RIT’’).”
Diz ainda que “Por outro lado, a motivação e qualificação dos factos tributários carece, igualmente, de ser precisa...” e que “A recorrente, a prestar serviços sujeitos a IT desde 2006, nunca foi confrontada com qualquer “advertência” por parte da administração fiscal sobre a eventual necessidade de tributar em IT uma importante parte das suas operações, designadamente, as que identifica na notificação modelo M/6 (cfr. Doc. 1), como sendo, para além do rendimento do hotel, os designados como venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, rendimentos da garagem e estacionamento, rendimentos de serviços de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias e serviços de correio, edredão, venda de amenidades, jornais e remessas (“consignment”).”... “Omitiu por isso a administração fiscal, de modo ostensivo e absoluto, uma pronúncia sobre os factos e o direito que sustentaram o acto ora impugnado.”
Mais acrescentou que a notificação refere a existência de uma proposta com o n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014 onde pressupõe ter sido exarado o despacho de indeferimento cujo teor devia ter sido integralmente comunicado à recorrente e que não foi.
Concluindo que “o acto objecto do presente recurso se encontra insuficientemente fundamentado, por força do n.º 2 do artigo 115.º do CPA, o que consubstancia vício de forma que o invalida e que justifica a sua anulação, ao abrigo dos artigos 124.º e 125.º do CPA...”
Da falta de fundamentação
Apreciando o invocado vício, comecemos por afirmar, que o acto de liquidação oficiosa se encontra devidamente fundamentado, conforme Proposta n.º XXX/NVT/DOI/RFM/2014, constante no processo administrativo que mereceu a concordância por despacho do Senhor Subdirector dos Serviços de Finanças, onde se encontram explicitadas as razões de facto e de direito para terem sido aquelas actividades tributadas, além do que melhor se poderá aferir, relativamente a toda a actividade da Administração Fiscal, que resultou na decisão ora recorrida.
Tendo-se transcrito na Nota constante no verso do modelo M/6 os elementos relevantes dessa proposta atinentes ao período e ao estabelecimento em causa.
A recorrente, certamente que por dever de ofício, ataca o acto recorrido, assacando-lhe uma pluralidade de pretensos vícios, como se a Administração fiscal tivesse “inventado” uma liquidação oficiosa sem que previamente tivesse contactado a recorrente, como efectivamente sucedeu, após ter cotejado as declarações a que a mesma está obrigada, quer em sede de imposto de turismo, através do modelo M/1, quer através do modelo M/1 do Imposto complementar de rendimentos.
E foi na sequência desta actividade da Administração Fiscal, que foi necessário pedir mais elementos à contribuinte, ora recorrente.
Segundo a declaração M/1 do imposto complementar de rendimento e cópias dos anexos, a contribuinte declarou em conjunto os rendimentos dos exercícios do período de 2009 a 2012 (relativo a todos os estabelecimentos) dos estabelecimentos constantes do mapa 1 da Proposta n. o XXXX/NVT/DOI/RFM/2014.
Para verificar os dados o Núcleo Fiscal emitiu um ofício no dia 17 de Dezembro de 2013, como anexo 1 (fls. 241) pedindo os nomes dos estabelecimentos e respectivos números de cadastro, que tinham os rendimentos constantes do Mapa 2 da Declaração M/1.
Em conformidade com a resposta da contribuinte/recorrente, em 11/02/2014 (fls. 237 a 238) e em 10/03/2014 (fls. 235 a 236) e em 04/04/2014 (fls. 233) - esta na sequência do oficio de 14/03/14 (fl. 234) enviado após as primeiras respostas, - foram apurados os elementos relevantes e discriminados os rendimentos de acordo com os itens constantes da Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014.
Resulta inequívoco, pelo que antecede, que o acto de liquidação oficiosa se encontra devidamente fundamentado na Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014, que mereceu a concordância do Senhor Subdirector de Finanças, e onde se encontram explicitadas as razões de facto e de direito para terem sido aquelas actividades tributadas, em obediência ao artigo 115.º do CPA que dispõe que a fundamentação “...deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão...”
E as razões de facto e de direito subjacentes ao acto de liquidação oficiosa constantes da Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014 foram sucintamente vertidas na Nota constante no verso do modelo M/6 notificada à ora recorrente.
Com efeito, foram indicados os serviços, o período a que estes respeitam, os montantes, a taxa aplicável e as normas legais em que assenta a liquidação.
O acto ora recorrido que decidiu a reclamação do acto de liquidação oficiosa também se encontra devidamente fundamentado, conforme Proposta n.º XXX/NVT/DOI/RFM/2014 que mereceu a concordância da Senhora Directora dos Serviços pelo despacho ora impugnado onde se encontram explicitadas as razões de facto e de direito para o indeferimento da reclamação e para terem sido aquelas actividades tributadas.
Pelo ofício n.º XXX/NVT/DOI/RFM/2014 foi a ora recorrente notificada da decisão sobre a reclamação.
Invoca a recorrente não poder o acto recorrido referir-se a um período de 12 meses porquanto em imposto de turismo a soma dos rendimentos que constituem a matéria colectável são de verificação mensal de forma a ser paga a colecta até ao termo do mês subsequente àquele em que os serviços foram prestados conforme artigo 12.º do RIT.
Esquece, no entanto, que o acto recorrido de liquidação oficiosa se impôs face à diferença apurada entre a declaração da recorrente relativamente ao imposto complementar de rendimentos e a declaração relativa ao imposto de turismo.
Sendo, pois, correcta a liquidação adicional nos termos do artigo 8.º do RIT.
A exigência de fundamentação visa efectivamente permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação.
Ora, a recorrente, após ter sido notificada da liquidação oficiosa, através do modelo M/6 ou após notificação da decisão da reclamação em momento algum, solicitou que a administração lhe comunicasse algum elemento que considerasse em falta como seja o teor da Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014 naquele citada ou da Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014, que, presentemente, em sede de recurso hierárquico, entende essencial para decidir pela impugnação ou conformação com o acto notificado.
Após a notificação do acto de liquidação oficiosa a ora recorrente para além de não ter solicitado qualquer elemento que considerasse em falta, apresentou inclusivamente reclamação daquele acto e até um recurso contencioso fiscal (processo n.º 1122/14/CF no Tribunal Administrativo) daquele acto em moldes tais que dúvidas não restam quanto à clareza dos fundamentos para tributação das actividades em sede de imposto de turismo.
Constituindo a falta ou insuficiência de fundamentação um vício de forma que determina, em princípio, a invalidade do acto administrativo, sempre se dirá que os vícios poderão considerar-se sanados quando se demonstrar que, apesar da imprecisão ou omissão ou irregularidade do conteúdo do acto, foi atingido o objectivo que se visava atingir com a imposição deste conteúdo, designadamente que o seu destinatário se apercebeu do seu exacto alcance.
Quanto à não notificação à recorrente do texto integral da Proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014 sempre se dirá que “A notificação é uma das formas de publicidade a par da publicação, daí que não é um elemento constitutivo do acto administrativo a notificar. Ela tem uma função meramente instrumental, ou seja, “é um instrumento de que a Administração se serve para fazer chegar ao destinatário determinado acto administrativo. Portanto, não cria relações jurídicas nem interfere com a validade ou a perfeição do acto” (vide Ac. TSI de 26. 04.2012).
Com efeito, os requisitos de validade respeitam a momentos anteriores ou concomitantes do exercício da competência dispositiva na matéria e os requisitos de eficácia são posteriores. “Os primeiros manifestam-se na prática ou no sentido da decisão e repercutem-se na definição nela própria contida, os segundos não têm aí assento ou influência, reflectindo-se apenas na ineficácia ou inoperatividade do respectivo acto (cfr. Código do Procedimento Administrativo, 2a edição, Actualizada Revista e Aumentada, Mário Esteves de Oliveira Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, pág. 627). “Finalmente, recorde-se que a falta de comunicação destes elementos não afecta a validade do acto. Se era válido, assim continuará a ser. O que acontece é que ele não produzirá efeitos enquanto o interessado não os conhecer na íntegra. Faltar-lhe-á eficácia externa” (ob cit pág 422).
São elementos essenciais da notificação o respectivo sentido, o autor e a data da decisão. Sem estes o acto é ineficaz relativamente ao interessado. (vide Acórdão do TUI no Processo n.º 33/2011 de 28 de Setembro).
Não parece questionável a necessidade de comunicar o texto integral do acto administrativo.
Contudo, foi transcrito na nota constante no verso do modelo M/6 os elementos relevantes da proposta n.º XXXX/NVT/DOI/RFM/2014 atinentes ao período e estabelecimento em causa. A não notificação daquele texto integral não colide com a validade do acto.
Sendo não essencial a comunicação da fundamentação integral do acto este é plenamente eficaz se tal notificação não for requerida pelo administrado, como não foi.
O mesmo se dizendo quanto à notificação do acto que decidiu a reclamação.
Pela correspondência trocada previamente, não pode a contribuinte seriamente afirmar, como afirma, desconhecer a fundamentação.
Quer no prazo para a reclamação, quer dentro do prazo para o recurso hierárquico necessário teve oportunidade para por via da consulta do processo ou por via da passagem de certidão, discutindo nessa sede a natureza gratuita da mesma, de se inteirar de toda a actividade de instrutória que conduziu quer à liquidação oficiosa, quer à decisão da reclamação.
Senão o não fez foi porque não entendeu verdadeiramente essencial para contraditar, pela via da reclamação, e do recurso, a liquidação oficiosa.
Não é sério esperar que a Administração Fiscal, em sede de notificação, envie cópia ou certidão de todo o processo!
Vício de violação de lei: incidência real e pessoal do Imposto de Turismo - ofensa aos artigos 1.º, 2.º e 5.º do RIT.
Vendas de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões.
A recorrente, salvo o devido respeito, vem numa interpretação das normas de incidência real e pessoal constantes nos artigos 1.º e 2.º do RIT, defender que “encontram-se excluídas da incidência do IT as verbas qualificadas pelo acto recorrido como venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões.”
Por estes serviços de transporte não serem prestados pela recorrente, mas sim por entidades terceiras, sujeitas a um regime de concessão ou licenciamento para as suas actividades económicas específicas.
Concluindo que a recorrente não presta quaisquer serviços de transporte marítimo ou aéreo por lhe estar legalmente vedada essa faculdade no âmbito do enquadramento legal da actividade transportadora da RAEM alegando que aquele serviço é cobrado aos clientes pelo Hotel Mundo de Estrelas, o qual, posteriormente entrega o preço desse serviço à empresa transportadora o que confere à recorrente, no seu entender, a qualidade de simples intermediária não especialmente remunerada.
Na óptica da recorrente o rendimento proveniente dos serviços prestados é da empresa transportadora sujeito ao imposto que tributa os rendimentos de natureza comercial e que se encontram excluídos da determinação da matéria colectável nos termos do artigo 5.º RIT.
Considerando que a recorrente não sendo prestadora daqueles serviços, nem uma qualquer entidade prestadora destes serviços de acordo com a previsão do n.º 1 do artigo 1.º RIT por remissão do artigo 2.º. não estão sujeitos aqueles serviços a imposto de turismo.
Ora, estes serviços têm vindo a ser integrados em “pacotes” quer por Agências de Turismo, quer em companhias aéreas, e mais recentemente passaram a figurar na contabilidade das unidades Hoteleiras, como a entidade recorrente.
Correspondem também, por isso, a serviço para beneficio dos quais os clientes escolhem ficar alojados na unidade hoteleira que os presta, em razão também, e por vezes decisivamente, pela possibilidade de obter comodamente e por vezes até com vantagem de preço no conjunto, beneficiando em seu favor a relação custo beneficio, ficando o valor do imposto de turismo diluído, até pela taxa residual diminuta, no valor global praticado, não interessando para o caso quem efectivamente presta o serviço - o que necessariamente integra estes serviços no conceito legal de serviços complementares.
Como é do conhecimento comum, a generalidade dos turistas, excepto os que vêm a Macau exclusivamente para jogar nos casinos, pretendem maximizar a viagem a Macau com uma extensão a Hong Kong, ou um passeio de barco ou de Helicóptero no Delta do Rio das Pérolas, ou com uma “escapadela” a Bangkok, ou Hanoi.
Rendimentos da garagem e estacionamento
De igual modo, contesta a aplicabilidade da incidência à utilização do serviço de garagem e de estacionamento,
Por o artigo 1.º do RIT determinar que o IT incide exclusivamente sobre os serviços prestados no âmbito das actividades específicas dos estabelecimentos hoteleiros.
Não traduzindo o serviço de garagem e de estacionamento, na óptica da recorrente, um qualquer serviço nem integrando o leque das actividades específicas de um estabelecimento hoteleiro porque o acesso a estacionamento é disponibilizado à população em geral e aos hóspedes da recorrente em situação análoga à dos diversos parques de estacionamento da cidade e do mesmo modo considera o estacionamento em parque no hotel da recorrente pela similitude factual.
Sem razão em nosso entendimento, porquanto a existência de serviço de estacionamento, com ou sem o serviço extra de ajuda ao mesmo através de “Valet”, é também um serviço complementar que visa favorecer e complementar a actividade específica, sobretudo com a dificuldade crescente de estacionamento na cidade, e com a incerteza na obtenção de lugar de estacionamento nos parques públicos.
Quer seja em veículo próprio ou alugado este serviço deve ser considerado complementar, constituindo uma preciosa mais valia, até porque o cliente “tipo” de um hotel classificado com 5 estrelas, como é o caso do Hotel Mundo das Estrelas, tem a pretensão de usufruir do beneficio de automóvel privado, senão mesmo dos múltiplos veículos de luxo que o mesmo hotel coloca ao dispor dos clientes, em serviço complementar com motorista, e sobre este serviço também recai Imposto de Turismo.
Rendimentos de serviços de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias e serviços de correio, edredão, venda de amenidades e jornais
A recorrente alega a mesma ilegalidade na liquidação relativamente às verbas qualificadas pelo acto recorrido como de utilização de serviços de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias e serviços de correio, edredão, vendas de amenidades e jornais.
Considerando que se trata de um mero acesso a bens de consumo que não se traduzem na prestação de um qualquer serviço nem integram o leque de actividades específicas de um estabelecimento hoteleiro e estão acessíveis à população em geral e aos hóspedes do hotel bem como em diferentes estabelecimentos comerciais da cidade.
Que também os serviços de fotocópias, correio ou transporte não se enquadram no conceito de actividade complementar à actividade hoteleira e que podem ser prestados por qualquer estabelecimento na RAEM e quanto à venda de selos nos correios de Macau sem sujeição a IT
Ora, considerando o conceito de serviços complementares que pressupõe para além da actividade principal todos os serviços que as exigências de conforto e instalação numa unidade hoteleira tornam necessário juntar na actualidade, nele se incluem a disponibilização de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, serviço de garagem e estacionamento, serviços de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias e serviços de correio, edredão, venda de amenidades e jornais (não havendo igualmente violação do artigo 5.º do RIT).
Todos estes serviços complementares são, presentemente, imprescindíveis as unidades Hoteleiras para atrair a atenção e conquistar clientes, que não se limitam ao jogador de casino, mas vão também ao turista que vem disfrutar das singularidades de Macau, como antigo cadinho de fusão entre o Oriente e o Ocidente, com um património cultural reconhecido pela UNESCO, uma gastronomia variada e de fusão, ou a nova vertente de Centro de Congressos, de espectáculos com estrelas do Showbiz internacional, da música, do cinema, do desporto, de celebrações de casamento, nas salas multifunções e com a tecnologia disponibilizada para o efeito.
Apreciando as questões de Direito,
O artigo 1.º alínea a) do RIT estabelece que “O imposto de turismo incide sobre os serviços prestados no âmbito das actividades específicas de (…) estabelecimentos hoteleiros e similares, como tal definidos no Regulamento da Actividade Hoteleira e Similar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/96/M, de 1 de Abril”.
E no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 16/96/M, de 1 de Abril pode ler-se “Para efeitos do presente diploma consideram-se estabelecimentos hoteleiros os que se destinam a proporcionar ao público alojamento, mediante pagamento, com ou sem fornecimento de refeições e outros serviços complementares. “
E são estabelecimentos similares os que se destinam a proporcionar ao público, mediante pagamento, alimentos ou bebidas para serem consumidos no próprio local. (cfr. artigo 4.º Decreto-Lei n.º 16/96/M)
Na alínea a) do artº. 2.º do RIT estabelece-se por sua vez que “São sujeitos passivos do imposto as pessoas singulares ou colectivas que (…) prestem os serviços previstos no n.º 1 do artigo anterior”.
Ou seja, enquanto proprietária de um estabelecimento hoteleiro assim definido nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º16/96/M, de 1 de Abril, é a recorrente, como facilmente se conclui, sujeita à incidência do imposto de turismo, por aplicação conjugada dos artigos 1.º e 2.º do RIT.
Correspondendo, em suma, a serviços para benefício dos quais os clientes escolhem ficar alojados na unidade hoteleira que os presta.
Conclui-se, pois, estarem compreendidos na incidência do imposto de turismo todos os serviços prestados no âmbito das actividades especificas do estabelecimento hoteleiro que, nos termos definidos no artigo 3.º do Decreto Lei n.º 16/96/M, de 1 de Abril, sejam alojamento, refeições e outros serviços complementares, com excepção dos mencionados no n.º 2 do artigo 1.º do RIT: os serviços referentes a telecomunicações e lavandarias.
Com efeito, são excluídos da incidência do imposto o preço dos serviços complementares prestados referentes a telecomunicações e lavandarias e as taxas de serviço até ao limite de 10%, em conformidade com as alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 1.º RIT
Sendo assim, os serviços complementares prestados pelos estabelecimentos hoteleiros são tributáveis, só estando excluídos da norma de incidência os já mencionados serviços complementares referentes a telecomunicações e lavandarias.
E como se tem vindo a entender, não tendo havido qualquer alteração de entendimento por parte da Administração fiscal, o conceito de serviços complementares pressupõe como se disse o mesmo fim da actividade principal, de alojamento e restauração e ainda todos os serviços que as exigências de conforto e instalação numa unidade hoteleira tornaram necessário juntar às actividades principais.
Neste caso concreto a norma de incidência do RIT remeteu para o Regulamento da Actividade Hoteleira e Similar aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/96/M a definição de estabelecimentos hoteleiros e similares e é nesse âmbito e no da Portaria n.º 83/96/M que se afere, como se disse, o que constitui actividade específica dos estabelecimentos hoteleiros.
Por outro lado, os serviços previstos para a concessão a um hotel de esta ou aquela categoria não deixam de deter a natureza de serviço complementar por corresponderem apenas, na sua óptica, a prestações de serviços incluídos nas exigências de conforto de determinada categoria de unidade hoteleira e poderem ser desenvolvidas por um outro agente económico que não estabelecimento hoteleiro ou similar - São exactamente por corresponderem a prestações de serviços incluídos nas exigências de conforto de determinada unidade hoteleira que são considerados serviços complementares incluídos nas actividades específicas dos estabelecimentos hoteleiros independentemente de poderem ser desenvolvidas por um outro agente económico. Veja-se o serviço de lavandarias - lavandarias e tinturarias - que é qualificado no âmbito da Contribuição Industrial com o código próprio da Tabela de Actividades 95.20.00 e não se põe em causa ser um serviço complementar.
A opção por prestar directamente o serviço, ou disponibilizar certo tipo de produtos, ou, por mera opção de gestão, subcontratar a uma empresa terceira certo tipo de serviços não tem, na óptica da Administração Fiscal, qualquer efeito em termos fiscais, na medida em que o serviço é disponibilizado ao cliente que, a partida, sabe que pode contar com ele, por constar na “lista de serviços disponibilizados e publicitados pelo Hotel”. Isto vale quer para o champagne do serviço de minibar, quer para uma refeição romântica para a um casal em lua de mel em “room service “, quer para o mesmo se deslocar no Rolls Royce Phantom num passeio nocturno pela cidade de Macau e, porque não, num cruzeiro no Rio das Pérolas, incluído no “package” das noites de “lua de mel” especialmente concebida pelo departamento de marketing da unidade hoteleira, para “alcançar” este nicho de mercado.
O entendimento propugnado pelo vetusto acórdão citado, além de versar sobre legislação com normas diversas do RIT de Macau, adopta uma concepção cristalizada no tempo, em que a externalização de serviços não existia, e em que os Serviços de Hotelaria se limitavam a fornecer o quarto, com a tradicional cama com lençóis de linho branco, e a opção do pequeno almoço continental.
Como a entidade recorrente bem sabe, presentemente, em Macau, estamos a “anos luz” dessa realidade, com uma oferta de serviços e sofisticação que o legislador, embora não tenha previsto, praeclaramente acautelou ao enunciar uma norma aberta com o conceito indeterminado, mas determinável, de “serviços complementares” de estabelecimentos hoteleiros e similares, aos quais a própria actividade hoteleira tem contribuído, com a sua própria evolução, para o desenvolvimento da doutrina aplicada pela Administração Fiscal, a qual também tem que evoluir, e adaptar-se as novas realidades.
E, é preciso que se afirme, sem tibiezas, que se a política fiscal da RAEM consagrou este imposto, o qual tem uma taxa de apenas 5%, meramente residual se comparada com o que é a média e a moda (em termos estatísticos) em outros ordenamentos jurídicos, como por exemplo na República Portuguesa, onde foi proferido o acórdão citado, que só a titulo de imposto sobre o valor acrescentado, aplicado indiscriminadamente a todos os serviços, incide presentemente sobre o consumidor uma taxa de 6%, 13% ou de 23%!
A recorrente, ao citar o douto acórdão, está consciente de que o mesmo foi proferido num quadro legal assaz diverso quer em termos das próprias normas que regiam o imposto de turismo em Portugal, designadamente na sua redacção, quer, de forma completa e propositadamente desenquadrada do contexto do sistema fiscal do ordenamento jurídico Português, o qual, comporta uma “bateria” de impostos à qual a entidade recorrente não se encontra sujeita na sua actividade na RAEM
Todos estes serviços, que também podem ser consubstanciados na disponibilização de produtos, como é o caso de bebidas, comida no quarto, tabaco, serviço de escritório (fax, computador, sala de conferencias ou reuniões), estacionamento, “valet parking”, viatura com motorista, filmes, massagem, e outros serviços de beleza, são inquestionavelmente complementares e fazem parte da nova realidade complexa em que se tornou a actividade de hotelaria.
Macau, como centro internacional de lazer e negócios tem vindo a assumir esta vertente que, por um lado, permite a diversificação da actividade económica, e por outro permite inegavelmente potenciar e fortalecer a actividade “matriz” da hotelaria, o que tem possibilitado elevadas taxas de ocupação, as quais, até pelo mero efeito da lei da oferta e da procura, tem permitido o aumento do valor cobrado por noite em cada estabelecimento hoteleiro, aumentando consequentemente a receita e o lucro de cada unidade hoteleira, de acordo com a sua categoria.
Os referidos serviços encontram-se, pois, sujeitos à incidência dos artigos 1.º e 2.º do RIT.
Vício de violação de lei - Princípio da boa fé, em especial na componente da confiança - artigo 8.º do CPA
O princípio da boa fé determina que a administração deve relacionar-se com os particulares de acordo com as regras da boa-fé, ponderando os valores fundamentais do direito, designadamente, a confiança suscitada pela sua actuação e o objectivo a alcançar.
Este princípio tem um domínio primacial de aplicação no que concerne aos actos praticados no exercício de poderes discricionários, introduzindo neste aspectos vinculados, cuja não observância é susceptível de constituir vício de violação de lei.
Ora, a incidência de imposto de turismo e consequente liquidação adicional corresponde ao exercício de uma competência vinculada.
Quando estão em causa poderes vinculados, o princípio da legalidade sobrepõe-se a quaisquer outros princípios.
Pois quando a Administração actua com poderes vinculados, o respectivo acto será legal ou ilegal, consoante respeite, ou não, o quadro desenhado na lei.
No âmbito da actividade administrativa são pressupostos da tutela da confiança um comportamento gerador de confiança, a existência de uma situação de confiança, a efectivação de um investimento de confiança e a frustração da confiança por parte de quem a gerou.
Não se pode considerar que pelo simples facto de a Administração nos períodos de Outubro a Dezembro de 2006 e de Janeiro a Dezembro de 2007 e 2008 não ter procedido à liquidação adicional de imposto de turismo pelos serviços ora em causa que tal haja implicado automática e sem mais o criar um clima de confiança legítima ou um quadro de total e absoluta segurança jurídica da posição que vem defender.
Isto porque, da mesma maneira que a actividade hoteleira tem evoluído, também a doutrina da Administração Fiscal vai evoluindo e adaptando-se a medida que vai interagindo, fiscalizando e solicitando elementos complementares aos contribuintes, no exercício dos seus poderes de autoridade administrativa na prossecução do interesse público.
IV. Vício de violação de lei: Princípios da legalidade e da tipicidade - artigo 71.º alínea º 3) da Lei Básica
Invoca ainda a recorrente que a administração fiscal actua, “ (…) no âmbito da liquidação a que se reporta o presente recurso, numa manifesta e grave violação de lei, tributando diversos serviços que não encontram previsão nas normas de incidência do RIT, o que afronta manifestamente os Princípios da Legalidade e da Tipicidade que regem o Direito Fiscal e, consequentemente, ferem de ilegalidade o acto recorrido” Considera que o facto do RIT, “não prever a tributação dos serviços que foram objecto da liquidação impugnada não permite, atento os referidos princípios, que a administração fiscal atribua ao termo “serviços complementares” uma abrangência tal que permita a sua aplicação indiscriminada a actividades realizadas num estabelecimento hoteleiro, quando as mesmas não passam de estruturas de apoio ao cliente no sentido de lhe proporcionar conforto, de acordo com as regras da classificação hoteleira, mas que, ainda assim, podem ser desenvolvidas por um qualquer agente económico (que não é estabelecimento hoteleiro ou similar), caso em que a prestação desses serviços não está sujeita a IT.”
Apreciando, cumpre reafirmar que:
O imposto de turismo incide sobre os serviços prestados no âmbito das actividades específicas dos estabelecimentos hoteleiros e similares e estabelecimentos tipo “health club”, saunas, massagens e “karaokes”.
A definição dos estabelecimentos de hotelaria e similares consta do Regulamento da Actividade Hoteleira e Similar (RAHS), aprovado pelo DL n.º 16/96/M, de 1 de Abril e pela Portaria n.º 83/96/M, de 1 de Abril.
São excluídos da incidência do imposto o preço dos serviços complementares prestados referentes a telecomunicações e lavandarias e as taxas de serviço até ao limite de 10% (cf. RIT, art.º 1.º, n.º 2).
Concluindo-se, pois, estarem compreendidos na incidência do imposto de turismo todos os serviços prestados no âmbito das actividades específicas do estabelecimento hoteleiro que, nos termos definidos no artigo 3º do Decreto Lei na 16/96/M, de 1 de Abril, são alojamento, refeições e outros serviços complementares, com excepção dos mencionados no na 2 do artigo 1 º do RIT: os serviços referentes a telecomunicações e lavandarias.
Esta norma (na 2 do artigo 1º RIT) constitui uma norma de delimitação negativa da situação jurídica de incidência, precisando, em sentido restritivo, o âmbito da norma de incidência (o nº 1 do artigo 1º do RIT) de forma a evitar o enquadramento no âmbito do respectivo tipo de certas realidades que nele estariam incluídas se tal norma não existisse. Neste caso, os serviços complementares prestados referentes a telecomunicações e lavandarias.
Os serviços referentes à venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, de garagem e estacionamento, de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias, serviços de correio, edredão, venda de amenidades e jornais foram efectivamente prestados pelo “Hotel Mundo de Estrelas” no hotel caindo no âmbito de incidência do imposto de turismo por se enquadrarem nos respectivos serviços complementares (artigos 1.º e 2.º do RIT) e não beneficiarem de qualquer isenção pelo que inexiste violação dos principias da Legalidade e da Tipicidade do regime tributário do artigo 71.º, alínea 3) da Lei Básica.
Pelo que não se verifica quaisquer dos vicias assacados pela recorrente ao acto recorrido.”
Em conformidade com o que antecede, foram formuladas as seguintes
“I. CONCLUSÕES
I. À luz do quadro legal aplicável - cfr. artigos 1º, 2º, 8º, 9º, 10º do RIT, ex vi artigos 2º e 3º do DL nº 16/84/M, incluindo os artigos 1º, 37º, 38º e 39º da Portaria nº 83/96/M, de 1 de Abril - dos factos citados, estão definidos os pressupostos tributários que motivaram a Administração a proceder à Liquidação Oficiosa do Imposto de Turismo de Janeiro a Dezembro de 2010, na importância de MOP$2,303,244.00.
II. Na liquidação oficiosa do acto tributário, estão identificados os critérios de delimitação positiva e negativa, para efeitos de tributação do preço dos serviços complementares - cfr. artigos: 1º, nº 1 e nº 2; 2º, 8º, 9º, 10º do RIT.
III. De acordo com o RIT, incluindo o artigo 2º, do DL nº 16/84/M, a liquidação oficiosa realizou-se dentro do prazo de caducidade do imposto de turismo “nos cinco anos seguintes àquele” em que ocorreu a prestação do serviço tributável, de Janeiro a Dezembro de 2010 - cfr. artigo 9º do RIT.
IV. A Sociedade foi validamente notificada da liquidação.
V. Não ocorreu nenhum vício de violação de lei, designadamente eventual vício de forma por falta de fundamentação, Princípio da Boa Fé bem como da legalidade e tipicidade tributária - por violação dos artigos artigos 113º, 114.º, 115.º e 8.º do CPA, 1º,2º e 5º do RIT e alínea 3) do artigo 71.º da Lei Básica.
VI. Nem resulta a invalidade e anulabilidade do acto tributário.
VII. Os preços relativos a serviços complementares, in casu, referentes à venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, de garagem e estacionamento, de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias, serviços de correio, edredão, venda de amenidades e jornais oferecidos aos hóspedes, estão sujeitas à incidência do imposto de turismo.
VIII. O legislador sujeita à incidência tributária do imposto de turismo, não só o preço relativo aos serviços prestados na prossecução da actividade principal, de alojamento e restauração, como também incide sobre o preço dos serviços complementares, apenas excluindo o preço dos serviços referentes a telecomunicações e lavandarias, e a taxas de serviço até ao limite de 10% - cfr. artigo 1º, nº 2, alínea a) e b), do RIT .
IX. Analisado o espírito e a letra da lei, sobretudo, a que se adequa a uma correcta aplicação dos princípios tributários em presença, sujeitos ao princípio da legalidade e tipicidade, o legislador define concretamente os serviços complementares excluídos à incidência do imposto, associa à incidência tributária todos os outros serviços complementares à actividade hoteleira.
X. O legislador consagra a delimitação negativa de incidência deste imposto, estando sujeitos à tributação o preço dos serviços complementares, que não sejam os referentes às telecomunicações e lavandaria.
XI. Ademais, os requisitos dos estabelecimento hoteleiros e nomeadamente no que concerne à classificação de Hotéis na categoria de cinco estrelas - cfr. artigos 1º, 37º, 38º e 39º da Portaria nº 83/96/M, de 1 de Abril - a lei considera como critérios exigíveis à atribuição desta categoria, a qualidade do serviço e das instalações, uma série de equipamentos e prestação de serviços complementares à prossecução da actividade principal, de alojamento e restauração, que permitem alcançar não só a obtenção da categoria de cinco estrelas, bem como proporcionar maior conforto, tendo em vista apoiar e satisfazer clientes, que procuram este tipo de serviços numa unidade hoteleira.
XII. A natureza de uma unidade hoteleira de 5 estrelas, destinada a prestar serviços de alojamento e restauração, mediante remuneração, compreende, uma diversidade de serviços complementares, desde os referentes à venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, de garagem e estacionamento, de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias, serviços de correio, edredão, venda de amenidades e jornais, uma vasta e qualificada oferta de instalações e serviços diferenciados, agilizados às exigências actuais dos clientes, tendo como objectivo a promoção da respectiva unidade hoteleira.
XIII. Por seu turno, o imposto de turismo constitui um imposto indirecto sobre bens e determinadas prestações de serviços, sendo um imposto sobre o consumo, na variável despesa, integrando-se normalmente no preço dos produtos ou prestação de serviços, em princípio suportado pelo consumidor-adquirente em função da repercussão do imposto.
XIV. O legislador sujeita à incidência tributária do imposto de turismo, não só os preços relativos aos serviços prestados na prossecução da actividade principal, de alojamento e restauração, como também incide sobre os preços dos serviços complementares, excluindo, apenas e de forma expressa, o preço dos serviços referentes a telecomunicações e lavandarias, e taxas de serviço até ao limite de 10% - cfr. artigo 1º, nº 2, alínea a) e b), do RIT .
XV. O acto de liquidação oficiosa do imposto, na importância tributável de MOP$2,303,244.00, não integra o preço de serviços complementares excluídos no artigo 1º, nº 2, alínea a) e b) do RIT.
XVI. Ao contrário, considera o preço de serviços complementares os serviços referentes à venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, de garagem e estacionamento, de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias, serviços de correio, edredão, venda de amenidades e jornais sujeitos à incidência tributária do imposto de turismo. Pelo que não assiste razão à recorrente.
XVII. Não há, portanto, qualquer vício de violação de lei no acto tributário, encontrando-se o mesmo devidamente fundamentado.
De tudo o quanto se explanou, não restam dúvidas em relação à validade do acto administrativo de liquidação oficiosa, uma vez que, estão reunidos os pressupostos de facto e de direito estabelecidos nos artigos 1º, 2º, 5º, 8º, 9º, 10º do RIT, que motivam a revisão oficiosa do acto tributário e determinam a correcção da matéria colectável, tendo a Sociedade sido notificada correctamente e nos termos do artigo 2º, do DL n.º 16/84/M.
Pelo exposto deverá o presente recurso hierárquico necessário ser considerado improcedente, propondo-se, deste modo, a V. Ex.ª que seja negado o provimento ao mesmo.”
Mais se comunica a V. Ex.ª que, nos termos do disposto no parágrafo (2) da alínea 8) do artigo 36.º da Lei n.º 9/1999, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 9/2004, e no artigo 7.º da Lei n.º 15/96/M, de 12 de Agosto, do acto administrativo em apreço cabe recurso contencioso a interpor, no prazo de 2 meses a contar da data da notificação, junto do Tribunal de Segunda Instância da Região Administrativa Especial de Macau.»
7 - No dia 25/02/2015, sobre a referida proposta o Secretário para a Economia e Finanças proferiu o seguinte despacho:
«Concordo com o indeferimento do recurso».
É este o acto recorrido.

III – O Direito
1. Questões a apreciar
Importa apreciar as questões suscitadas pela recorrente.
No acórdão de 8 de Junho de 2016, no Processo n.º 9/2016, apreciámos um recurso interposto pela mesma recorrente dos autos, contra a liquidação oficiosa do imposto de turismo relativo a 2011, enquanto o dos autos se refere à liquidação oficiosa do imposto de turismo relativo a 2010. Sendo a mesmas as questões suscitadas, transcrevemos aqui o mencionado acórdão:

“2. Da incidência do imposto de turismo
Trata-se de saber se o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 1.º do RIT (e os princípios da legalidade e da tipicidade), ao apenas exceptuar da incidência do imposto de turismo o preço de serviços complementares referentes a telecomunicações e lavandarias.
Relativamente ao ano de 2011 foi a recorrente tributada em imposto de turismo por serviços prestados em venda de bilhetes para ferries, helicópteros e aviões, rendimentos de garagem e estacionamento, serviços de transporte, aluguer de equipamentos, fotocópias e serviços de correios, edredão, venda de amenidades e jornais.
Entende a recorrente que não presta serviços de transporte. É apenas intermediária de serviços prestados aos clientes do Hotel por entidades terceiras.
Certo. Só que é uma intermediária remunerada, como a própria admite (conclusão 11.ª das alegações de recurso contencioso). E o imposto de turismo incide sobre o preço desses serviços.
Vejamos o que dispõe o artigo 1.º do RIT:
“Artigo 1.º
(Incidência real)
1. O imposto de turismo incide sobre os serviços prestados no âmbito das actividades específicas de:
a) Estabelecimentos hoteleiros e similares, como tal definidos no Regulamento da Actividade Hoteleira e Similar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/96/M, de 1 de Abril;
b) Estabelecimentos do tipo “health club”, saunas, massagens e «karaokes».
2. São excluídos da incidência do imposto:
a) O preço dos serviços complementares prestados nos estabelecimentos referidos no artigo anterior, referentes a telecomunicações e lavandarias;
b) As taxas de serviço até ao limite de 10%.”.
O imposto de turismo incide, pois, sobre o preço dos serviços prestados no âmbito das actividades dos estabelecimentos hoteleiros, que são os que estão agora em causa.
Dispõe o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 16/96/M, de 1 de Abril, que se consideram estabelecimentos hoteleiros os que se destinam a proporcionar ao público alojamento, mediante pagamento, com ou sem fornecimento de refeições e outros serviços complementares.
E, nos termos do artigo 5.º, n os 1 e 3, deste último diploma legal os hotéis de cinco estrelas têm como serviços principais, o alojamento e a alimentação, a par de serviços complementares.
Parece seguro, assim, que a actividade principal dos estabelecimentos hoteleiros de cinco estrelas é a prestação de alojamento e alimentação, sendo as restantes complementares.
Estatui o artigo 38.º da Portaria n.º 83/96/M de 1 de Abril, que nos hotéis de cinco estrelas, devem existir:
- Zona destinada a cofres individuais para guarda de valores, salvo se existirem nos quartos;
- Salas para reuniões;
- Salão conversível em salas de conferências ou de festas, dotado de equipamento adequado;
- Instalações de cabeleireiro;
- Parques de estacionamento;
- Piscina.

E os hotéis de luxo devem ter, ainda, health club (artigo 40.º).
O acórdão recorrido considerou que são apenas excluídos da incidência do imposto os serviços complementares mencionados no n.º 2, ou seja, os referentes a telecomunicações e lavandarias. Já que quando o proémio do artigo 1.º, n.º 1, do RIT alude que o imposto de turismo incide sobre os serviços prestados no âmbito das actividades específicas está a referir-se às actividades desenvolvidas no âmbito da hotelaria.
Na tese da recorrente o imposto apenas incide sobre o preço dos serviços prestados no âmbito das actividades específicas dos estabelecimentos hoteleiros, sendo que serviços complementares não são específicos dos estabelecimentos hoteleiros (artigo 9.º da alegação de recurso).
Mas salvo melhor opinião, as actividades específicas são as que são prestadas nos estabelecimentos hoteleiros, sejam a título principal ou complementar, como defende o acórdão recorrido.
Se a interpretação da recorrente fosse a correcta (de que os serviços complementares não são específicos dos estabelecimentos hoteleiros), o n.º 2 do artigo 1.º seria inútil ao excluir da incidência do imposto o preço dos serviços complementares prestados nos estabelecimentos, referentes a telecomunicações e lavandarias. É que, sendo estes serviços complementares e não sendo serviços específicos dos estabelecimentos hoteleiros (na tese da recorrente) sobre eles não incidiria o imposto, de acordo com o n.º 1 do mesmo artigo, nos termos do qual o imposto de turismo incide sobre os serviços prestados no âmbito das actividades específicas. Daí que temos de concluir necessariamente que os serviços complementares prestados nos estabelecimentos hoteleiros são prestados no âmbito das actividades específicas dos mesmos.
Ora, os únicos serviços complementares excluídos da incidência do imposto são os referentes a telecomunicações e lavandarias, como se diz expressamente no n.º 2 do artigo 1.º.
Logo, todos os restantes são tributados.
Também não procede o argumento da recorrente de que o legislador só excepcionou do pagamento do imposto, como serviços complementares, a lavandaria e telecomunicações, por serem os mais usuais em 1996. Não é seguramente assim. Muito antes desta data já os hotéis de cinco estrelas e outros prestavam serviços de transporte, venda de amenidades e jornais, serviço de fotocópias, etc.
Por último, a referência a um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo português, que supostamente acolheria a tese da recorrente, nunca colheria, independentemente de saber se as leis em causa, de Portugal e de Macau são semelhantes – questão que a recorrente não aborda.
É que no caso tratado no acórdão, o hotel limitou-se a ser um mero intermediário dos serviços prestados, sem qualquer remuneração. O que não é o caso da recorrente nas situações tributadas nos autos, como a própria alega, em que teve um ganho.
Improcede, assim, a imputação de violação do disposto no artigo 1.º RIT e, pela mesma razão, a imputação de violação dos princípios da legalidade e da tipicidade.

3. Violação do princípio da boa-fé
A esta imputação da recorrente, respondeu o acórdão recorrido que, no âmbito de actividade vinculada, como é o caso desta relativa à incidência real de imposto, não é operante aquela violação de princípios jurídicos, que constituem limites internos da discricionariedade.
A isto nada opôs a recorrente.
Tanto bastaria para julgar improcedente o vício.
Mas ainda se acrescenta o seguinte: na actividade vinculada da Administração, esta pode mudar a interpretação de regras jurídicas, a favor ou contra o particular, no caso o contribuinte, desde que entenda que a anterior interpretação não era legal. E mudando-a em desfavor do contribuinte, não pode este invocar um direito à manutenção da ilegalidade anterior. O que pode é impugnar o acto administrativo em que tal mudança se traduza, com fundamento em eventual ilegalidade, como fez nos autos.
Já no campo da actividade discricionária, como referimos no acórdão de 11 de Março de 2008, no Processo n.º 40/2007, a regra do precedente pode ser afastada por razões de boa administração ou de alteração das circunstâncias, se o interesse público justificar hoje uma conduta administrativa diferente daquela que antes foi adoptada na resolução de casos semelhantes ou idênticos, sendo que o afastamento da regra do precedente obriga a Administração a fundamentar as razões de facto e de direito que justificam uma tal preterição do precedente”.
Por nada haver a alterar ou a acrescentar ao que dissemos no mencionado acórdão, improcedem as questões suscitadas.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso jurisdicional.
Custas pela recorrente, fixando a taxa de justiça em 5 UC.
Macau, 22 de Junho de 2016.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa





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Processo n.º 32/2016

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Processo n.º 32/2016