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Processo n.º 20/2016. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
Assunto: Contencioso de plena jurisdição. Contrato de Concessão do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição. Isenção da taxa radioeléctrica. Audiência dos interessados. Procedimento administrativo. Princípio do aproveitamento dos actos administrativos praticados no exercício de poderes vinculados.
Data do Acórdão: 22 de Junho de 2016.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
I – Se o interessado pediu a isenção de taxa à Administração, sem suscitar a prescrição dos tributos e esta simplesmente indeferiu, não pode, no recurso contencioso do acto de indeferimento pedir a prescrição das taxas, por não estarmos no domínio do contencioso de plena jurisdição.
II – Nem a lei nem o Contrato de Concessão do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição, entre o então Território de Macau e a A, previam a isenção da taxa radioeléctrica.
III - Sempre que, no exercício de poderes vinculados por parte da Administração, o tribunal conclua, através de um juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa tomada era a única concretamente possível, a falta de audiência do interessado, prevista no artigo 93.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, degrada-se em formalidade não essencial do procedimento administrativo.
O Relator
Viriato Manuel Pinheiro de Lima


ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho de 24 de Abril de 2013, do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que indeferiu pedido de isenção de pagamento de taxas radioeléctricas, no montante total de MOP$7.264.556,00.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 26 de Novembro de 2015, negou provimento ao recurso.
Inconformada, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), alegando que:
- O acórdão recorrido incorreu em omissão de pronúncia sobre a questão da prescrição das taxas suscitada no recurso contencioso;
- A assim se não entender, o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 252.º, n.º 3, do Decreto n.º 38088, de 6 de Janeiro de 1951 ao ter considerado não ter havido prescrição das taxas anteriores ao ano de 2008;
- O acórdão recorrido violou o disposto no artigo 13.º, n.º 2, da Lei n.º 3/90/M, de 14 de Maio e na Cláusula 31.ª do Contrato de Concessão;
- O acórdão recorrido incorreu em erro de direito ao decidir não existir violação dos princípios da decisão, da protecção da confiança e da boa-fé.
- O acórdão recorrido incorreu em erro de direito ao decidir não existir falta de audiência prévia.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II – Os factos
O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
1. A Recorrente é uma sociedade anónima que tem por objecto a distribuição de sinais de televisão e áudio, no regime de subscrição, a instalação e operação de um sistema de telecomunicações público e a prestação de serviços de vídeo, a exploração da actividade publicitária, a prestação de serviços de formação profissional e assistência técnica, a comercialização de patrocínios de programação e de tempos de estúdio, produção e montagem, a gravação, edição e comercialização de publicações áudio e vídeo e de outros produtos relacionados com a sua actividade, a cedência de canal e de tempos de canal.
2. Por escritura pública outorgada em 29 de Abril de 1999 e publicada no Boletim Oficial de Macau n.º 18, II Série, de 5 de Maio de 1999, a ora Recorrente e o então Território de Macau celebraram o Contrato de Concessão do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição ("STTvS").
3. O aludido Contrato de Concessão foi celebrado pelo prazo de 15 anos, com inicio a 29 de Abril de 1999 terminando, por isso, a 29 de Abril de 2014, caso não venha o mesmo a ser renovado ou revisto por acordo das partes - cfr. Cláusula 3ª do Contrato de Concessão.
4. Nos termos do Contrato de Concessão celebrado, o então Território de Macau concedeu à Recorrente o direito de:
a) Prestar em exclusivo o Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição, também designados por STTvS;
b) Instalar e operar um sistema de telecomunicações público;
c) Prestar em exclusivo os serviços de vídeo, excepto o de video-telefone - (cfr. Cláusula 2ª, 19ª e 33ª, a) do Contrato de Concessão).
5. Sendo que os aludidos Serviços Terrestres de Televisão por Subscrição (STTvS), consistem na difusão ou na distribuição terrestre de sinais de televisão e áudio a subscritores, mediante a percepção pela Recorrente das taxas correspondentes.
6. Os canais televisivos transmitidos pela Recorrente não são canais de acesso livre, a cuja visualização qualquer particular pode aceder, mas de acesso condicionado, apenas podendo aceder a eles os subscritores do correspondente serviço.
7. O então Território de Macau, enquanto entidade Concedente do serviço, obrigou-se, nos termos do clausulado no Contrato de Concessão e demais legislação em vigor, a assegurar que a Recorrente fosse a única fornecedora dos STTvS.
8. Obrigou-se a assegurar o exercício por parte da Recorrente de todo o conjunto de direitos que lhe foram concedidos, por forma a que o serviço terrestre de televisão por subscrição viesse a ser prestado de acordo com os objectivos do Contrato de Concessão.
9. Conforme resulta do Contrato de Concessão, a par dos direitos atribuídos pela cláusula 33ª, foi atribuído à Recorrente um direito exclusivo para a exploração da actividade concedida, isto é, o STTvS, a qual consiste na difusão ou na distribuição terrestre de sinais de televisão e áudio a subscritores, mediante o recebimento das taxas correspondentes.
10. Existem empresas comerciais cuja actividade se encontrava registada na Repartição de Finanças para o exercício de instalação, manutenção e reparação de antenas.
11. Tais empresas, comummente designadas por Anteneiros, não se limitam a vender e instalar equipamentos de recepção a particulares.
12. Antes prestando serviços que incluem a disponibilização de antenas receptoras, a sua montagem, instalação e posterior ligação a vários utentes, mediante um pagamento mensal.
13. Disponibilizando equipamento que inclui amplificadores e descodificadores de sinal, sem os quais as emissões não eram acessíveis ao público.
14. Os Anteneiros captam os sinais televisivos através de antenas colocadas em determinados prédios, ampliam-nos e redistribuem-nos, por fio, para edifícios contíguos, percebendo dos seus clientes rendimentos do fornecimento desses sinais.
15. O que fazem através de uma estrutura organizativa própria, que explora economicamente a distribuição de sinal de televisão por cabo a um público indeterminado.
16. Esta actividade dos Anteneiros tem vindo a ser praticada desde que foi concedida à Demandante o exclusivo dos STTvS.
17. A ora Recorrente, por carta de 12 de Dezembro de 2003, dirigida ao Secretário para as Obras Públicas e Transportes, expôs e a final requereu que:
1. Apostados na prestação dum serviço publico de qualidade à população de Macau, semelhante ao que vem acontecendo com todos os centros urbanos mais evoluídos do Mundo, esta Empresa abalançou-se, em 1999, a elaborar um plano de investimentos e de exploração, sem perder de vista a realidade e as circunstancias do meio social na RAEM e de modo a que tivesse aquele mínimo de viabilidade que, perante os accionistas, se pudesse justificar os altos investimentos requeridos.
2. Tanta foi a vontade como o esforço e dedicação em implementar esse projecto - que sempre se julgou útil à RAEM - não se regateando a assunção de compromissos junto de entidade da RPC e dos mais notórios canais internacionais, que permitissem a difusão em Macau, de conteúdos de manifesta qualidade e de interesse público, dentro alias da política meritoriamente delineada e correctamente executada da internacionalização desta Região Administrativa.
3. Factores exógenos ao projecto - com especial realce pelo súbito incremento de concorrência desleal e desenfreada na distribuição ilícita de canais televisivos - deturparam a essência do projecto estabelecido e o retorno previsto, surgindo obstáculos intransponíveis para que houvesse um crescimento sustentado e razoavelmente previsível em circunstâncias normais.
4. Daí que, ao invés das previsões, os prejuízos foram-se acumulando ao longo dos anos e ficam expressos no mapa que se junta, acrescendo a mais de uma centena de milhões de patacas até a presente data. E nesse quadro negativo não deixa de ter lugar, também, a liquidação oportuna de Royalties de Taxas Radioeléctricas e de Estações Terrenas, cujo total ascende ao significativo montante de quatro milhões de patacas.
5. Este quadro de dificuldades tem provocado sistemático bloqueamento às iniciativas em carteira e que resultaria numa ainda melhor prestação de serviços públicos, bem como numa inibição na procura de parceiros de negócios, já que nesta espécie de prestação de serviços não é possível alhear-se ou desinteressar-se dos grandes grupos internacionais que predominam e criam as atracções mais desejadas pelo grande publico e a que a população da RAEM não foge à regra e bem merece.
6. Mesmo com estas dificuldades, não perde esta Empresa ânimo em prosseguir aos fins propostos e já se vislumbra uma solução próxima na remoção dos principais obstáculos a uma maior penetração no mercado e conquista do número significativo de utentes, solução essa que certamente necessitar de algum impulso que as entidades públicas possam vir a dar para que o êxito seja completo.
7. Mas, na previsão da continuação de prejuízos - enquanto essa perspectiva de prejuízos se mantiver apenas - o Conselho de Administração desta Sociedade vem solicitar que, ao abrigo do Contrato de Concessão (Clausula 31ª) e à semelhança do que já aconteceu com outras Empresas de serviços de interesses publico, também deve ser concedida isenção de impostos, taxas e emolumentos, designadamente os acima referidos no ponto 4, como forma de minimizar os prejuízos e reforçar a motivação o de quem trabalha e dos accionistas que tem depositado confiança em prestar um valido contributo ao desenvolvimento da RAEM.
18. A Recorrente, por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 13/07/2005, foi notificada para liquidar a quantia de MOP350.000.00, até 17/08/2005 na Direcção de Serviços de Finanças, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2005.
19. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 13/07/2005, a Recorrente foi notificada para liquidar a quantia de MOP254.976.00, até 17/08/2005 na Direcção de Serviços de Finanças, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2005.
20. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 15/12/2005, a Recorrente foi notificada para liquidar, até 31/01/2006, quantia de MOP466.667.00, na Direcção de Serviços de Finanças, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental no XXX/XX para o ano de 2006.
21. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 15/12/2005, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 31.01.2006, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2006.
22. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 28/12/2007, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 01.02.2008, a quantia de MOP350.000.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2007.
23. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 28/12/2007, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 01/02/2008, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para ano de 2007.
24. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 27/02/2008, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 15/04/2008, a quantia de MOP350.000.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX, para ano de 2008.
25. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 28/02/2008, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 15/04/2008, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para ano de 2008.
26. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 29/12/2008, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 02/02/2009, a quantia de MOP350.000.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2009.
27. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 29/12/2008, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 02/02/2009, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2009.
28. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 16/08/2010, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 20/09/2010, a quantia de MOP350.000.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2010.
29. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 16/08/2010, a Recorrente foi notificada a liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 20/09/2010, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2010.
30. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 29/12/2010, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 31/01/2011, a quantia de MOP350.000.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2011.
31. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 29/12/2010, a recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 31/01/2011, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX, para o ano de 2011.
32. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 14/12/2012, a Recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 31/01/2013, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX para o ano de 2012.
33. Por ofício referência nº XXXX/XX-XX.XX-XXX de 14/12/2012, a recorrente foi notificada para liquidar, na Direcção dos Serviços de Finanças e até 31/01/2013, a quantia de MOP254.976.00, referentes à cobrança das taxas radioeléctricas pela Autorização Governamental nº XXX/XX, para o ano de 2013.
34. A ora recorrente reiterou repetidamente o pedido de isenção requerido no ano de 2003 com fundamento na cláusula 31ª do Contrato de Concessão e no "súbito incremento de concorrência desleal e desenfreada na distribuição ilícita de canais televisivos".
35. Os pedidos de isenção de pagamento de taxas radioeléctricas foram indeferidos por despacho de 24 de Abril de 2013, do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, com base na seguinte informação dos serviços:
“1. A (A1) vem solicitar a isenção de pagamento das taxas relativas à utilização do espectro radioeléctrico na prestação do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição (STTvS).
A DSRT, suportando-se (i) no regime legal das radiocomunicações aprovado pelo Decreto-Lei nº 18/83/M, de 12 de Agosto, (ii) no contrato de concessão e (iii) na Tabela Geral de Taxas e Multas Aplicáveis aos Serviços Radioeléctricos, aprovada pelo Regulamento Administrativo nº 16/2010, diz não haver fundamento legal suficiente para autorizar a isenção - Informação nº XX/XX-XXX.
2. A A é concessionária do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição (STTvS) desde Abril de 1999, data da outorga da escritura pública do contrato de concessão.
De acordo com o nº 2 da cláusula 38ª do Contrato de Concessão de Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição (STTvS) em vigor, a concessionária obriga-se, pela utilização do espectro radioeléctrico, correspondente ao uso das frequências necessárias ao âmbito da concessão, ao pagamento das taxas respectivas.
Nos termos da cláusula 31ª do Contrato, “a Concessionaria poderá beneficiar de isenções de impostos, taxas e emolumentos ou usufruir de outros benefícios fiscais nos termos da lei.”
O artigo 13º da Lei nº 3/90/M, de 14 de Maio - Bases do regime das concessões de obras e serviços públicos - estabeleceu a obrigatoriedade de os concessionários pagarem os impostos, contribuições, taxas ou emolumentos estabelecidos na lei, abrindo apenas a porta à isenção, relativamente aos rendimentos auferidos pela exploração da concessão ou aos actos ou contratos que pratiquem, quando a natureza da concessão o justificar, devendo tal isenção constar do respectivo contrato de concessão.
Assim sendo, o benefício de isenção de pagamento das taxas pela utilização do espectro radioeléctrico há-de resultar de normativo legal.
O regime legal das radiocomunicações e o regime administrativo dos Serviços de Radiocomunicações constam do Decreto-Lei nº 18/83/M, de 12 de Março e do Decreto-Lei 48/86/M de 3 de Novembro, respectivamente,
A Tabela Geral de Taxas e Multas Aplicáveis aos Serviços Radioeléctricos foi aprovada pelo Regulamento Administrativo 16/2010, e posteriormente alterada pelos Regulamentos Administrativos nºs 5/2011 e 21/2012 (este último procedeu à sua republicação).
Consultados estes diplomas constata-se que não está prevista a possibilidade de isenção, redução ou suspensão do pagamento de qualquer das taxas referidas na Tabela Geral de Taxas e Multas Aplicáveis aos Serviços Radioeléctricos, nem a própria Tabela prevê a isenção, redução ou suspensão de taxas.
Pelo que, sujeito o serviço ao pagamento de uma das taxas referidas na referida Tabela, estas tem efectivamente de ser pagas, não existindo mecanismo administrativo que possa levar à sua isenção, redução do seu valor ou suspensão temporária do seu pagamento.
Deste modo não é possível determinar-se, por acto administrativo, a isenção do pagamento das taxas devidas, pela A, pela utilização do espectro radioeléctrico correspondente ao uso das frequências necessárias ao âmbito da concessão, quando tal isenção não está legalmente prevista.
Ainda que se proceda à revisão do actual contrato de concessão, eliminando ou alterando as clausulas 31ª e 38ª, a A continua a não poder beneficiar de isenção das taxas relativas à utilização do espectro radioeléctrico, por não estar previsto, na lei, qualquer regime de isenção.
Assim,
É de indeferir o pedido do A de isenção do pagamento das taxas pela utilização do espectro radioeléctrico na prestação do STTvS por, quer no âmbito dos Decreto Leis nºs 18/83/M de 12 de Março e 48/86/M de 3 de Novembro, quer do Regulamento Administrativo nº 16/2010, não se encontrar previsto regime que, por decisão administrativa, permita que se isente, reduza ou suspenda o pagamento das taxas constantes da Tabela Geral de Taxas e Multas Aplicáveis aos Serviços Radioeléctricos”.
É este o acto recorrido.
É dito no acórdão recorrido que é de conhecimento oficioso do Tribunal que a recorrente já recebeu duzentos milhões de patacas, da RAEM, a título de indemnização pelo incumprimento da obrigação contratual de não ter garantido o exclusivo previsto no contrato de concessão.

III – O Direito
1. Questões a apreciar
As questões a apreciar, eventualmente, são as suscitadas pela recorrente, atrás mencionadas.

2. Omissão de pronúncia – Prescrição
Entende a recorrente que o acórdão recorrido incorreu em omissão de pronúncia sobre a questão da prescrição das taxas suscitada no recurso contencioso.
A recorrente está equivocada, dado que o acórdão recorrido tratou da questão no seu n.º 5 (p. 35 do acórdão) dizendo que, por não ter sido a mesma questão suscitada perante a Administração, não foi objecto do acto administrativo recorrido, pelo que este não a abordou nem tinha de abordar, sendo a questão da dívida um fundamento de oposição à execução. E que sendo uma questão que não foi objecto do acto não havia que dela conhecer.
Improcede a questão suscitada.

3. Prescrição
A entender-se não ter havido omissão de pronúncia, entende a recorrente que o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 252.º, n.º 3, do Decreto n.º 38088, de 6 de Janeiro de 1951, ao ter considerado não ter havido prescrição das taxas anteriores ao ano de 2008.
Como bem entendeu o acórdão recorrido, a recorrente não suscitou a questão da prescrição perante a Administração e assim não foi objecto do acto administrativo recorrido, pelo que este não a abordou nem tinha de abordar.
Logo, não podia o acórdão recorrido conhecer da questão, visto não estarmos perante um meio de plena jurisdição, mas no contencioso de anulação. Só há que conhecer de questões que levem à anulação do acto administrativo e não à extinção do procedimento tributário.
Improcede a questão suscitada.

4. Violação do disposto no artigo 13.º, n.º 2, da Lei n.º 3/90/M e na Cláusula 31.ª do Contrato de Concessão
Vejamos se o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 13.º, n.º 2, da Lei n.º 3/90/M e na Cláusula 31.ª do Contrato de Concessão.
Integrado na lei que estabelece as bases (princípios gerais) a observar nas concessões de obras públicas e de serviços públicos, dispõe o artigo 13.º da Lei n.º 3/90/M:
“Artigo 13.º
(Regime fiscal)
1. Os concessionários de obras públicas e de serviços públicos ficam obrigados ao pagamento de impostos, contribuições, taxas ou emolumentos estabelecidos na lei.
2. Quando a natureza das concessões o justifique, os respectivos contratos podem isentar os concessionários de quaisquer impostos, contribuições, taxas ou emolumentos, relativamente aos rendimentos auferidos pela exploração da concessão ou aos actos ou contratos que pratiquem, outorguem ou em que intervenham”.
E a cláusula 31.ª do Contrato de Concessão do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição, entre o então Território de Macau e a A, estatui o seguinte:
“A Concessionária poderá beneficiar de isenção de impostos, taxas e emolumentos ou usufruir de outros benefícios fiscais nos termos da lei”.
Convém conhecer algumas normas do Decreto-Lei n.º 18/83/M, de 12 de Março, que regula o regime legal das radiocomunicações no território de Macau ou em navio ou aeronave sujeito às suas leis:
“Artigo 5.º
(Tutela dos operadores)
1. Estão sujeitos a tutela do Chefe do Executivo todos os operadores de serviço de radiocomunicações, incluindo a transmissão da radiodifusão sonora e televisiva”.
“Artigo 13.º
(Licença de equipamento de estação)
1. Todo o equipamento emissor, receptor ou emissor/receptor, quer individual, quer de uma rede de radiocomunicações, carece de uma licença atestando a legalidade da sua utilização, no quadro da respectiva autorização governamental.
  2.
  3.
  4. …”
“Artigo 33.º
(Taxa de exploração)
Os titulares de uma licença estão sujeitos ao pagamento de uma taxa de exploração destinada a cobrir os encargos de fiscalização das estações de radiocomunicações e das suas emissões”.
A simples leitura das normas transcritas mostra com evidência a sem razão da recorrente.
Em primeiro lugar, o artigo 13.º da Lei n.º 3/90/M prevê, em termos gerais, que os contratos de concessão de obras públicas e de serviços públicos possam isentar os concessionários de quaisquer impostos, contribuições, taxas ou emolumentos, relativamente aos rendimentos auferidos pela exploração da concessão ou aos actos ou contratos que pratiquem, outorguem ou em que intervenham.
Mas tal disposição legal, por si, não isenta de impostos, contribuições, taxas ou emolumentos nenhum concessionário.
Em segundo lugar, o contrato de concessão que, segundo a norma acabada de interpretar, pode isentar os concessionários de quaisquer impostos, contribuições, taxas ou emolumentos, em boa verdade, de nada isenta a ora recorrente. Basta ler a cláusula 31.ª do Contrato de Concessão do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição, atrás citada.
Em terceiro lugar, o contrato de concessão não só não isenta a recorrente da taxa radioeléctrica, mas prevê expressamente na cláusula 38.ª do Contrato:
“ Cláusula trigésima oitava – (Frequências radioeléctricas)
Um. A Autoridade de Telecomunicações procederá à consignação das frequências necessárias no âmbito da concessão, de acordo com a legislação aplicável.
Dois. Pela utilização do espectro radioeléctrico corresponde ao uso das frequências referidas no número anterior, a Concessionária fica obrigada ao pagamento das taxas respectivas”.
Em quarto lugar, ainda que o Contrato de Concessão do Serviço Terrestre de Televisão por Subscrição, com base no artigo 13.º da Lei n.º 3/90/M, isentasse a recorrente das taxas e impostos neste previstos, seguramente que não seria a taxa dos autos, a taxa radioeléctrica.
É que o artigo 13.º da Lei n.º 3/90/M prevê que os contratos de concessão de obras públicas e de serviços públicos possam isentar os concessionários de quaisquer impostos, contribuições, taxas ou emolumentos, relativamente aos rendimentos auferidos pela exploração da concessão ou aos actos ou contratos que pratiquem, outorguem ou em que intervenham. Mas a taxa radioeléctrica não é devida por rendimentos auferidos pela exploração da concessão nem por quaisquer actos ou contratos que pratiquem, outorguem ou em que intervenham. Trata-se antes de taxa de exploração destinada a cobrir os encargos de fiscalização das estações de radiocomunicações e das suas emissões (artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 18/83/M).
Em conclusão, a nenhum título foi a recorrente isenta da taxa radioeléctrica.
Improcede a questão suscitada.

5. Violação dos princípios da decisão, da protecção da confiança e da boa-fé

Na tese da recorrente, a falta de decisão da Administração durante anos criou a expectativa de que a isenção pedida fora aceite. Assim, o acto administrativo teria violado princípios da decisão, da protecção da confiança e da boa-fé.
A isto contrapôs o acórdão recorrido a que a falta de decisão conduziu ao indeferimento tácito do pedido.
Mas a recorrente entende que de acordo com a cláusula 67.ª do Contrato de Concessão a falta de decisão leva, não ao indeferimento, mas ao deferimento do acto.
Como se sabe, nos termos do artigo 102.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo a falta, no prazo fixado para a sua emissão, de decisão final sobre pretensão dirigida a órgão administrativo competente confere ao interessado, salvo disposição em contrário, a faculdade de presumir indeferida essa pretensão, para poder exercer o respectivo meio legal de impugnação.
O acto contrário, isto é, o deferimento tácito só ocorre nos casos especialmente previstos na lei (artigo 101.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo).
Ou seja, a menos que a lei expressamente preveja o deferimento tácito como resposta ao silêncio da Administração perante pedido do particular, o indeferimento tácito é a consequência regra, para todos os restantes casos.
Dispõe a cláusula 67.ª do Contrato:
“ Cláusula sexagésima sétima – (Prazo dos actos)
Com excepção da aprovação prevista no número um da cláusula quinquagésima oitava, os actos do Concedente previstos no Contrato devem ser praticados no prazo de trinta dias contados da data de recepção do pedido, sob pena de este se considerar aceite”.
O acto administrativo que aprecia pedido de isenção de taxa devida pela Concessionária não é um acto do Concedente previsto no Contrato. Nenhuma cláusula do Contrato prevê a possibilidade de isenção da taxa radioeléctrica. Logo, tal cláusula não permite considerar o acto como tacitamente deferido.
Aliás, nem a recorrente alguma vez considerou o seu pedido como tacitamente deferido. Se o tivesse considerado não teria pedido ao Tribunal a anulação do acto, que só faz sentido perante actos de indeferimento. Um acto expresso que indefere pedido de particular, revoga acto que o defere. Então o que teria feito sentido teria sido a impugnação do acto administrativo revogatório do acto constitutivo de direitos. O que não aconteceu.
Quanto à violação do princípio da decisão - nos termos do qual os órgãos administrativos têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares - a mesma não ocorreu, visto ter havido decisão.
Por outro lado, não há violação dos princípios da protecção da confiança e da boa-fé, que só relevariam perante actos discricionários.
Ora, o acto que indefere pedido de isenção de imposto ou taxa, não previsto na lei nem no contrato, é um acto vinculado para a Administração. Esta não pode, sem mais, isentar de impostos ou taxas os contribuintes.
Acresce que a circunstância de a Administração, porventura ilegalmente, não exigir o pagamento de impostos ou taxas aos chamados anteneiros, a ser exacto o que se alega, o que se desconhece, não legitima a violação da lei a favor da recorrente.
Improcedem os vícios suscitados.

6. Preterição de audiência prévia
Por fim, a falta de audiência prévia.
No acórdão deste Tribunal de 25 de Julho de 2012, no Processo n.º 48/2012, considerámos que sempre que, no exercício de poderes vinculados por parte da Administração, o tribunal conclua, através de um juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa tomada era a única concretamente possível, a falta de audiência do interessado, prevista no artigo 93.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, degrada-se em formalidade não essencial do procedimento administrativo e, por isso, não invalidante do acto.
É este entendimento que se mantém e, tendo-se dito já que o acto dos autos era praticado no exercício de poderes vinculados, nada mais resta senão julgar improcedente a questão suscitada.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso jurisdicional.
Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 10 UC.
Macau, 22 de Junho de 2016.

(Vencido quanto à improcedência da preterição da audiência prévia, nos termos do voto aposto ao acórdão de 25 de Julho de 2012, atrás mencionado. )

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa



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Processo n.º 20/2016

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