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Processo nº 356/2016
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 30 de Junho de 2016

ASSUNTO:
- Erro-vício

SUMÁRIO:
- Apenas o erro essencial pode determinar a anulação do negócio.
- O erro só é essencial quando é cognoscível pelo declaratário (cfr. artº 240º, nº 2 al. b) do CCM).
- A cognoscibilidade pode ser subjectiva ou objectiva (cfr. artº 241º e artº 240º, nº 3, ambos do CCM).
- Sendo a procuração um negócio unilateral, não há lugar a cognoscibilidade subjectiva.
- O erro considera-se objectivamente cognoscível quando, tendo em conta as circunstâncias concretas do caso sub justic, uma pessoa de normal diligência colocada na posição do declaratário se podia ter apercebido dele.
O Relator





Processo nº 356/2016
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 30 de Junho de 2016
Recorrente: A (Autor)
Recorrida: B (Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 12/01/2016, foi decidido julgou-se improcedente a acção interposto pelo Autor A.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
i. Tem o presente recurso por objecto a sentença dos presentes autos, que julgou improcedente o pedido formulado pelo autor e ora recorrente, para declarar nula a procuração outorgada pelo autor a favor da sua mulher, ora recorrida, em 6 de Março de 2012, para representá-lo na gestão e disposição futura de um imóvel pertencen te ao casal.
ii. A pretensão do autor, ora recorrente fundou-se na existência de erro-vício determinante da sua vontade, em relação ao objecto do negócio, porquanto outorgou a referida procuração apenas no intuito de agilizar e facilitar uma futura cessão da posição contratual, sem que nunca tivesse representado que a mesma pudesse vir a ser fon te de incidência fiscal.
iii. Adicionalmente, o recorrente invocou erro sobre os motivos determinantes da vontade, em relação às circunstáncias que constituiram a base do negócio, na medida em que a vontade de outorgar a procuração apenas se formou no espirito do recorrente por este se achar absolutamente convicto e seguro que tal acto estaria isento de tributação, o que não se veio a confirmar.
iv. Em suma, a sentença recorrida considera que a procuração outorgada pelo recorrente contêm exactamente os poderes que este pretendia conferir, e dirigida àquela a quem pretendia que fosse efectivamente a procuradora, pelo que não houve uma representação inexacta sobre a realidade, o objecto ou a pessoa do negócio.
v. Por outro lado, o tribunal a quo também não encontrou erro sobre os motivos determinantes da vontade, em relação ás circunstáncias que constituíram a base do negócio, por entender que ao decidir passar a procuração em causa à ré, o recorrente nem sequer tinha tomado em ponderação a circunstância de a mesma vir a ser sujeita a tributação ou não.
vi. Com tal decisão não se pode o recorrente conformar, por entender que o Tribunal a quo errou na apreciação dos pressupostos de facto fundamentais para a decisão da causa, conforme adiante se verá.
vii. Da factualidade provada nos presentes autos destaca-se a seguinte:
* Autor e Ré casaram segundo os ritos tradicionais chineses, em 1989.
* Na dia 06 de Março de 2012, o Autor outorgou uma procuração através da qual conferiu poderes à sua mulher B, ora Ré, para adquirir e vender a posição contratual de promitente-comprador sobre a fracção autónoma para habitação, do XX.º andar XX, Bloco XX, do Edifício "XX", prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2XXX0, com poderes para a prática de negócio consigo mesmo.
* No mesmo dia 06 de Março de 2012, foi celebrado um contrato-promessa celebrado por C e o casal B e A, ora Autor e Ré, através do qual o primeiro prometeu ceder aos segundos a posição contratual de promitente-comprador no contrato-promessa celebrado em 29 de Novembro de 2010 onde é promitente-vendedora a Sociedade de Investimento e Desenvolvimento D, Limitada, sobre a fracção autónoma para habitação acima identificada.
* A referida procuração não visava transmitir a posição contratual de promitente-comprador sobre a fracção autónoma em questão, mas apenas permitir que a Ré, na qualidade de cónjuge do outorgante, pudesse representar o marido, ora Autor, a agir em nome do casal no que respeita à aquisição e futura disposição sobre essa posição contratual no contrato-promessa, após a celebração, em cumprimento da promessa, do contrato prometido de cessão da posição contratual de promitente-comprador sobre o imóvel.
* Apesar de ter residência em Macau, o Autor trabalha na China, donde é muito mais fácil para a sua mulher, a ora Ré, tratar de formalidades e burocracias em Macau .
* Apesar de o contrato-promessa de cessão da posição contratual mencionar que a Ré e o Autor são solteiros, tal como acima alegado no artigo 1° da presente petição inicial, os mesmos são casados um com o outro hã muitos anos segundo os ritos tradicionais chineses, tendo em conjunto filhos, partilhando mesa e habitação.
* A procuração em causa foi revogada em 10 de Abril de 2012, sem nunca ter sido utilizada.
* No inicio da semana de 18 a 22 de Junho de 2012, o Autor foi surpreendido com a informação de que, na Direcção dos Serviços de Finanças, corriam diligências no sentido de ser liquidado oficiosamente o Imposto do Selo Especial em virtude de a procuração aqui em apreço ser considerada fonte de transmissão para efeitos do disposto na Lei na 6/2011.
* Neste seguimento, logo por requerimento datado de 22 de Junho de 2012, o Autor enviou uma exposição escrita à Sra. Directora dos Serviços de Finanças em que solicitou o reconhecimento de que o Imposto do Selo Especial não era aplicável à referida procuração.
* Para além dos argumentos acima invocados, o Autor desde logo alegou que o contrato-promessa de cessão de posição contratual não é fonte de uma transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis nos termos do disposto nos artigos 51.º e 57.º da Lei n.º 17/88/M, de 27 de Junho.
* Por outro lado, alegou ainda que a alínea 1) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 6/2011 visa precisamente permitir a transmissão de imóveis para a habitação entre os membros de uma família, até ao 2.º grau da linha colateral, sem serem sujeitos à carga fiscal prevista no Imposto do Selo Especial.
* Precisamente a situação ora em apreço, em que uma procuração foi outorgada por um cônjuge a favor do outro, ainda que sem a finalidade de operar uma transmissão do direito contratual em questão .
* Por despacho da Directora dos Serviços de Finanças de 1 de Agosto de 2012, exarado na Informação n.º 2953/NIS/DOI/RFM/2012, o requerimento do Autor foi indeferido com o fundamento apenas de que a procuração, apesar de ter sido revogada, está sujeita à tributação do Imposto do Selo Especial.
* No dia 20 de Agosto de 2012, o Autor apresentou reclamação sobre tal despacho, insistindo que o contrato-promessa de cessão de posição contratual não é fonte de uma transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis, a procuração não visava transmitir a posição contratual de promitente-comprador sobre a fracção autónoma em questão e a mesma fora celebrada entre dois cônjuges, tendo, por isso, que ser considerada isenta nos termos do artigo 9.°, n.º 1, alínea 1) da Lei n.º 6/2011.
* Por despacho da Sra. Directora dos Serviços de Finanças de 31 de Agosto de 2012, exarado na Informação n.º 3607/NIS/DOI/RFM/2012, foi mantido o indeferimento, considerando-se novamente que o imposto do selo especial era forçosamente devido.
* No dia 10 de Outubro de 2012, o Autor interpôs recurso hierárquico necessário para o Sr. Chefe do Executivo.
* Por despacho do Sr. Secretário para a Economia e Finanças, de 5 de Dezembro de 2012, exarado na Informação n.º 4429/NIS/DOI/RFM/2012, de 1 de Novembro, foi indeferido o recurso hierárquico necessário interposto.
* Notificado de tal decisão, no passado dia 17.01.2013, o Autor interpôs recurso contencioso de anulação, o qual corre hoje seus termos sob o n.º 51/2013 no Tribunal de Segunda Instáncia de Macau.
* O Autor nunca teria outorgado tal procuração, caso tivesse representado que tal acto poderia ser interpretado como fonte ou instrumento de incidência tributária adicional para efeitos de pagamento de imposto especial de selo.
viii. O negócio jurídico constitui uma manifestaçào da vontade dos sujeitos, a qual tem que ser exteriorizada, para poder produzir os efeitos pretendidos, sendo constituida por dois elementos: o elemento externo ou a vontade declarada, e o elemento interno ou a vontade real.
ix. Regra geral, esses dois elementos coincidem. Porém, excepcionalmente podem divergir, o que compreende as situações de falta e dos vicios da vontade.
x. Tais situações de falta e dos vicias da vontade são deficiências que afectam o processo gestativo da vontade negocial, que é determinada por motivos anómalos, que a desviam do modo julgado normal, e que o Direito valara como ilegitimos.
xi. A vontade livre e esclarecida é uma vontade não viciada, mas que o pode passar a ser quando ocorre um conhecimento defeituoso de causa, como acontece no caso do erro.
xii. O erro traduz-se numa representação inexacta ou na ignorância de uma qualquer circunstãncia de facto ou de direito que foi determinante na decisão de efectuar o negócio. Se estivesse esclarecido acerca dessa circunstância - se tivesse exacto conhecimento da realidade - o declarante não teria realizado o negócio ou não teria realizado o negócio nos termos em que o celebrou.
xiii. O erro implica uma avaliação falsa da realidade: seja por carência de elementos, seja por má apreciação destes, e pode incidir sobre circunstâncias passadas, presentes ou futuras.
xiv. O erro é, assim, um dos mais importantes tipos de vicias da vontade, abrangendo o erro-vicio sobre os motivos determinantes da vontade, em relação ao objecto do negócio, a que alude o art. 240°, e o erro sobre os motivos determinantes da vontade, em relação às circunstãncias que constituem a base do negócio, a que se reporta o art. 245°, ambos do CC.
xv. Dispõe o art. 245° que, se o erro do declarante recair sobre as circunstãncias que constituem a base do negócio, incidindo nos motivos determinantes da vontade, que não se refiram à pessoa do declaratário, nem ao objecto do negócio, pode o mesmo ser anulado ou modificado, aplicando-se o disposto sobre a resolução ou modificação dos contratos, por alteração das circunstãncias vigentes no momento em que foi concluido, previsto no art. 431° do CC.
xvi. Constituem base do negócio as circunstãncias determinantes da decisão do declarante que, pela sua importãncia, justificam, segundo os princípios da boa-fé, a invalidade do negócio, em caso de erro daquele, independentemente de o declaratário conhecer ou dever conhecer a essencialidade, para o declarante, dessas circunstãncias e, por maioria de razão, sem necessidade de os dois se mostrarem de acordo sobre a existência daquela essencialidade.
xvii. De facto, relativamente ao erro sobre a base do negócio, este consiste numa situação em que as partes representam, erroneamente, as circunstãncias basilares respeitantes ao próprio contrato em que fundaram a decisão de contratar, e que foi essencial para tal a decisão de contratar, nos seus termos concretoss, ocorrendo ele quando os elementos essenciais para a formação da vontade do declarante não correspondem à realidade, tornando a exigência do cumprimento do negócio concluido gravemente contrário aos princípios da boa-fé.
xviii. Regressando ao caso em apreço nos autos, entende, efectivamente, o tribunal a quo que erro é uma falsa ou inexacta representação sobre determinado facto, mas que não se poderá errar sobre as circunstáncias fácticas se não tenham sequer tenha passado pela cabeça tais circunstáncias no momento da decisão, todavia, considera que o recorrente simplesmente não concordou com a consequente sujeição do imposto do selo aplicada pela Administração Fiscal, mas que tal se trata de um facto novo e que nada tem a ver com o processo deliberativo, concluindo assim que não houve erro.
xix. Sucede que, salvo o devido respeito, tal conclusão não tem respaldo na factualidade provada, donde aliás, se retira precisamente o contrário.
xx. De facto, ficou demonstrado que a referida procuração náo tinha o intuito servir como instrumento de transmissão de posição contratual em contrato-promessa, mas sim o de agilizar e facilitar uma futura cessão da posição contratual, por forma a evitar que o recorrente se tivesse de deslocar propositadamente a Macau, tendo em conta que passa a maior parte do tempo em trabalho na China.
xxi. Por outro lado, ficou também demonstrado que o recorrente nunca teria outorgado tal procuração, caso tivesse representado que a mesma poderia ser interpretada como fonte ou instrumento de incidência tributária adicional para efeitos de pagamento de imposto especial de selo.
xxii. Logo por aqui se conclui que o recorrente equacionou a possibilidade de tributação, mas que acreditou que tal não viria a acontecer.
xxiii. E a razão é simples. Sendo casado com a recorrida c estando consciente da isenção de tributação de imposto do selo, nos termos do art. 9°, n.º 1, al 1) da Lei n.º 6/2011, segundo o qual, estão isentas do imposto do selo especial as transmissões para o cõnjuge, parente ou afim na linha recta e parente ou afim até ao 2.° grau da linha colateral, o recorrente estava convicto que estaria isento de tributação.
xxiv. Por outro lado, tendo outorgado a procuração antes da celebração do contrato-promessa de cessão de posição contratual em 29 de Novembro de 2010 - que não é um contrato de cessão ou um contrato-promessa de compra e venda, esses, sim, fonte de incidência tributária para efeitos de pagamento de Imposto do Selo - o recorrente estava também seguro que a mesma não estava sujeita ao Imposto do Selo Especial.
xxv. Por isso, a possibilidade de a procuração estar sujeita a tributação esteve sempre presente no processo de formação da vontade do recorrente, mas tendo este conhecimento genérico da lei - tal como a maioria da população - formou-se no seu espírito a convicção de que não estaria sujeita ao pagamento de imposto.
xxvi. Ou seja, o recorrente nunca deixou de equacionar a hipótese de vir a liquidar imposto, mas partiu do pressuposto que não estaria sujeito ao mesmo, atendendo à sua condição de casado com a recorrida e que a procuração não era fonte de tributação de Imposto do Selo.
xxvii. Ainda que se considere que o acto de tributação oficiosa da procuração praticado pela Administração Fiscal constitui uma circunstância nova e que nada tem a ver com a formação da vontade do recorrente, não se poderâ deixar de ignorar que a mesma representou uma surpresa para o recorrente, tendo em conta precisamente o facto de este estar convicto e seguro que o acto não estaria sujeito a tributação.
xxviii. Acresce que foi precisamente o facto de considerar que não estaria sujeito a tributação que levou o recorrente a outorgar a procuração a favor da sua mulher, sendo essa a condição determinante para o negócio, pois não havendo razão alguma para outorgar a referida procuração, que não fosse apenas a de facilitar a sua representação num eventual negócio com terceiro, não tinha o recorrente necessidade de sujeitar-se ao pagamento de um imposto absolutamente dispensável. Isto parece óbvío!
xxix. Conforme referiu o Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão do P. 9052/09.7TBOER.L1.S1:
Existe erro quando ocorre, no momento da formação da vontade de contratar, da assumpção da decisão de celebrar um contrato e da sua conclusão formal ou consensual, um desvio, relevante, substancial e essencial, entre o querido e o contratado, por forma a que a parte contratante, se tivesse obtido uma correcta e arrimada formação da sua vontade, não teria celebrado o contrato ou, pelo menos, não o teria concluído da forma em que acabou por o ser.
Este desvio na formação e conclusão da vontade de contratar e de concluir o contrato tem que incidir sobre o núcleo determinante do conteúdo substantivo do acordo das partes e tem que se revelar desvirtuador do sentido essencial que uma vontade deserta de vício teria querido naquele concreto e contemporâneo momento de assumpção da decisão de contratar.
xxx. Erro essencial é aquele que levou o errante a realizar o negócio em si mesmo e não apenas nos termos em que foi concluído.
xxxi. Não há dúvida que no momento da formação da vontade em outorgar a procuração o recorrente estava convicto e seguro de que sobre aquela não incidiria qualquer tributação de imposto do selo e que essa foi a condição fundamental para que tivesse outorgado a procuração.
xxxii. É evidente que caso o recorrente tivesse conhecimento que a procuração iria ser considerada fonte ou instrumento de incidência tributária e resultar num acréscimo substancial de custos, com o consequente decréscimo do seu património - contrariamente aquilo que projectou - este jamais a outorgaria.
xxxiii. Custos, esses que tornaram os efeitos jurídicos da procuração demasiadamente onerosos para o A., os quais jamais considerou na sua formação da vontade, afectando assim gravemente os princípios da boa-fé.
xxxiv. Efectivamente, apesar de a procuração ter sido revogada pelo recorrente a mesma não deixou de provocar efeitos jurídicos na esfera deste, por ser considerada fonte de tributação de Imposto Especial do Selo.
xxxv. Portanto, é manifesto que no pressente caso se verifica um erro essencial no momento da formação da vontade do recorrente, o que constitui elemento destruidor do negócio e implica a anulabilidade da procuração.
xxxvi. Verifica-se que se encontram reunidos os pressupostos da verificação do erro sobre a base do negócio, previstos no art. 245° do CC.
xxxvii. Pelo que não restam dúvidas que o recorrente tem direito a exigir a anulação da procuração, de acordo com os juizos de equidade, destruindo os seus efeitos retroactivamente, nos termos dos arts. 280° e 282°, do CC e art. 52° do Regime do Imposto do Selo.
xxxviii. Caso assim não se entenda, deverá ainda a procuração ser anulada por erro-vicio, ao abrigo do disposto no art. 240° do CC.
xxxix. Porquanto, o erro-vício traduz-se numa representação inexacta ou na ignorância de uma qualquer circunstância de facto ou de direito que foi determinante na decisão de efectuar o negócio.
xl. Ora, nos termos do art. 255.°, n.º 1 do Código Civil, procuração é um negócio jurídico unilateral, pelo que, no caso em apreço, o regime do erro terá que ser analisado tendo presente a natureza de tal instrumento jurídico.
xli. Com efeito, o negócio juridico unilateral é aquele que se completa com uma única declaração de vontade (de que é exemplo o testamento e a outorga de procurações); por sua vez, o negócio bilateral é aquele que precisa de duas declarações de vontade para se completar (de que é exemplo a compra e venda e, de um modo geral, a celebração de quaisquer contratos).
xlii. Significa isto que, no caso, a declaração negocial vertida na procuração objecto dos presentes autos ficou completa com a declaração do "declarante", o Autor, sem que tenha existido qualquer intervenção da Ré, na qualidade de "declaratária".
xliii. Em face da factualidade acima exposta, dúvidas não podem existir da essencialidade do erro, quer para o recorrente, quer para qualquer pessoa razoável colocada na posição do mesmo.
xliv. Com efeito, qualquer pessoa normal, colocada nas mesmas circunstãncias do recorrente, caso devidamente avisada de que a procuração poderia vir a ser interpretada como sendo fonte de incidência tributária acrescida, nunca teria outorgado tal procuração.
xlv. Tal como resulta do acima exposto, o recorrente apenas outorgou a procuração a fim de facilitar a futura cessão da posição contratual, não a tendo outorgado com o objectivo de operar qualquer transmissão.
xlvi. Jamais tendo concebido que a outorga da procuração nos termos em que o fez poderia vir a ser interpretada como fonte ou instrumento de transmissão, nos termos e para os efeitos da Lei n.º 6/2011, o diploma que veio instituir o Imposto Especial do Selo.
xlvii. O recorrente subscreveu a referida procuração em erro, porquanto jamais representou como possível que a referida procuração, não se destinando a operar qualquer transmissão, em vez de facilitar o futuro cumprimento de contrato-promessa de cessão da posição contratual, apenas viria a agravar a sua posição e a onerar o seu património.
xlviii. Facto tão mais grave, tendo em conta que a procuração foi revogada pelo recorrente logo em 10.04.2012, sem que nunca tenha sido utilizada ou que, por seu intermédio, se tenha operado qualquer acto de transmissão, o que, por si só, evidencia a essencialidade do erro em que laborou o recorrente.
xlix. Entende, por isso, que se encontram reunidos todos os pressupostos para a anulação da procuração, com fundamento em erro-vício, nos termos previstos pelo artigo 240° do CC.
l. Ainda na hipótese de assim não se entender, em qualquer caso, entende o recorrente que sempre se verificam os pressupostos do art. 241º do CC (Erro não objectivamente essencial).
li. Visto que, nos termos do referido normativo: "Ainda que o erro não preencha as condições da alínea b) do n.º 2 do artigo anterior, o mesmo é ainda causa de anulação do negócio: a) Se as partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo; ou b) Se, verificando-se os demais pressupostos constantes do artigo anterior, o declaratário conhecia ou não devia ignorar a essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o erro."
lii. Em qualquer dos casos, deve em consequência a procuração outorgada pelo recorrente a favor da recorrida, em 06.03.2012 ser anulada, nos termos do art. 280º do Código Civil, bem como ao abrigo do art. 52.º do Regime do Imposto do Selo.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
- Autor e Ré casaram segundo os ritos tradicionais chineses em 1989. (Artigo 1º)
- No dia 06 de Março de 2012, o Autor outorgou uma procuração através da qual conferiu poderes à sua mulher B, ora Ré, para adquirir e vender a posição contratual de promitente-comprador sobre a fracção autónoma para habitação, do XXº andar XX, Bloco XX, do Edifício “XX”, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2XXX0, com poderes para a prática de negócio consigo mesmo. (Artigo 2º)
- No mesmo dia 06 de Março de 2012, foi celebrado um contrato-promessa celebrado por C e o casal A e B, ora Autor e Ré, através do qual o primeiro prometeu ceder aos segundos a posição contratual de promitente-comprador no contrato-promessa celebrado em 29 de Novembro de 2010 onde é promitente-vendedora a Sociedade de Investimento e Desenvolvimento D, Limitada, sobre a fracção autónoma para habitação acima identificada. (Artigo 4º)
- A referida procuração não visava transmitir a posição contratual de promitente-comprador sobre a fracção autónoma em questão, mas apenas permitir que a Ré, na qualidade de cônjuge do outorgante, pudesse representar o marido, ora Autor, a agir em nome do casal no que respeita à aquisição e futura disposição sobre essa posição contratual no contrato-promessa, após a celebração, em cumprimento da promessa, do contrato prometido de cessão da posição contratual de promitente-comprador sobre o imóvel. (Artigo 5º)
- Apesar de ter residência em Macau, o Autor trabalha na China, donde é muito mais fácil para a sua mulher, a ora Ré, tratar de formalidades e burocracias em Macau. (Artigo 7º)
- Apesar de o contrato-promessa de cessão da posição contratual mencionar que a Ré e o Autor são solteiros, tal como acima alegado no artigo 1º da presente petição inicial, os mesmos são casados um com o outro há muitos anos segundo os ritos tradicionais chineses, tendo em conjunto filhos, partilhando mesa e habitação. (Artigo 8º)
- A procuração em causa foi revogada em 10 de Abril de 2012. (Artigo 10º)
- Sem nunca ter sido utilizada. (Artigo 11º)
- No início da semana de 18 a 22 de Junho de 2012, o Autor foi surpreendido com a informação de que, na Direcção dos Serviços de Finanças, corriam diligências no sentido de ser liquidado oficiosamente Imposto do Selo Especial em virtude de a procuração acima identificada. (Artigo 12º)
- Neste seguimento, logo por requerimento datado de 22 de Junho de 2012, o Autor enviou uma exposição escrita à Sra. Directora dos Serviços de Finanças em que solicitou o reconhecimento de que o Imposto do Selo Especial não era aplicável à referida procuração. (Artigo 13º)
- Para além dos argumentos acima invocado, o Autor alegou desde logo que o contrato-promessa de cessão de posição contratual não é fonte de uma transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis nos termos do disposto nos artigos 51º e 57º da Lei n.º 17/88/M, de 27 de Junho. (Artigo 14º)
- Por outro lado, alegou ainda que a alínea 1) do n.º 1 do artigo 9º da Lei n.º 6/2011 visa precisamente permitir a transmissão de imóveis para a habitação entre os membros de uma família, até ao 2º grau da linha colateral, sem serem sujeitos à carga fiscal prevista no Imposto do Sele Especial. (Artigo 15º)
- Precisamente a situação ora em apreço, em que uma procuração foi outorgada por um cônjuge a favor do outro, ainda que sem a finalidade de operar uma transmissão do direito contratual em questão. (Artigo 16º)
- Por despacho de Directora dos Serviços de Finanças de 01 de Agosto de 2012, exarado na Informação n.º 2953/NIS/DOI/RFM/2012, o requerimento do Autor foi indeferido com o fundamento apenas de que a procuração, apesar de ter sido revogada, está sujeita à tributação do Imposto do Selo Especial. (Artigo 17º)
- No dia 20 de Agosto de 2012, o Autor apresentou reclamação sobre tal despacho, insistindo que um contrato-promessa de cessão de posição contratual não é fonte de uma transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis, que a procuração não visava transmitir a posição contratual de promitente-comprador sobre a fracção autónoma em questão e que a mesma fora outorgada entre dois cônjuges, tendo, por isso, que ser considerada isenta nos termos do artigo 9º, n.º 1, alínea 1) da Lei n.º 6/2011. (Artigo 18º)
- Por despacho da Sra. Directora dos Serviços de Finanças de 31 de Agosto de 2012, exarado na Informação n.º 3607/NIS/DOI/RFM/2012, foi mantido o indeferimento, considerando-se novamente que o imposto do selo especial era devido. (Artigo 20º)
- No dia 10 de Outubro de 2012, o Autor interpôs recurso hierárquico necessário para o Sr. Chefe do Executivo. (Artigo 21º)
- Por despacho do Sr. Secretário para a Economia e Finanças, de 05 de Dezembro de 2012, exarado na Informação n.º 4429/NIS/DOI/RFM/2012, de 01 de Novembro, foi indeferido o recurso hierárquico necessário interposto. (Artigo 22º)
- Notificado de tal decisão, no passado dia 17/01/2013, o Autor interpôs recurso contencioso de anulação, o qual corre hoje seus termos sob o n.º 51/2013 no Tribunal de Segunda Instância de Macau. (Artigo 23º)
- O Autor nunca teria outorgado tal procuração, caso tivesse representado que tal acto poderia ser interpretado como fonte ou instrumento de incidência tributária adicional para efeitos de pagamento de imposto especial de selo. (Artigo 45º)
*
III – Fundamentação:
A sentença recorrida tem o seguinte teor:
   “...
   Cumpre analisar os factos e aplicar o direito.
   Com a presente acção, pretende o Autor ver anulada a procuração outorgada por ele a favor da Ré, fundamentando, e em síntese, que, no dia 06/03/2012, foi celebrado um contrato-promessa entre o Autor e a Ré e o C através do qual este prometeu ceder a aqueles a posição do promitente-comprador noutro contrato-promessa que tem por objecto a fracção autónoma "XX" do Bloco XX, do edifício "XX", do prédio descrito sob o nº 2XXX0 na Conservatória do Registo Predial. No mesmo dia, através da escritura pública, o Autor outorgou uma procuração a favor da Ré com poderes para a prática de negócio consigo mesmo em relação à fracção autónoma referida. A procuração não visava transmitir a posição contratual do promitente-comprador mas apenas permite à Ré poder representar o Autor, sendo as partes casados, a agir em nome do casal, no que respeito à aquisição e futura disposição sobre essa posição contratual no contrato-promessa. A procuração foi revogada em 10/04/2012 e nunca foi utilizada. Porém, por decisão da Directora da D.S.F., foi ordenada a tributação do imposto de selo especial sobre esse acto da passagem da procuração pelo Autor a favor da Ré. Contra essa decisão foi impugnada tanto por via administrativo como por via judicial, todos foram julgados improcedentes. Alegando o Autor que não teria outorgado a procuração caso tivesse representado que o acto poderia ser interpretado como fonte de incidência tributária adicional para efeito de pagamento de imposto especial de selo, pugnado que o acto deve ser anulado haver erro-vício na formação do respectivo negócio.
   A única central colocada pelo Autora consiste unicamente em saber se ocorre erro-vício que determinará a anulabilidade da procuração passada por ele a favor da Ré.
   "O vício da vontade trata-se de perturbações do processo formativo da vontade, operando de tal modo que esta, embora concorde com a declaração, é determinada por motivos anómalos e valorados, pelo direito, como ilegítimo." (Carlos Alberto de Mota Pinto, Teoria Geral de Direito Civil, pg. 500)
   O erro-vício é um dos vícios da vontade.
   Diz o mesmo Mestre que "o erro-vício traduz-se numa representação inexacta ou na ignorância de um qualquer circunstância de facto ou de direito que foi determinante na decisão de efectuar o negócio". (ob.ci. pg.505).
   A esse propósito, António Menezes Cordeiro, que "o erro implica uma avaliação falsa da realidade: seja por carência de elementos, seja por má apreciação destes". (in Tratado de Direito Civil Português, Parte Geral, Tomo I, 3ª ed. pg.807)
   O erro-vício é o erro ocorrido na fase de formação do contrato, que é diferente do erro-obstáculo ou erro-declaração. Para este caso existe uma divergência entre a vontade real e a vontade declarada, enquanto naquele caso, a vontade real e a vontade declarada não se difere, a divergência incide entre a vontade real e a vontade hipotética.
   Diz o Pedro Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil, 4ª ed. pg. 699, "Diferentemente do erro-vício, que incide no processe de formação da vontade negocial, sobre o processo deliberativo, e que faz com que a pessoa decida fazer aquilo que, se não houvesse erro, não faria; erro-obstáculo prejudica, não já a formação da vontade, mas a sua expressão e causa uma divergência não intencional entre o que a pessoa exprime e aquilo que ele queria exprimir."
   Contudo, nem todo o erro-vício poderá originar a anulação do negócio.
   Sobre as condições relevantes para o efeito anulatório do negócio, dispõe-se o art° 240° do C.C. o seguinte:
   "1. A declaração negocial é anulável por erro essencial do declarante, desde que o erro fosse cognoscível pelo declaratário ou tenha sido causado por informações prestadas por este.
   2. O erro é essencial quando:
   a)Tenha recaído sobre os motivos determinantes da vontade do errante, e de tal modo que este, caso tivesse tido conhecimento da verdade, não teria celebrado o negócio ou, a celebrá-lo, só o teria feito em termos substancialmente distintos; e
   b)Uma pessoa razoável colocada na posição do errante, caso tivesse tido conhecimento da verdade, não teria celebrado o negócio ou, a celebrá-lo, só o teria feito em termos substancialmente distintos."
   Com a consagração do preceito acima no C.C. vigente, desaparece a diversidade do tratamento de hipóteses abstractas de erro consoante o elemento sobre que este incide, tal como era definido no regime anterior, que havia regime específico para erro-vício sobre o objecto do negócio, a pessoa do declaratário ou sobre outros motivos determinantes da vontade.
   Exige a lei actual para efeito da anulação a essencialidade do erro e a cognoscibilidade do erro pelo declaratário ou o erro for causado por informações prestadas por este. Enquanto na vigência do Código Civil de 1966, a lei exige para a relevância anulatória requisitos diferentes, basta a essencialidade do erro e a cognoscibilidade da essencialidade pelo declaratário.
   Por outro lado, quanto à essencialidade do erro, adopta-se um critério mais objectivo, a essencialidade do erro é não só analisado segundo o critério subjectivo do errante, como também segundo o critério de razoabilidade, sob a perspectiva do homem médio ou razoável.
   Analismos o presente caso se apresentam os requisitos legais para a anulação.
   Invoca o Autor que outorgou a procuração em causa apenas com o intuito de agilizar/facilitar a futura cessão da posição contratual, não a teria outorgado caso tivesse representado que tal acto poderia ser interpretado como fonte ou instrumento de incidência tributária adicional para efeitos de pagamento de imposto especial do selo, qualificando, assim, a não representação dessa consequência como erro.
   Conforme os factos tidos como assentes, o Autor e a Ré celebraram em 06/03/2012 um contrato-promessa com C, através do qual este cedeu àqueles a posição contratual do promitente-comprador no outro contrato-promessa celebrado em 29/11/2010 onde é promitente-vendedora a Sociedade de Investimento de Desenvolvimento D, Limitada, sobre a fracção autónoma para habilitação "XX", do Bloco XX, do Edifício "XX"
   No mesmo dia, o Autor outorgou uma procuração através da qual conferiu poderes à Ré, para adquirir e vender a posição contratual de promitente-comprador sobre a referida fracção autónoma.
   A procuração visava que a Ré podia representar o Autor a agir em nome do casal no que respeito à aquisição e futura disposição sobre essa posição contratual no contrato-promessa, após a celebração, em cumprimento da promessa, do contrato prometido de cessão da posição contratual de promitente-comprador sobre o imóvel.
   Não se afigura que, no caso vertido, houve erro por parte do Autor sobre qualquer elemento do negócio jurídico, nem do objecto nem da pessoa nem das circunstâncias determinante na celebração do negócio jurídico. Vejamos.
   Ora bem, o negócio praticado pelo Autor é uma procuração que é um negócio jurídico unilateral. Deseja o Autor, com a outorga da procuração, que confere poderes para a Ré para que esta possa representá-lo para no futuro gerir e dispor o bem do casal. A procuração outorgada pelo Autor contém exactamente o conteúdo que este pretendeu conferir ao procurador e foi dirigido a quem que o mesmo queria ser atribuídos os poderes. Portanto, não houve qualquer representação inexacta sobre a realidade nem do objecto nem da pessoa do negócio.
   Pretendeu dizer o Autor que houve erro sobre os motivos determinantes da vontade em relação às circunstâncias que constituem a base do negócio.
   Quanto ao erro sobre a base do negócio, diz Pedro Pais de Vasconcelos, in obra citada., pg. 662, "A referência a circunstâncias leva a concluir que se trata de algo de exterior ao negócio que constitui o seu ambiente circunstancial envolvente, a realidade em que se insere, o estatus quo existente ao tempo da sua celebração, cuja existência ou subsistência tenha influência determinante na decisão negócio e seja necessário para o seu equilíbrio económico e a prossecução do seu fim, isto e, para a sua justiça interna."
   Portanto, não é qualquer circunstância que releva para efeito do erro sobre a base de negócio. É necessária a verificação do erro ou falsa representação sobre a circunstância que ambas as partes ou uma delas a tomaram na formação da sua vontade ao tempo da celebração do negócio.
   Nesse sentido, "Verifica-se erro sobre a base do negócio sempre que ocorra uma falsa representação das circunstâncias em que as partes fundaram a sua decisão de contratar, não se tornando necessário o reconhecimento por acordo da essencialidade dos motivos, aos contrário exigido para o erro sobre os motivos." (cfr. Acórdão do STJ., 16/11/2004, CJ./STJ, 2004,3°-113)
   "Considera-se erro sobre a base do negócio aquele que incide sobre as circunstâncias, sendo conhecidas de ambas as partes, foram tomadas em consideração por elas na celebração do acto de determinaram os termos concertos do conteúdo do negócio, circunstâncias que, ou determinaram ambas as partes ou que, sendo relativas a uma delas, a outra não podia deixar de aceitar como condicionamento do negócio, sem violação dos princípios de boa fé." (cfr. Acórdão do S.T.J. de 16/11/2001, in CJ 20074,3°-113)
   Para ser considerada circunstância sobre a base de negócio, é essencial que tal circunstância tinha sido considerada e reconhecida como relevante no momento da formação da vontade do negócio.
   Regressamos ao nosso caso em jogo, segundo o Autor, o que ele não tivesse representado é que a Direcção dos Serviços da Finança teria entendido tal acto como fonte de incidência tributária adicional. Todavia, essa circunstância em si é alheia ao próprio negócio jurídico cuja anulabilidade requeira. Na verdade, como a entidade administrativa entende se um determinado acto se deverá sujeitar ou não à cobrança do imposto de selo adicional, é um acto administrativo, e não é o efeito normalmente produzido pela passagem da procuração.
   O que é mais importante é que o Autor, ao decidir passar a procuração em causa à Ré, nem sequer tinha tomado em ponderação essa circunstância nem da sua verificação nem da inverificação. Ou seja, no processo deliberativo da outorga da procuração, a eventual incidência tributária não foi considerada nem podia ser circunstância determinante para celebração do negócio, daí que tal circunstância não poderá ser entendida como circunstância sobre a base do negócio.
   Mesmo que fosse considerada circunstância sobre a base do negócio, também não ocorre o erro, pois conforme os factos provados, o Autor não tinha representado como possível a que procuração passada pudesse ser fonte de incidência fiscal para efeito de imposto do selo especial, então, não houve falsa representação de qualquer circunstância decisiva para formação da sua vontade de declaração. Segundo o Autor, ele fez o acto no intuito de facilitar a futura cessão da posição contratual, a procuração passada por ele corresponde exactamente à sua vontade real. Essa pretensão do Autor terá sido satisfeita com a passagem da procuração, não tendo sido viciada por quaisquer circunstâncias. Como se disse acima, erro é uma falsa ou inexacta representação sobre determinado facto, um não poderá errar sobre circunstâncias fáticas algumas se sem sequer tinha passado pela cabeça tais circunstâncias no momento da decisão. De facto, o que o Autor não queria ver, ou melhor dizer, não concordou é efeito ou consequência reflexa determinada pela administração sobre o negócio jurídico praticado pelo Autor, no entanto, essa é circunstâncias nova, surgida após a celebração do acto, não tendo nada a ver com o processo deliberativo passado, ocorrido no momento da formação da vontade. Por isso, não poderá dizer que haverá erro sobre motivo determinante da vontade, sendo assim, não haverá lugar erro-vício, não justificará a anulação do negócio jurídico praticado.
   Nestes termos, por não se afigurar ocorrer erro menos essencial sobre os motivos determinantes da vontade, não poderá proceder o pedido do Autor.
***
IV) DECISÃO
   Em face de todo o que fica exposto e justificado, o Tribunal julga improcedente a acção e, em consequência, decide:
   - Julgar-se improcedente o pedido formulado pelo Autor A contra a Ré B.
*
  Custas pela Autor.
  Registe e Notifique.
   …”。
Trata-se de uma decisão que aponta para a boa solução do caso, com a qual concordamos na sua íntegra.
Assim, ao abrigo do disposto do nº 5 do artº 631º do CPCM, é de negar provimento ao recurso, com os fundamentos constantes na decisão impugnada.
Acrescenta-se ainda que o erro só é essencial quando é cognoscível pelo declaratário (cfr. artº 240º, nº 2 al. b) do CCM).
A cognoscibilidade pode ser subjectiva ou objectiva (cfr. artº 241º e artº 240º, nº 3, ambos do CCM).
No caso em apreço, não há lugar a cognoscibilidade subjectiva, uma vez que a procuração é um negócio unilateral.
Resta assim a cognoscibilidade objectiva.
Será que uma pessoa de normal diligência colocada na posição do declaratário se podia ter apercebido do alegado erro, tendo em conta as circunstâncias concretas do caso sub justice?
A resposta, para nós, não deixa de ser negativa por razões seguintes:
- no momento da aquisição da posição contratual de promitente-comprador da fracção autónoma em causa, o Autor e a Ré declararam ser solteiros; e
- pela procuração foram conferidos poderes especiais de celebração de negócio consigo mesmo, o que não é uma situação normal para aquele que passa a procuração a outrem com o fim de atribuir simplesmente os poderes representativos.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
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Custas pelo Autor.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 30 de Junho de 2016.

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Ho Wai Neng
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José Cândido de Pinho
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Tong Hio Fong



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356/2016