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Processo nº 796/2015
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 22 de Setembro de 2016

ASSUNTO
- Nº 2 do artº 13º da Lei 12/2011
- Interpretação jurídica
- Concessão da isenção do imposto

SUMÁRIO
- O nº 2 do artº 13º da Lei nº 12/2011 não prevê qualquer condição legal resolutiva da isenção concedida, antes pelo contrário, prevê simplesmente os requisitos para a concessão da isenção do imposto em causa.
- Sendo requisitos (a lei chama-lhes “condições”) da concessão da isenção, os mesmos têm de ser todos verificados no momento da concessão.
- A expressão “não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel” consagrada no nº 2 do artº 13º da Lei nº 12/2013 tem o sentido de impedir o beneficiário de gozar de uma segunda isenção em virtude de uma segunda aquisição no mesmo ano de 2012 e não o sentido de permitir a revogação da isenção legalmente concedida no momento posterior em consequência da modificação superveniente dos factos.
- Não tendo o legislador da Lei nº 12/2011 previsto outras situações que permitem revogar uma isenção legalmente concedida, funciona então a regra geral da revogabilidade dos actos válidos prevista no artº 129º do CPAM, nos termos do qual os actos administrativos válidos que forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos não são revogáveis, salvo quando todos os interessados dêem a sua concordância à revogação do acto e não se trate de direitos ou interesses indisponíveis, ou quando a revogação diz apenas à parte que seja desfavorável aos interesses dos seus destinatários.
O Relator (por vencimento),
















Processo n.º 796/2015
(Recurso Contencioso)

Data : 22 de Setembro de 2016
Recorrente: A
Entidade Recorrida: Secretário para a Economia e Finanças

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
A Recorrente A, mais bem identificada nos autos, vem, nos termos do art.º 20º e seguintes, contra a decisão proferida pelo Exm.º Senhor Secretário para a Economia e Finanças, interpor o presente RECURSO CONTENCIOSO, o que faz, alegando em síntese conclusiva:
1. O presente recurso tem como objecto o despacho proferido no dia 29 de Julho de 2015 pelo Exm.º Senhor Secretário para a Economia e Finanças, segundo o qual, foi rejeitado o recurso hierárquico necessário interposto pela recorrente, e perde os efeitos a isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens concedida pela Direcção dos Serviços de Finanças, devendo a recorrente efectuar o pagamento de imposto de MOP15.127,00.
(i) Erro na interpretação do art.º 13.º, n.º2 da lei n.º12/2011
2. Entende a recorrente que, partindo da ideia e da finalidade legislativa, a criação do disposto no art.º 13.º da Lei n.º12/2011 pelo legislador tem por finalidade a concessão aos residentes permanentes da Região Administrativa Especial de Macau maiores, de benefício tributário para “aquisição de habitação pela primeira vez” em Macau.
3. A recorrente, por sua vez, entende que não tem qualquer dúvida sobre a interpretação de “aquisição de habitação pela primeira vez”, o que quer dizer isso é aquisição de imóvel em Macau pela primeira vez.
4. Tal como foi referido pelo Exm.º Chefe do Executivo no relatório das linhas de acção governativa 2008, quanto à respectiva medida, que “o Governo decidiu também aplicar medidas de redução e isenção fiscais a áreas não contempladas no passado, a saber: …… os residentes permanentes de Macau que não possuírem imóveis (incluindo imóveis para fins comerciais, industriais e habitacionais) quando comprarem um imóvel, ficarão isentos do pagamento do imposto do selo sobre a transmissão da propriedade até 3 milhões do valor do imóvel (só aplicável às habitações e lugares de estacionamento) …… .”. (sublinhado nosso)
5. Pelo que, temos que fazer uma interpretação seguinte quanto à parte controvertida do art.º 13.º, n.º2 da Lei n.º12/2011: ou seja, a lei só exige que, antes de pedir a isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens em 2012, o requerente não possa ser proprietário de qualquer bem imóvel em Macau.
6. É de salientar de novo que a criação do art.º 13.º da Lei n.º12/2011 pelo legislador tem por finalidade a concessão de um benefício tributário ao requerente que reúna as condições da “aquisição de habitação pela primeira vez”, mas não restrição de aquisição de outro imóvel no mesmo ano contra o requerente após ter reunido os requisitos e conseguido a isenção.
7. Pelo que, a entidade recorrida efectivamente errou na interpretação e aplicação do art.º 13.º n.º2 da Lei n.º12/2011, e o que fez com que o acto administrativo padecesse do vício de anulabilidade previsto no art.º 124.º do Código do Procedimento Administrativo.
(ii) Qualificação do direito
8. Por outro lado, segundo o acto recorrido, a isenção concedida à recorrente em 2012 pelos Serviços de Finanças é um acto administração com condição de rescisão.
9. Desde modo, os elementos acessórios só podem ser incluídos em actos de conteúdo indeterminado, relativamente aos quais, por conseguinte, a competência para fixar os efeitos de direito seja, total ou parcialmente, discricionária.
10. No presente caso, evidentemente não tem a ver com o exercício do poder discricionário. Pelo que, o acto administrativo recorrido efectivamente confunde os requisitos legais com as condições do acto administrativo.
11. Assim, a recorrente entende que, o que o acto alega que a ocorrência da condição de rescisão causou à recorrente a cessação da isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens e o pagamento do imposto de MOP15.127, deve pertencer à “revogação” prevista no art.º 127.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, segundo a qualificação direito.
(iii) Ultrapassagem do prazo de revogação do acto administrativo
12. Sem prejuízo do fundamento indicado no seguinte ponto (iv), a recorrente supõe que o acto de concessão da isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens padece do vício de anulabilidade e que se permite à autoridade administrativa proceder à revogação por sua iniciativa, tal acto de revogação, evidentemente já ultrapassa o prazo previsto na lei.
13. Pelo que, só se pode revogar “os actos administrativos anuláveis” quando esteja “dentro do prazo do respectivo recurso contencioso”.
14. Conjugando o artigo 25.º, n.º2 do Código do Processo Administrativo Contencioso com o art.º 130.º do Código do Procedimento Administrativo, podemos saber que o prazo máximo para a interposição de recurso é de 365 dias. Mas normalmente não se procede à notificação do acto administrativo ao Ministério Público, pelo que o prazo de 365 dias deve ser considerado a partir de a recorrente ser notificada.
15. No dia 6 de Agosto de 2012, a Direcção dos Serviços de Finanças, na Informação n.º3400/NIS/DOI/RFM/2012 autorizou o supracitado pedido, e no dia 8 de Agosto do mesmo ano, notificou o mandatário judicial da recorrente disso.
16. Pelo que, contado desde 9 de Agosto de 2012 até 2 de Abril de 2015 (dia em que se faz o acto de revogação), evidentemente o prazo já ultrapassa 365 dias.
17. Pelo que, não se pode proceder à revogação do acto da isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens concedida na Informação n.º3400/NIS/DOI/RFM/2012, sob pena de violação do disposto no art.º 130.º do Código do Procedimento Administrativo.
18. Por conseguinte, no prazo de 365 dias, caso a autoridade administrativa não proceda à revogação, o acto revogado tornou-se como acto válido e legal.
19. Pelo que, deve a recorrente gozar continuadamente a isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens concedida na Informação 3400/NIS/DOI/RFM/2012, sem necessitar de pagar o imposto de MOP15.127,00.
(iv) Não se pode revogar a isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens concedida na Informação 3400/NIS/DOI/RFM/2012 por se tratar do acto administrativo previsto no art.º 129.º, n.º1, al. b) do Código do Procedimento Administrativo
20. Além disso, a recorrente também entende que, segundo o disposto no art.º 129.º, n.º1, al. b) do Código do Procedimento Administrativo, o acto administrativo ora recorrido não pode revogar a isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens concedida na supracitada Informação.
21. Nos termos do art.º 129.º, n.º1 do Código do Procedimento Administrativo, em princípio, os actos administrativos que sejam válidos são livremente revogáveis, mas quando forem constitutivos de direito, a revogação é proibida por lei, quanto ao seu fundamento, pode-se verificar o disposto na al. b) do mesmo artigo.
22. In casu, evidentemente é um acto constitutivo de direito, praticado pelos Serviços de Finanças na Informação 3400/NIS/DOI/RFM/2012 que autorizou o pedido da isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens formulado pela recorrente.
23. Dado que a Direcção dos Serviços de Finanças constituiu à recorrente o direito da isenção de imposto do selo sobre transmissão do seu bem sito na Avenida de XX, n.ºXX, Edifício XX, XXº andar XX, do qual detém 1/2 do direito de propriedade.
24. Pelo que, o acto recorrido não pode revogar a isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens concedida na Informação n.º3400/NIS/DOI/RFM/2012, de 6 de Agosto de 2012, sob pena de violação do disposto no art.º 129.º, n.º1, al. b) do Código do Procedimento Administrativo.
Face ao acima exposto, pede-se aos meritíssimos juízes que julguem procedente o recurso, anulando o despacho proferido no dia 29 de Julho de 2015 pelo Exm.º Senhor Secretário para a Economia e Finanças, por padecer do vício de anulabilidade previsto no art.º 124.º do Código do Procedimento Administrativo;
Ou, julguem que o acto de revogação já ultrapassou o prazo de revogação; além disso, dado que o acto administrativo anterior pertence ao acto previsto no art.º 129.º, n.º1, al. b) do Código do Procedimento Administrativo, não podendo ser revogado.
Por fim, requer-se a V. Ex.as que seja citada a entidade recorrida, para, querendo, contestar, bem como sejam juntos aos presentes autos de recurso os respectivos processos administrativos, independentemente de contestação ou não.
    B, Exmo Secretário Secretário para a Economia e Finanças, entidade recorrida nos autos à margem identificados, veio apresentar a sua CONTESTAÇÃO, dizendo, em síntese:
    I. O presente recurso vem interposto do acto que indeferiu o pedido da revogação da cessação da eficácia de isenção de imposto do selo até ao valor tributável de MOP3,000,000.00 sobre transmissão de um bem imóvel, sito na Avenida de XX, XX, Edf. XX, XX Andar “XX”, em Macau, com o n.º de matriz 7XXX0-05-XX e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º XXX01, proferido pelo Despacho do Sr. Secretário para a Economia e Finanças de 29.07.2015, exarado na proposta n.º 1308/NIS/DOI/RFM/2015 de 14.07.2015.
    II. A Recorrente alega que o art. 13°, n.º 2 da Lei OR/2012 só exige que o requerente, na data da apresentação do pedido de isenção, não seja proprietário de qualquer imóvel na RAEM e tal medida visa meramente conceder o beneficiário fiscal ao requerente da aquisição da primeira vez da habitação própria, e não visa condicionar o poder do requerente para comprar posteriormente os bens imóveis, dentro do mesmo prazo, invocando o acto praticado pela Entidade Recorrida padecer o vício de erro da interpretação da norma referida.
    III. A Entidade Recorrida não concordando com os entendimentos da Recorrente, considera que a interpretação do art. 13°, n.º 2 da Lei OR/2012 não deveria atender exclusivamente à letra da lei, mas tendo em conta a vontade real do legislador constante do relatório do diploma ou dos próprios trabalhos preparatórios da lei, a medida de isenção prevista na norma referida não se trata de uma isenção pura mas de uma isenção condicional uma vez que a eficácia do acto impeditivo se encontra subordinada à realização de um facto acessório que é uma conditio iuris.
    IV. Caso entendesse como a Recorrente, ao preencher todos pressupostos na data da apresentação do requerimento, obteria definitivamente a isenção e poderia adquirir o imóvel quando quisesse e de tal maneira aumentaria a procura dos bens imóveis, dispararia o preço e aumentaria o encargo da aquisição da primeira habitação própria das camadas mais desfavorecidas da população, alargando ainda mais o fosso entre ricos c pobres, e só quem tem alta capacidade económica poderia obter o benefício fiscal. Tal entendimento desvia o objectivo de estabelecimento deste benefício fiscal - a redistribuição da riqueza entre os residentes, e tendencialmente proteger os interesses das camadas mais desfavorecidas da população.
    V. E, a Entidade Recorrida entende que a decisão da isenção é precária e não definitiva, só se tomando definitiva após a verificação do evento certo - não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel na RAEM, por este meio, todos os beneficiários adquirem a primeira e única habitação própria até ao fim do ano 2012, evitando disparar do preço dos imóveis, mantendo o equilibrio entre a oferta e a procura dos bens imóveis no mercado, realizando a finalidade da redistribuição da riqueza entre os residentes.
    VI. A hipótese alegada na petição do recurso pela Recorrente, o requerente adquiriu o bem imóvel no ano anterior, uma vez que não o transmite para o terceiro antes de 1 de Janeiro de 2012, o mesmo é sempre o proprietário do imóvel referido, não preenchendo os pressupostos da isenção pré-estabelecida no art. 13°, n.º 2 da Lei OR/2012.
    VII. A Administração Fiscal só pode conceder o beneficio fiscal a quem preencher cumulativamente os requisitos constantes no art. 13°, n.º 2 da Lei OR/2012, aqui exerce o poder vinculado, a Recorrente invoca que os elementos acessórios, ora clausúla acessória da condição resolutiva, só podem ser incluídos em acto de conteúdo indeterminado.
    VIII. Porém, no presente caso, a própria norma legal estabeleceu condição para a isenção, sujeitando-a à verificação do certo evento (não ser proprietário de qualquer imóvel na RAEM até ao fim de 2012), tais são condições impróprias-conditiones juris, respeitam a requisitos legais da prática do respectivo acto ou da operatividade dos seus efeitos.
    IX. As conditiones juris não são cláusulas acessórias ou facultativas do objecto do acto administrativo, portanto, a Entidade Recorrida não confunde o pressuposto legal e o acto administrativo condicionado, não padecendo o acto do vício de erro na qualificação jurídica.
    X. A DSF exerce a sua competência própria - a competência própria exclusiva do subalterno é excepcional, só existindo nos casos em que a lei expressamente a consagra, assim o recurso hierárquico pode levar o superior não apenas a anular ou revogar o acto recorrido, mas também a modifica-lo ou substitui-lo.
    XI. No casu subjudice, a eficácia do acto de isenção cessou automaticamente por se verificar a condição legal, e não foi revogado o acto por invalidade, a natureza da condição opera ipso jure, não dependendo de uma posterior declaração da administração, e na norma legal não está previsto o prazo limite para a verificação de tal condição.
    XII. O acto de isenção cessa automaticamente a sua eficácia por verificação da condição legal, o prazo legal para revogar o acto inválido, ora 365 dias a contar da data da notificação de isenção concedida, não se aplica ao caso.
    XIII. A isenção de imposto do selo concedido pelo despacho 06.08.2012 não estava definida em termos absolutos ou definitivos, mas sujeita à condição resolutiva da manutenção a eficácia do acto administrativo, este é incompatível com o carácter constitutivo de direito de um acto administrativo.
    XIV. A decisão de cessação da eficácia do acto da isenção proferida pela Entidade Recorrida que é a declaração de caducidade, c não é o acto de revogação, ambos são distintos, mesmo a Entidade Recorrida não tendo havido declaração, o acto em relação ao qual se verifique um motivo de caducidade deve considerar-se como tendo caducado.
    XV. Conclui mos que o acto praticado pela Entidade Recorrida - declaração de cessação da eficácia do acto de isenção por caducidade, não viola o art. 129°, n.º 1, a1.b) do CPA.
    XVI. Inexistindo os vícios discriminados pela Recorrente na decisão de indeferimento do pedido, não enferma o acto administrativo de vício conducente à sua anulação.
    Termos em que se requer a V. Exª que o presente recurso seja declarado improcedente sendo, consequentemente, mantido o despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças, de 29 de Julho de 2015, com as devidas consequências legais.
    O Digno Magistrado do MP oferece o douto parecer adiante transcrito.
    Foram colhidos os vistos legais.
*
  II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito.
*
    III - FACTOS
    Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:
    1. Em 23.07.2012, a Recorrente A elaborou o documento da aquisição da fracção supra referida, com a quota de propriedade de 50 %.
    2. Em 24.07.2012, a Recorrente A apresentou pedido de reconhecimento de isenção de imposto do selo sobre a transmissão da fracção autónoma correspondente ao XX Andar XX do Edf. XX, n° XX à Direcção dos Serviços de Finanças.
    3. O pedido de isenção de imposto do selo sobre a transmissão do bem imóvel foi autorizado por despacho de 06.08.2012 do Senhor Subdirector dos Serviços, que ex arado na informação n.º 3400/NIS/DOI/RFM/12 (competência delegada pelo Despacho n.º 002/DIR/2012).
    4. A Recorrente, em 08.08.2012, foi notificada por oficio n° 3560/NIS/DOI/RFM/2012 da decisão da autorização de isenção de imposto do selo sobre a fracção referida.
    5. Em 09.08.2012 a Recorrente entregou a declaração M/1 2012/08/01534817 relativa à referida transmissão.
    6. Em 06.09.2012, a Recorrente apresentou a declaração Mil 2012/08/016857/3 relativa à aquisição da fracção autónoma sitada na Avenida de XX, XX, Edf. XX, XX Andar "XX", em Macau, com o n.º de matriz 7XX20-05-XX e descrito na Conservatória do Registo Predial sob n.º XXX01, o documento da aquisição foi elaborado em 31.08.2012.
    7. Por despacho de 02.04.2015 da Senhora Directora dos Serviços de Finanças, exarado na proposta n° 350/NIS/DOI/RFM/2015, de 19.03.2015, foi proferido despacho denominado de anulação da isenção atribuída.
    8. E liquidado o imposto devido de MOP15,127.00.
    9. Por se constatar não se encontrarem reunidas as condições previstas no n.º 2 do art. 13° da Lei OR/2012.
    10. O despacho recorrido fundamentou-se no facto da Recorrente, posteriormente à aquisição imóvel para habitação para a qual beneficiou de isenção de imposto do selo e no mesmo ano ter adquirido mais um bem imóvel, verificando-se não se encontrarem preenchidos, com esse facto, os requisitos previstos no art. 13°, n.º 2 da Lei OR/2012, em conformidade com a informação n.º 35/GS-SEF/2011, pela qual, tendo em atenção ao requisito "não seja proprietário no ano de ( ... ) de qualquer imóvel" dever a Administração verificar se os interessados preenchem os requisitos da isenção do imposto do selo posteriormente ao facto sujeito a tributação uma vez que a Administração só pode ter a certeza da verificação daqueles requisitos no ano seguinte.
    11. Em 28.04.2015, a Recorrente foi notificada por oficio n° 825/NIS/DOI/RFM/2015, de 24.04.2015 da decisão denominada de anulação de isenção de imposto do selo e da liquidação efectuada.
    12. Inconformada com aquela decisão, veio a Recorrente apresentar em 07.05.2015 a reclamação à Direcção dos Serviços de Finanças, a qual foi indeferida pelo despacho da Senhora Directora da DSF, de 28.05.2015.
    13. Em 08.06.2015, a Recorrente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação.
    14. A mesma apresentou em 18.06.2015 o requerimento do recurso hierárquico necessário ao Senhor Secretário para a Economia e Finanças, o qual foi indeferido pelo despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças, de 29.07.2015, (o ora despacho recorrido), cuja decisão foi notificada em 06.08.2015 à Recorrente, mediante o Oficio n.º 2287/NIS/DOI/RFM/2015, datado de 03.08.2015.
15. Consta do PA, relativamente ao recurso hierárquico subsequente à decisão sobre a reclamação do despacho denominado de anulação da isenção do imposto de selo relativamente à transmissão do prédio o seguinte expediente:
“Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Direcção dos Serviços de Finanças
Parecer:
Exmo. Sr. Secretário para a Economia e Finanças,
  Concordo com a proposta. Pede-se que seja rejeitado o recurso hierárquico necessário interposto pela impugnante sobre a matéria referida, porque possuía mais de um imóvel dentro do ano em que foi isenta.
  À consideração superior.
Director
Ass. vide o original
C
16/07/2015
Despacho:
À/Ao NIS
Para accionamento.
30/07/2015
Ass. vide o original

Concordo.
É rejeitado o recurso hierárquico.

Ass. vide o original
XX
29/07/2015

Assunto: Recurso hierárquico sobre a anulação de isenção do imposto do selo sobre transmissões de bens
Declaração M/1 n.º 2015/08/800102/2
Recorrente: A
Proposta n.º 1308/NIS/DOI/RFM/2015
Data: 14/07/2015
Quanto à matéria referida, é formulado o seguinte relatório:
Factos
1. Como se descobriu que a beneficiária foi isenta em 2012 de pagamento do imposto do selo no valor até $3,000,000 pela compra de unidade habitacional e, em seguida, comprou dentro do mesmo ano um outro imóvel, ou seja, foi proprietária dum outro imóvel no mesmo ano, não é preenchida a condição prevista no art.º 13.º n.º 2 da Lei n.º 12/2011. Pelo que, por despacho de 02/04/2015 da Directora proferido na proposta n.º 350/NIS/DOI/RFM/2015, cumpre liquidar de novo o imposto do selo não pago do qual A foi isenta. A notificação foi enviada em 24/04/2015, processada pelos correios em 27/04/2015.
2. Em 07/05/2015, A reclamou da matéria referida, a nossa Directora proferiu despacho em 28/05/2015 sobre a proposta n.º 784/NIS/DOI/RFM/2015 e rejeitou a reclamação. A respectiva notificação foi enviada em 03/06/2015, processada pelos correios em 05/06/2015. A reclamação de actos insusceptíveis de recurso contencioso suspende o prazo de interposição do recurso hierárquico necessário, pelo que, podia-se interpor recurso hierárquico necessário até 06/07/2015.
3. Em 18/06/2015, A interpôs recurso hierárquico necessário sobre a matéria referida ao Secretário para a Economia e Finanças, com fundamentos em:
●Na notificação da nossa Direcção sobre a rejeição da reclamação, falta o teor previsto no art.º 70.º alíneas c) e d) do Código de Procedimento Administrativo, portanto, a decisão de rejeição da reclamação padece do vício de nulidade previsto no art.º 122.º n.º 2 alínea d) do mesmo Código;
●Já passou o prazo para a nossa Direcção de revogar “acto administrativo anulável” (art.º 130.º do Código de Procedimento Administrativo);
●Os actos administrativos não são livremente revogáveis quando forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos; só são revogáveis na parte em que sejam desfavoráveis aos interesses dos seus destinatários ou quando todos os interessados dêem a sua concordância à revogação do acto. (art.º 129.º do Código de Procedimento Administrativo);
●A nossa Direcção interpretou erradamente o art.º 13.º n.º 2 da Lei n.º 12/2011;
●Deste modo, A entende que é anulável o acto administrativo proferido na proposta n.º 350/NIS/DOI/RFM/2015 de 02/04/2015.
Análise
4. Os actos administrativos produzem efeitos jurídicos desde que a entidade competente toma decisão, a formulação de “notificação” faz com que os actos administrativos produzam efeitos externos, o eventual vício do teor da “notificação” pode conduzir a não produção de efeitos externos do acto administrativo, não obstante a validade daquilo próprio (normalmente, se o teor da “notificação” padecer de vício, basta enviar de novo uma notificação que esteja conforme à lei).
5. O art.º 122.º do Código de Procedimento Administrativo só dispõe que, o acto administrativo é nulo quando aquilo (decisão administrativa) próprio padecer de vício previsto neste artigo. No caso, a decisão própria de rejeição da reclamação não padece de qualquer vício, pelo que não há circunstância indicada neste artigo.
6. A declarou que, na notificação de rejeição da reclamação, não foram justificados o órgão a que compete apreciar a impugnação desse acto, o prazo para deduzir impugnação e se podia interpor recurso contencioso sobre o acto, assim, foi prejudicado o seu direito de recurso para lei. Cumpre dizer que, a decisão da Directora sobre a reclamação consiste em manter a decisão proferida na proposta n.º 350/NIS/DOI/RFM/2015 de 02/04/2015, é um acto confirmativo, não há novo efeito jurídico, além disso, no ofício n.º 825/NIS/DOI/RFM/2015 enviado em 24/04/2015 pela nossa Direcção a A, foi indicado expressamente que “quanto ao acto referido, a requerente pode deduzir reclamação à Directora dentro de 15 dias contados da recepção da presente notificação (ao abrigo do art.º 145.º n.º 2 alínea a) do Código de Procedimento Administrativo) …… e/ou ao abrigo do art.º 155.º do Código de Procedimento Administrativo e do art.º 6.º alínea a) da Lei n.º 15/96/M, interpor recurso hierárquico necessário ao Secretário para a Economia e Finanças. …… Se a requerente não concordar com a decisão do Secretário para a Economia e Finanças, sendo ele que profere a decisão final sobre o respectivo caso, a requerente pode interpor recurso contencioso ao TSI dentro de 2 meses contados da recepção da notificação de decisão final (formulada ao abrigo do art.º 2.º n.º 3 do Decreto-Lei n.º 16/84/M de 24 de Março) ao abrigo do art.º 7.º da Lei n.º 15/96/M.”
7. Daqui se vê que, na 1ª notificação a nossa Direcção já informou a contribuinte dos meios ulteriores e prazos de impugnação e recurso contencioso, por causa disso, A sabia interpor recurso hierárquico necessário dentro do prazo legal após receber a notificação de rejeição da reclamação. Permite-se saber que, A já conheceu da 1ª notificação os meios de impugnação administrativa e recurso contencioso.
8. Outrossim, a impugnante A conseguiu interpor recurso hierárquico necessário dentro do prazo legal e a entidade competente admitiu esse recurso hierárquico, nesta fase não sofre qualquer prejuízo o seu direito de recurso para lei.
9. Ao abrigo do art.º 13.º n.º 2 da Lei n.º 12/2011 (Lei do Orçamento de 2012), são condições cumulativas da concessão da isenção que o adquirente seja:
●Pessoa singular;
●Maior de idade;
●Residente permanente da Região Administrativa Especial de Macau;
●E que não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel na Região Administrativa Especial de Macau, independentemente da utilização dada ao mesmo, de acordo com os fins previstos no artigo 1.º da Lei n.º 6/99/M, de 17 de Dezembro.
10. Pelo que, consiste em um dos requisitos de determinar se a impugnante gozava da qualidade isentiva que não fosse proprietária no ano de 2012 de qualquer imóvel. O ano de 2012 conta-se globalmente, isto é, tinha de ser preenchida essa condição no ano de 2012, basta conduzir à insatisfação da condição prevista no artigo referido a detenção, em qualquer momento de 2012, de imóvel alheio do objecto que usou para pedir isenção.
11. De acordo com o fundamento (III) no relatório n.º 35/GS-SEF/2011, a administração fiscal não podia confirmar se a contribuinte não foi proprietária de outro imóvel até 31 de Dezembro, isto é, a administração fiscal não podia confirmar previamente que, do dia de pedido de apreciação ao fim do ano, a contribuinte não comprar-se-ia outro imóvel, portanto, a apreciação do pedido de isenção do respectivo ano só poderia ser concluída no ano seguinte, ou seja, a administração fiscal fez apreciação “posterior” depois da ocorrência do facto sobre o qual incidiu o imposto, de forma a reconhecer que estava satisfeita a condição legal de isenção.
12. Daqui se vê que, a isenção concedida em 2012 pela nossa Direcção a A foi materialmente um acto administrativo sujeito à condição de resolução (art.º 111.º do Código de Procedimento Administrativo). A condição de resolução significa que as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a resolução dos efeitos do negócio jurídico (art.º 263.º do Código Civil). Quanto ao negócio jurídico de isenção acima descrito, a sua resolução condiciona-se por “insatisfação da condição prevista no art.º 13.º n.º 2 da Lei n.º 12/2011 (Lei do Orçamento de 2012) ”, a satisfação dessa condição provoca a resolução dos efeitos do acto administrativo de “isenção do imposto do selo no valor até $3,000,000”.
13. Tomando como referência a análise feita pelo nosso Núcleo de Apoio Jurídico sobre recurso hierárquico necessário dos casos anteriores do mesmo tipo (proposta n.º 129/NAJ/NA/15), foi indicado que “o acto de isenção proferido pela administração fiscal nos termos do art.º 13.º da Lei n.º 12/2011 é provisório, instável e vinculado pelas condições de resolução, só é consolidado quando ocorra o facto confirmativo – isto é, o requerente não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel na Região Administrativa Especial de Macau, mas o recorrente tornou-se em proprietário dum outro imóvel após concedida a isenção, o que podia resultar em que cessaram automaticamente os efeitos de isenção e recaiu sobre o beneficiário o dever de pagar o devido imposto.”
14. Após isenta de pagamento do imposto do selo no valor até $3,000,000 pela compra de unidade habitacional (Avenida de XX, n.º XX, Edf. XX, XXº andar, apartamento XX), em 31 de Agosto do mesmo ano, A comprou um outro imóvel (Avenida de XX, n.º XX, Edf. XX, XXº andar, apartamento XX), assim sendo, extinguiram-se os efeitos do acto de isenção em vista de preenchimento da condição de resolução. Pelo que, A é obrigada a pagar o imposto do selo não pago do qual foi isenta, no valor de $15,127.
Proposta
15. Pelo exposto, propõe-se que seja submeta a presente proposta ao Secretário para a Economia e Finanças para rejeitar o recurso hierárquico necessário.
À consideração superior.
Chefe da Repartição de Finanças de Macau
Ass. vide o original
D”
*
    IV - FUNDAMENTAÇÃO
    O Mmº Relator apresentou o projecto do acórdão no sentido de julgar improcedente o presente recurso contencioso, com fundamentos seguintes:
    “1. A questão que se coloca fundamentalmente é a de saber se deve ser anulado o acto de isenção de transmissão de um imóvel ocorrida em 2012, tendo a interessada ora recorrente, nesse mesmo ano, adquirido um outro imóvel, o que levou à revogação do acto que isentara a primeira transmissão.
    2. Somos a louvar-nos no douto parecer apresentado pelo Digno Magistrado do MP que, pela sua assertividade, somos a transcrever:
“Objecto do presente recurso contencioso é o despacho de 29 de Julho de 2015, da autoria do Exm.º Secretário para a Economia e Finanças, que rejeitou o recurso hierárquico que A, ora recorrente, interpusera de acto de anulação de benefício fiscal.
    A recorrente entende que o acto recorrido padece dos vícios de violação de lei traduzidos na errada interpretação do artigo 13.°, n.º 2, da Lei 12/2011, e na revogação ilegal do acto que lhe autorizara o benefício fiscal, quer se considere este válido ou inválido, no que é contraditada pela autoridade recorrida, cuja contestação se pronuncia pela legalidade do acto e pela sequente improcedência do recurso.
    Analisemos os invocados vícios.
    Está em causa um acto impositivo do pagamento de imposto de selo pela transmissão onerosa de um imóvel destinado a habitação, como consequência de haver sido dada sem efeito isenção que fora concedida ao abrigo do artigo 13.° da Lei 12/2011.
    Diz a recorrente que, quando lhe foi concedida a autorização para beneficiar da isenção, por ocasião da compra, em 2012, de metade da fracção do XX.° andar XX, do Edifício XX, não era proprietária de qualquer outro imóvel, na Região Administrativa Especial de Macau, o que satisfaz a inerente exigência constante do n.° 2 daquele artigo 13.°. O facto de posteriormente, no mesmo ano, ter adquirido outra fracção de imóvel, em Macau, não põe em causa a verificação daquele requisito, pois, a seu ver, a exigência do aludido artigo 13.°, n.º 2, quanto à qualidade de não proprietário, só se reporta à primeira aquisição no ano visado. No seu entendimento, posteriores aquisições de imóveis, ainda que ocorridas no mesmo ano, em nada beliscam a manutenção do benefício fiscal concedido na primeira aquisição. Daí que a recorrente sustente que o acto incorreu em erro de interpretação do artigo 13.º, n.° 2, da Lei 12/2011.
    Afigura-se que a letra do normativo em questão, posto que, na versão portuguesa, não prime por uma redacção muito feliz, não favorece a tese da recorrente. A norma exige que o adquirente não seja proprietário de qualquer [outro] imóvel no ano de 2012, isto é, durante o ano económico em que vai vigorar o orçamento. E a discussão gerada na Assembleia Legislativa, a propósito de idêntica norma, por ocasião da aprovação da Lei do Orçamento para 2008, de que dá conta o parecer n.º 5/III/2007, da Assembleia Legislativa, também aponta no mesmo sentido, ou seja, de que apenas poderá beneficiar da isenção o adquirente de imóvel se, durante o ano considerado, for apenas proprietário desse adquirido imóvel para que requer o benefício.
    Portanto, não se afigura que proceda o invocado vício de violação do artigo 13º, n.º 2, da Lei 12/2011.
    Adentro deste entendimento, importa ter presente que, se a lei impõe como condição da concessão do benefício, para aquisições de imóveis efectuadas em 2012, que os adquirentes não sejam proprietários de outros imóveis durante esse mesmo ano, isto acarreta que, na prática, por decorrência da própria norma legal, o benefício autorizado vai ficar sujeito a uma condição resolutiva, que opera com a aquisição de qualquer outro imóvel durante esse ano, tal como sustenta a entidade recorrida. Pois bem, se a recorrente, após ter visto deferido o pedido de benefício fiscal, com a inerente dispensa de pagamento de imposto de selo, por aquisição onerosa de imóvel em 2012, vem a adquirir um outro imóvel durante o mesmo ano de 2012, incorre em situação que a exclui do direito, por força daquela condição. A consequência lógica a extrair pela Administração será, a nosso ver, a da revogação do acto que autorizou a dispensa do pagamento do imposto de selo, para possibilitar a respectiva cobrança, desde que essa revogação se apresente consentânea com os parâmetros legais que devam ser atendidos. E entramos aqui na abordagem dos restantes vícios imputados ao acto.
    Na verdade, o acto recorrido é, pela sua estatuição e pelos seus efeitos, um acto revogatório do acto de autorização de isenção do imposto de selo, a tanto não obstando a circunstância de, em certo passo do procedimento, haver sido apodado de anulação do acto de isenção de imposto. Também a recorrente sustenta que se está perante um acto revogatório.
    Todavia, para apurar da sua validade ou invalidade, é preciso determinar primeiro se o acto revogado - isto é, o acto que autorizou a dispensa do pagamento do imposto - é válido ou inválido, pois o regime de revogabilidade difere, conforme os casos. Para a revogabilidade de actos válidos rege o artigo 129.° do Código do Procedimento Administrativo; tratando-se de revogar actos inválidos, rectius, actos anuláveis, é observável o regime do artigo 130.° do Código do Procedimento Administrativo.
    A recorrente aborda as duas hipóteses e conclui que, em qualquer delas, o acto revogatório é inválido. No caso do artigo 129.° referido, assevera que a revogação estava proibida porque o acto revogado, que a isentou do pagamento do imposto, fora constitutivo de direitos; para a hipótese do artigo 130.°, argumenta que, por ocasião do acto revogatório, já havia transcorrido o prazo em que era permitida a revogação.
    Não sufragamos tal entendimento.
    A nosso ver, o acto de isenção é um acto válido. No momento em que foi proferido, a beneficiária reunia todos os requisitos de que dependia a isenção. É claro que, por força da própria lei, no sentido que supra expusemos, o benefício só se consolidava em definitivo se, no transcurso do ano de 2012, nenhuma outra propriedade imóvel fosse adquirida pela recorrente. Trata-se da tal condição resolutiva de que fala a autoridade recorrida. Com a ocorrência de ulterior aquisição de imóvel, durante o ano de 2012, o direito ao benefício não chegou a consolidar-se, em definitivo, na esfera jurídica da recorrente, tendo mesmo cessado com a aquisição do segundo imóvel. O que quer dizer que estamos perante um acto válido, que permitiu a exercitação de um direito latente que veio a extinguir-se com a verificação da causa resolutiva. Ou seja, o acto é válido, mas, em bom rigor, não é constitutivo de direitos.
    E sendo assim, como cremos, tal acto era livremente revogável, nos termos do artigo 129.° do Código do Procedimento Administrativo.
    Donde a improcedência dos vícios de violação de lei por ilegalidade da revogação.
    Ante o exposto, e salvo melhor juízo, o recurso não merece provimento.”
    3. Não obstante, os argumentos invocados pela recorrente, estejam já refutados na posição acima transcrita não nos eximiremos a mais algumas observações complementadoras da argumentação expendida.
    Contrariamente ao sustentado pela recorrente, a interpretação que se nos afigura mais razoável do n.º 2 do art. 13º da Lei n.º 1272011, e a que se visou isentar a transmissão de uma habitação, desde que nesse ano de 2012 o interessado tenha adquirido apena uma habitação. Se adquirir duas ou mais, deixaria de haver lugar à habitação.
    Há que procurar a interpretação mais consentânea com a ratio legis, tal como decorre do art. 8.º, n.º 1 do CC.
    O pensamento legislativo inerente a esta norma, não está, em primeira linha, como poderia parecer, num benefício a uma primeira aquisição de habitação, ainda que indirectamente tal medida não deixe de se traduzir nesse incentivo. De outro modo, o legislador não deixaria de ter posto a tónica na isenção da primeira habitação.
    O benefício, tal como consagrado, traduz uma preocupação em moderar a especulação, favorecendo o acesso ao mercado habitacional de quem tenha menores rendimentos, o que se evidencia pelo limite do valor dos prédios sujeitos a isenção, pela limitação uma unidade adquirida durante o ano da execução orçamental em curso e por ser indistinto o fim da aquisição, como decorre do art. 13º da Lei 12/2011:
“1. No ano de 2012, os documentos, papéis e actos que sejam fonte, para efeitos fiscais, de transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação, referidos no artigo 42 da Tabela Geral do Imposto do Selo, aprovada pela Lei n.º 17/88/M, de 27 de Junho, com a redacção que lhe foi introduzida pelas Leis n.os 4/2009 e 4/2011, estão isentos do imposto do selo até ao valor de $ 3 000 000,00 (três milhões de patacas).
2. São condições cumulativas da concessão da isenção que o adquirente seja pessoa singular, maior de idade, residente permanente da Região Administrativa Especial de Macau e que não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel na Região Administrativa Especial de Macau, independentemente da utilização dada ao mesmo, de acordo com os fins previstos no artigo 1.º da Lei n.º 6/99/M, de 17 de Dezembro, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3. Se o adquirente for proprietário de um imóvel cuja finalidade seja a prevista na alínea g) do n.º 1 do artigo 1.º da lei referida no número anterior e satisfaça as demais condições constantes no número anterior pode beneficiar da isenção mencionada no n.º 1.
4. Para efeitos do disposto no n.º 2, considera-se proprietário a pessoa singular que tenha adquirido bens imóveis a título oneroso ou gratuito por qualquer um dos documentos considerados como fonte de transmissão para efeitos fiscais, de acordo com os números 2 e 3 do artigo 51.º do Regulamento do Imposto do Selo, independentemente do registo de aquisição na Conservatória do Registo Predial.
5. Quando o valor do bem adquirido exceda o montante referido no n.º 1, mas se encontrem verificadas as demais condições da concessão da isenção, é o remanescente tributado de acordo com as regras gerais do Regulamento do Imposto do Selo.”
    A comparação com o art. 14º da Lei 7/2007 colocada pela recorrente não evidencia claramente qualquer diferença de critérios e objectivos prosseguidos pelo legislador nas diferentes conjunturas temporais e as referências ao relatório das acções governativas do ano de 2008 não são de molde a infirmar a interpretação acolhida pela entidade recorrida.
    Quem sai beneficiado são as camadas mais desfavorecidas, quem tem menos posses, pelo que se compreende que quem tem meios para adquirir em determinado ano fiscal duas ou mais habitações já não deve merecer a isenção fiscal. Por que razão havia de merecer a isenção fiscal quem tem meios e fortuna para comprar duas casas? É a mesma racionalidade que leva a considerar a isenção até um certo limite; acime dele, mesmo tratando-se de uma única habitação, há lugar ao imposto.
    4. Posto isto, vejamos agora da possibilidade de revogação do acto.
    A questão, mais uma vez, está devidamente equacionada no parecer acima transcrito e entendemos igualmente que a concessão da isenção do imposto – tendo o imposto de ser pago num prazo após a transacção – tem ou pode ser de ser declarada sem que o ano fiscal de 2011 termine, mas fica sujeita à condição resolutiva se sobrevier pelo interessado a aquisição de uma segunda habitação.
    Ora foi exactamente isso que aconteceu.
    Quanto à impossibilidade de revogação de um acto válido constitutivo de direitos, como decorre do art. 129º do CPA, essa impossibilidade não se verifica na exacta medida em que a ocorrência de um facto posterior resolutivo operou o desaparecimento dos efeitos produzidos sub conditione e assim do direito à isenção, tal como fora declarado pela Administração fiscal, na certeza de que os efeitos do preenchimento da condição se retrotrem à data da conclusão do negócio, como estabelece o art. 269º do CC, “ex vi” art.288. º.
    Tal como se assinala, não é o nomen júris dado pela parte que caracteriza o acto, mas antes é o seu conteúdo que define a sua natureza. Pelo que, como bem se assinalou, não estamos perante um acto de anulação de uma isenção, antes perente um acto revogatório de uma declaração de isenção que não se firmou na ordem jurídica e não foi constitutivo de direitos, face à sobrevinda condição resolutiva, não havendo aí a apontada limitação temporal à sua prolação.
    Nestes termos, pelas razões invocadas e acolhidas por este Tribunal, o recurso não deixará de improceder.”
Após a devida discussão e aprovação na conferência, o Mmº Relator ficou vencido pelo que passa o 1º Adjunto a elaborar o acórdão nos termos do nº 3 do artº 631º do CPCM, o que faz nos seguintes termos:
Salvo o devido respeito, entendemos que o nº 2 do artº 13º da Lei nº 12/2011 não prevê qualquer condição legal resolutiva da isenção concedida, antes pelo contrário, prevê simplesmente os requisitos para a concessão da isenção do imposto em causa.
O nº 2 do artº 13º da Lei nº 12/2011 tem a seguinte redacção:
    “2. São condições cumulativas da concessão da isenção que o adquirente seja pessoa singular, maior de idade, residente permanente da Região Administrativa Especial de Macau e que não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel na Região Administrativa Especial de Macau, independentemente da utilização dada ao mesmo, de acordo com os fins previstos no artigo 1.º da Lei n.º 6/99/M, de 17 de Dezembro, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”
Portanto, para que seja concedida a isenção do imposto, é necessário reunir cumulativamente os seguintes requisitos:
1. Ser pessoa singular;
2. Ser maior de idade;
3. Ser residente permanente da RAEM; e
4. Não possuir qualquer imóvel na RAEM no ano de 2012.
Sendo requisitos (a lei chama-lhes “condições”) da concessão da isenção, os mesmos têm de ser todos verificados no momento da concessão, que é o caso da Recorrente.
E uma vez concedida a isenção do imposto, o legislador apenas prevê uma situação em que o beneficiário tem de pagar o imposto isento, que é justamente a prevista no nº 6 do mesmo artº 13º da Lei nº 12/2011, a saber:
    “6. A transmissão dos imóveis, que não seja por motivo de sucessão hereditária, no período de 3 anos contados da data da concessão da isenção, determina a caducidade imediata da mesma, devendo o seu beneficiário, antes daquela ocorrer, proceder ao pagamento do imposto do selo que seria devido nos termos gerais.”
Não tendo o legislador da Lei nº 12/2011 previsto outras situações que permitem revogar uma isenção legalmente concedida, funciona então a regra geral da revogabilidade dos actos válidos prevista no artº 129º do CPAM, nos termos do qual os actos administrativos válidos que forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos, que é o caso, não são revogáveis, salvo quando todos os interessados dêem a sua concordância à revogação do acto e não se trate de direitos ou interesses indisponíveis, ou quando a revogação diz apenas à parte que seja desfavorável aos interesses dos seus destinatários.
A expressão “não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel” consagrada no nº 2 do artº 13º da Lei nº 12/2013 tem o sentido de impedir o beneficiário de gozar de uma segunda isenção em virtude de uma segunda aquisição no mesmo ano de 2012 e não o sentido de permitir a revogação da isenção legalmente concedida no momento posterior em consequência da modificação superveniente dos factos.
Por exemplo, se um indivíduo comprar em Junho de 2012 um imóvel e obtiver isenção do imposto, não poderá beneficiar outra vez dessa isenção na aquisição de outro imóvel em Novembro desse ano, porque nesse momento “já ele é proprietário no ano de 2012”. Da mesma maneira, se em Junho de 2012 adquirir um imóvel, não beneficiará da isenção do imposto se ele tinha anteriormente adquirido um outro imóvel, porque “já ele era proprietário no ano de 2012”. Quanto a lei diz “não seja proprietário no ano de 2012 de qualquer imóvel” quer reportar-se ao momento em que a isenção é concedida e não a momento posterior desse ano, caso em que o legislador haveria de dizer “que não venha a ser proprietário no ano de 2012 ”.
Essa intenção legislativa fica mais clarificada com a lei orçamental seguinte, pois o artº 13º da Lei nº 17/2013 (onde também se fala “Isenção de imposto do selo sobre transmissões de bens”) introduziu sob o nº 9 a disposição de que “O disposto no n.º 1 do presente artigo não se aplica no período de vigência deste Orçamento, aos sujeitos passivos que obtiveram o benefício fiscal desta natureza em anos anteriores”.
Como se vê, assiste razão à Recorrente quando diz que o artº 13º da Lei nº 12/2011 tem por finalidade a concessão aos residentes permanentes maiores da RAEM de benefício tributário para aquisição de habitação pela primeira vez na RAEM.
Em relação ao outro fundamento do recurso que imputa ao acto recorrido a violação do artº 130º do CPAM, cumpre-nos dizer que este fundamento é improcedente na medida em que, como já vimos na supra e tal como é reconhecido pelo Mº Pº, o acto que concedeu a isenção do imposto é um acto válido, pelo que não se aplica a regra da revogação do acto anulável prevista no artº 130º, mas sim a do artº 129º, todos do CPAM.
Tudo visto, resta decidir.
*
V - DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em julgar procedente o presente recurso contencioso, anulando o acto recorrido.
Sem Custas, por a entidade recorrida gozar da isenção subjectiva.
Notifique e D.N.
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Macau, 22 de Setembro de 2016
_________________________ _________________________
Ho Wai Neng Mai Man Ieng
_________________________ (Fui presente)
José Cândido de Pinho
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João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(vencido nos termos do meu projecto gentilmente transcrito pelo ora Relator)

796/2015 32