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 ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
A Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada, melhor identificada nos autos, requereu junto ao Tribunal de Segunda Instância o procedimento de suspensão de eficácia do acto do Senhor Chefe do Executivo da Região Administrativa Especial de Macau, de 26 de Janeiro de 2016, que declarou a caducidade da concessão por arrendamento do terreno situado na península de Macau, nos NATAP, designado por lote “P”.
Por Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância, foi indeferida a requerida suspensão de eficácia.
Inconformada com o Acórdão, a Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada recorreu para o Tribunal de Última Instância, que decidiu negar provimento ao recurso.
Vem agora a mesma sociedade apresentar reclamação, alegando que o Acórdão reclamando incorre em duas nulidades, previstas nas al.s c) e d) do n.º 1 do art.º 571.º do Código de Processo Civil.
Respondeu a entidade recorrida, entendendo que deve ser julgada improcedente a reclamação.
O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o douto parecer, pugnando pela improcedência da reclamação.
Foram corridos os vistos.
Cumpre decidir.

2. Fundamentação
As nulidades invocadas pela reclamante referem-se, respectivamente, à oposição entre os fundamentos e a decisão e à omissão de pronúncia.

2.1. Na tese da ora reclamante, ao concluir pela não verificação do alegado prejuízo de difícil reparação decorrente da execução da decisão administrativa impugnada, incorreu o Tribunal de Última Instância na oposição entre os fundamentos (de facto) do acórdão e a decisão adoptada, uma vez que o indeferimento da providência cautelar se encontra incompatível com os factos provados e com o racional da decisão que o próprio tribunal assumiu.
Ora, com “os factos provados” queria a reclamante referir concretamente a que o Lote P, que está em causa nos presentes autos, era o único terreno em desenvolvimento por sua parte aquando da declaração de caducidade da concessão do terreno.
Para a reclamante, tal facto resulta claramente da conjugação dos factos provados n.º 33 e n.º 37 (designadamente este), com o qual se dá “por reproduzido o teor do relatório de Somerley (doc. 10) ou do auditor (doc. 12) a respeito da situação financeira da requerente à data da declaração de caducidade”, enquanto o tribunal concluiu pelo contrário.
Desde logo, não podemos deixar de notar que, perante os mesmos factos provados, incluindo n.ºs 33 e 37, o Tribunal de Segunda Instância também não considerou provado que o Lote P era o único terreno em desenvolvimento por parte da reclamante, tendo consignado no seu acórdão o seguinte:
“E não nos parece, por outro lado, que a não suspensão irá necessariamente provocar a inactividade da requerente. Quer dizer, o facto de não ser decretada a suspensão de eficácia apenas impedirá a requerente de continuar esta obra em concreto nos tempos mais próximos, mas não a impedirá de prosseguir a sua actividade noutras obras e noutros empreendimentos em curso ou em projecto. Na realidade, o despacho em causa tem os seus efeitos … confinados ao terreno em causa e não implica a cessação da sua actividade construtiva e de comercialização imobiliária noutros terrenos – a si ou a outrem concessionados – em Macau ou noutras paragens mais ou menos próximas” (cfr. fls. 40 do acórdão). E finalmente, não foi dado como verificado o requisito previsto na al. a) do n.º 1 do art.º 121.º do CPAC.
E a reclamante (então requerente) não arguiu a nulidade do acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância decorrente da oposição entre os fundamentos e a decisão, ora invocada pela reclamante.
Posto isto, e sem mais delongas, afigura-se-nos não verificado o vício em causa.

2.2. Alega ainda a reclamante que foi omitida a devida pronúncia sobre a questão por si colocada na conclusão n.º 39 das suas alegações de recurso.
Nos termos da al. d) do n.º 1 do art.º 571.º do CPC, é nula a sentença “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Quanto às questões a resolver na sentença, dispõe o art.º 563.º do CPC o seguinte:
“Artigo 563.º
(Questões a resolver e ordem do julgamento)
1. Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 230.º, a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões que possam conduzir à absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica.
2. O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
3. O juiz ocupa-se apenas das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
Daí decorre que o juiz deve resolver todas as questões suscitadas pelas partes, devendo ocupar-se apenas dessas questões, salvo questões de conhecimento oficioso.
E só a omissão de pronúncia sobre questões, e não sobre os fundamentos ou razões deduzidas pelas partes, que o juiz tem a obrigação de conhecer determina a nulidade da sua sentença.
Ora, a conclusão n.º 39 das alegações de recurso apresentadas pela reclamante tem o seguinte teor:
“39. Certo é que o Tribunal a quo deu como reproduzidos e provados os docs. 10 e 12 juntos com o requerimento inicial (cfr. facto provado 37; cfr. artigo 245.º do requerimento inicial), assim como os factos provados 38, 40, 41, 42, 43 e 44, de que resulta que a não paralisação dos efeitos do acto suspendendo é de molde a atirar a Polytex para a falência, dada a incapacidade e indisponibilidade económica e financeira para solver os seus compromissos, em valor bastante superior ao dos seus activos.”
Tal como resulta nitidamente de tal conclusão, entende a reclamante que a não suspensão dos efeitos do acto administrativo em causa implica necessariamente a sua falência.
Não se trata, a nosso ver, duma questão propriamente dita.
A verdadeira questão colocada ao tribunal reside em saber se se verifica o requisito de prejuízo de difícil reparação, sobre a qual o tribunal não deixou de tomar decisão.
Mesmo entendendo que com a conclusão n.º 39 se suscita uma questão que mereça tratamento e pronúncia autónoma, certo é que, mesmo assim, não se pode falar na omissão de pronúncia, pois o tribunal chegou a emitir a sua pronúncia quanto à questão em causa, tendo concluído que “não se pode afirmar, como afirmou a recorrente, que caso não sejam suspensos os efeitos do acto suspendendo e não seja dada a oportunidade de concluir o aproveitamento contratualizado, ela só terá um destino que é a cessação da sua actividade e, posteriormente, a falência” (cfr. fls. 42 do acórdão reclamando).
Improcede a arguição de nulidade por omissão de pronúncia.

4. Decisão
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente a presente reclamação.
Custas pela reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 5 UC.

               Macau, 7 de Dezembro de 2016
               
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa



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Processo n.º 55/2016