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Processo nº 407/2015
(Recurso Contencioso ― Reclamação para a conferência)

Data: 2/Março/2017

Reclamante:
- A


Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:


I) RELATÓRIO
A, recorrente nos autos acima cotados, inconformada com o despacho do relator de 30 de Novembro de 2016, que indeferiu a realização da inquirição de testemunhas, vem pedir que seja a questão submetida à conferência, por entender em sentido contrário.
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Devidamente notificada, respondeu a entidade recorrida Sua Ex.ª o Chefe do Executivo, pugnando pela improcedência da reclamação.
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O Digno Magistrado do Ministério Público deu o seguinte douto parecer:
“Com muito elevado respeito pela tese eloquentemente explanada pela recorrente, não podemos deixar de opinar pela improcedência da sua Reclamação de fls. 611 a 630 dos autos, sendo a qual deduzida do douto despacho de fls. 607 a 608 dos autos.
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Antes de mais, acompanhamos a judiciosa posição do MMº Juiz Relator e os dois fundamentos, no sentido de surgir a caducidade preclusiva quando qualquer concessão provisória não se converter na definitiva ao prazo máximo de 25 anos e, de outro lado, de in casu precludir o seu direito de produção de prova.
Por outra banda, perfilhamos inteiramente a sensata jurisprudência que inculca (Acórdão do Venerando TSI no Processo n.º 261/2003): «Estando em causa a anulação de um acto praticado em dada conjuntura temporal, em regra, a apreciação do mesmo e aferição da sua legalidade têm de ser apreciadas à luz dessa conjuntura, a não ser que se lhe aponte um vício existente e observável àquela data, não se podendo impor um comportamento a partir de dados que a entidade administrativa não dispunha, por falta de fornecimento dos mesmos por parte do contribuinte.»
E acreditamos que tem plena aplicação ao caso sub iudice a douta orientação jurisprudencial fixada pelo Venerando TUI no Acórdão tirado no seu Processo n.º 39/2013, que assevera peremptoriamente: «Está vedado, ao que interpõe recurso contencioso de acto disciplinar punitivo, pedir a produção de meios de prova para provar factos ou fazer contraprova de factos da acusação ou da defesa, quando, tendo tido a oportunidade de o fazer no processo disciplinar, omitiu tal pretensão.»
De qualquer maneira, não nos resta margem para dúvida de que a nossa ordem jurídica se alicerça na axiologia de respeitar e prosseguir os valores fundamentais de direito, valores que alimentam nomeadamente os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, princípios que vêem contemplação nos arts. 6º e 103º da Lei Básica.
No nosso prisma, é igualmente certo que a Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras) e, designadamente, o seu art. 215º não atraiçoam os valores fundamentais subjacentes ao ordenamento jurídico de Macau, nem contendem com princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica, nem infringem disposições na Lei Básica.
Afigura-se-nos que em boa verdade, a inquirição de testemunhas é impertinente para a questão de saber se a Lei n.º 10/2013 está conforme ou não com qualquer disposição na Lei Básica, embora adiramos à prudente jurisprudência emanada no aresto decretado no Processo n.º 9/2006 pelo Venerando TUI, onde se lêem os seguintes sumários:
II – Na Ordem Jurídica da Região Administrativa Especial de Macau os tribunais podem conhecer da conformidade das leis com a Lei Básica no julgamento dos casos e, cumprindo o disposto no artigo 11º da mesma Lei, não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na Lei Básica ou os princípios nela consagrados, sem prejuízo do disposto no artigo 143º do referido diploma legal.
III – Na Ordem Jurídica de Macau, o conhecimento da conformidade das leis com a Lei Básica, no julgamento dos casos, faz-se de acordo com os meios processuais que couberem à situação, por não existir nenhum meio processual específico para fiscalização da conformidade das leis com a mesma Lei.
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Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência da Reclamação da recorrente.”
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Consta do despacho reclamado o seguinte:
“Por se verificar que, na pendência do presente recurso, já decorreu o prazo máximo da concessão previsto no próprio contrato de concessão, foram convidadas as partes para se pronunciarem sobre a eventual utilidade da realização da diligência de inquirição de testemunhas.
Aceitando o convite, sustentou a recorrente a utilidade das diligências probatórias requeridas, enquanto a entidade recorrida e o Ministério Público defenderam a desnecessidade de produção de prova testemunhal.
Sem embargos de melhor opinião, entendo eu não ser pertinente no âmbito dos presentes autos a produção de prova testemunhal, na medida em que tal como se expôs anteriormente, seguindo de perto o entendimento exarado recentemente em Acórdãos deste TSI (Proc. 179/2016/A e Proc. 1074/2015), a caducidade da concessão pelo decurso do prazo máximo é entendida como caducidade-preclusão, cuja declaração depende simplesmente do facto objectivo que é o passar do tempo, melhor dizendo, o decurso do prazo legal ou contratualmente estabelecido, e uma vez ultrapassado aquele limite, a caducidade opera-se automaticamente, e o despacho que vem declarar a sua caducidade não tem natureza constitutiva, mas apenas declarativa, ou seja, um acto não inovador.
Nesta medida, ainda que as razões invocadas pela recorrente sejam consideradas procedentes, crendo-se que a recorrente já não poderá proceder ao seu aproveitamento por qualquer forma, decorrido que seja o prazo máximo da concessão, pelo que, em nome da economia processual, com vista a evitar a prática de actos inúteis, julgo que é desnecessária a produção de prova testemunhal.
Por outro lado, como observa José Cândido de Pinho1, “não deve ser possível fazer no recuso contencioso a prova de factos a respeito dos quais o recorrente tenha podido fazer prova no procedimento administrativo, não obstante o poder inquisitivo da Administração. (…) Isto é, não pode ser feita no recurso contencioso a prova de factos – para efeito do vício de erro sobre os pressupostos de facto, v.g. – se o recorrente teve a possibilidade de em concreto a fazer no processo administrativo.”
No mesmo sentido, veja-se o decidido no Acórdão deste TSI, no Processo nº 402/2014.
E o acontece é que a recorrente, aquando da audiência prévia no âmbito do procedimento administrativo, embora não estivesse impedida de fazer prova da matéria de facto que entendesse necessária, não logrou indicar qualquer prova testemunhal para o efeito, daí que já não pode agora, em sede de recurso contencioso, pedir a realização da respectiva diligência probatória.
Face ao exposto, indefere-se a realização da inquirição de testemunhas solicitada pela recorrente.
Notifique.
Após, cumpra o disposto no artigo 68º do CPAC.”

Em nossa modesta opinião, julgamos que basta considerar o segundo fundamento para ver indeferida a presente reclamação.
De facto, apenas compete ao Tribunal sindicar a bondade da decisão da Administração que foi dada com base em elementos probatórios carreados no procedimento administrativo.
Tal como se referiu na decisão reclamada, podendo ser feita a produção de prova no procedimento mas não se fez, já não pode fazer no recurso contencioso.
E não se diga que não podia fazer durante o procedimento, considerando que aquando da audiência prévia, para além de poder pronunciar-se sobre as questões que constituem objecto do procedimento, podem os interessados requerer ainda diligências complementares e juntar documentos que entenderem (artigo 94º, nº 3 do CPA).
Destarte, julga-se improcedente a reclamação.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente a reclamação, confirmando a decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 4 U.C.
Notifique.
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RAEM, 2 de Março de 2017
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
           João A. G. Gil de Oliveira (não acompanho a douta posição que fez vencimento, pois venho entendendo nos processos em que sou relator que a produção de prova sobre a culpe do concessionário acautela eventual opção que se venha a tomar sobre as soluções plausíveis que se possam delinear sobre estes casos.)
1 José Cândido de Pinho, Manual de Formação de Direito Processual Administrativo Contencioso, CFJJ, 2015, pág. 125
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