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Processo nº 115/2017
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Em audiência colectiva no T.J.B. responderam:
(1ª) A,
(2a) B,
(3°) C,
(4a) D,
(5a) E,
(6°) F,
(7°) G, e,
(8a) H, todos com os sinais dos autos.

A final, o Tribunal decidiu:

–– condenar a (1ª) arguida A, como co-autora de 13 crimes de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão cada, 1 crime de “burla de valor consideravelmente elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., na pena de 2 anos e 3 meses de prisão, e 1 outro de “burla de valor consideravelmente elevado (na forma tentada)”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., na pena de 10 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 4 anos e 3 meses de prisão;

–– condenar a (2ª) arguida B, como co-autora de 3 crimes de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão cada, e 1 outro de “burla de valor consideravelmente elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., na pena de 2 anos e 3 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão;

–– condenar o (3°) arguido C, como co-autor de 2 crimes de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão cada, e 1 outro de “burla de valor consideravelmente elevado (na forma tentada)”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., na pena de 10 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 1 ano e 3 meses de prisão;

–– condenar a (4ª) arguida D, como co-autora de 2 crimes de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena de 7 meses de prisão cada, e 1 outro de “burla de valor consideravelmente elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., na pena de 8 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 1 ano de prisão;

–– condenar a (5ª) arguida E, como co-autora de 1 crime de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena de 7 meses de prisão, e 1 outro de “burla de valor consideravelmente elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., na pena de 8 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 10 meses de prisão;

–– condenar os (6° e 7°) arguidos F e G, como co-autores de 1 crime de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena individual de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos; e,

–– condenar a (8ª) arguida H, como co-autora de 3 crimes de “burla de valor elevado”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 3 do C.P.M., na pena de 7 meses de prisão cada.
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 1 ano de prisão.

No mesmo Acórdão decidiu ainda o Colectivo:

- condenar a (1ª) arguida A no pagamento de HKD$315.000,00 à assistente dos autos;
- condenar as (1ª e 2ª) arguidas A e B no pagamento solidário da quantia de HKD$360.000,00;
- condenar os (1ª e 6°) arguidos A e F no pagamento solidário da quantia de HKD$70.000,00;
- condenar os (1ª e 7°) arguidos A e G no pagamento solidário da quantia de HKD$90.000,00;
- condenar as (1ª e 8ª) arguidas A e H no pagamento solidário da quantia de HKD$170.000,00;
- condenar as (1ª, 2ª e 8ª) arguidas A, B e H no pagamento solidário da quantia de HKD$75.000,00;
- condenar os (1ª, 3° e 4ª) arguidos A, C e D no pagamento solidário da quantia de HKD$90.000,00; e,
- condenar os (1ª e 3° a 5ª) arguidos A, C, D e E no pagamento solidário da quantia de HKD$90.000,00; (cfr., fls. 1168 a 1200-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformados, os (2ª, 4ª a 6° e 8ª) arguidos B, D, E, F e H recorreram.

- A (2ª) arguida B, considera que “excessiva” é a pena que lhe foi aplicada e que devia ser suspensa na sua execução; (cfr., fls. 1224 a 1227-v).

- Os (4ª a 6° e 8ª) arguidos D, E, F e H, são de opinião que a decisão recorrida padece de erro na “decisão da matéria de facto”, (no caso, de “erro notório na apreciação da prova”), e “erro na decisão de direito”, (por se ter indevidamente considerado os recorrentes “co-autores” e por os ter condenado no “pagamento solidário da indemnização”); (cfr., fls. 1257 a 1282).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso da (2ª) arguida B merece provimento, pugnando pelo não provimento dos recursos dos (4ª a 6° e 8ª) arguidos, D, E, F e H; (cfr., fls. 1309 a 1318-v e 1319 a 1324-v).

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Neste T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“1. Do recurso da arguida B
Na Motivação de fls.1224 a 1227v. dos autos, a recorrente solicitou a atenuação especial e a suspensão da execução da pena, assacando, ao douto Acórdão sob sindicância, a violação do preceito n.°2 do art.400° do CPP em conjugação com as disposições no n.°2 do art.201° ex vi art.221° do Código Penal, bem como no art.48° deste mesmo Código.
Em relação a este recurso, sufragamos as criteriosas explanações do ilustre Colega na douta Resposta (cfr. fls.1309 a 1318 verso), no sentido do merecer provimento, em virtude do depósito voluntário da recorrente (doc. de fls.1048 dos autos), depósito que representa a vontade de reparação.
Com todo o respeito pela opinião diferente, a atenciosa leitura do douto aresto recorrido deixa-nos a impressão de o sobredito depósito não ver constante dos factos dados como provados e, nomeadamente, não se encontrar a devida valorização ao graduar a pena aplicada à recorrente.
O que significa que ao graduar a pena aplicada em dois anos e seis meses de prisão efectiva, o Tribunal a quo não demonstrou a observância ao preceituado nos arts.201° bem como 66° e 67° do Código Penal, daí se surge o erro de direito.
*
2. Do recurso dos arguidos D, E, F e H
Na Motivação de fls.1257 a 1282 dos autos, os quatro recorrentes assacaram sucessivamente o erro (notório) na apreciação de prova, não verificação dos pressupostos de co-autoria, e a infundada condenação dos recorrentes no pagamento solidário da quantia de MOP$1,297,800.00.
2.1- No caso sub iudice, é de acentuar que o Tribunal a quo fixou o número de crimes imputados a cada arguido, inclusive os sobreditos 4 recorrentes, em estrita e rigorosa conformidade com as vezes da conduta ilícita que cada arguido tinha praticado. Quer dizer que para qualquer arguido, cada crime tem por base uma conduta – havendo aqui, pois, uma exacta correspondência.
Esta correspondência demonstra que o douto raciocínio do Tribunal a quo consiste em entender que cada um dos ora recorrentes participou apenas nos benefícios obtidos com a sua intervenção nos crimes, não nos benefícios adquiridos nos crimes sem a sua intervenção.
De outro lado os 5°, 17°, 19°, 21°, 27°, 31°, 33°, 37°, 38°, 42° e 44° factos provados estribam-se respectivamente nas transcrições dos vídeos que gravaram as imagens, bem como nos de revistas e apreensões, sendo todos estes meios de prova especificamente indicados ao passo de cada facto provado, e constantes dos presentes autos.
Sabe-se que no que respeite ao «erro notório na apreciação de prova» previsto na c) do n.°2 do art.400° do CPP, é pacífica e consolidada, no actual ordenamento jurídico de Macau, a seguinte jurisprudência (a título meramente exemplificativo, vide. Acórdãos do Venerando TUI nos Processo n.°17/2000, n.°16/2003, n.°46/2008, n.°22/2009, n.°52/2010, n.°29/2013 e n.°4/2014):
O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, ou que se retirou de um tacto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta.
Convém ter presente a advertência do Venerando TUI no seu Processo n.°13/2001: O recorrente não pode utilizar o recurso para manifestar a sua discordância sobre a forma como o tribunal a quo ponderou a prova produzida, pondo em causa, deste modo, a livre convicção do julgador.
Por sua vez, o Alto TSI inculca (aresto no Proc. n.°470/2010): Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.
Em conformidade com todas as sensatas jurisprudências supra citadas, afigura-se-nos inquestionável que não se verifica o invocado «erro notório na apreciação de prova», Com efeito, tal arguição dos recorrentes resulta, em boa verdade, da excessiva e sofisticada interpretação por eles dos factos provados no que respeitem à distribuição dos benefícios.
2.2- Antes de mais, sufragamos a brilhante jurisprudência que nos inculca: São requisitos essenciais para que ocorra “comparticipação criminosa” sob a forma de “co-autoria”, a existência de decisão e de execução conjuntas. O acordo pode ser tácito, bastando-se com a consciência/vontade de colaboração dos vários agentes na realização de determinado crime. No que respeita à execução, não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos ou tarefas tendendas a atingir o resultado final, importando apenas que a actuação de cada um, embora parcial, se integre no todo e conduza à produção do objectivo em vista. No fundo, o que importa é que haja uma actuação concertada entre os agentes e que um deles fira o bem tutelado. (Acórdão do Venerando TSI no processo n.°161/2004)
Ora bem, na nossa óptica, não é necessário que todos os arguidos se conheçam reciprocamente, nem que eles saibam todos os pormenores do plano criminoso, basta que um agente aceite uma sugestão ou adira a um plano criminoso, e o execute de actuação concertado e em conjugação de esforço com demais co-participantes.
Nesta linha de ponderação, e ressalvado sempre o elevado respeito pela opinião diferente, inclinamos a entender que os factos dados por provados pelo Tribunal a quo caucionam solidamente a verificação in casu dos pressupostos da co-autoria dos ora recorrentes, embora as intervenções de qualquer um deles sejam menos intensivas do que os primeiros três arguidos identificados no Acórdão em questão.
2.2- Ora, a insubsistência dos argumentos supra analisados conduz a ser irremediavelmente infundado o terceiro argumento tendente a pôr em crise a obrigação solidária de indemnização.
Por todo o expendido acima, propendemos pela provimento parcial do recurso da arguida B e pelo improcedência do recurso conjuntamente interposto pelos quatro recorrentes acima referidos”; (cfr., fls. 1347 a 1349).

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Nada parecendo obstar, cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 1178-v a 1186-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem os (2ª, 4ª a 6° e 8ª) arguidos B, D, E, F e H recorrer do Acórdão do T.J.B. que os condenou nos termos atrás já referidos.

Vejamos se tem razão, começando-se por identificar as questões pelos recorrentes colocadas e trazidas à apreciação deste T.S.I..

Entende a (2ª) arguida B que “excessiva” é a pena, que devia ser especialmente atenuada e que devia ser suspensa na sua execução. Em síntese alega que reparou parte do prejuízo causado à assistente.

Os (4ª a 6° e 8ª) arguidos D, E, F e H consideram que o Acórdão recorrido está inquinado com os vícios de “erro notório na apreciação da prova”, tendo-se incorrido também em “erro na decisão de direito” por “não verificação dos pressupostos da co-autoria” e indevida condenação no pagamento solidário dos montantes indemnizatórios discriminados no Acórdão recorrido.

–– Ponderando nas questões assim trazidas à apreciação deste T.S.I., mostra-se-nos adequado – e lógico – começar pelo recurso destes últimos (4ª a 6° e 8ª) arguidos, e, desde já, pelo apontado vício na decisão da matéria de facto, ou seja, o imputado “erro notório na apreciação da prova”.

Pois bem, repetidamente tem este T.S.I. considerado que “O erro notório na apreciação da prova apenas existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 12.01.2017, Proc. n.° 498/2016, de 26.01.2017, Proc. n.° 776/2016 e de 16.02.2017, Proc. n.° 341/2016).

Como também já tivemos oportunidade de afirmar:

“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 19.01.2017, Proc. n.° 549/2016, de 26.01.2017, Proc. n.° 744/2016 e de 23.02.2017, Proc. n.° 118/2017).

E, sem prejuízo do muito respeito por outro entendimento, somos de opinião que inexiste o assacado vício, pois que não se vislumbra onde, como, ou em que termos tenha o Colectivo a quo desrespeitado qualquer “regra sobre o valor da prova tarifada” – que, no caso, não existe – o mesmo sucedendo com as “regras de experiência” e “legis artis”.

Aliás, basta uma leitura ao Acórdão recorrido, em especial, ao segmento em que o Colectivo justifica e explicita, (detalhadamente), o porque da sua convicção, (cfr., fls. 1186-v a 1189), para se constatar da inexistência do imputado vício, afigurando-se que a referida “fundamentação” se nos apresenta clara e lógica, pouco havendo a acrescentar.

De facto, e como é evidente, não existe “erro” (nem “contradição”) porque, (como parecem entender os ora recorrentes), a decisão proferida é (alegadamente) contrária em relação a uma “afirmação” feita no âmbito de 1, 2 ou mais depoimentos…

Como nos parece óbvio, é (apenas) “natural” que existam elementos probatórios em “sentido diverso ou contrário”, uns no sentido do que consta da acusação (ou pronúncia), e outros, no sentido da contestação, havendo, ou no sentido da versão do arguido, (quando não é coincidente com a da acusação ou pronúncia).

E, não é por o Tribunal decidir num, ou noutro sentido, que se incorre em “erro” ou “contradição”, pois que só se incorre em tais vícios nas situações atrás já expostas, o que, como se disse, não é o caso dos autos.

–– Quanto à “co-autoria”.

Teve já este T.S.I. oportunidade de sobre esta matéria se pronunciar, (consignando-se, nomeadamente, no Ac. de 28.04.2011, Proc. n.° 415/2010, e, mais recentemente, de 14.01.2016, Proc. n.° 1053/2015, do ora relator), que são requisitos essenciais para que ocorra “comparticipação criminosa” sob a forma de “co-autoria”, a existência de “decisão” e de “execução conjuntas”.
O “acordo” pode ser tácito, bastando-se com a consciência/vontade de colaboração dos vários agentes na realização de determinado crime.
No que respeita à “execução”, não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os actos ou tarefas tendentes a atingir o resultado final, importando, apenas, que a actuação de cada um, embora parcial, se integre no todo e conduza à produção do objectivo em vista.
No fundo, o que importa é que haja uma “actuação concertada” entre os agentes e que um deles fira o bem tutelado; (cfr., também os Acs. deste T.S.I. de 23.01.2014, Proc. n.° 816/2013 e de 24.07.2014, Proc. n.° 428/2014).

Por sua vez, é cúmplice aquele que tem uma actuação à margem do crime concretamente cometido, quedando-se em actos anteriores ou posteriores à sua efectivação. Na cumplicidade, há um mero auxílio ou facilitação da realização do acto assumido pelo autor e sem o qual o acto ter-se-ia realizado, mas em tempo, lugar ou circunstâncias diversas. Portanto, aqui, o cúmplice, fica fora do acto típico e só deixa de o ser, assumindo então o papel de co-autor, quando participa na execução, ainda que parcial, do projecto criminoso.

No caso dos autos, colhe-se (claramente) da matéria de facto dada como provada que os ora recorrentes aderiram a um “plano”, desempenhando, em conjunção de esforços, um papel imprescindível para a sua concretização e sucesso: se os mesmos, na qualidade de jogadores, não se deslocassem, intencionalmente e conforme combinado, à mesa de jogo onde estava a (1ª) arguida a prestar serviço, e aí fizessem as “apostas” que fizeram, nunca poderiam ter conseguido qualquer quantia como obtiveram.

Nesta conformidade, à vista está a solução, sendo de confirmar, também aqui, a decisão recorrida.

–– Por fim, e no que toca à questão do “pagamento solidário da indemnização”, é também evidente que não tem os recorrentes razão.

Com efeito, e como – bem – se observa no douto Parecer do Ministério Público, a decisão em questão assenta tão só no que provado ficou, pois que (apenas) corresponde com a actuação dos arguidos e dos prejuízos pelos mesmos respectivamente causados.

Tudo visto, e improcedendo todos os argumentos pelos (4ª a 6° e 8ª) arguidos apresentados, há que negar provimento aos seus recursos.

–– Vejamos agora do “recurso da (2ª) arguida B”.

Diz a arguida que “reparou” parte do prejuízo que causou, que o fez tempestivamente, e que, desta forma, devia beneficiar de uma “atenuação especial da pena” nos termos do art. 201° e 67° do C.P.M..

Pois bem, desde já há que dizer que corresponde à verdade o alegado pela recorrente.

Com efeito, e tal como consta de fls. 1048 dos presentes autos, em 19.07.2016, (antes da audiência de julgamento), a arguida depositou à ordem destes autos o quantum de HKD$30.000,00.

Porém, e ainda que se mostre de reconhecer que o Colectivo a quo não terá atentado em tal “depósito”, ponderando na restante conduta (provada) da ora recorrente, e em especial, no (total do) prejuízo que com a mesma causou, cremos que motivos não há para uma “atenuação especial da pena”, nos termos do art. 201° e 67° do C.P.M..

Com efeito, nos termos do n.° 2 do art. 201° do C.P.M., “Se a restituição ou reparação for parcial, a pena pode ser especialmente atenuada”, e, no caso, atento o que se deixou exposto, sendo apenas “parcial” e “diminuta” é este Tribunal da opinião que a mesma “reparação” efectuada não justifica uma “atenuação especial da pena”.

É, sem dúvida, “circunstância” que deve ser tida em conta na “determinação da medida da pena”.

E, nesta sede, ponderando nas molduras penais para os crimes pela recorrente cometidos, e afigurando-se-nos de considerar que as penas parcelares e única fixadas já se encontram bem – excessivamente – próximas dos seus respectivos mínimos legais, apresenta-se-nos inexistente qualquer margem para a sua redução, sendo assim de se manter.

Por sua vez, fortes sendo as necessidades de prevenção geral deste tipo de crime – que tem registado um considerável aumento nos últimos anos – confirma-se também a decisão de não se suspender a execução da pena única decretada, pois que verificados não estão os pressupostos do art. 48° do C.P.M..

Dest’arte, improcede também o recurso da (2ª) arguida B.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento aos recursos.

Custas pelos recorrentes, com a taxa de justiça de 4 UCs para a (2ª) arguida B, e de 8 UCs para os (4ª a 6° e 8ª) arguidos D, E, F e H.

Honorários ao Exmo. Defensor Oficioso dos (4ª a 6° e 8ª) arguidos D, E, F e H, no montante de MOP$2.000,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 23 de Março de 2017
José Maria Dias Azedo
[Dando como reproduzido o teor da declaração de voto que anexei ao Acórdão deste T.S.I. de 16.03.2017, Proc. n.° 117/2017, pois que considero que em causa está o crime de “peculato”, em concurso aparente com o de “abuso de confiança”].

Chan Kuong Seng

Tam Hio Wa



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