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Processo nº 167/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 27 de Abril de 2017

Assunto:
- Tolerância de 30 minutos
- Nº 4 do artº 10º do DL nº 24/89/M

SUMÁRIO:
- Nos termos do nº 4 do artº 10º do DL nº 24/89/M, o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados não é contado para efeitos da prestação das horas extraordinárias, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos diários.
- O legislador prevê simplesmente uma situação de tolerância de 30 minutos para os casos ocasionais de necessidade à preparação para o início do trabalho ou à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados, não tendo portanto qualquer intenção legislativa no sentido de permitir a entidade patronal a transformar como regra, exigindo o trabalhador a comparecer no local de trabalho sempre com antecedência de 30 minutos em todos os dias de trabalho.
O Relator,
Ho Wai Neng

Processo nº 167/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 27 de Abril de 2017
Recorrentes: A (Autor)
B, SARL (Ré)
Recorridos: Os mesmos

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
  Por sentença de 05/12/2016, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré B, SARL a pagar ao Autor A a quantia de MOP$274,170.00, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vêm recorrer o Autor e a Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
O Autor, A:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao ora Recorrente as quantias pelo mesmo reclamadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, feriados obrigatórios e pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo devida pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal, feriado obrigatórios e prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho e, nesta medida, se mostra em violação ao disposto nos artigos 10.º, n.º 4, 17.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que atenda à totalidade dos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Em concreto,
3. Ao condenar a Ré a pagar ao Autor apenas uma quantia em singelo pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal não gozado, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na medida em que de acordo com o referido preceito se deve entender que o mesmo trabalho deve antes ser remunerado em dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescido de um outro dia de descanso compensatório, tal qual tem vindo a ser seguido pelo Tribunal de Segunda Instância;
4. De onde, resultando provado que durante todo o período da relação laboral o ora Recorrente não gozou dos respectivos dias de descanso semanal deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$108,000.00 a título do dobro do salário - e não só de apenas MOP$54,000.00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, devendo manter-se a restante condenação da Ré no pagamento da quantia devida a título de não gozo de dias de descanso compensatório em virtude do trabalho prestado em dia de descanso semanal;
Acresce que,
5. Contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, não parece correcto concluir que pela prestação de trabalho nos dias de feriados obrigatórios se deva proceder ao desconto do valor do salário em singelo já pago;
6. Pelo contrário, salvo melhor opinião, a fórmula correcta de remunerar o trabalho prestado em dia de feriado obrigatório nos termos do disposto no artigo 20.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, será conceder ao Autor, ora Recorrente, um "acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito" - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - conforme tem vindo a ser entendido pelo Tribunal de Segunda Instância;
7. De onde, resultando provado que durante todo o período da relação laboral o ora Recorrente prestou a sua actividade durante os 6 dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diários dos Casinos operados pela Ré, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao ora Recorrente a quantia de MOP$21,750.00 - e não apenas a quantia de MOP$14,500.00 conforme decidido pelo Tribunal a quo - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, o que desde já e para os legais efeitos se requer;
Por último,
8. Contrariamente ao entendimento sufragado pelo douto Tribunal a quo, está o ora Recorrente em crer que a situação de "tolerância" de 30 minutos para a conclusão de tarefas não acabadas cantante do n.º 4 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, tão-só se justifica para situações ocasionais, isto é, para situações esporádicas, não podendo tal circunstância se transformar em regra;
9. De onde, tendo a Recorrida transformado em regra a obrigatoriedade de ora Recorrente ter de comparecer com uma antecedência de 30 minutos antes do início do seu horário normal de trabalho deve determinar o pagamento ao Recorrente a quantia de MOP$25.000,00, acrescida de juros até integral e efectivo pagamento, pela prestação pelo ora Recorrente de 30 minutos de trabalho por dia para além do seu período normal diário.
*
A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 279 a 292, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
*
A Ré, B, SARL:
I.- O presente recurso é interposto da douta Sentença proferida pelo douto Tribunal a quo a fls. 189 e segs. dos presentes autos, que julgou procedente a acção e, em consequência, condenou a ora Recorrente a pagar ao Recorrido A a quantia de MOP$274.170,00 (duzentos e setenta e quatro mil, cento e setenta patacas), acrescida de juros legais até efectivo e integral pagamento, além do montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, que a ré pagou aos residentes locais a liquidar em execução de sentença.
II.- A ora Recorrente não se conforma com a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância, estando em crer que a mesma padece dos seguintes vícios de nulidade por falta de fundamentação e erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito.
III.- Por decisão proferida nos presentes autos pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância, foi a sentença previamente proferida declarada nula a decisão então proferida por falta de fundamentação porque de acordo com aquele Venerando Tribunal, a decisão então em crise padecia gravemente do vício de falta de fundamentação porquanto pelo menos parte dos factos peticionados não poderiam definitivamente serem dados como provados, singelamente, sem que fossem suportados por outros que os justificassem, tal resultando da seguinte passagem do doutíssimo acórdão do Venerando Tribunal de Segunda Instância:
«Deste modo, nós até cremos que, cotejando o n.1 com o nº 2 do art. 32º citado, a regra (nº 1) é a identificação precisa e concreta dos factos, enquanto a excepção (nº 2) é a possibilidade de a sentença se restringir à sua parte decisória ou dispositiva, sem relatório e sem fundamentaçào factual e jurídica. Só que para esta excepção ser accionada é preciso que se verifique uma condição, que é a de os autos traduzirem uma situação de "manifesta simplicidade ".
Ora, o caso dos autos, tanto no plano dos factos, como no de direito, está longe de ser dotada dos atributos de "manifesta simplicidade ".
E se outras dificuldades não existirem, bastará citar uma no plano dos factos, que consiste na circunstância de o autor afirmar ter trabalhado todos os dias da semana (art. 10°, p.i.), embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª ré (arts. 10° e 12°, p.i.). Quantos foram esses dias de faltas justificadas? Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art.º 22° da pi? O tribunal deverá aceitar os dias que o autor indica a este respeito? Aí está uma dificuldade que a 1ª instância terá que resolver, a qual ainda poderá ser impugnada pela ré em recurso para este TSI.»
IV.- O Tribunal de Segunda Instância apontou directamente para a existência de uma inconsistência e omissão de factos que deveras não foram alegados pelo Autor, e que impediam mesmo que o Tribunal de Segunda Instância se substituísse ao Tribunal de Primeira Instância quanto à decisão sobre a matéria de facto, i.e., o Tribunal de Segunda Instância determinou que essa avaliação dos factos incoerentes e a violação do ónus de alegação fossem tidos em conta pelo Tribunal de Primeira Instância e que daí resultasse uma decisão de matéria de facto devidamente suportada em factos que pudessem ou devessem serem dados por reconhecidos pela Ré, mas com todo o respeito que é sempre merecido, a decisão ora em crise, "passou por cima" dessa orientação, senão mesmo determinação do Tribunal de Segunda Instância, passando apenas, em nossa opinião, a factualizar as conclusões feitas pelo Autor na sua petição inicial e que se não encontram suportadas em factos concretos.
V.- Da mesma forma, a decisão em crise, com a técnica adoptada não resolveu as incoerências apontadas, continuando, dessa forma a padecer do mesmo vício já anteriormente apontado pelo Tribunal de Segunda Instância. Para isso, temos o exemplo dado pelo Tribunal de Segunda Instância, pelo qual o Autor afirma «ter trabalhado todos os dias da semana (art. 10º, p.i.), embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré (arts. 10º e 12º, p.i.). Quantos foram esses dias de faltas justificadas? Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano defaltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art.º 2º da pi? O tribunal deverá aceitar os dias que o autor indica a este respeito?»
VI.- Estas incoerências apontadas pelo Tribunal de Segunda Instância deveriam ser resolvidas pelo Tribunal de Primeira Instância, como bem determinou o Tribunal Superior. No entanto, a decisão em crise mantém na integra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder todas as questões/vícios já apontados pelo Tribunal de Segunda Instância:
d) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana (com a transcrição do art. 10º, p.i.), embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré;
e) Quantos foram esses dias de faltas justificadas?
f) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art.º 22° da pi? Que factos suportam esta conclusão?
VII.- Isto é, a sentença ora em crise consiste numa transcrição para a decisão de facto de todas as conclusões do Autor e dos factos incoerentemente alegados, que adiante são individualmente tratados nos capítulos deste recurso, mormente a respeito do subsídio de alimentação e do subsídio de efectividade reclamado pelo Autor, ora Recorrido, da compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriados obrigatórios, da comparticipação nos custos de alojamento e do trabalho por turnos e trabalho extraordinário e ainda das gorjetas a que o Autor julga ter direito sendo a decisão essencialmente a mesma, com os mesmos vícios, ao qual acresce o vício resultante da violação do acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância.
VIII.- O que o Tribunal a quo não podia fazer foi o que fez, ou seja, factualizar as conclusões (não suportadas em factos) e os factos incoerentes e contraditórios que se mantêm na íntegra por essa razão, esta decisão padece do mesmo vício já anteriormente apontado pelo Tribunal de Segunda Instância à primeira sentença proferida: a falta de fundamentação, sendo, consequentemente nula, nos termos do artigo 571º, n° 1, al. b), do CPC.
IX.- Quanto ao subsídio de alimentação o Douto Tribunal a quo condenou a Ré, ora Recorrente, a pagar ao Autor a quantia de MOP$30.420,00, a título de subsídio de alimentação e com relevo para a apreciação de tal pedido deu o douto Tribunal a quo provado que:
Descontados os dias que - com autorização prévia da 1ª Ré - o Autor se ausentou para o Nepal e/ou outros dias em que tenha sido expressamente dispensado do trabalho e se tenha ausentado para o exterior da RAEM por um período superior a 24 horas, o Autor prestou trabalho para a 1ª Ré todos os dias da semana (10º)
Durante o tempo que prestou trabalho, todas as faltas justificadas e/ou dispensas ao serviço (com ou sem retribuição) foram previamente autorizadas pela 1ª Ré, mediante o preenchimento pelo Autor de um formulário (pedido de faltas) que a 1ª Ré conservava na sua posse, sem que alguma vez tivessem sido devolvidas ao Autor quaisquer dos referidos formulários (12°)
Resulta do ponto 3.1 do Contrato de Prestação de Serviços n° 5/96, ser devido ao Autor (e aos mais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de "(...) MOP$20.00 patacas diárias por pessoa, a titulo de subsidio de alimentação" (17º)
Entre 01/11/1997 e 29/05/2002 a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação (18º)
Durante todo o período de trabalho a 1ª Ré nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros (19º)
Durante o tempo que o Autor prestou a sua actividade para a 1ª Ré não existiam cantinas e/ou refeitórios nos casinos que eram operador pela 1ª Ré (20º)
As únicas salas destinadas ao descanso e às refeições do Autor (e dos demais trabalhadores não residentes) a apenas disponibilizavam agua quente e agua fria (21º)
(Sublinhado e destacado nossos)
X.- Com base nos sobreditos factos entendeu o Tribunal a quo que tem o Autor a receber a título de subsídio de alimentação a quantia de MOP$30.420.00 (1521 dias x MOP$20.00). Porém, não resulta do elenco dos factos provados que o Recorrido tenha trabalhado 1521 dias. O que se alegou e provou foi que o Recorrido (i) esteve ao serviço da Recorrente entre 01/11/1997 e 29/05/2002; (ii) que se ausentou para o Nepal (iii) que foi expressamente dispensado do trabalho (iv) que teve faltas justificadas. Sendo certo que no artigo 22° do petitório o Recorrido peticiona a indemnização pelo subsídio de alimentação com base nos aludidos 1521 dias sem que se perceba de que forma os calculou baseando-se o Autor em alusões genéricas e abstractas, tais como os "número de dias de dispensa remunerados e/ ou não remunerados nos quais o Autor terá sido dispensado", ou em médias de "30 dias por cada ano civil,", não especificando, nem alegando quais os dias concretos. Ora, o direito invocado pelo Autor não se pode presumir como certo, e o Tribunal terá que apreciar com base nos factos alegados pelo Autor e conforme o Direito. E não o faz! E a parca matéria fáctica alegada pelo Autor não pode conduzir, sem mais, à procedência do pedido.
XI.- O Recorrido confessa que teve férias, que deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa em alguns dias mas não alega e como tal não se comprova quais são esses dias.
E se não foram alegados esses dias, e sendo os subsídios de alimentação e de efectividade atribuídos em função da efectiva prestação de trabalho, como poderá o Tribunal determinar quais os dias em que o Autor trabalhou e quais efectivamente os dias em que o Autor tem direito a tais subsídios? Tornando-se impossível ao Tribunal estabelecer quais os dias relativos aos quais o Recorrido tem direito ao subsídio de alimentação, o qual conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário. Pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, não tendo sido alegados nem provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em o fez, padecendo assim a douto sentença nesta parte do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento de compensação a título de subsidio de alimentação.
XII.- O mesmo se diga quanto ao reclamado subsídio de efectividade, sendo que aqui é ainda mais gritante a falta de alegação do Autor isto porque veio reclamar o Recorrido na sua petição inicial que a ora Recorrente lhe era devedora da quantia de MOP$55.000,00 a título de subsídio de efectividade tendo-se limitado o Recorrido a atribuir um valor sem que para tal sequer explique a que dias o pagamento em falta se refere, a que meses e a que anos, e de que forma é feita tal equação aritmética e tendo mais uma vez o Tribunal presumido como certo o direito do Autor sem que para talo mesmo tenha sido aplicado, determinando que: "Quanto ao subsídio de efectividade resulta igualmente não ter sido pago pela Ré ao Autor (cf. Facto 26) sendo que entre 01 de Novembro de 1997 e 29 de Maio de 2002 o Autor não deu qualquer falta ao serviço, sem conhecimento e autorização prévia da Ré (cf. Facto 25) pelo que lhe é devida a quantia de MOP250x4diasx55meses, isto é MOP55.000,00."
XIII.- Por definição também o subsídio de efectividade é atribuído por trabalho efectivo, ou seja, por trabalho efectuado e o Contrato de Prestação de serviços estabelece no ponto 3.4 ser devido ao Autor "...um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dada qualquer falta ao serviço." (Sombreado nosso). No entanto não foi feita nos presentes autos qualquer prova relativamente à assiduidade do Autor, não se tendo apurado quantos dias de trabalho efectivo ele prestou e nem se alguma vez faltou ao serviço, pelo contrário resulta confessado pelo Recorrido que o mesmo deu faltas ao serviço, ainda que justificadas, não as quantificando e neste pressuposto se questiona como poderá o Tribunal de Primeira Instância fixar os dias que fixou para cálculo das compensações se não sabe quantos foram os dias de faltas justificadas?
XIV.- A verdade é que mais uma vez deixou a decisão recorrida escapar que o próprio Autor alega não ter trabalhado todos os dias, sendo insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permita ao Tribunal a quo sustentar a condenação da Recorrente a pagar ao Recorrido qualquer montante a título de subsídio de efectividade, verificando-se assim mais uma vez erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias peticionadas a título de subsídio de alimentação e de subsídio de efectividade, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto no contrato de prestação de serviços n° 5/96, devendo por isso, a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado. Ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrida a compensação a título de subsídio de efectividade e de subsidio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
XV.- O Recorrido reclama ainda uma indemnização pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriados obrigatórios no período decorrido entre 01.11.1997 e 29.05.2002, assim e com relevo para a apreciação de tais pedidos deu o Tribunal a quo por provado que:
10) Descontados os dias que - com autorização prévia da 1ª Ré - o Autor se ausentou para o Nepal e/ou outros dias em que tenha sido expressamente dispensado do trabalho e se tenha ausentado para o exterior da RAEM por um período superior a 24 horas, o Autor prestou trabalho para a 1ª Ré todos os dias da semana (10º)
12) Durante o tempo que prestou trabalho, todas as faltas justificadas e/ou dispensas ao serviço (com ou sem retribuição) foram previamente autorizadas pela 1ª Ré, mediante o preenchimento pelo Autor de um formulário (pedido de faltas) que a 1ª Ré conservava na sua posse, sem que alguma vez tivessem sido devolvidas ao Autor quaisquer dos referidos formulários (12°)
27) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002 a 1ª Ré nunca atribuiu ao Autor em cada período de sete dias um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição (32º)
28) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002 a 1ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção sem prejuízo da correspondente retribuição (33º)
34) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002 o Autor prestou a sua actividade de guarda de segurança durante os 6 dias de feriado obrigatórios por forma a garantir o fimcionamento continuo e diário dos vários casinos operados pela 1ª Ré (45º)
XVI.- Resultando provado nos pontos 10 e 12 da matéria de facto (i) que o Recorrido esteve ao serviço da Recorrente entre 01/11/1997 e 29/05/2002; (ii) que o Recorrido se ausentou para o Nepal (iii) que o Recorrido foi expressamente dispensado do trabalho (com ou sem remuneração) (iv) que teve faltas justificadas, como pode o Tribunal entender decidir o n° de dias devidos e não gozados pelo Recorridos a que se faz alusão a fls 13 da sentença? E como concluir que nos anos de 1998, 1999, 2000, 2001 eram devidos 49 dias e que os mesmos não foram gozados ou que entre 01.11.1997 e 31.12.1997 teria o Recorrido direito a 8 dias e não os gozou e que entre 01.01.2002 e o termo da relação laboral eram 20 os dias devidos e não gozados? Isto porque estando provadas as ausências do Recorrido para o Nepal e as dispensas para o trabalho remuneradas nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente ao pagamento da quantia de MOP$112.000.00 sem que se provasse o número de dias concretos que o Autor deixou de gozar o seu descanso semanal.
XVII.- O mesmo se diga quanto aos dias feriados, pois como pode concluir o Tribunal que durante o período em que decorreu a relação laboral deixou o Recorrido de gozar 6 dias de feriados obrigatórios se não se sabe quando o Autor se deslocou ao Nepal, nem em que dias foi dispensado de trabalhar? A verdade é que existe uma clara contradição entre a matéria de facto provada nas alíneas 10° e 12° dos factos provados e a decisão no que concerne à condenação pelo alegado trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriados obrigatórios, já que tendo o Tribunal dado por provado que o Recorrido se ausentou para o Nepal, que foi expressamente dispensado do trabalho (com ou sem remuneração) e que teve faltas justificadas nunca poderia ter condenado a Recorrente no pagamento dos montantes em que condenou pois ficou por apurar o n° de dias de descanso semanal que o Recorrente deixou de gozar e quais os dias feriados que trabalhou verificando-se assim uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dias feriados, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17° e 19° do DL 24/89/M.
Devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrida a compensação a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dias feriados que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
XVIII.- Quanto à comparticipação nos custos de alojamento resulta da factualidade provada que "Aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepaleses) alojamento gratuito em Macau. "Por seu lado, baseou a sentença recorrida a condenação da Recorrente neste ponto determinando que: "Cremos que, à falta de qualquer outra justificação que se mostra indevido o desconto de forma automática da quantia de HK$750,00 por cada mês, atenta, desde logo, a obrigação assumida de disponibilizar aquando da contratação de alojamento gratuito (cfr. facto provado 36), pelo que terá de devolvera quantia de MOP$41.250,00 a título de devolução da "comparticipação no alojamento" (Mop$750.00 x 55 meses)." Ora, não está alegado pelo Autor, ora Recorrido, que foi a Recorrente quem garantiu o alojamento gratuito em Macau. Na verdade, estes factos constitutivos do direito, depois de subsumidos, permitem concluir pelo pedido alegado que existe uma outra entidade responsável pelo recrutamento, ou seja uma agência de recrutamento, o qual não pode ser olvidado pelo Digno Tribunal a quo. E estes factos, ainda que confessados pela Ré, ora Recorrente, não estão também suficientemente alegados para permitir uma condenação pelo Tribunal.
XIX.- Pelo que também aqui não poderá proceder o pedido do Recorrido, verificando-se assim uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias aqui peticionadas, violando assim o princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17° e 19° do DL 24/89/M, devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrida a compensação a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dias feriados que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
XX.- No que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas pela prestação de trabalho em regime de turno e trabalho extraordinário à semelhança do ocorrido com o subsídio de alimentação o Recorrente limitou-se a invocar factos genéricos, ou seja,o Recorrido não alega especificadamente quais os factos que permitam concluir que tenha direito a pedir qualquer tipo de compensação a esse titulo, isto porque o Recorrido não especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias, não sendo por isso possível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de alegação. E ainda se ficou provado que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) ou pedia dispensas como pode o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que o Autor estava de turno? Ou ainda se eram ou não despendidas horas extraordinárias. Na verdade, não é possível ao Tribunal determinar quais as horas extraordinárias que o trabalhador efectuava, motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar a Recorrente, em violação do art. 5° do CPC e do art. 10° do DL 24/89/M.
XXI.- Mas mais se saliente um facto importante que o Tribunal deveria ter tido também em consideração, já que se reporta à relação laboral, in totum, que são as férias anuais gozadas pelo Autor pois o Tribunal para o cômputo de todas as compensações devidas pelos créditos reclamados pelo Recorrido tem que ter em conta todos os dias de trabalho bem como todos os dias de férias, feriados e descansos gozados para efectivamente proceder ao calculo das mesmas. E na verdade, não foram reclamados pelo Autor os créditos relativos às férias anuais. E se não foram reclamadas é porque foram gozadas e pagas pela Ré.
XXII.- Ora, não tendo sido alegado pelo Recorrido e tendo em conta que à data, de acordo com o aludido Contrato de Prestação de Serviços (Cfr. Clausula 4.3.) o Autor teria direito a dez dias de férias anuais, incontornável será de admitir e prever a existência desses dias. Não se sabendo quando, em cada ano, o Autor, ora Recorrido, gozou as férias anuais, porque, repita-se, não foi alegado pelo Autor, e não tendo sido também alegado pelo Autor quais os dias em que este tirou folgas (faltas justificadas e dispensas ao trabalho) pergunta-se mais uma vez como pode o Tribunal a quo, estabelecer com toda a certeza os dias para cômputo das compensações relativas aos feridos obrigatórios e descansos semanais, subsídio de efectividade, subsídio de alimentação e trabalho extraordinário nos turnos? Face a esta falta de previsão por parte do Digno Tribunal no apuramento das compensações a atribuir ao Recorrido entende a Recorrente, sempre com todo o respeito, que padece a douta decisão dos vícios de erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito.
XXIII.- No que às bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, se refere em síntese, o Recorrido alega nos artigos 22° a 31° da petição que "Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi-lhe dito que seria possível que o Autor viesse a receber "gorjetas" dos clientes da 1ª Ré (B)." e que a 1ª Ré sempre pagou aos seus trabalhadores residentes diversas bonificações e/ou remunerações adicionais, incluindo as gorjetas que eram recebidas dos clientes das salas de jogo e que também o Autor tinha o direito de as receber mas que nunca lhe foram atribuídas resultando da douta sentença recorrida com interesse para apreciação da causa que:
"Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviço n° 5/96 que (...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor) este terá direito, para além da remuneração supra referida às bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª Outorgante (leia-se a primeira Ré) paga aos operários residentes no território" Mais resultando da douta sentença que:
"Entre 1/11/1997 e 29/05/2002 a 1ª Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais incluindo as gorjetas que pagou a todos os demais trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança.
Entendemos que a conjugação do teor do contrato de prestação de serviços e da factualidade provada, que este pedido deve proceder nos termos em que está formulado, o que se decidirá."
XXIV.- Ora, na verdade, como é consabido, a distribuição de bonificações não tem carácter de obrigatoriedade e não é automática, sendo antes ocasional e a atribuição do bónus é uma gratificação paga pela entidade patronal e traduz-se numa recompensa, num incentivo que é atribuído pelo empregador ao trabalhador face ao seu bom desempenho no exercício da sua actividade profissional, competindo a cada empresa, determinar as condições de atribuição do bónus ao trabalhador, tais como a assiduidade, a angariação de clientes, o resultado atingido na prestação do seu trabalho, etc. e o bónus não será atribuído caso não sejam verificados os requisitos para a sua atribuição.
XXV.- Ora, não resultou dos factos alegados que o Autor seria assíduo ou um trabalhador exemplar, pois aquilo que foi confessado pelo Recorrido na sua petição inicial é de que faltava e pedia dispensas no trabalho, sendo certo que, o bónus corresponde a uma remuneração variável, casuisticamente paga pelo empregador, a título de gratificação, não decorrendo do contrato de trabalho a sua obrigatoriedade, nem correspondendo a uma obrigação do empregador razão pela qual não se encontra incluída no conceito de salário, tal qual definido no artigo 25° do Decreto-Lei n° 24/89/M mas sim designada como remuneração variável, não controlada pelo empregador, nos termos do disposto do artigo 2° número 5 da Lei n.º 7/2008.
XXVI.- Veio o Recorrido reclamar que a 1ª Ré, ora Recorrente, nunca lhe pagou quaisquer remunerações adicionais, incluindo as gorjetas. Ora, as gorjetas são gratificações dadas por um terceiro, ou seja, são entregues pelo cliente directamente ao trabalhador que lhe presta um determinado serviço, não tendo a entidade patronal qualquer controlo sobre essas mesmas quantias, sendo mais provável que um trabalhador que lide diária e directamente com os clientes da sua entidade patronal possa vir a receber essas gorjetas, repita-se, sem qualquer controlo daquela, em comparação com aqueles trabalhadores que não têm qualquer contacto com os clientes como era o caso do Recorrido.
XXVII.- Por outro lado, na mesma senda dos restantes créditos reclamados estando provadas as ausências do Recorrido para o Nepal e as dispensas para o trabalho remuneradas nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente ao pagamento das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, por falta de preenchimento do requisito para tal e neste sentido também aqui pecou a douta sentença recorrida nos mesmo moldes pelos vícios de erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito pelo que deverá a mesma ser revogada.
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O Autor respondeu à motivação do recurso da Ré, nos termos constantes a fls. 267 a 275, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1) Entre 01 de Novembro de 1997 e 29 de Maio de 2002, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (B, SARL), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (1.º)
2) Conforme informação prestada pelo Gabinete para os Recursos Humanos da RAEM (GRH), o Autor exerceu a sua prestação de trabalho para a 1ª Ré ao abrigo de um Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre a 1ª Ré e a Sociedade ECONFORCE – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. (2.º)
3) Mais foi informado pelo GRH que se trata do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96 (Cfr. doc. 1, que se dá por integralmente reproduzido para os legais efeitos). (3.º)
4) O referido Contrato de Prestação de Serviços foi sucessivamente objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (4.º)
5) O Autor nunca recebeu cópia de qualquer Contrato de prestação de serviços ao abrigo do qual foi recrutado e autorizado a prestar trabalho para a 1ª Ré. (5.º)
6) O Autor desconhece a língua portuguesa e é leigo em Direito. (6.º)
7) Ao longo da relação laboral, a Ré apresentou ao Autor vários contratos de trabalho cuja cópia o Autor não dispõe, mas desde já requer que a 1ª Ré proceda à sua junção, nos termos e para os efeitos do art. 455.º do CPC, ex vi do n.º 1 do art. 1.º do CPT. (7.º)
8) Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela 1ª Ré. (8.º)
9) Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor prestou trabalho nos locais (postos de trabalho) indicados pela 1ª Ré e que eram fixados pela 1ª Ré de acordo com as suas exclusivas necessidades. (9.º)
10) Descontados os dias que – com autorização prévia da 1ª Ré – o Autor se ausentou para o Nepal, e/ou outros dias em que tenha sido expressamente dispensado do trabalho e se tenha ausentado para o exterior da RAEM por um período superior a 24 horas, o Autor prestou trabalho para a 1ª Ré durante todos os dias da semana. (10.º)
11) Durante o tempo que prestou trabalho para a 1ª Ré, o Autor nunca deu qualquer falta injustificada. (11.º)
12) Durante o tempo que prestou trabalho, todas as faltas justificadas e/ou dispensas ao serviço (com ou sem retribuição) foram previamente autorizadas pela 1ª Ré, mediante o preenchimento pelo Autor de um formulário (“pedido de faltas”) que a 1ª Ré conservava na sua posse, sem que alguma vez tivessem sido devolvidos ao Autor quaisquer dos referidos formulários. (12.º)
13) Aquando do recrutamento do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor que iria auferir uma quantia de HK$7,500.00 por cada mês de trabalho. (13.º)
14) Para um período de trabalho de 8 horas de trabalho por dia e de 6 dias por semana. (14.º)
15) Aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor que teria direito a alimentação e alojamento gratuitos em Macau. (15.º)
16) Durante o período que prestou trabalho, a 1ª Ré pagou ao Autor a quantia de Mop$7,500.00, a título de salário de base mensal. (16.º)
17) Resulta do ponto 3.1 do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (17.º)
18) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (18.º)
19) Durante todo o período de trabalho a 1ª Ré nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (19.º)
20) Durante o tempo em que o Autor prestou a sua actividade para a 1ª Ré não existiam cantinas e/ou refeitórios nos Casinos que eram operados pela 1ª Ré. (20.º)
21) As únicas salas destinadas ao descanso e às refeições do Autor (e dos demais trabalhadores não residentes) apenas disponibilizavam água quente e água fria. (21.º)
22) Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, que “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a 1ª Ré) paga aos operários residentes no Território”. (23.º)
23) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais incluindo-se as gorjetas que pagou a todos os demais trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança. (24.º)
24) Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (28.º)
25) Durante todo o período da relação laboral, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte da 1ª Ré. (29.º)
26) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, a 1ª Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia a título de subsídio mensal de efectividade. (30.º)
27) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, a 1ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (32.º)
28) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, a 1ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (33.º)
29) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, a 1.º Ré (B) nunca fixou ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (34.º)
30) Durante o mesmo período, a 1ª Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal. (35.º)
31) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor prestou a sua actividade de guarda de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1ª Ré. (36.º)
32) Entre 01/11/1997e 29/05/2002, a 1ª Ré nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório, em troca do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (42.º)
33) A não atribuição ao Autor de um dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal confere a este o direito a auferir um outro dia de salário, em singelo. (43.º)
34) Entre 01/11/1997 e 29/05/2002, o Autor prestou a sua actividade de guarda de segurança durante os 6 dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1ª Ré. (45.º)
35) Durante o referido período de tempo, a 1ª Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (46.º)
36) Aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (52.º)
37) Durante todo o tempo em que o Autor prestou trabalho para a 1ª Ré, a 1ª Ré forneceu ao Autor alojamento num apartamento propriedade da 1ª Ré e sita no Edifício Taipa Garden. (53.º)
38) O Autor dividia o referido apartamento com outros sete colegas de trabalho de origem Nepalesa. (54.º)
39) Em contrapartida da “utilização” do referido apartamento, durante todo o período em que o Autor prestou trabalho para a 1ª Ré, a 1ª Ré procedeu ao desconto da quantia de HKD$750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (55.º)
40) O referido desconto no salário do Autor era operada de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela 1ª Ré. (56.º)
41) De onde, mesmo que o trabalhador (leia-se, o Autor) optasse por residir fora da residência que lhe era destinada pela 1ª Ré, sempre lhe seria descontado a quantia de HK$750,00 por cada mês. (57.º)
42) Em cada residência residiam cerca de 8 trabalhadores (guardas de segurança de origem nepalesa), cada um dos quais “pagava” à 1ª Ré a quantia de HK$750,00. (58.º)
43) Por cada mês a 1ª Ré auferia (de forma automática e mediante dedução dos respectivos salários) por parte do Autor (e dos demais trabalhadores de origem nepalesa que com ele residia) uma quantia de HK$6,000.00, a título de “comparticipação no alojamento”. (59.º)
44) Certo é que, ao tempo (entre 1997 a 2002) em que a 1ª Ré “providenciou” ao Autor (e aos demais guardas de segurança de origem nepalesa) o referido apartamento, as rendas cobradas por apartamentos idênticos aos providenciados pela 1ª Ré ao Autor (e aos demais trabalhadores de origem nepalesa que com ele residia) se cifrava entre as Mop$1.500,00 a Mop$1.800,00 (entre 1996 e 1999) e entre Mop$2,000.00 a Mop$3.000,00 (entre o ano 2000 a 2003) por cada mês. (60.º)
45) Durante o período de tempo em que o Autor prestou trabalho para a 1ª Ré, a 1ª Ré cobrou ao Autor (e aos demais trabalhadores de origem nepalesa que com ele residia) uma renda muito superior aos valores de mercados então praticados em Macau. (61.º)
46) Era expressamente proibido ao Autor (e aos demais trabalhadores de origem nepalesa que com ele residia) receber quaisquer visitas e/ou familiares no referido apartamento. (62.º)
47) Sendo, igualmente, expressamente vedado a entrada de quaisquer pessoas de sexo feminino em qualquer dos alojamentos “providenciados” pela 1ª Ré…(63.º)
48) Durante todo o período da relação de trabalho com a 1ª Ré, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (72.º)
49) O Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pela 1ª Ré. (73.º)
50) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia cada, conforme se dispõe:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h) (74.º)
51) Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores não residentes e guardas de segurança) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (75.º)
52) Daqui resultava que, entre o fim da prestação de trabalho no turno C (00h às 08h) e o início da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h), o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período total de 24 horas. (76.º)
53) Entre o fim da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h) e o início da prestação de trabalho no turno A (8h às 16h) o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período total de 24 horas. (77.º)
54) Em cada ciclo de 21 dias de trabalho consecutivos, o Autor prestava trabalho durante dois períodos de 8 horas cada (o que perfaz um total de 16 horas de trabalho) num período total de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos (C-B) e (B-A). (78.º)
55) O que corresponde à prestação pelo Autor de, pelo menos, 16 horas de trabalho para além do seu período normal de trabalho (de 8 horas por dia e 48h por semana), em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (79.º)
56) A 1ª Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (80.º)
57) Por ordem da 1ª Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (83.º)
58) Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais. (84.º)
59) O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (85.º)
60) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (86.º)
61) Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, o Autor (e os demais guardas de segurança) sempre obedeceu às ordens e às instruções que lhe foram dadas pelos seus superiores hierárquicos e representantes da 1ª Ré. (87.º)
62) A 1ª Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia salarial pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno e relativamente ao qual o Autor permaneceu sob as ordens e as instruções da 1ª Ré. (88.º)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A- Recurso da Ré
Entende a Ré que a sentença recorrida padece dos vícios de nulidade por falta de fundamentação e erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito.
Na sua óptica, a sentença recorrida não contém todos os factos necessários para a sua condenação dos créditos reclamados a título dos subsídios de alimentação e de efectividade, da compensação da prestação das horas extraordinárias, dos dias de descanso semanal, incluindo os respectivos dias de descano compensatório, e dos feriados obrigatórios não gozados, especialmente não tendo alegado e provado o nº de dias de trabalho efectivo e o nº de dias do descanso semanal e dos feriados obrigatórios não gozados.
Em relação à condenação da devolução da comparticipação nos custos de alojamento descontada, entende a Ré que não foi alegado nem provado que foi ela quem garantiu ao Autor o alojamento gratuito em Macau, pelo que na falta desse facto constitutivo do direito, a condenação em causa não pode ter lugar.
Por fim, quanto à condenação da atribuição das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, alega a Ré, em sede do recurso, que a atribuição das mesmas não é automática, antes depende de certas condições a definir pela empresa, tais como a assiduidade, a angariação de clientes, o resultado atingido no trabalho.
Ora, não tendo alegado e provado que o Autor era um trabalhador exemplar e tendo em conta a natureza das gorjetas, que são gratificações dadas ao trabalhador directamente por clientes da empresa, sem qualquer controlo por parte da empresa, não pode a sentença recorrida ter lhe condenado o pagamento àquele título.
Quid iuris?
Por Acórdão de 20/10/2016 (fls. 170-182 dos autos), foi declarada a nulidade da sentença recorrida, determinando que o Tribunal a quo proferir decisão sobre a matéria de facto confessada e julgar a causa conforme for de direito.
Em cumprimento do Acórdão em referência, o Tribunal a quo considerou provada, por confissão, a factualidade acima transcrita.
Após a análise da mesma, verifica-se que dela não consta do número dos dias de trabalho efectivo, dos de descanso semanal e de feriados obrigatórios não gozados.
No entanto, para o cálculo do quantum das compensações devidas, a sentença recorrida serviu os seguintes dados sem que justificou a sua razão de ser, a saber:
- 1521 dias de trabalho efectivo durante a manutenção da relação loboral;
- 8 dias de descanso semanal para o ano de 1997 (entre 01/11/1997 a 31/12/1997), 49 dias para o ano de 1998 a 2001 e 20 dias para o ano de 2002 (entre 01/01/2002 a 29/05/2002); e
- 6 dias de feriados obrigatórios não gozados para os anos de 1998 a 2001 e 5 dias para o ano de 2002 (entre 01/01/2002 a 29/05/2002).
Já em sede do Acórdão de 20/10/2016, este TSI afirmou de forma expressa a necessidade da identificação precisa e concreto dos factos, chamando atenção, a título exemplificativo, ao Tribunal a quo para se pronunciar se deveria ser atendida a média de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o Autor concedia na nota do artº 22º da p.i., através da qual se pode determinar que o nº total de dias de trabalho efectivo ao longo da duração da relação de trabalho entre o Autor e a Ré era de 1521 dias.
Ora, ao não constar do elenco da factualidade provada que o Autor faltou justificadamente a média de 30 dias por ano, dá a ideia de que este facto não é considerado como provado.
Assim sendo, porquê razão o Tribunal a quo utilizou este facto no cálculo das compensações que o exigem para o efeito?
Não sabemos, uma vez que não foi dada qualquer justificação para o efeito.
O mesmo acontece para as situações de descanso semanal, incluindo o respectivo dia de descanso compensatório e de feriados obrigatórios.
Verifica-se assim a nulidade da sentença por falta de fundamentação nos termos da al. b) do nº 1 do artº 571º do CPCM.
O nº 1 do artº 630º do CPCM prevê a regra da substituição ao Tribunal recorrido, permitindo este TSI conhecer do objecto do recurso nos casos da nulidade da sentença.
Passamos então conhecer do mérito da causa.
Em relação aos créditos reclamados a título dos subsídios de alimentação, da compensação dos dias de descanso semanal, incluindo os respectivos dias de descano compensatório e dos feriados obrigatórios não gozados, cujo cálculo do quantum compensatório depende do nº de dias de trabalho efectivo ou dos dias concretos do descanso semanal e dos feriados obrigatórios, não obstante tais elementos não forem considerados como provados, o certo é que isto não determina a absolvição da Ré tal como é pretendida, uma vez que face à factualidade já apurada e por força do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/96, bem como por aplicação analógica do DL nº 24/89/M1, não temos qualquer dúvida de que a Ré tem a obrigação de pagar, só que não sabemos, por falta de elementos nos autos, quais são as quantias exactas.
Nesta conformidade e tendo em conta o disposto do nº 2 do artº 564º do CPCM, ex vi do artº 1º do CPT, a Ré deve ser condenada no que se liquidar em execução da sentença.
Quanto à fórmula de compensação do descanso semanal, considerando que se trata de matéria mais do que analisada e decidida por este TSI2, vamo-nos remeter para a Jurisprudência quase uniforme deste Tribunal no sentido de que o trabalhador tem o direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da remuneração correspondente, para além do singelo já recebido, ou seja, o quantum compensatório é calculado pela fórmula seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 2.
Em relação aos feriados obrigatórios, a fórmula é a seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 3, para além do singelo já recebido.
Para o dia de descanso compensatório, a fórmula é: Nºs de dias não gozados X salário diário X 1.
Sobre o pedido da condenação da devolução da comparticipação nos custos de alojamento descontada, ficou provado que “Aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau”.
Segundo a cláusula 4.4 do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/96, é a agência de emprego quem se responsabiliza pelo fornecimento de alojamento adequado aos trabalhadores recrutados no exterior.
Por outro lado, a cláusula 1 do mesmo Contrato diz expressamente que foi a agência de emprego quem contratou os trabalhadores de origem Nepalesa, os quais são posteriormente cedidos à Ré.
Nesta conformidade e em conjugação do teor do Contrato de Prestação de Serviço em referência e da factualidade provada, não se nos afigura que a Ré tenha assumido a obrigação de fornecer o alojamento gratuito ao Autor e aos demais trabalhadores não residente de origem Nepalesa recrutados ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/96.
Contudo, prevê-se na al. a) do artº 9º do DL nº 24/89/M, que é proibido ao empregar “obrigar o trabalhador a adquirir ou a utilizar serviços fornecidos pelo empregador ou por pessoa por ele indicada”.
Será que o Autor ficou obrigado a residir no alojamento fornecido pela Ré?
A resposta, para nós, não deixa de ser positiva, pois ficou provado que “… mesmo que o trabalhador (leia-se, o Autor) optasse por residir fora da residência que lhe era destinada pela Ré, sempre lhe seria descontado a quantia de HK$750,00 por cada mês”.
Assim, não temos qualquer dúvida em afirmar que a conduta da Ré violou a al. a) do artº 9º do DL nº 24/89/M, pelo que terá de devolver ao Autor a quantia HKD$41.250,00 (HKD$750*55 meses), o que corresponde a MOP$42.487,50, a taxa cambiária de 1.03.
Como o Autor pediu simplesmente a devolução da quantia MOP$41.250,00, é este valor que vai ser condenado, tendo em conta o princípio do pedido.
No que respeita ao pedido da atribuição das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, prevê a cláusula 3.3 do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/96 que decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho, o trabalhador terá direito, para além da remuneração normal, as bonificações ou remunerações adicionais que a Ré paga aos trabalhadores residentes.
Como resulta do próprio Contrato de Prestação de Serviço, o Autor só tem esse direito quando a Ré chegou a pagar as bonificações ou remunerações adicionais aos trabalhadores residentes em situação análoga do Autor, facto este que não ficou provado, pelo que este pedido é de se julgar improcedente.
No que respeita ao pedido do pagamento do subsídio de efectividade no valor de MOP$55.000,00 (MOP$250 X 4 dias X 55 meses), prevê a cláusula 3.4 do Contrato de Prestação em referência que o trabalhador tem direito a um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço.
Ora, é já jurisprudência assente ao nível deste TSI de que a sua atribuição não está excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho.
Pois, “se o patrão autoriza uma falta seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade.” (cfr. Ac. do TSI, de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013).
Face ao expendido e tendo sido dado como provado que o Autor nunca, sem conhecimento e autorização prévia da Ré, deu qualquer falta ao trabalho, este pedido não deixa de se julgar procedente.
Por fim, quanto à compensação da prestação das horas extraordinárias, o nº 1 do artº 10º do DL nº 24/89/M prevê que “Nenhum trabalhador deve normalmente prestar mais do que oito horas de trabalho por dia e quarenta e oito por semana, devendo o período normal de trabalho ser interrompido por um intervalo de duração não inferior a trinta minutos, de modo a que os trabalhadores não prestem mais de cinco horas de trabalho consecutivo”.
Ficou provado que o Autor prestou 16 horas de trabalho para além do seu período normal de trabalho (de 8 horas por dia e 48h por semana), em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo.
Assim, o Autor tem o direito de ser compensado pela prestação de trabalho nestas horas extraordinárias.
Mais se provou que por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno e durante esses 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais.
Serão que esses 30 minutos também contam para o efeito do cômputo da compensação de horas extraordinárias?
Nos termos do nº 4 do artº 10º do DL nº 24/89/M, o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados não é contado para efeitos da prestação das horas extraordinárias, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos diários.
Assim, num primeiro momento e na letra da lei, parece que os referidos 30 minutos não devam ser considerados como horas extraordinárias de trabalho.
Salvo o devido respeito, achamos que a resposta não é tão linear.
Para nós, o legislador prevê simplesmente uma situação de tolerância de 30 minutos para os casos ocasionais de necessidade à preparação para o início do trabalho ou à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados, não tendo portanto qualquer intenção legislativa no sentido de permitir a entidade patronal a transformar como regra, exigindo o trabalhador a comparecer no local de trabalho sempre com antecedência de 30 minutos em todos os dias de trabalho, que é o caso.
Nesta conformidade, esses 30 minutos devem ser contados para o cômputo da compensação da prestação de trabalho em horas extraordinárias.
Porém, como não se sabe o nº de dias de trabalho efectivo do Autor, não é possível determinar, por ora, o quantum da compensação, pelo que a Ré será condenada a pagar ao Autor, a título de compensação do trabalhos prestado em horas extraordinárias no montante que se liquidar em execução da sentença nos termos do nº 2 do artº 564º do CPCM, ex vi do artº 1º do CPT.
B- Recurso do Autor
Face à decisão tomada no recurso da Ré, torna-se desnecessário conhecer do recurso do Autor.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
- conceder provimento parcial ao recurso da Ré, declarando a nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação;
- em substituição do Tribunal recorrido, julgar a acção parcialmente procedente, e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor:
* a quantia de MOP$41.250,00, a título da devolução de comparticipação no alojamento indevidamente descontada;
* a quantia de MOP$55.000,00, a título de subsídio de efectividade;
* subsídio de alimentação, compensação dos dias de descanso semanal, dos dias do descanso compensatório e dos feriados obrigatórios não gozados, bem como da prestação de trabalho em horas extraordinárias, incluindo o período de 30 minutos antes do início de cada turno de trabalho, com montantes a liquidar na execução da sentença;
* juros de mora a partir da data do presente aresto para as quantias certas; e
* absolver da Ré do pedido da atribuição das bonificações ou remunerações adicionais.
- não conhecer o recurso do Autor por desnecessidade.
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Custas pelas partes em ambas as instâncias na proporção do decaimento, atendendo ao resultado da liquidação na execução da sentença.
Notifique e D.N.
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RAEM, aos 27 de Abril de 2017.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
(Votei vencido quanto à fórmula adoptada na compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal e de feriados obrigatórios nos termos e fundamentos já expostos nos processos congéneres.
Provado que o Autor ora recorrente já recebeu da Ré ora sua entidade patronal o salário diário em singelo, para efeitos de cálculo do valor da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal e de feriados obrigatórios, terá que deduzir esse montante pago em singelo.)
1 Este Tribunal já se pronunciou de forma unânime em vários processos laborais de situação similiar (cfr. Procs. nºs 722/2010, 876/2010, 805/2010, 837/2010, 574/2010, 774/2010, 838/2010, etc, de 07/07/2011, 02/06/2011, 30/06/2011, 16/06/2011, 12/05/2011, 19/05/2011 e 16/06/2011, respectivamente) no sentido de que:
- O Contrato de Prestação de Serviço celebrado entre a Ré e a agência de emprego é um contrato a favor de terceiro;
- Este contrato é aplicável à relação laboral estabelecida entre o Autor e a Ré.
- As disposições do DL nº 24/89/M aplicam-se analogicamente para a determinação do quantum indemnizatório.

2 Os Acs. do TSI, de 30/10/2014, Proc. nº 396/2014; de 23/10/2014, Proc. nº 338/2014; de 27/11/2014, Proc. nº 654/2014.

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167/2017