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Processo n.º 14/2017. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: Secretário para a Segurança.
Recorrido: A.
Assunto: Autorização de residência. Antecedentes criminais. Procedimento penal extinto por prescrição.
Data da Sessão: 31 de Maio de 2017.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
Para efeitos do disposto na alínea 1) do n.º 2 do artigo 9.º da Lei n.º 4/2003, não tem antecedentes criminais o julgado e condenado à revelia, em pena de prisão, cujo procedimento penal veio a ser extinto por prescrição.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima


ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A interpôs recurso contencioso de anulação do despacho de 19 de Agosto de 2015, do Secretário para a Segurança, que negou a concessão de autorização de residência temporária do recorrente, com fundamento em que o recorrente foi condenado em pena de prisão pela prática de crimes, que podem constituir ameaça e perigo para a segurança interna e tranquilidade da Região.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 27 de Outubro de 2016, concedeu provimento ao recurso e anulou o acto recorrido, com fundamento em que o procedimento criminal fora extinto por prescrição, pelo que o recorrente não tinha antecedentes criminais.
Inconformado, interpõe o Secretário para a Segurança recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), suscitando as seguintes questões:
   - No caso dos autos, o antecedente criminal efectivamente existe; a sentença condenatória foi efectivamente proferida, por Tribunal competente, e não foi nunca declarada, por qualquer sentença ou outra decisão judicial posterior, a respectiva inexistência ou nulidade.
  - Ou seja, o antecedente criminal em que a Autoridade administrativa se baseou existe efectivamente (não foi nunca apagada do mundo jurídico), e a sentença que o corporizou esteve apta, aliás, a ser executada, mediante os respectivos mandados, desde a data da sua prolação, 2000.05.31, até 13.09.2013.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II – Os factos
O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
O recorrente contencioso, A, possuidor do passaporte de Taiwan, pediu, em 30 de Março de 2015, ao Chefe do Executivo a autorização de residência por motivo de reagrupamento familiar com a mulher e filhos.
O recorrente contencioso casou com a sua mulher, B, em 5 de Outubro de 2004 em Taiwan, China.
O casal tem dois filhos.
Em 27 de Julho de 2015, o Chefe do Serviço de Migração, Substº do CPSP fez a seguinte proposta ao Sr. Comandante do CPSP:
“1. Requerente, do sexo masculino, casado, com 40 anos de idade, nascido em Taiwan, titular do documento de viagem de Taiwan, vem requerer autorização de residência em Macau por motivo de reagrupamento familiar com o seu cônjuge que é titular do bilhete de identidade de residente permanente de Macau.
2. Dos dados constantes do processo e fornecidos pelo Departamento de Informações do CPSP, verifica-se que:
- Em 25 de Agosto de 1998, o requerente foi libertado do Estabelecimento Prisional de Coloane e conduzido a este departamento. Segundo a Informação nº MIGXXX/98 deste departamento, por despacho superior de 26 de Agosto de 1998, o requerente foi repatriado ao local de origem e foi interdito de entrar em Macau pelo período de três anos.
- O requerente foi condenado em 31 de Maio de 2000 pelo Tribunal Judicial de Base na pena de seis anos de prisão, pela prática dos crimes previstos no nº 2 do artº 2º (fazer parte de uma associação ou sociedade secreta ou a apoiar) e na al. h) do nº 1 do artº 1º (exploração ilícita de jogo, de lotarias ou de apostas mútuas, e cartel ilícito para jogo), ambos da Lei nº 6/97/M, pela prática do crime previsto no artº 1º (exploração ilícita de jogo) da Lei nº 8/96/M, e pela prática dos crimes previstos na al. a) do nº 1 do artº 70º (exercício ilegal da actividade de radiodifusão) e nos artºs 12 º e 13º (radiodifusão televisiva e atribuição), todos da Lei nº 8/89/M.
3. Segundo o anterior nº 2, atentos os antecedentes criminais do requerente, não se deve deferir o requerimento em apreço.
4. Realizada a audiência escrita, o requerente apresentou, mediante o seu procurador, alegações escritas e anexos a este serviço.
5. Analisados os documentos apresentados e os motivos alegados pelo requerente na fase de audiência e atenta a gravidade dos crimes cometidos, que podem constituir ameaça e perigo para a segurança interna e intranquilidade da RAEM, bem como com base na análise deste caso (nº 6 da informação), propõe-se o indeferimento do presente pedido de fixação de residência, nos termos do art.º 9, n.º 2, alíneas 1) (antecedentes criminais), da Lei n.º 4/2003.
6. Submete-se à consideração do Sr. Comandante.”
Em 29 de Julho de 2015, o Sr. Comandante do CPSP proferiu o seguinte despacho:
“Concordo. Submete-se à apreciação do Exmo. Sr. Secretário para a Segurança.”
Em 19 de Agosto de 2015, o Sr. Secretário para a Segurança proferiu o seguinte despacho:
“Pelos motivos expostos nesta informação, indefiro o pedido.”
O recorrente contencioso trabalha no escritório do Advogado C desde 16 de Fevereiro de 2015, exercendo as funções de adjunto. A sua mulher e filhos são residentes de Macau e residem aqui.
Os dados no P.A. mostram que o recorrente não compareceu à audiência de julgamento e foi condenado em 31 de Maio de 2000 pelo Tribunal Judicial de Base na pena de seis anos de prisão.
No que concerne aos crimes cometidos, em Setembro de 2013 o Tribunal Judicial de Base declarou extinto o procedimento criminal por força da prescrição e tal extinção foi notificada oportunamente ao CPSP.

III – O Direito
1. Questões a apreciar
Ao recorrente foi negada a autorização de residência em Macau por ter antecedentes criminais.
Trata-se de saber se tem antecedentes criminais o indivíduo condenado à revelia pela prática de crime, em pena de prisão, cujo procedimento criminal veio a ser extinto por prescrição.

2. Condenação à revelia, não transitada em julgado
O arguido foi julgado e condenado, à revelia, pela prática de crimes, em pena de prisão.
A sentença nunca transitou em julgado, em virtude de o arguido não ter sido notificado da sentença condenatória e, entretanto, o procedimento criminal veio a ser extinto por prescrição.
Atente-se que não foi a pena que foi extinta por prescrição. Esta supõe o trânsito em julgado da sentença condenatória. No caso dos autos foi o próprio procedimento penal que foi extinto por prescrição, por nunca ter transitado em julgado a sentença.
Ou seja, a condenação do arguido foi meramente provisória e nunca se tornou definitiva, em virtude de ter sido julgado na sua ausência, dado que, quando se aguardava a notificação do arguido da sentença, decorreu o prazo de prescrição do procedimento criminal, que apagou a sentença condenatória, pelo que, esta, para todos os efeitos, não existe.
O procedimento penal extingue-se por efeito da prescrição (artigo 110.º do Código Penal).
Logo, o arguido não tem antecedentes criminais.
Como refere o parecer do Ex.mo Magistrado do Ministério Público, citando um autor, uma vez prescrito o crime, antes de qualquer decisão transitada em julgado, qualquer solução que o considerasse, de futuro, para efeitos criminais, seria atentatório do princípio da presunção de inocência, previsto no artigo 29.º da Lei Básica.
O acórdão recorrido não merece censura.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso jurisdicional.
Sem custas.
Macau, 31 de Maio de 2017.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa
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Processo n.º 24/2017