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Processo n.º 183/2016
(Recurso contencioso)

Relator: João Gil de Oliveira
   
  Data: 6/Julho/2017
   
Assuntos:
   
   - Indeferimento tácito
   - Prática de acto devido
   - Prescrição do procedimento disciplinar

 SUMÁRIO :
    
    Se se verificarem os pressupostos da prescrição do procedimento disciplinar, tendo o advogado sancionado recorrido judicialmente da aplicação da sanção disciplinar, na sequência do entendimento do tribunal, e requerido a prescrição do procedimento junto do Conselho Superior da Advocacia, mesmo na pendência daquele recurso, há que anular o acto de indeferimento tácito do órgão decisor, relativo ao pedido de prescrição formulado pelo requerente, devendo a entidade recorrida praticar o acto devido de deferimento desse pedido, através da declaração de extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar, estando em causa uma actuação vinculada decorrente da aplicação das regras prescricionais respectivas.
    
              O Relator,




















Processo n.º 183/2016
(Recurso Contencioso)

Data : 6 de Julho de 2017

Recorrente: A

Entidade Recorrida: Conselho Superior da Advocacia

    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
  
   1. O recorrente A, mais bem identificado nos autos, em face do indeferimento tácito resultante do facto de o Conselho Superior da Advocacia não ter proferido decisão sobre o seu pedido de 26 de Junho de 2015 da declaração da extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar dos apensados Processos n.ºs 10/07/CSA e 27/07/CSA, vem, ao abrigo do disposto no artigo 44.º, n.º 3 do Código Disciplinar dos Advogados e artigos 21.º e 24.º do CPAC, interpor para este TSI recurso contencioso do referido indeferimento tácito, pedindo que seja determinada a prática de acto administrativo legalmente devido.
  
   Para tanto, alega em síntese conclusiva:
  
  
  1. O objecto do presente recurso contencioso do indeferimento tácito provém do Processo n.º 49/2015 do TUI, onde o recorrente afirma junto do TUI a existência da circunstância que implique a declaração da extinção, por prescrição, do procedimento dos Processos disciplinares n.ºs 10/07/CSA e 27/07/CSA já apensados, e concorda com o douto entendimento do TUI no outro processo (Processo n.º 37/2015). Pelo que o recorrente pediu ao TUI, em 2 de Julho de 2015, a suspensão do Processo n.º 49/2015, de forma que pedisse oportunamente ao Conselho Superior da Advocacia a prescrição do procedimento disciplinar.
  2. O recorrente deduziu o supradito pedido junto do Conselho Superior da Advocacia em 26 de Junho de 2015, pedindo a declaração da extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar dos Processos n.ºs 10/07/CSA e 27/07/CSA já apensados.
  3. Tendo decorrido mais de metade dum ano sobre a data acima referida, o Conselho Superior da Advocacia não proferiu qualquer decisão quanto ao pedido supracitado.
  4. Nesta fase, o recorrente interpõe recurso contencioso do indeferimento tácito do Conselho Superior da Advocacia observando o despacho proferido pelo Relator do Processo n.º 49/2015 do TUI, a fls. 341 deste.
  5. O presente recurso tem por objecto a falta de decisão pelo Conselho Superior da Advocacia sobre o pedido do recorrente referido no ponto 2.º anterior, que é presumido indeferido tacitamente de acordo com o artigo 102.º do CPAM.
  6. Ao abrigo do disposto no artigo 21.º do CPAC, o indeferimento tácito é recorrível por violação de lei, designadamente o artigo 102.º do CPA.
  7. Ao abrigo do disposto no artigo 33.º do CPAC, o recorrente tem interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso.
  8. Ao abrigo do disposto no artigo 25.º, n.º 2, al. c) e n.º 3 do CPAC, o prazo para interposição do recurso é de 360(sic) dias se se trate de um indeferimento tácito. E o referido prazo não foi ultrapassado de acordo com o artigo 26.º, n.º 4 do CPAC.
  9. Ao abrigo do disposto no artigo 44.º, n.º 1 do Código Disciplinar dos Advogados, das deliberações do Conselho Superior da Advocacia há reclamação para o mesmo órgão no prazo de dez dias a contar da respectiva notificação, se não tiver sido interposto recurso contencioso. Daí que da decisão do Conselho Superior da Advocacia não há recurso hierárquico necessário e a mesma não obsta a interposição directa de recurso contencioso.
  10. Ao abrigo do artigo 44.º, n.º 3 do Código Disciplinar dos Advogados e artigo 36.º, n.º 15 da Lei de Bases da Organização Judiciária, o TSI é competente para conhecer do presente recurso contencioso.
  11. Assim sendo, neste recurso contencioso pede-se, para além da anulação ou da declaração da nulidade do referido acto administrativo de indeferimento tácito, a determinação da prática de acto administrativo legalmente devido.
  12. O Conteúdo da presente impugnação: em 26 de Junho de 2015, o recorrente deduziu junto do Conselho Superior da Advocacia o pedido de declaração da prescrição do procedimento disciplinar.
  13. Tal como se referiu anteriormente, primeiro, nos autos n.º 10/07/CSA, a infracção do recorrente ocorreu em 16 de Outubro de 2006, e a acusação foi notificada, por carta registada, em 25 de Maio de 2007. Por isso, de acordo com o artigo 112.º, n.º 1, al. b) do CPM, a prescrição do referido procedimento disciplinar suspendeu-se a partir desse momento, e a suspensão não podia ultrapassar 3 anos.
  14. O prazo de prescrição reiniciou-se em 25 de Maio de 2010.
  15. Por o procedimento disciplinar prescrever no prazo de três anos a contar da data da infracção, o tempo decorrido, contando-se a partir da data da infracção disciplinar (Outubro de 2006), e suspendendo-se em 25 de Maio de 2007 por causa suspensiva pelo prazo máximo de suspensão, ou seja, três anos, até a data em que o Conselho Superior da Advocacia proferiu a deliberação punitiva (20 de Abril de 2012), não ultrapassa o prazo de prescrição de três anos (contado o prazo de prescrição do procedimento disciplinar de três anos e ressalvado o de suspensão, também de três anos)
  16. Em segundo lugar, nos autos n.º 27/07/CSA, a infracção do recorrente ocorreu no final de Maio ou início de Junho de 2007, e o recorrente foi notificado da respectiva acusação em 6 de Janeiro de 2008 por carta registada. Por isso, de acordo com o artigo 112.º, n.º 1, al. b) do CPM, a prescrição do referido procedimento disciplinar suspendeu-se a partir desse momento, e a suspensão não podia ultrapassar 3 anos.
  17. O prazo de prescrição reiniciou-se em 6 de Janeiro de 2011.
  18. Por o procedimento disciplinar prescrever no prazo de três anos a contar da data da infracção, o tempo decorrido, contando-se a partir da data da infracção disciplinar (1 de Junho de 2006(sic)), e suspendendo-se em 6 de Janeiro de 2008 por causa suspensiva pelo prazo máximo de suspensão, ou seja, três anos, até a data em que o Conselho Superior da Advocacia proferiu a deliberação punitiva (20 de Abril de 2012), não ultrapassa o prazo de prescrição de três anos (contado o prazo de prescrição do procedimento disciplinar de três anos e ressalvado o de suspensão, também de três anos)
  19. Conforme o douto entendimento vertido no Processo n.º 37/2015 do TUI, o procedimento disciplinar extingue-se com a decisão, tal como a instância se extingue com a sentença. O que não quer dizer que o prazo de prescrição do procedimento disciplinar não continue a correr até à formação do caso decidido.
  20. Se tiver havido recurso contencioso da decisão disciplinar, (o prazo de prescrição) coincide com o trânsito em julgado da sentença neste recurso contencioso. Tal como o prazo de prescrição do procedimento criminal continua a correr até ao trânsito em julgado da sentença, salvo casos de suspensão ou interrupção do procedimento.1
  21. A partir da formação do caso decidido da decisão disciplinar ou do trânsito em julgado da sentença começa então a correr o prazo de prescrição da pena [artigos 110.º, 111.º e 114.º, n.º 2, do Código Penal, aplicável por força do artigo 65.º, alínea a) do Código Disciplinar dos Advogados].2
  22. No entanto, conforme o supra referido entendimento vertido no Processo n.º 37/2015 do TUI, o prazo de prescrição em causa continua a correr até ao trânsito em julgado da decisão do recurso contencioso.
  23. Para o recorrente, o final do prazo de prescrição do procedimento disciplinar dos presentes dois autos deve ser o trânsito em julgado da decisão final, mas não o dia em que o Conselho Superior da Advocacia tomou a deliberação punitiva. Antes disso, o prazo de prescrição do procedimento disciplinar ainda estava a correr.
  24. Nos autos n.º 10/07/CSA, a infracção do recorrente ocorreu em 16 ou 17 de Outubro de 2006. De acordo com o artigo 113.º, n.º 3 do CPM, a prescrição do procedimento disciplinar teve lugar em 16 de Abril de 2014 quando, ressalvado o tempo de suspensão, tinha decorrido quatro anos e meio (o prazo de 3 anos acrescido de metade), ou seja, o prazo máximo de prescrição por causa da interrupção.
  25. Nos autos n.º 27/07/CSA, a infracção do recorrente ocorreu em 1 de Junho de 2007. De acordo com o artigo 113.º, n.º 3 do CPM, a prescrição do procedimento disciplinar teve lugar em 1 de Dezembro de 2014 quando, ressalvado o tempo de suspensão, tinha decorrido quatro anos e meio (o prazo de 3 anos acrescido de metade), ou seja, o prazo máximo de prescrição por causa da interrupção.
  26. Tal matéria superveniente teve lugar após a tomada da respectiva deliberação pelo Conselho Superior da Advocacia e trata-se de causa de extinção de procedimento, por já ter decorrido o prazo máximo de prescrição do procedimento disciplinar dos referidos dois processos.
  27. Afigura-se ao recorrente que a respectiva prescrição deveria ter tido lugar de acordo com a lei acima referida.
  28. Dado que o recorrente suscitou, em 26 de Junho de 2015, a questão de prescrição do procedimento disciplinar ao Conselho Superior da Advocacia, mas este não tomou qualquer decisão, cabe ao recorrente apenas interpor o presente recurso contencioso em face deste indeferimento tácito.
  29. Nestes termos, o recorrente pede ao Venerando TSI que, de acordo com os artigos 21.º e 24.º do CPAC, julgue procedente o recurso, anulando ou declarando nulo o acto administrativo de indeferimento tácito, e determinando a prática de acto administrativo legalmente devido, isto é, a declaração da extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar dos Processos n.ºs 10/07/CSA e 27/07/CSA já apensados.

    2. CONSELHO SUPERIOR DA ADVOCACIA (doravante designado por CSA), entidade Recorrida nos autos do processo de recurso contencioso à margem referenciados, em que é recorrente A, veio apresentar as suas ALEGAÇOES, dizendo, no essencial:
    Não é a primeira vez que o recorrente vem invocar a prescrição dos procedimentos disciplinares, cuja decisão põe agora em causa (processos n.ºs 10/07/CSA e 27/07/CSA).
    Na verdade, o recorrente já suscitou esta mesma questão em sede de recurso contencioso para este Exmo. Tribunal de Segunda Instância (TSI), no processo de recurso contencioso n.º 114/2013, bem como no recurso que interpôs da decisão proferida em tais autos, e que correu termos no Tribunal de Última Instância (TUI), sob o n.º 49/2015.
    (…)
    Como bem se vê, a questão da prescrição, no que à decisão proferida nos procedimentos disciplinares 10/07/CSA e 27/07/CSA diz respeito, já é uma questão decidida, pelo que estamos perante uma excepção de caso julgado formal e material.
    Assim sendo, nos termos do disposto no art. 231°, do Código do Processo Civil (CPC), aqui aplicável ex vi do disposto no art. 1.° do CPAC, tal obsta a que o recorrente possa interpor outra acção sob o mesmo objecto.
    Este facto, bem como o facto de o recorrente vir apresentar novo recurso contencioso, com base numa "nova versão" quanto à invocação de tal prescrição, configura uma manifesta má-fé processual, nos termos do disposto no art. 385.°, n.º 2, alíneas a) e d), também do Código do Processo Civil (CPC), aqui aplicável ex vi do disposto no art. 1.° do CPAC,
    Pelo qual deverá o recorrente ser exemplarmente condenado em multa, nos termos do disposto do n.º 1 da citada norma do CPC.
    Mas ainda que assim não se entenda,
    Segundo refere o próprio recorrente, o presente recurso versa sobre o indeferimento tácito da reclamação por ele apresentada ao CSA, invocando a prescrição do procedimento disciplinar sobre as infracções por ele cometidas, e que deram azo aos processos 10/07/CSA e 27/07/CSA, nos quais veio a ser-lhe imposta uma pena de multa, em cúmulo jurídico.
    Ainda segundo o próprio afirma, tais infracções terão sido cometidas, respectivamente, em 16 de Outubro de 2006 (proc. n.º 10/07/CSA), e finais de Maio de 2007 (proc. n.º 27/07/CSA).
    Tal e como havíamos já referido na Contestação apresentada no processo de recurso contencioso 114/2013, que versou sobre o acórdão e deliberação do CSA proferidos nesses mesmos processos, a entidade recorrida refuta o entendimento de que ao procedimento disciplinar dos advogados seja aplicável o Código do Procedimento Administrativo (doravante "CPA"), desde logo, porque o direito supletivo que lhe é aplicável encontra-se expressamente previsto no art. 65.º do Código Disciplinar dos Advogados (doravante "CDA").
    Ora, relativamente à questão do prazo para indeferimento tácito da reclamação sobre Acórdão e deliberação do CSA, dispõe especificamente a norma do n.º 2 do art. 44.º do Código Disciplinar dos Advogados (doravante "CDA"), que, para todos os efeitos, sempre constitui norma especial sobre esta questão jurídica - até para efeitos do , disposto no art. 102.°, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo, invocada pelo recorrente.
    Assim sendo, o prazo para apresentação de reclamação das deliberações do CSA, é de 10 (dez) dias - art. 44.°, n.º 1, do CDA.
    Findo este prazo, o CSA tem, então, o prazo de 20 (vinte) dias para proferir decisão sobre a reclamação apresentada, findo o qual será a mesma considerada indeferida (tacitamente) - art. 44.°, n.º 2 do CDA.
    E após o termo deste prazo de 20 (vinte) dias, que é efectivamente de indeferimento tácito da reclamação, o interessado teria o prazo de 10 (dez) dias para recorrer contenciosamente de tal indeferimento - art. 44.°, n.º 3, do CDA.
    Esta norma do art. 44.°, n.º 3, do CDA, também constitui lei especial relativamente ao disposto no art. 25.°, n.º 2, alínea c), e n.º 3, do CPAC, que o recorrente entende ser aplicável no presente caso.
    Acresce que,
    O recorrente, mesmo entendendo que a prescrição ocorreu a 16 de Abril de 2014 e a 1 de Dezembro de 2014, para cada um dos procedimentos disciplinares - vide conclusões n.ºs 24 e 25 da sua petição de recurso - veio a apresentar reclamação escrita ao CSA, invocando esta questão, apenas em 26 de Junho de 2015. Ou seja, apenas mais de seis meses após o termo do último daqueles prazos, em clara violação do disposto no art. 44.°, n.º 1, do CDA.
    Apresentada tal reclamação, e muito tempo após a prolação do Acórdão proferido nos autos do recurso que correu termos no TUI, sob o n.º 49/2015, vem então o recorrente apresentar, em 29 de Março de 2016, o presente recurso do indeferimento tácito, indeferimento tácito esse, ocorrido 20 dias depois da apresentação da sua reclamação - art. 44.°, n.º 2, do CDA - ou seja em 16 de Julho de 2015, e do qual deveria ter recorrido contenciosamente no prazo de 10 dias após tal data - art. 44.°, n.º 3, do CDA - ou seja, até 26 de Julho de 2015.
    (…)
    Porém, o recorrente, na qualidade de advogado que fez o estágio e nele frequentou o módulo de Deontologia Profissional, não ignorava, nem podia ignorar, a existência de tais normas - as do art. 44.° do CDA.
    Parece-nos, pois, que também aqui é manifesta a litigância de má-fé do recorrente, devendo o mesmo ser exemplarmente condenado na multa correspondente, conforme o disposto nas normas do art. 385.°, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e d) do CPC, aqui aplicável por via do art. 1.º do CPAC.
    Termos em que,
    devem ser julgadas procedentes as excepções acima invocada, de caso julgado e de extemporaneidade do presente recurso e, em consequência, deve o presente recurso contencioso ser julgado totalmente improcedente.
    Mais, deve o recorrente ser exemplarmente condenado como litigante de má-fé, no pagamento de multa, nos termos do disposto nas normas do art. 385.°, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e d) do CPC, ex vi do disposto no art. 1.º do CPAC.

3. A deu resposta oportuna às excepções suscitadas.

  4. A apresentou alegações facultativas, concluindo:

1. O indeferimento tácito posto em causa pelo recurso contencioso sub judice deriva dos autos de recurso contencioso do Tribunal de Última Instância, n.º 49/2015. O recorrente manifestou ao TUI que no âmbito do processo disciplinar n.º 10/07/CSA e apenso n.º 27/07/CSA, existiam circunstâncias que conduziram à prescrição do procedimento disciplinar, e concordou com o douto entendimento do TUI no processo n.º 37/2015: “Quando o prazo de prescrição do procedimento disciplinar se completa na pendência do recurso contencioso daquela decisão, cabe ao Conselho Superior de Advocacia suscitar declarar a prescrição do procedimento disciplinar.” Por isso, em 2 de Julho de 2015, veio o ora recorrente solicitar ao TUI que fosse suspenso o processo de recurso contencioso n.º 49/2015, para ele requerer, tempestivamente, ao Conselho Superior de Advocacia a declaração de prescrição do respectivo procedimento disciplinar.
2. O recorrente apresentou o referido requerimento ao Conselho Superior de Advocacia no dia 26 de Junho de 2015, solicitando a este que se declarasse a prescrição do procedimento disciplinar, em virtude de existirem no processo disciplinar n.º 10/07/CSA e apenso n.º 27/07/CSA circunstâncias que conduziram à prescrição.
3. Decorrido mais de meio ano desde 26 de Junho de 2015, o Conselho Superior de Advocacia, até à presente data, ainda não tomou nenhuma decisão relativamente ao requerimento acima aludido.
4. Ora, de acordo com o despacho do Mm.º Juiz Relator do TUI, a fls. 341 dos autos do recurso contencioso n.º 49/2015, vem o recorrente interpor recurso contencioso do indeferimento tácito do Conselho Superior de Advocacia.
5. O acto recorrido é a falta de decisão pelo Conselho Superior de Advocacia sobre o requerimento do recorrente mencionado acima no número 2.º, a qual, nos termos do art.º 102.º do CPA, faz presumir indeferido o requerimento.
6. Segundo o art.º 21.º do CPAC, o indeferimento tácito é recorrível, por violar a lei, em particular o art.º 102.º do CPA.
7. À luz do art.º 33.º do CPAC, o recorrente tem interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso contencioso.
8. De harmonia com o art.º 25.º, n.º 2, al. c) e n.º 3 do CPAC, o prazo de recurso é de 360 dias, quando se esteja perante um indeferimento tácito. Atento o disposto no art.º 26.º, n.º 4 do mesmo diploma legal, ainda não decorreu o prazo para interposição de recurso contencioso do indeferimento tácito.
9. Em consonância com o art.º 44.º, n.º 1 do Código Disciplinar dos Advogados, das deliberações do Conselho há reclamação para o mesmo órgão no prazo de dez dias a contar da respectiva notificação, se não tiver sido interposto recurso contencioso, o que demonstra que as deliberações do Conselho Superior de Advocacia não são objecto de recurso hierárquico necessário, sendo, deste modo, susceptíveis de recurso contencioso.
10. Nos termos do art.º 44.º, n.º 3 do Código Disciplinar dos Advogados, conjugado com o art.º 36.º, n.º 15 da Lei de Bases da Organização Judiciária, o TSI é o órgão judicial competente para julgar o recurso contencioso vertente.
11. Nesta conformidade, no presente recurso contencioso, além do pedido de anulação ou de declaração de nulidade do acto administrativo de indeferimento tácito, solicita-se simultaneamente a determinação da prática de acto administrativo legalmente devido.
12. Conteúdo da impugnação: no dia 26 de Junho de 2015, o ora recorrente requereu ao Conselho Superior de Advocacia que fosse declarada a prescrição do procedimento disciplinar.
13. Como se referiu acima, em primeiro lugar, no processo n.º 10/07/CSA, a infracção disciplinar imputada ao recorrente teve lugar em 16 de Outubro de 2006, e o recorrente foi notificado da respectiva acusação em 25 de Maio de 2007 por carta registada com aviso de recepção. Assim sendo, conforme o art.º 112.º, n.º 1, al. b) do Código Penal, a prescrição deste procedimento penal suspendeu-se desde então, por período não superior a 3 anos.
14. A prescrição apenas voltou a correr a partir de 25 de Maio de 2010.
15. O prazo de prescrição do procedimento disciplinar instaurado contra advogado se completa quando tiverem decorrido 3 anos sobre a prática da infracção disciplinar. In casu, o prazo de prescrição de 3 anos começou a correr no dia da consumação da respectiva infracção disciplinar (Outubro de 2006), e suspendeu-se, por verificada uma causa de suspensão, desde 25 de Maio de 2007 até ao fim de 3 anos, período máximo de suspensão permitido. À data da deliberação punitiva do Conselho Superior de Advocacia (20 de Abril de 2012), o tempo decorrido ainda não tinha completado o prazo de prescrição de 3 anos (ou seja, conta-se o prazo de prescrição de 3 anos, ressalvando-se os 3 anos de suspensão).
16. Em segundo lugar, no processo n.º 27/07/CSA, a infracção disciplinar imputada ao recorrente ocorreu no final de Maio ou início de 2007, tendo o recorrente sido notificado da acusação no dia 6 de Janeiro de 2008 por carta registada com aviso de recepção. Portanto, conforme o art.º 112.º, n.º 1, al. b) do Código Penal, a prescrição deste procedimento penal suspendeu-se desde então, por período não superior a 3 anos.
17. A prescrição apenas voltou a correr a partir de 6 de Janeiro de 2011.
18. O prazo de prescrição do procedimento disciplinar instaurado contra advogado se completa quando tiverem decorrido 3 anos sobre a prática da infracção disciplinar. In casu, o prazo de prescrição de 3 anos começou a correr no dia da consumação da respectiva infracção disciplinar (1 de Junho de 2006), e suspendeu-se, por verificada uma causa de suspensão, desde 6 de Janeiro de 2008 até ao fim de 3 anos, período máximo de suspensão permitido. À data da deliberação punitiva do Conselho Superior de Advocacia (20 de Abril de 2012), o tempo decorrido ainda não tinha completado o prazo de prescrição de 3 anos (ou seja, conta-se o prazo de prescrição de 3 anos, ressalvando-se os 3 anos de suspensão).
19. Conforme manifestado pelo Venerando TUI no processo n.º 37/2015, o procedimento disciplinar extingue-se com a decisão, tal como a instância se extingue com a sentença. O que não quer dizer que o prazo de prescrição do procedimento disciplinar não continue a correr até à formação do caso decidido.
20. Se tiver havido recurso contencioso da decisão disciplinar, o termo do prazo de prescrição do procedimento penal coincide com o trânsito em julgado da sentença neste recurso contencioso. Tal como o prazo de prescrição do procedimento criminal continua a correr até ao trânsito em julgado da sentença, salvo casos de suspensão ou interrupção do procedimento.3
21. A partir da formação do caso decidido da decisão disciplinar ou do trânsito em julgado da sentença começa então a correr o prazo de prescrição da pena [artigos 110.º, 111.º e 114.º, n.º 2, do Código Penal, aplicável por força do artigo 65.º, alínea a) do Código Disciplinar dos Advogados].4
22. Todavia, de acordo com o aludido entendimento do TUI no processo n.º 37/2015, os prazos de prescrição em análise continuam a correr até ao trânsito em julgado da sentença.
23. Na opinião do recorrente, nos dois processos disciplinares sub judice, o termo do prazo de prescrição do respectivo procedimento disciplinar deve coincidir com o trânsito em julgado da sentença final, mas não com a data da decisão punitiva do Conselho Superior de Advocacia, sendo que o prazo prescricional continua a correr até ao trânsito em julgado da sentença.
24. Com base nisto, no âmbito do processo n.º 10/07/CSA, tendo a infracção disciplinar imputada ao recorrente ocorrido em 16 ou 17 de Outubro de 2006, em conformidade com o art.º 113.º, n.º 3 do Código Penal de Macau, a prescrição do procedimento disciplinar teria sempre lugar no dia 16 de Abril de 2014, quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, havia decorrido o prazo máximo de quatro anos e meio (o prazo de prescrição de três anos acrescido de metade), aplicável por interrupção da prescrição.
25. De forma igual, no âmbito do processo n.º 27/07/CSA, tendo a infracção disciplinar imputada ao recorrente ocorrido em 1 de Junho de 2006, em conformidade com o art.º 113.º, n.º 3 do Código Penal de Macau, a prescrição do procedimento disciplinar teria sempre lugar no dia 1 de Dezembro de 2014, quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, havia decorrido o prazo máximo de quatro anos e meio (o prazo de prescrição de três anos acrescido de metade), aplicável por interrupção da prescrição.
26. Essa matéria de facto superveniente, posterior à respectiva deliberação do Conselho Superior de Advocacia, constitui causa de extinção do procedimento, na medida em que em ambos os processos disciplinares, já decorreu o prazo máximo de prescrição.
27. Do ponto de vista do recorrente, consoante as disposições legais supracitadas, os prazos de prescrição em apreço têm que ter sido completados.
28. Segundo o entendimento do Venerando TUI, compete e só compete ao Conselho Superior de Advocacia conhecer, oficiosamente, a questão da prescrição do procedimento disciplinar ora em causa.
29. O recorrente suscitou, no dia 26 de Junho de 2015, a questão da prescrição do procedimento disciplinar perante o Conselho Superior de Advocacia, mas este não tomou nenhuma decisão. Face ao indeferimento tácito da sua pretensão, o recorrente não tinha alternativa senão interpor o presente recurso contencioso.
30. Mesmo no decorrer deste recurso contencioso, o Conselho Superior de Advocacia, após regularmente citado pelo Venerando TSI, continua sem tomar decisão acerca da questão da prescrição do procedimento disciplinar.
31. Portanto, o recorrente vem solicitar ao Venerando TSI que, conceda provimento ao presente recurso contencioso ao abrigo do disposto nos art.ºs 21.º e 24.º do CPAC e, por conseguinte, anule ou declare nulo o acto administrativo de indeferimento tácito, e determine a prática do acto administrativo legalmente devido, que seria declarar extinto o procedimento disciplinar por ter decorrido o prazo de prescrição no processo n.º 10/07/CSA e apenso n.º 27/07/CSA.
5. O Digno Magistrado do MP oferece douto parecer, nos termos que adiante se irão transcrever.
    

II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito.
    
    III - FACTOS
Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:
- Em 15/12/2006, o Conselho Superior da Advocacia deliberou instaurar processo disciplinar contra o Recorrente sob a forma de inquérito sob o nº 10/07/CSA.
- Em 06/02/2007, o Recorrente foi notificado da abertura da instrução do processo disciplinar.
- Em 21/03/2007, o Recorrente prestou declarações na qualidade de arguido.
- Em 22/05/2007, o instrutor do processo deduziu acusação contra o Recorrente.
- O Recorrente foi notificado da acusação por carta registada de 25/05/2007 para, querendo, apresentar a defesa por escrito no prazo de 10 dias.
- Em 18/06/2007, a Recorrente apresentou defesa por escrito.
- Em 03/07/2007, o instrutor do processo disciplinar elaborou o relatório final, submetendo-o à aprovação do Conselho Superior da Advocacia.
- Em 08/06/2007, o Conselho Superior da Advocacia deliberou instaurar processo disciplinar contra o Recorrente sob a forma de inquérito sob o nº 27/07/CSA.
- Por carta registada de 26/06/2007, notificou-se o Recorrente da abertura da instrução do processo disciplinar.
- Em 17/12/2007, o instrutor do processo deduziu acusação contra o Recorrente.
- O Recorrente foi notificado da acusação por carta registada de 03/01/2008 para, querendo, apresentar a defesa por escrito no prazo de 10 dias.
- Em 14/01/2008, o Recorrente apresentou defesa a por escrito, requerendo a inquirição de 4 testemunhas arroladas.
- Em 23/01/2008, foram inquiridas as testemunhas arroladas.
- Em 13/02/2008, o instrutor do processo disciplinar elaborou o relatório final, submetendo-o à aprovação do Conselho Superior da Advocacia.
- Em 20/04/2012, o mesmo Conselho deliberou por unanimidade o seguinte acórdão:

“ ACÓRDÃO
    Acordam os membros do Conselho Superior de Advocacia no processo disciplinar comum n.º 10/07/CSA e apenso n.º 27/07/CSA, em que é arguido o Dr. A, advogado-estagiário (actualmente advogado), ora com escritório em Macau, na Avenida XX, n.º XX, Edifício XX, XX.º andar XX.

PROCESSO N.º 10/07/CSA
I
Instrução
    O presente processo teve origem na queixa, identificada nos presentes autos a fls. 13 e seguintes, apresentada contra o Sr. Dr. A pelo interessado B.
    Analisada a participação que lhe foi dirigida, deliberou este Conselho instaurar processo de inquérito, nos termos do artigo 51.º do Código Disciplinar dos Advogados.
    Oportunamente deu o Exmo. Senhor Instrutor cumprimento ao disposto no artigo 21.º do Código Disciplinar dos Advogados (fls.13).
    Notificado para se pronunciar, a fls. 29, sobre a matéria dos autos, o participado apresentou a resposta de fls. 38 e seguintes, onde negou os factos.
    Finda a instrução, o Exmo. Senhor Instrutor emitiu o PARECER, de fls. 80 e seguintes, no sentido da dedução de acusação, o qual mereceu acolhimento por parte deste Conselho, como resulta de fls. 89 e 90.

II
Acusação
    Em cumprimento do deliberado por este Conselho, foi proferido o despacho de acusação, a fls. 92 e seguintes:
Despacho de Acusação
    Seguirá aforma de Processo Comum.
    Proceda à necessária alteração.
__ x __
    Contra o arguido Sr. Dr. A, Advogado Estagiário, com domicílio profissional na Rua de XX, Edifício XX, XX° andar- XX, Macau, profiro o seguinte despacho de Acusação:
    1º
    Por despacho judicial proferido no dia 5 de Julho de 2006 no âmbito do Processo CR1-05-0153 PCS do 1° juízo Criminal, (acidente de viação) o Colega arguido Advogado Estagiário foi nomeado patrono oficioso do participante, ofendido nesses Autos, com o fim de deduzir pedido cível em representação deste.
    2º
    Notificado desse despacho, o Colega arguido consultou aqueles autos.
    3º
    Todavia em vez de deduzir o pedido cível em vista do qual tinha sido nomeado patrono, o Colega arguido entendeu requerer ao Meritíssimo juiz do processo que fosse revogado o patrocínio concedido e liberto do encargo que lhe havia sido cometido.
    4º
    1) Fundamentou esses pedidos nas seguintes razões:
    a) "Lida a certificação da situação económica da vítima constante da página. 74 dos autos, julgo que não se deve dar apoio judiciário à vítima;"
    b) "Na referida certificação, obviamente se lê que a vítima é funcionário público, com um rendimento líquido mensal no valor de MOP$14,768.80, ele tem 14 meses de remuneração mensal como é funcionário público, além disso, o depósito de todas as contas da vítima totaliza-se no valor de MOP$40,000.00;"
    c) "Entretanto, na referida certificação da situação económica, não se revela que a vítima tem grande encargo económica, por isso, ele, absolutamente, tem capacidade económica suficiente para pagar todas as custas processuais deste processo."
    
    5°
    O respectivo requerimento acabou por ser indeferido. No respectivo despacho judicial escreveu-se, o seguinte: .
    "Segundo as informações constantes destes autos, a família do Requerente B é composta por três membros, ele próprio, umfilho e uma filha, com 6 anos e 10 anos respectivamente. A família tem um rendimento mensal total no valor de MOP14,768.80, destinado a sustentar a vida familiar. Segundo as informações sobre as despesas familiares fornecidas pelo Requerente B (c.f. P. 82 a P.100), o Requerente gasta mensalmente, em média, cerca de MOP$7,000 para alimentar os filhos e para sustentar a própria vida. Além disso, o Requerente paga MOP$4,500 para empregar uma criada para cuidar os filhos, paga mensalmente a quantia de MOP$2,800 para a amortização de encargos com a moradia. Assim, as despesas gerais da família totalizam-se no valor de MOP$14,300 por mês, Tendo em vista da actual situação económica de Macau, o Juízo entende que as despesas atrás enumeradas são razoáveis e adequadas.
    Pelo exposto, pode-se saber que todos os rendimentos mensais do Requerente podiam apenas cobrir as despesas gerais da família.
    Toda a gente sabe que os honorários de advogados para proceder a acção cível não são baixos, geralmente, os honorários de advogados chegam mais de dez mil, se o caso for complicado ou o montante requerido for elevado, os honorários de advogados serão mais elevados.
    Assim, tendo em vista que as feridas do Requerente descritas na acusação são graves, estima-se que o valor de indemnização requerida será elevado, pelo que os honorários de advogados serão, correspondentemente, elevados.
    Tendo em consideração que o Requerente tem apenas mais de 40 mil patacas de depósito e os seus rendimentos mensais podem apenas sustentar as despesas gerais da família, este Juízo entende que o Requerente, realmente, tem insuficiência de capacidade económica, relativamente à contratação de advogado para proceder a acção cível.
    Por isso, este Juízo não aceita o requerimento de escusa do Dr. A Advogado Estagiário e a decisão sobre a concessão de apoio judiciário ao Requerente mantém-se."
    6°
    Este despacho de indeferimento foi notificado ao Colega arguido (fls. 62 - 5) e também ao participante (fls. 11 e 25).
    7º
    Recebida a notificação, o participante apressou-se a entrar em contacto com o Escritório do Colega arguido, o que fez no dia 9 de Outubro de 2006.
    8º
    Fê-lo com o objectivo de ter oportunidade de conferenciar com o Colega arguido o qual, porém, informou-o, através dum empregado do Escritório, que, por falta de tempo, só o podia receber no dia 16 do mês seguinte, ou seja numa data muito próxima do termo do prazo de 10 dias, destinado a dedução do pedido cível.
    9º
    Na data aprazada, o participante conferenciou, efectivamente, com o Colega participado no Escritório deste.
    10°
    O participante fazia-se acompanhar de vários documentos justificativos de alguns danos patrimoniais por ele sofridos, entre os quais vários recibos das despesas médicas e medicamentosas e as tidas com a hospitalização a qual teve que se socorrer, tudo isso em consequência do acidente de viação de que foi vítima.
    11°
    O Colega arguido, porém, recusou-se a receber essa documentação, exigindo que o participante fizesse a soma dos valores constantes desses recibos e lhe indicasse o total dessas despesas.
    12°
    No dia 17 de Outubro, o participante deslocou-se, novamente, ao Escritório do Colega arguido a fim de proceder a entrega desses documento, o que não conseguiu concretizar, por terem sido novamente rejeitados.
    13°
    Além da exigência referida não artigo 11º, o Colega arguido entendeu exigir também que o participante indicasse o montante certo que pretendia fosse pedido ao Tribunal a título de indemnização por danos não patrimoniais.
    14°
    A essas duas determinações respondeu o participante, esclarecendo que não possui conhecimentos suficientes para dar satisfação as exigências feitas.
    15°
    Esta resposta deixou insatisfeito o Colega arguido o qual por isso teve uma pequena discussão com o participante.
    16°
    Um advogado ou patrono oficioso que tem a seu cargo a dedução dum pedido cfvel no âmbito dum processo-crime por acidente de viação tem o dever de, antes de mais, conhecer as circunstâncias em que ocorreu o sinistro.
    17º
    O Colega arguido cumpriu esse dever consultando o processo em causa e conversando com o participante chegando a conclusão de que o acidente era da responsabilidade do outro interveniente.
    18°
    Além disso, para estar habilitado a deduzir um pedido dessa natureza, um advogado ou patrono oficioso tem de diligenciar no sentido de obter informações que permitam determinar o valor dos danos patrimoniais sofridos pelo lesado, ocupando nelas um lugar de destaque as constantes de quaisquer documentos respeitantes a essa matéria, designadamente de recibos relativos às despesas médicas, medicamentosas e de hospitalização.
    19°
    Ora o Colega arguido, recusando-se a aceitar esses documentos e transferindo para o participante a obrigação de encontrar o total dessas despesas, desprezou, por completo, algumas informações úteis e até necessárias que o habilitariam a proceder ao cômputo desses danos, colocando-se, por outro lado, na situação de vir a ficar privado de produzir a necessária prova no prazo legal, dado o disposto no artigo 68° do Código de Processo Penal.
    20º
    A indicação do valor dos danos morais não está dependente da vontade ou do arbítrio do ofendido.
    21º
    Antes, a determinação desse valor terá de ser feita de harmonia com as situações experimentadas, física e psicologicamente, pelo lesado em consequência do sinistro mas tomando-se em linha de conta os critérios de natureza legal (v. g. artigo 489 do Código de Processo Civil) e as diversas orientações que a Jurisprudência, designadamente da RA.E.M., tem vindo a adoptar sobre a matéria, questões essas as quais um leigo em direito é estranho.
    22º
    O comportamento do Colega arguido, atrás descrito, provocou a quebra da relação de confiança que deve existir entre o patrono e o patrocinado e levou o participante a requerer ao Meritíssimo Juiz daqueles autos que fosse designado novo patrono em substituição do Colega arguido, pedido que veio a ser deferido.
    Com o mesmo comportamento, violou o Colega arguido os deveres previstos nos artigos 3º, 11º, n.º 1 e 16º, n.º 2 do Código Deontológico.
- X -
    Notifique o colega arguido, enviando cópia.
- X -
    Prazo para a defesa: 10 dias
- X -
    Solicite e junte o extracto do registo disciplinar do colega arguido.
- X -
    Dê-se conhecimento à Exma Presidente do C.S.A., enviando cópia.
    (a) Salvador Coutinho de Figueiredo


III
Defesa
    Notificado da acusação, como resulta de fls. 101 a 104, que se dá por integralmente reproduzida, o arguido veio a defender-se, nos termos constantes de fls. 116 e seguintes.

IV
Relatório Final
    Não havendo mais diligências a realizar, o Exmo. Senhor Instrutor elaborou o seguinte Relatório Final de fls. 123:
    Foi com base numa queixa apresentada pelo interessado B, identificado a fls. 47 que o presente processo disciplinar foi mandado instaurar contra o colega-Estagiário Sr. Dr. A.
    Finda a instrução foi emitido o necessário Parecer o qual mereceu a concordância desse Conselho Superior da Advocacia.
    Na sequência do deliberado por esse Conselho Foi então proferido o despacho de acusação, nos termos constantes de fls. 92 a 99. Na sua defesa, o colega arguido alega "não ser verdade que tenha havido recusa no recebimento dos documentos de despesas que lhe foram apresentados pelo seu então patrocinado" e adianta a seguinte justificação:
    a) O que realmente aconteceu foi que, porque se tratava de um considerável volume de documentos, os quais implicavam o dispêndio do tempo para fazer a respectiva soma, o ora contestante solicitou ao seu patrocinado que o ajudasse a proceder a tal contabilização;
    b) Quiçá porque o contestante tinha já antes apresentado um requerimento de escusa do patrocínio, com fundamento na falta de preenchimento do requisito de insuficiência económica do requerente do apoio judiciário, este, mal disposto, ausentou-se do escritório do patrono do contestante, recusando-se a prestar-lhe tal colaboração;
    c) O que afectou, de algum modo, a relação de confiança que se deveria ter estabelecido entre o contestante e o patrono;
    d) O contestante atravessava, à data dos fatos, um período difícil, pois esteve envolvido, entre 30 de Setembro e 14 de Outubro de 2006 na preparação das provas escritas de fim do estágio-conforme se pode comprovar na A.A.M.
    e) Havendo a nomeação oficiosa em questão (na sua segunda fase, após o indeferimento do pedido de escusa por si apresentado) ocorrido numa fase de alguma desconcentração do seu trabalho ê em que tinha obtido dispensa de comparência no escritório do seu patrono, justamente para a preparação dos exames;
    f) Havendo, imediatamente após a realização das provas escritas, iniciado a preparação das orais que, inicialmente previstas para Novembro daquele ano, vieram a ser realizadas em Janeiro do ano seguinte.
    Não obstante as explicações que ficam referidas, as quais não vieram a ser confirmadas, por nenhuma diligência probatória ter sido requerida, o Colega arguido reconhece que "a factualidade apurada permite a identificação de falta de cuidado e de zelo no modo como agiu, não tendo preparado o pedido cível para que fora oficiosamente mandatado".
    Invocando a seu favor:
    a) "O quadro de ocupação em que se encontrava, por virtude da proximidade das provas de exame final de estágio e alguma inexperiência que lhe não permitiu ter dado um tratamento diferente à incumbência que lhe foi atribuída;"
    b) A ausência de prejuízos para o participante;
    c) O facto de a falha observada estar absolutamente em contraste com o modo de estar do contestante no exercício da profissão pois, alvo de considerável número de nomeações oficiosas, nunca ocorrera uma situação idêntica} que tenha conduzido à rotura na relação advogado / patrocinado;
    d) A circunstância de não ter antecedentes nem circunstâncias agravantes.
    e) O facto de ter sabido retirar a devida lição da situação determinativa do presente processo disciplinar} pede que lhe seja dispensada a aplicação da pena.
- X -
    A prova existente nos autos permite confirmar o teor da acusação.
    Assim dá-se como estabelecido o seguinte:
    Por despacho judicial proferido no dia 5 de Julho de 2006 no âmbito do Processo CR1-05-0153 PCS do 1° juízo Criminal, (acidente de viação) o Colega arguido Advogado Estagiário foi nomeado patrono oficioso do participante, ofendido nesses Autos, com o fim de deduzir pedido cível em representação deste.
    Notificado desse despacho, o Coleqa arguido consultou aqueles autos.
    Todavia em vez de deduzir o pedido cível em vista do qual tinha sido nomeado patrono, o Colega arguido entendeu requerer ao Meritíssimo juiz do processo que fosse revogado o patrocínio concedido e liberto do encargo que lhe havia sido cometido.
    Fundamentou esses pedidos nas seguintes razões:
    a) "Lida a certificação da situação económica da vítima constante da página 74 dos autos, julgo que não se deve dar apoio judiciário à vítima;"
    b) "Na referida certificação, obviamente se lê que a vítima é funcionário público, com um rendimento líquido mensal no valor de MOP14,768.80, ele tem 14 meses de remuneração mensal como é funcionário público, além disso, o depósito de todas as contas da vítima totaliza-se no valor de MOP40,000.00;"
    c) "Entretanto, na referida certificação da situação económica, não se revela que a vítima tem grande encargo económica, por isso, ele, absolutamente, tem capacidade económica suficiente para pagar todas as custas processuais deste processo."
    O respectivo requerimento acabou por ser indeferido. No respectivo despacho judicial escreveu-se, o seguinte:
    "Segundo as informações constantes destes autos, a família do Requerente B é composta por três membro, ele próprio, um filho e uma filha, com 6 anos e 10 anos respectivamente. A família tem um rendimento mensal total no valor de MOP14,768.80, destinado a sustentar a vida familiar.
    Segundo as informações sobre as despesas familiares fornecidas pelo Requerente B (c.f. p. 82 a p.100), o Requerente gasta mensalmente, em média, cerca de MOP7,000 para alimentar os filhos e para sustentar a própria vida. Além disso, o Requerente paga MOP4,500 para empregar uma criada para cuidar os filhos, paga mensalmente a quantia de MOP$2,800 para a amortização de encargos com a moradia.
    Assim, as despesas gerais da família totalizam-se no valor de MOP14,300 por mês, Tendo em vista da actual situação económica de Macau, o juízo entende que as despesas atrás enumeradas são razoáveis e adequadas.
    Pelo exposto, pode-se saber que todos os rendimentos mensais do Requerente podiam apenas cobrir as despesas gerais da família.
    Toda a gente sabe que os honorários de advogados para proceder a acção cível não são baixos, geralmente, os honorários de advogados chegam mais de dez mil, se o caso for complicada ou o montante requerido for elevado, os honorários de advogados serão mais elevados.
    Assim, tendo em vista que as feridas do Requerente descritas na acusação são graves, estima-se que o valor de indemnização requerida será elevado, pelo que os honorários de advogados serão, correspondentemente, elevados.
    Tendo em consideração que o Requerente tem apenas mais de 40 mil patacas de depósito e os seus rendimentos mensais podem apenas sustentar as despesas gerais da família, este Juízo entende que o Requerente, realmente, tem insuficiência de capacidade económica, relativamente à contratação de advogado para proceder a acção cível.
    Por isso, este juízo não aceita o requerimento de escusa do Dr. A Advogado Estagiário e a decisão sobre a concessão de apoio judiciário ao Requerente mantém-se."
    Este despacho de indeferimento foi notificado ao Colega arguido (fls. 62 - 5) e também ao participante (fls. 11 e 25).
    Recebida a notificação, o participante apressou-se a entrar em contacto com o Escritório do Colega arguido, o que fez no dia 9 de Outubro de 2006.
    Fê-lo com o objectivo de ter oportunidade de conferenciar com o Colega arguido o qual, porém, informou-o, através dum empregado do Escritório, que, por falta de tempo, só o podia receber no dia 16 do seguinte, ou seja numa data muito próxima do termo do prazo de 10 dias, destinado a dedução do pedido cível.
    Na data aprazada, o participante conferenciou, efectivamente, com o Colega participado no Escritório deste.
    O participante fazia-se acompanhar de vários documentos justificativos de alguns danos patrimoniais por ele sofridos, entre os quais vários recibos das despesas médicas e medicamentosas e as tidas com a hospitalização a qual teve que se socorrer, tudo isso em consequência do acidente de viação de que foi vitima.
    O Colega arguido, porém, recusou-se a receber essa documentação, exigindo que o participante fizesse a soma dos valores constantes desses recibos e lhe indicasse o total dessas despesas.
    No dia 17 de Outubro, o participante deslocou-se, novamente, ao Escritório do Colega arguido a fim de proceder a entrega desses documento, o que não conseguiu concretizar, por terem sido novamente rejeitados.
    Além da exigência atrás referida, o Colega arguido entendeu exigir também que o participante indicasse o montante certo que pretendia fosse pedido ao Tribunal a título de indemnização por danos não patrimoniais.
    A essas duas determinações respondeu o participante, esclarecendo que não possuía conhecimentos suficientes para dar satisfação as exigências feitas.
    Esta resposta deixou insatisfeito o Colega arguido o qual por isso teve uma pequena discussão com o participante.
    Um advogado ou patrono oficioso que tem a seu cargo a dedução dum pedido cível no âmbito dum processo crime por acidente de viação tem o dever de, antes de mais, conhecer as circunstâncias em que ocorreu o sinistro.
    O Colega arguido cumpriu esse dever consultando o processo em causa e conversando com o participante chegando a conclusão de que o acidente era da responsabilidade do outro interveniente.
    Além disso, para estar habilitado a deduzir um pedido dessa natureza, um advogado ou patrono oficioso tem de diligenciar no sentido de obter informações que permitam determinar o valor dos danos patrimoniais sofridos pelo lesado, ocupando nelas um lugar de destaque as constantes de quaisquer documentos respeitantes a essa matéria, designadamente de recibos relativos às despesas médicas, medicamentosas e de hospitalização.
    Ora o Colega arguido, recusando-se a aceitar esses documentos e transferindo para o participante a obrigação de encontrar o total dessas despesas, desprezou, por completo, algumas infracções úteis e até necessárias que o habilitariam a proceder ao cômputo desses danos, colocando-se, por outro lado, na situação de vir a ficar privado de produzir a necessária prova no prazo legal, dado o disposto no artigo 68° do Código de Processo Penal.
    A indicação do valor dos danos morais não está dependente da vontade ou do arbítrio do ofendido.
    Antes, a determinação desse valor terá de ser feita de harmonia com as situações experimentadas, física e psicologicamente, pelo lesado em consequência do sinistro mas tomando-se em linha de conta os critérios de natureza legal (v.g. artigo 489º do Código Civil) e as diversas orientações que a Jurisprudência, designadamente da R.A.E.M., tem vindo a adoptar nessa matéria, questões essas as quais um leigo em direito é estranho.
    O comportamento do Colega arguido, atrás descrito, provocou a quebra da relação de confiança que deve existir entre o patrono e o patrocinado e levou o participante a requerer ao Meritíssimo Juiz daqueles autos que fosse designado novo patrono em substituição do Colega arguido, pedido que veio a ser deferido.
    Com o mesmo comportamento, violou o Colega arguido os deveres previstos nos artigos 3°, 11º, n.º 1 e 16°, n.º 2 do Código Deontológico.
    A favor do Colega arguido, a confissão (fIs. 54).
    É primário.
    O seu comportamento revela alguma irreflexão, à qual não será alheio o facto de ser ainda Advogado-Estagiário.
    A falta cometida pelo arguido é de média gravidade e dela não resultaram prejuízos para o participante.
    Inexistem agravantes.
    Tomando em linha de conta o condicionalismo que fica referido e o critério a que se reporta o artigo 42º do Estatuto Disciplinar dos Advogados afigura-se não dever ser imposta ao arguido pena mais grave do que a prevista na alínea a) do artigo 1º do artigo 41º do mesmo diploma a não ser que se entenda isenta-lo da pena.
V.
Factos Provados
    Face ao relatório final do Exmo. Instrutor e demais elementos dos autos, julga-se provada toda a matéria acusatória nos precisos termos do Relatório do Exmo. Instrutor.
    O arguido é primário e confessou os factos.

PROCESSO N.º 27/07/CSA
I
Instrução
    O presente processo foi instaurado junto do Conselho Superior de Advocacia, tendo tido origem nas declarações do membro F e Sá, que chamou a atenção para o grave incidente provocado pelo Dr. A nas instalações da sede da AAM, o qual terá proferido palavras desrespeitosas e injuriosas para com este Conselho.
    Na reunião de 8 de Junho do 2007 deliberou este Conselho instaurar processo de inquérito, nos termos do artigo 51.º do Código Disciplinar dos Advogados.
    Oportunamente deu o Exmo. Senhor Instrutor cumprimento ao disposto no artigo 21.º do Código Disciplinar dos Advogados. (fls.4)
    Notificado para se pronunciar, a fls. 6, sobre a matéria dos autos, o participado apresentou a resposta de fls. 10 e seguintes, onde negou os factos.
    Finda a instrução, o Exmo. Senhor Instrutor de fls. 22 e seguintes, no sentido da dedução de acusação, o qual por parte deste Conselho, como resulta de fls. 29 a 31.

II
Acusação
    Em cumprimento do deliberado por o despacho de acusação, de fls. 29 e seguintes:

Despacho de Acusação

Seguirá aforma de Processo Comum.
Proceda à necessária alteração.
__ X __
    Contra o arguido Sr. Dr. A, Advogado, com domicílio profissional na Rua XX. Edifício XX, XXº andar- XX, Macau, profiro o seguinte despacho de Acusação:

    Em fins de Maio ou princípios de Junho do corrente ano, o Colega arguido deslocou-se à Associação dos Advogados de Macau a fim de consultar um processo disciplinar instaurado pelo Conselho Superior da Advocacia no qual figurava como arguido e no âmbito do qual havia sido proferido despacho acusatório.

    Foi ali atendido pela funcionária daquela Associação, C a qual explicou ao Colega arguido que podia consultar esses autos mas que não lhe era permitido fotocopiar as peças que o integravam, como o mesmo pretendia.

    A mesma explicação foi dada ao Colega arguido pela testemunha D, também funcionária daquela Associação e que se encontrava ali presente.

    Reagiu mal o colega participado, que entendeu protestar em voz muito alta dizendo que não compreendia porque é que não podia fotocopiar o processo uma vez que já tinha sido deduzida a acusação.

    Como a sua pretensão não fosse atendida, o Colega arguido, bastante exaltado e nervoso proferiu então a seguinte frase: “點解Dr. E被法官投訴, 話佢話法庭用擲銀來決定案之結果都無事, 投訴被歸檔, 點解我就要收起訴書, 係唔係我係中國人” que pode ser traduzida nos termos seguintes: "O Dr. E, que foi queixado pelo juiz como ele disse que alguns juízes tomam decisões com uma moeda, mas o processo acabou por arquivamento, mas a gente recebeu a petição inicial (foi pronunciada), porquê? Será porque sou chinês?"

    A funcionária C ouvindo esta frase, percebeu que o Colega arguido tinha pretendido "significar que o Conselho Superior da Advocacia fazia diferença entre Advogados Chineses e Portugueses, arquivando os processos disciplinares respeitantes a estes e acusando aqueles."

    O Dr. E referido pelo Colega arguido é o Colega Sr. Dr. E cujo processo disciplinar, instaurado com base numa denúncia feita por um dos juízes do Tribunal judicial de Base, foi mandado arquivar por esse Conselho Superior da Advocacia.
    Com o comportamento que descrito fica, violou o Colega participado os deveres consignado nos artigos 1º, n.º 1 e 3, 3º e 14º, a) do Código Deontológico.
- X-
    Notifique - a partir do dia 3/11/2008 - enviando cópia de extracto
    Prazo para a defesa: 10 dias
    Solicite e junte o extracto do registo disciplinar do colega arguido. 17/17/2007
    (a) Salvador Coutinho de Fiqueiredo

III
Defesa
    Notificado da acusação, como resulta de fls. 33 a 36, que aqui se dá por integralmente reproduzida, o arguido veio defender-se, nos termos constantes de fls. 42 e seguintes.

IV
Relatório Final
    Não havendo mais diligências a realizar, o Exmo. Senhor Instrutor elaborou o seguinte Relatório Final de fls. 76:
    Consta da Acta da Reunião desse Conselho Superior da Advocacia de 8 de Junho de 2007 o seguinte:
    "Logo de imediato, pediu a palavra o membro F que chamou a atenção dos membros do CSA para o grave incidente provocado pelo Dr. A nas instalações da sede da MM, o qual terá proferido, em voz alta de forma pouco urbana, e perante as duas funcionárias da AAM, palavras desrespeitosas e injuriosas para com este CSA. Chamada a esta reunião a Srª. Selina, funcionária da AAM, confirmou o incidente e informou que o Dr. A proferiu as seguintes palavras: "o Dr. E foi participado por um juiz por ter afirmado que a decisão do Tribunal era pôr moeda ao ar e o seu processo disciplinar foi arquivado, enquanto que em relação a ele o CSA estava a acusá-lo, pelo que o CSA discriminava racialmente contra os advogados Chineses".
    Após breve discussão entre os membros presentes foi deliberado por unanimidade instaurar processo comum de inquérito contra o Dr. A, nos termos do artigo 51º do Código Disciplinar dos Advogados, com vista ao cabal esclarecimento dos factos".
    "Igualmente por aprovação unânime dos membros presentes, foi decidido dispensar a designação dos instrutores por ordem alfabética e nomear instrutor o ilustre Advogado Dr. Salvador Figueiredo para instruir o respectivo processo de inquérito, tendo em conta a vasta experiência, isenção e competência com que tem vindo a desempenhar a função de instrutor nos outros processos, com a consequente estabilidade e seriedade".
    Instaurado, assim, o inquérito e cumpridas as formalidades prescritas no Código Disciplinar dos Advogados, foi deduzida contra o arguido Sr. Dr. A a necessária acusação.
    Notificado dela, apresentou o Colega arguido a sua defesa.
    Oportunamente, foram inquiridas as testemunhas arroladas nessa fase processual.
    Cabe agora apreciar algumas questões suscitadas nessa defesa.
    Do estatuto da testemunha e de participante
    Sustenta-se na defesa que "para avaliar da credibilidade que pode atribuir-se ao depoimento da "confirmante" importaria "para fins probatórios saber como chegou tal facto ao conhecimento do Conselho': até por que "não podem confundir-se os estatutos processuais de participante e testemunha que são estatutos diferentes na medida em que quem participa tem naturalmente interesse na procedência da imputação"
    Em princípio terá relevância "para fins probatórios" apurar as vias pelas quais uma determinada denúncia chega ao conhecimento do Conselho Superior da Advocacia quando este órgão Disciplinar toma a iniciativa de instaurar o procedimento disciplinar. Porque em causa pode estar a idoneidade moral e o perfil psicológico do denunciante, o mesmo é dizer a sua credibilidade.
    No caso dos autos, porém, tal problema não se coloca.
    A "confirmante" é a testemunha C na qual o Colega arguido afirma depositar a maior das confianças.
    Ora, foi precisamente dirigindo-se a esta "confirmante" que o colega arguido proferiu a frase referida na acusação nas circunstâncias ali descritas. Confirmou pois ela o que havia ouvido da boca do arguido. Consequentemente ainda que se admita que quem deu conhecimento ao Conselho foi pessoa diferente da "confirmante" a verdade é que a credibilidade desta não pode ser posta em dúvida. Aliás a própria defesa vem depor a favor da credibilidade da referida testemunha.
    Por outro lado, não encontramos qualquer razão válida para distinguir o estatuto de denunciante do da testemunha.
    O Código de Processo Penal, aplicável subsidiariamente ao Processo Disciplinar, não inclui os denunciantes no leque dos que sofrem da incapacidade testemunhal ou dos que estão impedidos de depor.
    Acresce que, no caso em apreço, estão em jogo apenas interesses públicos, confiados por lei à Associação dos Advogados de Macau o que afasta imediatamente a hipótese aventada de existir "interesse na procedência da imputação".
    Assim, a impugnação do depoimento da referida testemunha esboçada na defesa não pode, pois, ser considerada em termos do seu acolhimento.
__ X __
    DA GARANTIA DA IMPARCIALIDADE
    Nada permite afirmar que o Ilustre membro do Conselho Sr. Dr. F tenha sido participante nos presentes Autos.
    É que, como consta da Acta que atrás ficou transcrita, aquele colega limitou-se a "chamar a atenção dos membros do Conselho Superior da Advocacia para o grave incidente... ".
    Uma mera "chamada de atenção" não pode ser confundida nem com denúncia nem com participação. Quem instaurou o processo disciplinar foi o Conselho Superior da Advocacia e fê-lo oficiosamente (artigo 4° do C.D.)
    Não se vê, portanto, que a suspeição e o impedimento deduzidos na defesa tenham alguma justificação.
    Em qualquer caso, caberá a esse Conselho pronunciar-se e tomar posição definitiva sobre estes pontos.
    Finalmente, quanto ao problema também suscitado da instauração prévia dum processo crime, caberá recordar que na nossa ordem jurídica o procedimento disciplinar goza de autonomia relativamente ao procedimentos criminal.
__ X __
    A prova produzida nos Autos não possui a virtualidade de alterar a posição assumida na acusação.
    Nenhuma das testemunhas arroladas pela defesa presenciou o incidente protagonizado pelo Colega arguido. Depuseram elas sobre o perfil psicológico e moral do arguido e confirmaram que, dadas as características das suas cordas vocais, ele expressava-se num timbre elevado.
    Nada, porém disseram, nem podiam fazê-lo, dado não terem estado presentes, sobre os concretos factos atribuídos ao Colega arguido.
    Ora, considerando o contexto no qual a frase: referida na acusação foi proferida, dificilmente se pode sustentar que se tratou dum desabafo como pretende a defesa.
    Reconhecendo-se é certo que frases como aquela que consta da acusação "só são possíveis de ser pronunciadas quando se tem absoluta confiança nos presentes e tem conhecimento antecipado dessa confiança", ocorre perguntar se no caso em apreço existia a invocada confiança.
    A resposta é negativa.
    Da circunstância de os Advogados depositarem muita confiança na pessoa da testemunha C (fls. 62. 63 68) não decorre necessariamente que entre o Colega arguido e aquela houvesse alguma particular familiaridade. O relacionamento entre ambos era "estritamente profissional no sentido de que as conversas entre eles, assim como com quaisquer outros estagiários "versavam" apenas sobre os assuntos da Associação... " (fls. 16).
    Procurando reconstituir o cenário no qual ocorreu o incidente referido nos Autos prestou aquela testemunha o seguinte depoimento:
    ''A matéria dos autos disse que no mês de Maio ou Junho do este ano apareceu nas instalações da Associação dos advogados o Advogado e não estagiário Sr. Dr. A. Vinha ele consultar um processo disciplinar no qual tinha sido deduzida acusação. Pretendia ele não só consultar esses autos mas também fotocopiá-los. Tanto a D. Celeste como a depoente explicaram aquele Advogado que tal não era permitido. Reagiu mal o mesmo Advogado que começou a falar em voz muito alta dizendo que não compreendia porque é que não podia fotocopiar o processo uma vez que já tinha sido deduzida a acusação. Foi-lhe explicado que essas eram ordens superiores e que para fotocopiar o processo devia falar com alguém do Conselho Superior da Advocacia. O referido Advogado, muito exaltado e nervoso disse então mais o menos o seguinte: “點解Dr. E被法官投訴, 話佢話法庭用擲銀來決定案之結果都無事, 投訴被歸檔, 點解我就要收起訴書, 係唔係我係中國人”. A depoente ouvindo as frases que ficam referidas percebeu que o referido Advogado queria significar que o Conselho Superior da Advocacia fazia diferença entre os Advogados Chineses e Portugueses arquivando os processos respeitantes a estes e acusando aqueles. Foi este o sentido que a depoente captou daquelas frases e acha que o mesmo sentido seria apreendido por qualquer outra pessoa que soubesse chinês e estivesse presente. A depoente está convencida que o referido Advogado quis apenas protestar e não desabafar até porque apresentava um ar de pessoa muito zangada".
    Este testemunho permite, pois, concluir que o Colega arguido "zangou-se" por não ter sido autorizado a extrair as fotocópias que pretendia. E foi com o ar zangado que lançou a frase em questão que rematou com uma interrogação, sem que tivesse tido sequer o cuidado de prestar quaisquer esc1arecimentos sobre o seu conteúdo.
    Colocou, assim, aquela testemunha, sem mais e inopinadamente, perante determinados factos mas também perante um juízo de valor negativo, sem lhe dar a possibilidade de formular de forma objectiva o seu próprio juízo sobre o conteúdo da mensagem que lhe era transmitida, o que é censurável. Assim, impõe-se que se dê como estabelecido o seguinte:
    1) - Em fins de Maio ou princípios de Junho do corrente ano, o Colega arguido deslocou-se à Associação dos Advogados de Macau a fim de Consultar um processo disciplinar instaurado pelo Conselho Superior da Advocacia no qual figurava como arguido e no âmbito do qual havia sido proferido despacho acusatório.
    2) - Foi ali atendido pela funcionária daquela Associação, C a qual explicou ao Colega arguido que podia consultar esses autos mas que não lhe era permitido fotocopiar as peças que o integravam, como o mesmo pretendia.
    3) - A mesma explicação foi dada ao Colega arguido pela testemunha D, também funcionária daquela Associação e que se encontrava ali presente.
    4) - Reagiu mal o colega participado, que entendeu protestar em voz muito alta dizendo que não compreendia porque é que não podia fotocopiar o processo uma vez que já linha sido deduzida a acusação.
    5) - Como a sua pretensão não fosse atendida, o Colega arguido, bastante exaltado e nervoso proferiu então Q seguinte frase: “點解Dr. E被法官投訴, 話佢話法庭用擲銀來決定案之結果都無事, 投訴被歸檔, 點解我就要收起訴書, 係唔係我係中國人” que pode ser traduzida nos termos seguintes: "O Dr. E, que foi queixado pelo juiz como ele disse que alguns juízes tomam decisões com uma moeda, mas o processo acabou por arquivamento, mas a gente recebeu a petição inicial (foi pronunciada), porquê? Será porque sou chinês?"
    6) - A funcionária Hoi ln Wa ouvindo esta frase, percebeu que o Colega arguido tinha pretendido "significar que o Conselho Superior da Advocacia fazia diferença entre Advogados Chineses e Portugueses, arquivando os processos disciplinares respeitantes a estes e acusando aqueles."
    7) - O Dr. E referido pelo Colega arguido é o Colega Sr. Dr. E cujo processo disciplinar, instaurado com base numa denúncia feita por um dos juízes do Tribunal judicial de Base.foi mandado arquivar por esse Conselho Superior da Advocacia.
    Com o comportamento que descrito fica violou o Colega participado os deveres consignado nos artigos 1°, n.º 1 e 3, 3° e 14°, a) do Código Deontológico.
    E nem se diga - como o faz o arguido na sua defesa - que não se compreende o enquadramento dos factos constantes da acusação naqueles normativos.
    Não se deve esquecer que o Conselho Superior da Advocacia não é uma entidade datada de personalidade jurídica. Quem a possui é a Associação dos Advogados de Macau a qual é servida por determinados órgãos. O Conselho Superior da Advocacia não figura no elenco desses órgãos. Antes foi-lhe conferido um tratamento privilegiado: é o órgão de disciplina profissional dos Advogados.
    E parece óbvio que, quando se fala de Advogados, está-se a reportar a Advogados inscritos na Associação dos Advogados de Macau.
    Ora, convenhamos que um Advogado que gratuita, injusta e injustificadamente lança críticas descabidas ao Conselho Superior i.e. ao seu próprio órgão disciplinar não está a defender o prestígio da sua profissão.
    De mesma maneira, haverá que aceitar que um Advogado que se dirige a uma colaboradora da Associação dos Advogados de forma exaltada, permitindo-se protestar junto dela, não está propriamente a proceder com urbanidade.
    Finalmente não será difícil admitir que um Advogado que põe em causa, sem qualquer fundamento, a justeza duma deliberação do Conselho Superior da Advocacia, não serve nem o direito, nem a justiça.
    Mantém-se, por isso, a qualificação jurídica adoptada na acusação.
    O Colega arguido é primário e confessou parcialmente os factos.
    As faltas cometidas são de média gravidade. Está a dar os primeiros passos na profissão que escolheu. Tem pendente contra si um outro processo disciplinar ---- 10/07/CSA ---- no âmbito do qual foi proposta a aplicação da pena de advertência.
    Pelo exposto e tomando em consideração o critério consagrado no artigo 43° do Código Disciplinar dos Advogados, afigura-se que se lhe deve aplicar, por cada uma das infracções atrás referidas a pena da alínea c) do n.º 1 do artigo 41° do mesmo diploma, graduada em $2.000.00 patacas, impondo-se-lhe, feito o cúmulo, a pena única de 6,000 patacas.
    Sugere-se que se proceda ã apensação dos presentes Autos ao referido processo 10/07/CSA.
    É esta a nossa proposta.
    V. Excias. Porém, melhor decidirão.

O Instrutor
G
V.
Factos Provados
    Face ao relatório final do Exmo. Instrutor e demais elementos dos autos, julga-se provada toda a matéria acusatória nos precisos termos do Relatório do Exmo. Instrutor.

DECISÃO
    Tudo analisado e ponderado, este Conselho delibera:
    I - Quanto à matéria do Processo n.º 10/07/CSA - julgar provada a acusação, nos precisos termos do Relatório Final do Exmo. Senhor Instrutor, como acima consta provado, e ao qual este Conselho adere como seu e aqui integrante, e nessa conformidade, de acordo com o proposto pelo Exmo. Instrutor, condena-se o arguido na pena de Advertência prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do Código Disciplinar dos Advogados, por infracção ao disposto nos artigos 3.º, 11.º, n.º 1, e 16.º, n.º 2 do Código Deontológico.
    II - Quanto à matéria do Processo n.º 27/07/CSA - julgar provada a acusação, nos precisos termos do Relatório Final do Exmo. Senhor Instrutor, como acima consta provado, e ao qual este Conselho: adere como seu e aqui integrante, salvo quanto à medida da pena proposta, e nessa conformidade, condena-se o arguido na pena de MOP$6,000.00 (seis mil Patacas) de multa prevista na alínea c) do nº. 1 do artigo 41.º do Código Disciplinar dos Advogados, por infracção ao disposto nos artigos l.º, nºs. 1 e 3, 3.º e 14.º, alínea a) do Código Deontológico.

    Cúmulo jurídico
    Em cúmulo jurídico, este Conselho acorda punir o arguido com a pena única de MOP$8,000.00 (oito mil Patacas) de multa, nos termos da 2.ª parte do artigo 71.º, n.º 2 do Código Penal, conjugado com o n.º 1 do mesmo artigo e Código, aqui aplicável ex vi artigo 65.º do Código Disciplinar dos Advogados.
    Registe-se e notifique-se, nos termos do artigo 40.º do Código Disciplinar dos Advogados.
    Macau, 20 de Abril de 2012.

  Deste acórdão interpôs recurso para este TSI, que, por acórdão de 5 de Março de 2015, concedeu provimento ao recurso, anulando o acto recorrido, tendo decidido que a conduta do recorrente/arguido no Processo n.º 27/07/CSA não constituía infracção disciplinar.
  Quanto ao Processo n.º 10/07/CSA, decidiu pela não prescrição do procedimento disciplinar e não apreciou as restantes questões suscitadas por entender que, anulado o acto recorrido quanto ao Processo n.º 27/07/CSA, a entidade recorrida teria de, em execução de sentença, reformular a pena aplicada quanto àquele Processo.
  Inconformados recorreram para o TUI o recorrente A e o Conselho Superior da Advocacia, ali se tendo deliberado no Proc. 49/2015, em 9/3/2016, julgar improcedente o recurso daquele, que pugnava pela aplicação da prescrição e procedente o recurso da entidade recorrida que pugnava pelo carácter injurioso das expressões utilizadas pelo arguido:
  
  Em 26 de Junho de 2015, o recorrente deduziu junto do Conselho Superior da Advocacia um pedido de declaração de prescrição do procedimento disciplinar.
  
  Não obteve resposta a tal pedido.

    IV – FUNDAMENTOS
    1. As questões que vêm suscitadas estão perfeitamente escalpelizadas e respondidas no douto parecer oferecido pelo Digno Magistrado do MP, razão por que somos a transcrevê-lo, sufragando os fundamentos aí vertidos que servirão assim de suporte à nossa decisão:
    “A, devidamente identificado nos autos, interpõe recurso contencioso do acto tácito de indeferimento do pedido que, em 26 de Junho de 2015, formulou perante o Conselho Superior da Advocacia (CSA), onde impetrava a extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar que lhe foi movido através dos processos 10/2007 ICSA e 27/2007 ICSA.
    Diz que o acto padece de violação de lei, já que, à luz do quadro normativo aplicável, cujas disposições particulariza, é fora de dúvida que o procedimento disciplinar se encontrava prescrito - e assim devia ter sido declarado pela autoridade recorrida - pelo menos desde 16 de Abril de 2014, num dos casos, e desde início de Dezembro de 2014, no outro caso.
    Pede a anulação do acto e a condenação do recorrido à prática do acto devido.
    O Conselho Superior da Advocacia, não tendo contestado, apresentou alegações facultativas, onde suscita as excepções de caso julgado e de extemporaneidade da reclamação e do recurso.
    Vejamos, de imediato, esta matéria, que, a proceder, obstará ao conhecimento do fundo do recurso.
    O CSA diz que há caso julgado porque a questão da prescrição já foi apreciada, no Tribunal de Segunda Instância e no Tribunal de Última Instância, tendo a respectiva decisão passado em julgado.
    Há aqui seguramente confusão.
    O que o TSI e o TUI apreciaram foi a questão da ocorrência ou não da prescrição reportada ao momento do acto administrativo então sindicado, ou seja, a decisão punitiva de 20 de Abril de 2012. Ambos afirmaram que, ao momento da prolação da decisão administrativa, não tinha ainda transcorrido o prazo de prescrição do procedimento disciplinar. Foi esta a decisão que transitou em julgado sobre questão relacionada com a prescrição.
    Não conheceram, nem podiam ter conhecido, da eventual ocorrência posterior da prescrição, nomeadamente por reporte a 26 de Junho de 2015, altura em que o recorrente formulou o pedido objecto de indeferimento tácito. Aliás, o TUI afirmou, com iniludível clareza, no seu acórdão de 9 de Março de 2016, atinente ao recurso da decisão punitiva, que, quando o prazo de prescrição do procedimento disciplinar se completa após a decisão punitiva e antes de se formar caso decidido, designadamente na pendência do recurso contencioso daquela decisão, cabe ao interessado suscitar a questão ao órgão decisor, não podendo fazê-lo no recurso contencioso, por falta de jurisdição do Tribunal. O que o ora recorrente fez, em consonância com a citada passagem do acórdão, consistiu exactamente em dirigir, em 26 de Junho de 2015, requerimento ao Conselho Superior da Advocacia no sentido de ver declarado extinto, por prescrição, o procedimento disciplinar levado a cabo através dos processos 10/2007 ICSA e 27/2007 ICSA.
    Portanto, não há qualquer decisão passada em julgado sobre este assunto, pelo que soçobra a invocada excepção.
    Alega ainda o Conselho Superior da Advocacia que a reclamação foi apresentada fora de tempo, tal como o foi o presente recurso contencioso. Para tanto, louva-se no artigo 44.º do Código Disciplinar dos Advogados (CDA).
    Também aqui não assiste razão ao CSA.
    O artigo 44.º referido estatui sobre reclamação administrativa e recurso contencioso de deliberações proferidas em matéria disciplinar pelo Conselho. Mas não estava em causa qualquer reclamação, não se percebendo a razão por que o recorrido chama reclamação ao requerimento formulado pelo ora recorrente em 26 de Junho de 2015. O que se deparava ao Conselho era um pedido de apreciação de uma matéria que dizia respeito à sua área de atribuições e competência. Só se tivesse havido deliberação sobre o que lhe fora requerido - e não houve - é que se colocava a questão da observação dos prazos previstos no aludido artigo 44.º para reclamação e para o recurso contencioso.
    Na falta de deliberação, e consequente impossibilidade de reclamação, há que seguir as regras gerais do Código do Procedimento Administrativo, sob pena de, perante a inércia do CSA, os administrados que com ele se relacionam, ficarem despidos de tutela jurisdicional efectiva.
    Improcede, assim, a suscitada extemporaneidade da reclamação e do recurso.
    Posto isto, passemos aos pedidos do recorrente.
    Pretende, em primeiro lugar, ver anulado o acto de indeferimento tácito, por violação de lei.
    Vejamos.
    A primeira das infracções disciplinares que lhe foram imputadas ocorreu em 16 de Outubro de 2006 e a segunda consumou-se em finais de Maio ou inícios de Junho de 2007. Foram deduzidas acusações, tendo-lhe sido notificada a relativa à primeira infracção em 25 de Maio de 2007 e a correspondente à segunda infracção em 6 de Janeiro de 2008. A deliberação punitiva remonta a 20 de Abril de 2012. Em 26 de Junho de 2015, na pendência do recurso contencioso, portanto antes de se haver formado caso decidido, o recorrente requereu ao recorrido que declarasse extinto, por prescrição, o procedimento disciplinar de que era alvo nos dois processos. Sendo o indeferimento deste pedido que está em causa no presente recurso contencioso, importa indagar se o procedimento estava, na realidade, prescrito ou não. Na hipótese de se encontrar prescrito, é óbvia a violação de lei traduzida no indeferimento.
    O procedimento disciplinar prescreve no prazo de três anos a contar da data da infracção - artigo 11.° do CDA -, aplicando-se supletivamente, no domínio da interpretação e integração das lacunas, em primeira linha, o direito penal vigente na RAEM - artigo 65.° do CDA. Nos termos do Código Penal de Macau, constitui causa de suspensão da prescrição do procedimento, a pendência do processo a partir da notificação da acusação, não podendo esta suspensão ultrapassar os 3 anos - artigo 112.º do Código Penal. Por outro lado, e reportando-se a matéria de interrupção da prescrição, esclarece o Código Penal que a prescrição terá sempre lugar, ressalvado o tempo de suspensão, quando, desde o início da contagem da prescrição tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade - artigo 113.º do Código Penal.
    É seguro, face aos dados temporais supra referidos, que, após a notificação das acusações, ocorreu a suspensão do prazo de prescrição, na qual se consumiu o máximo legalmente previsto, ou seja 3 anos, em cada um dos procedimentos. Descontado este prazo de suspensão, importa indagar se transcorreu ou não o prazo normal de prescrição, que é de três anos. Aliás, para que não restem dúvidas, e mesmo nada tendo sido invocado em termos de interrupção, pode ter-se em conta o prazo máximo de interrupção, como faz o recorrente, ou seja, fazendo acrescer de metade o prazo normal da prescrição, o que impõe que se jogue com um prazo de quatro anos e seis meses.
    Computando este prazo máximo a partir da consumação das infracções, e levando em conta o prazo de suspensão de três anos, temos que o procedimento disciplinar pela primeira infracção se extinguiu, por prescrição, em 16 de Abril de 2014, e que o procedimento disciplinar relativo à segunda infracção se extinguiu, também por via de prescrição, em finais de Novembro ou princípios de Dezembro de 2014.
    É seguro que, quando impetrou do CSA a declaração de extinção do procedimento disciplinar, com fundamento na respectiva prescrição, o pedido estava, em qualquer dos casos, fadado ao deferimento. Logo, o impugnado acto de indeferimento tácito padece de violação de lei, por ofensa das várias normas aplicáveis em matéria de prescrição.
    Procede o primeiro dos pedidos, por via do invocado vício de violação de lei, pelo que o acto deve ser anulado.
    No que toca ao segundo pedido, crê-se que se mostram satisfeitos os requisitos de que depende.
    O acto impugnado é um acto de indeferimento tácito (artigo 103.°, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Administrativo Contencioso), em vez do qual deveria ter sido praticado, vinculadamente, um acto de deferimento do pedido, através da declaração de extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar exercido no âmbito dos processos disciplinares 10/2007 ICSA e 27/2007/CSA. Na verdade, estando em causa uma actividade de aplicação e interpretação da lei, portanto vinculada, o acto de deferimento impunha-se, ante a oficiosidade do conhecimento da prescrição, em face do pedido do recorrente, arguido nos processos disciplinares, e atentas as regras da prescrição.
    Deve, pois, na procedência deste segundo pedido, condenar-se o CSA a proferir acto que, conhecendo do pedido formulado pelo ora recorrente em 26 de Junho de 2015, se pronuncie sobre a extinção, por prescrição do procedimento disciplinar que lhe foi movido nos dois identificados processos do CSA.”
    2. Vamos destacar as linhas-força que nos hão-de guiar na síntese que importa reter, actualizando aqui a factualidade já acima fixada, para facilitar a análise, pese embora a repetição.
- Em 15/12/2006, o Conselho Superior da Advocacia deliberou instaurar processo disciplinar contra o Recorrente sob a forma de inquérito sob o nº 10/07/CSA, por infracção ocorrida em 16 de Outubro de 2006.
- Em 06/02/2007, o Recorrente foi notificado da abertura da instrução do processo disciplinar.
- Em 21/03/2007, o Recorrente prestou declarações na qualidade de arguido.
- Em 22/05/2007, o instrutor do processo deduziu acusação contra o Recorrente.
- O Recorrente foi notificado da acusação por carta registada de 25/05/2007 para, querendo, apresentar a defesa por escrito no prazo de 10 dias.
- Em 18/06/2007, a Recorrente apresentou defesa por escrito.
- Em 03/07/2007, o instrutor do processo disciplinar elaborou o relatório final, submetendo-o à aprovação do Conselho Superior da Advocacia.
- Em 08/06/2007, o Conselho Superior da Advocacia deliberou instaurar processo disciplinar contra o Recorrente sob a forma de inquérito sob o nº 27/07/CSA, por infracção ocorrida entre finais de Maio e princípios de Junho de 2007.
- Por carta registada de 26/06/2007, notificou-se o Recorrente da abertura da instrução do processo disciplinar.
- Em 17/12/2007, o instrutor do processo deduziu acusação contra o Recorrente.
- O Recorrente foi notificado da acusação por carta registada de 03/01/2008 para, querendo, apresentar a defesa por escrito no prazo de 10 dias.
- Em 14/01/2008, o Recorrente apresentou defesa por escrito, requerendo a inquirição de 4 testemunhas arroladas.
- Em 23/01/2008, foram inquiridas as testemunhas arroladas.
- Em 13/02/2008, o instrutor do processo disciplinar elaborou o relatório final, submetendo-o à aprovação do Conselho Superior da Advocacia.
- Em 20/04/2012, o mesmo Conselho deliberou por unanimidade o acórdão: já acima transcrito.
- Foi interposto recurso da deliberação proferida, vindo, a final, o TUI a proferir acórdão em 9/3/2016.
- Em 26 de Junho de 2015, o recorrente deduziu junto do Conselho Superior da Advocacia um pedido de declaração de prescrição do procedimento disciplinar
    3. Das excepções aduzidas pela entidade recorrida
    Como bem se vê, contrariamente ao afirmado, a questão da prescrição, no que à decisão proferida nos procedimentos disciplinares 10/07/CSA e 27/07/CSA diz respeito, não é uma questão decidida, pelo que não estamos perante uma excepção de caso julgado formal e material.
    No acórdão do TSI é expressa a improcedência do pedido de prescrição, porque à data da prolação do acórdão o prazo prescricional ainda não tinha corrido.
    Também o TUI não conheceu da prescrição tendo-se pronunciado no sentido de remeter o recorrente para a entidade recorrida, o CSA, dizendo que o pedido de prescrição devia ali ser formulado.
    Perde sentido o pedido de litigância de má-fé e se menor correcção existe, temos de o reconhecer, é da parte da recorrida ao imputar às decisões proferidas um conteúdo que, de todo, elas não encerram.
    
    4. Quanto à extemporaneidade do recurso do acto tácito e pedido de acto devido é também manifesta a sem razão da recorrida.
    O artigo 44º do CDA (Código Disciplinar dos Advogados) versa sobre as reclamações das decisões do Conselho, o que, manifestamente, não é o caso. Aqui estaremos até perante uma ausência de qualquer deliberação, para além de que a prescrição pode ser invocada a todo o tempo, bastando, para tanto, o decurso do prazo relevante para que ela se verifique. Dir-se-á até que, em matéria de prescrição, quanto mais tempo passar, mais ela se consolida. Será até talvez dos poucos, se não o único instituto em que a prescrição não funciona no sentido da destruição dos seus próprios efeitos, isto é, não se pode dizer que a “prescrição fica prescrita”, ou que o decurso do tempo anula a possibilidade da sua invocação.
    Não deixamos de salientar estranheza no denodo com que se pugna por uma litigância de má-fé, ao invocar-se um pretenso desconhecimento ou errada interpretação da norma do art. 44º do CDA, quando quem labora em erro sobre a mesma norma é exactamente a parte impetrante. Será que, por isso, devia ser condenada em litigante de má-fé?
    
    Somos, pois, a remetermo-nos para quanto se aduz no supra citado parecer.
    Questão que se coloca - aludindo a entidade recorrida até à formação do caso julgado -, é a do conflito entre o a punição que se poderia ter como definitivamente decidida, face à decisão final proferida pelo TUI, o que se poderia entender ter estabilizado e fixado a punição, nos termos em que ela foi proferida, e o pedido entretanto formulado de prescrição junto do órgão decisor, na medida em que a partir do trânsito daquela decisão (judicial) não seria já possível falar em prescrição do procedimento disciplinar (quanto muito prescrição da pena), pois a sanção estaria encontrada, não obstante o TUI ter sugerido que a questão fosse suscitada junto do órgão decisor, suspendendo o recurso jurisdicional em curso para possibilitar aquele pedido, mas acabando por, antes do prazo de recurso do acto tácito, decidir o recurso.
    No fundo, pode considerar-se que com aquela decisão do V.º TUI ainda ficou a aberta a porta à decisão definitiva sobre a punição, na medida em que se salvaguardou a possibilidade de o órgão decisor aplicar a prescrição.
    
    Na verdade, se bem que afirmado em sede de processo crime, - o que assume contornos diferentes da jurisdição administrativa -, “transitada em julgado a sentença de condenação do arguido precludido ficou o direito de requerer ou de conhecer oficiosamente a prescrição do procedimento criminal (…) A questão da prescrição do procedimento criminal tem necessariamente de ser suscitada e apreciada até ao trânsito em julgado da decisão, ficando o eventual erro que tenha sido cometido nesse âmbito coberto pelo caso julgado.”5
     Tanto mais que este entendimento poderia dar azo a que o interessado jogasse com o tempo, de modo a completar o tempo prescricional que eventualmente faltasse para o efeito.
    
    Na medida em que essa vantagem não deixou de ser processualmente facultada pelas opções tomadas e pelo próprio curso dos recursos interpostos, somos a entender que o interessado não deve ser “castigado” por isso, havendo que aplicar a lei e o benefício que para ele resulta do limite máximo imposto por lei ao período de suspensão da prescrição do procedimento.
    
    5. Prescrição
    A considerar-se que a prescrição actua mesmo na pendência do recurso judicial interposto, como flui da decisão do TUI6 - “O prazo de prescrição do procedimento disciplinar começa a correr desde o dia em que a infracção se consumou, nos termos do artigo 111.º do Código Penal, aplicável subsidiariamente, nos termos do artigo 65.º, alínea a) do Código Disciplinar dos Advogados, e termina na data da formação do caso decidido da decisão disciplinar que, se tiver havido recurso contencioso da decisão disciplinar, coincide com o trânsito em julgado da sentença neste recurso contencioso –“, o procedimento disciplinar pelas infracções imputadas ao arguido está prescrito, por, desde as respectivas datas do seu cometimento e salvaguardadas as interrupções e asuspensão (suspensão que tem o limite máximo de 3 anos), ter decorrido o prazo da prescrição (3 anos) acrescido do período de salvaguarda de metade desse prazo, ao todo, 7 anos e meio (3 anos do prazo de prescrição, acrescido de metade, mais o prazo máximo possível de suspensão de 3 anos), vista até a última interrupção (despacho punitivo), prazo esse que cobre as interrupções e suspensões ocorridas, impondo a lei um limite máximo desde a última interrupção – artigos 112º, 113º do CP, 11º, n.º 1, 2 e 3, 65º, a) do CDA.
    Isto é: mesmo partindo da data do último acto interruptivo, face ao disposto no art. 113º, n.º 1, c) – relevando aqui a dedução da acusação -, ficando o procedimento suspenso, a partir dessa data, face ao art. 112º, n.º 1, b) do CP -, descontando o prazo máximo de suspensão de 3 anos, já decorreu, até ao pedido de prescrição junto do órgão decisor, o período da prescrição acrescido de metade.
A aplicação subsidiária das regras do Código Penal ao procedimento disciplinar dos advogados não oferece contestação.7
Como parece também ser claro que a suspensão da prescrição do procedimento se mantém na pendência do recurso, falando a lei - n.º 1 do art.º 112.º do CP, « A prescrição do procedimento criminal suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que: (…) b) O procedimento criminal estiver pendente a partir da notificação da acusação…».8

O recorrente, na linha do que foi decidido/sugerido pelo TUI (não se pode confundir esta posição com uma decisão sobre a prescrição pelo tribunal), - tendo-se afirmado ali que quando o prazo de prescrição do procedimento disciplinar se completa após decisão punitiva e antes de se formar caso decidido, designadamente na pendência do recurso contencioso daquela decisão, cabe ao interessado suscitar a questão ao órgão decisor, não podendo fazê-lo no recurso contencioso, por falta de jurisdição do Tribunal - foi ao processo disciplinar, junto do CSA pedir que fosse declarado prescrito o procedimento disciplinar.

    O órgão decisor não apreciou esse pedido e, como visto, verificam-se os pressupostos de aplicação da prescrição, pelo que na linha do entendimento do V.º TUI, que admite a possibilidade de essa excepção ser ainda conhecida, impõe-se a prática do acto devido, tal como vem peticionado.

6. Litigância de má-fé
Como se viu, não haverá lugar à litigância de má-fé, não se verificando os pressupostos da sua aplicação, tal como alegado pela entidade recorrida, visto que o recorrente não litigou contra a verdade dos factos, nem fez do processo um uso reprovável, não se divisando na sua conduta que tenha agido com dolo ou negligência na defesa dos seus interesses, no âmbito deste processo, e na invocação dos fundamentos em que baseou a sua pretensão.
    Tudo visto, resta decidir, no sentido da procedência do presente recurso e pedido que vem formulado.
    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em julgar procedente o presente recurso contencioso e, em consequência, anulando-se o acto de indeferimento tácito, relativo ao pedido de prescrição formulado pelo requerente, deve a entidade recorrida praticar o acto devido de deferimento desse pedido, através da declaração de extinção, por prescrição, do procedimento disciplinar, estando em causa uma actuação vinculada decorrente da aplicação das regras prescricionais respectivas.
    Sem custas pela entidade recorrida, por estar isenta.
Macau, 6 de Julho de 2017
_________________________ _________________________
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira Mai Man Ieng
_________________________ (Fui presente)
Ho Wai Neng
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José Cândido de Pinho
(na sequência do acórdão deste T.S.I. 4/7/2013, Proc. n.o 328/2013, altero a minha posição quento a custas, considerando que a AAM, por não ser pessoa colectiva de “utilidade pública administrativa”, delas não está isenta ao abrigo do art. 2º, n.o 1, al. e), do R.C.T.).
1 Acórdão do Venerando TUI, Proc. n.º 37/2015, fls. 6.
2 Acórdão do Venerando TUI, Proc. n.º 37/2015, fls. 6.

3 Acórdão do Venerando TUI, Proc. n.º 37/2015, fls. 6.
4 Acórdão do Venerando TUI, Proc. n.º 37/2015, fls. 6.
5 - Ac- da RC, de , 18/5/2016 , Proc. n.º 372/01.0TALRA.C1
6 - Acs do TUI, Processos n.ºs 49/2015 e 37/2015
7 - Acs. do TUI, de 9/3/2016, Proc. n.º49/2015; de 17/11/205, Proc. n.º 37/2015; Acs do TSI, de 9/5/2005, Proc. n.º 9/2005;21/1/2016, Proc. n.º 429/2014; 4/12/2014, Proc. n.º 185/2014.
8 - Ac. do STJ, de 20/1/2012 , Proc. n.º 263/06.8JFLSB.L1.S1; de 27/10/2010, Proc. n.º 121/10.1YFLSB
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183/2016 60/60