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Processo n.º 29/2015. Recurso jurisdicional em matéria cível.
Recorrentes: A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V, W, X, Y, Z, AA, AB, AC, AD, AE, AF, AG, AH, AI, AJ, AK, AL, AM, AN, AO, AP, AQ, AR, AS, AT, AU, AV, AW, AX, AY e AZ.
Recorridos: BB, BC, BD, BE, BF, BG, BH, BI, BJ, BK, BL, BM, BN, BO, BP, BQ, BR, BS, BT, BU, BV e BW.
Assunto: Legitimidade para recurso. Terceiro. Direito de propriedade sobre prédio.
Data do Acórdão: 27 de Setembro de 2017.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.

SUMÁRIO
Quem não é parte no processo não tem legitimidade para recorrer de sentença que julgou reconhecido o direito de propriedade sobre prédio se, arrogando-se ser titular de tal direito, não o demonstra, por não se poder considerar ter sido directa e efectivamente prejudicado com a decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 585.º do Código de Processo Civil.
O Relator,

Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório e factos provados
Por sentença de 21 de Setembro de 2011, o Ex.mo Juiz Presidente do Tribunal Colectivo julgou procedente a acção declarativa intentada por A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V, W, X, Y, Z, AA, AB, AC, AD, AE, AF, AG, AH, AI, AJ, AK, AL, AM, AN, AO, AP, AQ, AR, AS, AT, AU, AV, AW, AX, AY e AZ contra BA, que não contestou e, em consequência, determinou que:
   - se declara que BA, por facto que lhe é exclusivamente imputável, não cumpriu as obrigações que através dos contratos-promessas aludidos nos presentes autos e que havia assumido para com A e outros; e
   - se declara os Autores como titulares de partes indivisas das Fracções Autónomas P1R/C e P2R/C, inscritas a favor da BA sob o nº XXXXX, a folhas XX verso do livro XXX, correspondendo a cada um o direito a um lugar de estacionamento de automóvel ligeiro.
   Ambas as fracções do prédio sito em Macau, no [Endereço (1)] e [Endereço (2)], identificado como Edifício, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º XXXXX, a folhas XXX do livro XXX, com o regime de propriedade horizontal inscrito sob o n.º XXXXX, a folhas XX verso do livro XXX.
Recorreram para o Tribunal de Segunda Instância (TSI) BB, BC, BD, BE, BF, BG, BH, BI, BJ, BK, BL, BM, BN, BO, BP, BQ, BR, BS, BT, BU, BV e BW, que não são partes na acção dos autos, por entenderem ser terceiros directamente prejudicados com a decisão.
Para tal, estes recorrentes alegaram e demonstraram ter intentado uma acção judicial (CV3-11-0020-CAO) - que estava pendente - contra a mesma ré da presente acção e outros, pedindo a declaração de aquisição por usucapião de partes indivisas das mesmas fracções dos autos, destinadas a parques de estacionamento.
O TSI, por acórdão de 4 de Dezembro de 2014, decidiu que os recorrentes tinham legitimidade para impugnar a decisão recorrida.
E o TSI modificou a matéria de facto.
Quanto ao mérito da causa, o acórdão recorrido revogou a sentença recorrida e absolveu a ré dos pedidos.
Recorreram os autores para este Tribunal de Ultima Instância (TUI), suscitando as seguintes questões e argumentos:
- Os ora recorridos não tinham legitimidade para recorrer da sentença de 1.ª instância, porque os lugares de estacionamento de que alegam ser titulares noutra acção, são distintos dos dos presentes autos, pelo que não são afectados pela decisão dos autos; por outro lado, ainda não foi proferida decisão naquela outra acção a reconhecer a titularidade dos 21 lugares de estacionamento; por último há oposição entre a fundamentação e a decisão;
- O acórdão recorrido não poderia ter alterado a matéria de facto e considerado que as partes não celebraram contratos-promessa de compra e venda;
- O acórdão recorrido errou ao entender que os contratos dos autos não são contratos-promessa de compra e venda.
Entretanto, a acção judicial (CV3-11-0020-CAO), que estava pendente, foi decidida por acórdão do TSI, de 16 de Fevereiro de 2017, transitado em julgado, que confirmou a sentença de 1.ª instância, que julgou improcedente a acção, absolvendo os réus do pedido.

II – O Direito
Como se disse, recorreram para o TSI, BB, BC, BD, BE, BF, BG, BH, BI, BJ, BK, BL, BM, BN, BO, BP, BQ, BR, BS, BT, BU, BV e BW, que não são partes na acção dos autos, por entenderem ser terceiros directamente prejudicados com a decisão.
Para tal, estes recorrentes alegaram e demonstraram ter intentado uma acção judicial (CV3-11-0020-CAO) - que estava pendente - contra a mesma ré da presente acção e outros, pedindo a declaração de aquisição por usucapião de partes indivisas das mesmas fracções dos autos, destinadas a parques de estacionamento.
O acórdão recorrido decidiu que os recorrentes tinham legitimidade para impugnar a decisão recorrida, face ao disposto no n.º 2 do artigo 585.º do Código de Processo Civil.
Para tal, entendeu que os recorrentes intentaram uma acção judicial (CV3-11-0020-CAO) - que estava pendente - contra a mesma ré da presente acção e outros, pedindo a declaração de aquisição por usucapião de partes indivisas das fracções dos autos, destinadas a parques de estacionamento. E que, tendo os autores intentado a presente acção pedindo a declaração de que são titulares de partes indivisas das fracções dos autos, estes estão a prejudicar os outros co-titulares nos direitos de propriedade sobre as mesmas.
Recorrem agora os autores para este TUI, defendendo que os ora recorridos não tinham legitimidade para recorrer da sentença de 1.ª instância, porque os lugares de estacionamento de que alegam ser titulares noutra acção, são distintos dos dos presentes autos, pelo que não são afectados pela decisão dos autos; por outro lado, ainda não foi proferida decisão naquela outra acção a reconhecer a titularidade dos 21 lugares de estacionamento; por último há oposição entre a fundamentação e a decisão.
Quanto ao segundo argumento – de que ainda não foi proferida decisão naquela outra acção a reconhecer a titularidade dos 21 lugares de estacionamento – era exacta a afirmação de que tal acção ainda estava pendente, pelo que ainda não existia decisão a reconhecer a titularidade dos 21 lugares de estacionamento.
Quanto à substância do argumento, entendem os ora recorridos que a usucapião pode ser arguida ainda que não declarada pelo Tribunal ou a sua aquisição registada.
Para tal, dizem que a usucapião, para ser eficaz, basta ser invocada.
Os ora recorridos não têm razão.
O único direito, que os ora recorridos alegam ter sobre as fracções autónomas em questão, é a titularidade do direito de propriedade de partes indivisas das fracções, adquiridas por meio de usucapião.
É certo que podem invocar a usucapião, até extrajudicialmente, mas daí não decorre que o Tribunal a tenha de reconhecer.
O que o artigo 296.º do Código Civil - aplicável à usucapião por força do disposto no artigo 1217.º do mesmo diploma - diz é que o tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita ou pelo seu representante.
Logo, se os ora recorridos não demonstrarem a aquisição por usucapião, não dispõem de qualquer direito sobre as fracções, pelo que, seguramente não são prejudicados pela decisão de 1.ª instância (n.º 2 do artigo 585.º do Código de Processo Civil).
Ora, a acção judicial (CV3-11-0020-CAO), que estava pendente, foi decidida por acórdão do TSI, de 16 de Fevereiro de 2017, transitado em julgado, que confirmou a sentença de 1.ª instância, que julgou improcedente a acção, absolvendo os réus do pedido.
Assim, sendo esta acção sido improcedente impõe-se julgar procedente o presente recurso, por falta de legitimidade dos recorrentes (ora recorridos) para a interposição de recurso da sentença de 1.ª instância, por não terem sido prejudicados com a decisão. É que, embora, arrogando-se a titularidade de direito, que supostamente foi reconhecido aos autores da presente acção com a sentença de 1.ª instância, não lograram provar tal direito.
Estão prejudicadas as restantes questões suscitadas no recurso.

III - Decisão
Face ao expendido, concede-se provimento ao recurso, revoga-se o acórdão recorrido na parte em que decidiu que os recorrentes (ora recorridos) têm legitimidade para recorrer da sentença de 1.ª instância e, por falta dela, não admitem o recurso desta sentença.
Custas pelos ora recorridos nos dois recursos, para o TSI e TUI.
Macau, 27 de Setembro de 2017.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

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