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Proc. nº 672/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 21 de Setembro de 2017
Descritores:
-Concessão de terras
-Caducidade
-Multa
-Actividade vinculada

SUMÁRIO:

I. A caducidade preclusiva ocorre ope legis e automaticamente e repousa a sua eficácia extintiva no facto objectivo do mero decurso do tempo, cego e independentemente de outros factores, como o da culpa, por exemplo.

II. Se o concessionário não realizar o aproveitamento no prazo acordado contratualmente para o efeito é vinculada a actividade administrativa na declaração de caducidade com esse fundamento (por alguns designada caducidade-sanção), independentemente de não ter havido aplicação de multa.

III. O facto de o concedente não ter aplicado a multa contratual na altura própria não o impede de a aplicar posteriormente.

IV. De igual modo, a circunstância de naquela ocasião não ter sido declarada a caducidade por não aproveitamento no prazo previsto não afasta o dever de a declarar a todo o momento, nem faz transferir para o contraente público a culpa do não aproveitamento.

V. Na matéria vinculada referida em II, os vícios imputados ao acto que tenham o seu campo de aplicação vocacionado exclusivamente aos actos administrativos integrados em actividade discricionária (como é, por exemplo, o caso dos vícios invocados respeitantes a violação do princípio da igualdade, imparcialidade, proporcionalidade, protecção dos direitos e interesses dos residentes) terão que ser julgados improcedentes.









Proc. nº 672/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
Companhia de Investimento Predial Pak Lok Mun, Limitada, com sede em Macau, na Calçada de S. Agostinho, n.º 6, Edifício Ka Va Kok, r/c, em Macau, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º 4660 (SO), interpôs neste TSI, -----
O presente recurso contencioso,-----
Do despacho do Chefe do Executivo de 15 de Maio de 2015 que declarou a caducidade da concessão provisória, por arrendamento, do terreno com a área de 2209m2, situado na ilha da Taipa, na Avenida Kwong Tung, na Baixa da Taipa, designado por lote BT11, pelo incumprimento do aproveitamento do terreno no prazo fixado no contrato.
Na petição inicial formulou as seguintes conclusões:
«1) Com o presente recurso contencioso, a Recorrente vem pedir a declaração de nulidade ou a anulação do acto administrativo que foi notificado pessoalmente à Recorrente por carta registada com aviso de recepção no dia 12 de Junho de 2015;
2) O acto administrativo foi praticado por sua Excelência o Chefe do Executivo e consiste na aposição da fórmula “Concordo” na primeira folha de um documento autónomo intitulado “Parecer”, com data de 14 de Maio de 2015, e assinado pelo Senhor Secretário para as Obras Públicas e Transportes (SOPT);
3) Infere-se logicamente do texto daquele “Parecer” do SOPT, mormente das palavras a carregado, que o acto administrativo visa produzir os efeitos de declaração de caducidade da concessão do terreno identificado no mesmo “Parecer”, cuja concessionária é a ora Recorrente;
4) Sendo assim, esta decisão do Chefe do Executivo devia observar o disposto no artigo 167.º da Lei n.º 10/2013, Lei de Terras;
5) O referido artigo 167.º da Lei de Terras estabelece as seguintes exigências de forma:
I. O Chefe do Executivo deve afirmar expressamente que declara a caducidade da concessão;
II. Tal afirmação expressa do Chefe do Executivo deve ser reduzida a escrito, em despacho do Chefe do Executivo; não deve ser, portanto, uma declaração meramente verbal, nem uma declaração a inferir de documentos de outra entidade; deve ser o texto escrito do próprio despacho do Chefe do Executivo a conter a declaração de caducidade da concessão;
III. O despacho do Chefe do Executivo contendo o texto a declarar a caducidade da concessão deve ser publicado no Boletim Oficial.
6) Ora, o acto administrativo impugnado não foi publicado no Boletim Oficial, em manifesta violação do disposto no artigo 167.º do CPA; e este vício de forma é insuprível porque
7) Faltou lavrar o despacho que contivesse - formalmente e por escrito! - a declaração de caducidade da concessão, como é exigido pelo artigo 167.º da Lei de Terras, o que gera outro vício de forma; e também este vício é insuprível porque
8) Não existe uma decisão final expressa do Chefe do Executivo com o teor” é declarada a caducidade da concessão”, como exige o artigo 167.º da Lei de Terras para este tipo específico de actos administrativos.
9) Exigência formal que reforça, para este tipo de actos administrativos, os requisitos previstos no artigo 100.º do CPA, para a decisão final expressa, afloramento de um princípio geral aplicável à generalidade dos actos administrativos: tem-se entendido que os efeitos, o conteúdo ou sentido, do acto administrativo têm sempre de vir enunciados nele próprio (Mário Esteves de Oliveira /Pedro Costa Gonçalves /J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo comentado, 2.ª ed., anotação IV ao artigo 125.º, p. 604)
10) Ocorrem, portanto, três distintas violações das exigências legais impostas pelo artigo 167.º da Lei de Terras, sendo certo que cada violação determina, isoladamente considerada, a invalidade do acto impugnado, por vício de forma, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
11) Mas não é apenas na parte da decisão que o acto recorrido enferma de vícios de forma.
Também há vícios de forma relativamente às exigências legais de fundamentação do acto administrativo.
12) Na verdade, uma vez que extingue direitos e interesses legalmente protegidos da Recorrente, o acto recorrido devia ser expressamente fundamentado, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 114.º e do artigo 115.º, ambos do CPA.
13) E como o despacho do CE é um mero “Concordo” aposto na primeira folha do parecer do SOPT, deveria o texto deste Parecer conter a fundamentação expressa do acto, com a exposição das razões de facto e de direito, nos precisos termos estabelecidos no n.º 1 do artigo 115.º do CPA.
14) A fundamentação por remissão obriga a que a informação, parecer ou proposta para que se remete contenha as razões de facto e de direito, ainda que de forma sucinta, mas de modo a que se perceba por que se decidiu naquele sentido. Não contendo tal informação, com suficiência e clareza os motivos, causas ou pressupostos da decisão, estamos perante a falta de fundamentação do acto administrativo: a obscuridade e insuficiência da fundamentação do acto valem como falta de fundamentação. A falta de fundamentação inquina o acto de ilegalidade que determina a sua anulabilidade.
15) Sucede que o parecer do SOPT em cuja primeira folha foi aposto o “Concordo” do CE não contém a exposição das razões de facto e de direito que determinaram apática do acto; o que nele se lê é: «Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que nele vem proposto pelas razões indicadas naquele, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno.»
16) Esta afirmação genérica e indeterminada a aludir em bloco às razões indicadas no processo não integra no acto administrativo a exposição dos respectivos fundamentos, pelo que não satisfaz as exigências legais: «fundamentações do tipo “pelos motivos revelados no processo” ou “pelas razões feitas saber” não são expressas, por não virem declarados quais são esses motivos ou razões. Não estando eles enunciados ou manifestados no acto, a fundamentação “falta”, não existe» (Mário Esteves de Oliveira /Pedro Costa Gonçalves /J. Pacheco de Amorim (Código do Procedimento Administrativo comentado, 2.ª ed., anotação ao artigo 125.º, p. 601).
17) A isto acresce que não existe no processo qualquer exposição das razões de direito que determinaram a prática do acto, a qual aliás nunca terá sido sequer elaborada, sabendo-se que «a validade de um acto administrativo afere-se sempre pela conformidade desse acto com o ordenamento jurídico no momento em que ele é praticado» (Freitas do Amaral, Direito Administrativo, p. 429).
18) A Recorrente conjectura, por conhecimento genérico da lei, que os órgãos administrativos poderiam estar a ponderar a aplicação do artigo 215.º da Lei n.º 10/2013, Lei de Terras. Mesmo assim, porém, corno o artigo 215.º tem três alíneas é manifesto que não se pode afirmar, com toda a certeza, qual das alíneas se pretendeu aplicar, visto que não há qualquer indicação expressa a esse respeito.
19) Não há no texto do acto administrativo recorrido, nem no texto dos elementos existentes no processo - pelo menos naqueles elementos cujo teor foi facultado à Recorrente - uma única linha, uma única palavra a expor o modo como a Administração interpreta o artigo 215.º da Lei n.º 10/2013, a indicar quais são os requisitos de cada uma das respectivas alíneas ou a estabelecer a correspondência entre os factos carreados para o processo e as hipóteses daquelas normas jurídicas.
20) Os órgãos administrativos nunca elaboraram qualquer informação, relatório ou parecer sobre a interpretação e aplicação do artigo 215.º da Lei n.º 10/2013, Lei de Terras, à concessão aqui em crise.
21) O modo como ocorre, no acto recorrido, a falta de exposição dos fundamentos de facto e de direito é particularmente grave visto que põe em crise todas as finalidades prático-jurídicas do dever de fundamentação expressa dos actos administrativos.
22) Nomeadamente, a decisão final ora impugnada não ponderou as questões suscitadas pela concessionária e também não ponderou as questões suscitadas na parte final do parecer da Comissão de Terras de 15 de Dezembro de 2011, onde se mostra que a prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes é no sentido da não declaração da caducidade da concessão.
23) Assim, além do mais, não é possível conhecer as razões, de fado e de direito, para a não aplicação, à concessão da Recorrente, dos mesmos critérios com que factualidade semelhante foi anteriormente ponderada, em casos semelhantes, pelo Chefe do Executivo;
24) E a decisão recorrida é de sentido oposto aos despachos do Chefe do Executivo em casos semelhantes, decidindo de modo diferente da prática habitualmente seguida, pelo que devia observar o disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 114.º e do n.º 1 do artigo 115.º, ambos do CPA.
25) Donde, também esta falta de fundamentação gera um vício de forma do acto administrativo ora impugnado.
26) Ocorrem, portanto, três distintas violações das exigências legais em sede de fundamentação dos actos administrativos:
I. Falta uma exposição das razões de facto que determinaram a decisão, pelo que o acto recorrido é inválido por vício de forma, nos termos conjugados da alínea a) do n.º 1 do artigo 114.º e do n.º 1 do artigo 115.º, ambos do CPA, e da alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC;
II. Falta urna exposição das razões de direito que determinaram a decisão, tendo em conta o ordenamento jurídico em Maio de 2015, isto é, ao tempo em que o acto é praticado, pelo que o acto recorrido é inválido por vício de forma, nos termos conjugados da alínea a) do n.º 1 do artigo 114.º e do n.º 1 do artigo 115.º, ambos do CPA, e da alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC;
III. Falta urna exposição das razões de facto e de direito que determinaram a diferença desta decisão face à prática e aos critérios seguidos pelo Chefe do Executivo em todos os casos semelhantes, nomeadamente aqueles que são identificados no Parecer da Comissão de Terras de Dezembro de 2011, pelo que o acto recorrido é inválido por vício de forma, nos termos conjugados da alínea e) do n.º 1 do artigo 114.º e do n.º 1 do artigo 115.º, ambos do CPA, e da alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
27) O acto recorrido enferma, ainda, de outro vício de forma, nos termos da mencionada alínea c) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC por violação do direito de audiência prévia previsto nos artigos 93.º e seguintes do CPA.
28) Em 2010 e 2011, quando procuraram criar a aparência formal de cumprimento do disposto nos artigos 93º e seguintes do CPA, os órgãos administrativos verdadeiramente não ouviram e não consideraram os motivos e argumentos aduzidos pela concessionária ora recorrente.
29) Em todo o caso, essas diligências foram feitas em períodos anteriores à conclusão da instrução, pelo que não eram idóneas a satisfazer os requisitos daquelas normas jurídicas do CPA.
30) Nem se objecte com a tese de que teria havido continuidade do procedimento desde 2010 até 2015, sem mais diligências instrutórias posteriores ao parecer da Comissão de Terras de Dezembro de 2011 e sem levar em conta toda a factualidade entretanto ocorrida, porquanto tal tese implicaria, além do mais, a clara violação do disposto nos artigos 61.º e 59.º do CPA e a ofensa aos princípios da legalidade, da boa fé, da desburocratização e eficiência consagrados, respectivamente, nos artigos 3.º, 8.º e 12.º do mesmo Código.
31) Entre 2010 e 2015, o contraente público aceitou o pagamento do prémio e os órgãos administrativos continuam a apreciar os projectos para o aproveitamento do terreno objecto da concessão, embora com delongas que são imputáveis aos próprios órgãos administrativos.
32) Salvo o devido respeito, tanto a fidelidade à verdade dos factos, como, até, a necessidade de presumir que os órgãos administrativos actuam no âmbito e dentro do perímetro da legalidade administrativa impõem que se conclua que em 2015 há, outrossim, um novo procedimento administrativo, o qual aproveitou o histórico de 2011, mas em que falta a instrução e a ponderação dos factos posteriores, bem como a audiência da concessionária.
33) A consideração isolada de cada um dos vícios que se apontou deve ser complementada por uma sua apreciação de conjunto, global, que tenha em conta o relevo e a repercussão social do assunto mas sem esquecer a preocupação com a veracidade dos factos e o respeito pelos princípios da legalidade e da boa fé, consagrados, respectivamente, nos artigos 3.º e 8.º do CPA;
34) Salvo o devido respeito, notificar um particular que é parte no contrato de concessão de um terreno de que essa concessão caducou, por uma decisão tácita do Chefe do Executivo, cujo sentido tem de se inferir de um documento elaborado por outra entidade, sem lhe apresentar uma exposição dos fundamentos de facto e de direito, por conseguinte sem qualquer resposta às questões anteriormente suscitadas pela própria concessionária e recusando-lhe, em 2015, o direito de audiência prévia, sem publicar no Boletim Oficial aquela decisão, e
35) Para mais, em conflito aberto com a veracidade dos factos, mormente dos factos ocorridos de 2010 até ao presente, em que o contraente público aceitou o pagamento do prémio, o qual se encontra totalmente pago, exigiu declarações e garantias bancárias da capacidade financeira e se encontra a apreciar, há vários anos, os projectos pertinentes,
36) Constitui, na percepção da Recorrente, um rol de enfermidades tão graves, que o acto recorrido deve ser considerado nulo, por lhe faltarem os elementos essenciais, nos termos do n.º 1 do artigo 122.º do CPA.
Subsidiariamente, mas sem conceder,
37) A Recorrente entende que o acto recorrido está inquinado de ilegalidade por erro nos pressupostos e enferma ainda de vários vícios de violação de lei, mormente por violação dos princípios da imparcialidade, da igualdade e da proporcionalidade.
Questões de erro nos pressupostos:
38) Começando pelas questões de erro nos pressupostos, a invalidade resulta de diferentes causas e linhas de raciocínio já desenvolvidamente expostas no articulado;
39) Assim, por um lado, a Recorrente sustenta que ocorreu, na realidade, manifesta violação do princípio do inquisitório, em especial da dimensão material deste princípio, porque os órgãos administrativos não cumpriram os seus poderes-deveres de proceder às investigações necessárias ao conhecimento dos factos essenciais ou determinantes para a decisão, à descoberta e ponderação de todas as dimensões de interesses públicos e privados que se ligam com a decisão final;
40) Em consequência directa dessas violações de lei, mormente do disposto nos artigos 59.º e 86.º, ambos do CPA, os órgãos administrativos não averiguaram factos relevantes e deixaram de fora do procedimento factos de que tinham conhecimento;
41) Não fora a violação reiterada do princípio do inquisitório, se o procedimento tivesse sido instruído com toda a factualidade pertinente, com a máxima aquisição dos factos referidos no articulado e dos demais que eram conhecidos dos órgãos administrativos instrutores, não ocorresse tal deficit de instrução, e a decisão final teria sido noutro sentido que não o da declaração de caducidade:
42) A decisão teria sido no mesmo sentido das decisões finais que foram tomadas nos procedimentos administrativos em que alguma daquela factualidade foi feita constar e foi ponderada, isto é, a decisão final teria sido a de continuidade da concessão.
43) A violação do princípio do inquisitório inquinou, portanto, por deficit de instrução, o próprio acto administrativo, o qual enferma de ilegalidade, nomeadamente por violação dos artigos 59.º e 86.º do CPA mas também por violação dos princípios da legalidade e da prossecução do interesse público consagrados, respectivamente, nos artigos 3.º e 4.º do CPA.
44) Por outro lado, como falta uma exposição das razões de facto e de direito que determinam a decisão recorrida, a Recorrente foi colocando sucessivas hipóteses, cada uma correspondendo a uma hipotética via de fundamentação do acto administrativo, mas após a apreciação de cada hipótese, a Recorrente chega à conclusão que existe erro nos pressupostos que inquina o acto recorrido de ilegalidade.
45) Isto porque, como é sabido, os pressupostos de um acto administrativo devem ser sempre verdadeiros, pois se o autor de tal acto «admite a existência dessa situação quando efectivamente assim não sucede, é evidente que o autor se fundou, por erro, numa situação diferente insusceptível de servir de base à concretização da delegação conferida pela norma legal abstracta. Tal erro produz o resultado de tirar ao acto a sua base legal, tomando-a ilegal. O juiz deve então assimilar este erro de facto à violação da própria lei» (Michel Stassinopoulos, Traité des actes administratifs, p. 175).
46) A primeira série de hipóteses de fundamentação do acto impugnado assenta numa conjectura comum: o acto recorrido teria aplicado alguma alínea do artigo 215.º da Lei n.º 10/2013, Lei de Terras.
47) Nesta primeira série de hipóteses, ao fazer aplicação de alguma alínea do mencionado artigo da Lei de Terras, o acto recorrido está viciado por erro nos pressupostos,
48) Já por a realidade factual não corresponder às referências a prazos que constam das hipóteses das alíneas 1) e 3) do artigo 215.º da Lei de Terras, porque, nomeadamente:
I. As partes nunca atribuíram qualquer efeito prático a esses prazos;
II. Era patente e do conhecimento da Administração que a “Fábrica de Artigos de Vestuário Estilo” já tinha entregue todos os estudos prévios, anteprojectos de obra (projecto de arquitectura) e projectos de obra a que se referiu posteriormente o artigo Quinto do Contrato de concessão;
III. No acompanhamento da execução do contrato, a Administração não determinou outros prazos à concessionária e deu indicações de que o plano inicial iria ser alterado, alteração que se comprova, aliás, no facto de ter sido adiada, por tempo indeterminado, a execução das infraestruturas e dos arruamentos assinalados pela letra F;
IV. O contraente público aceitou o pagamento do prémio, o qual se encontra totalmente pago;
V. Em cumprimento de obrigação adicional imposta pela Administração, a concessionária ora Recorrente declarou expressamente o seu interesse no aproveitamento do lote objecto da concessão e prestou garantia bancária comprovativa da sua capacidade financeira;
VI. Os órgãos administrativos estão a apreciar, há vários anos, os estudos e projectos para empreendimento de aproveitamento do lote objecto da concessão.
49) Já também por não estar verificado, na hipótese de aplicação da alínea 3) do referido artigo 215.º, o requisito da culpa da concessionária no não aproveitamento do terreno e,
50) Tanto assim, que a Administração concluiu, em casos semelhantes e ponderando os motivos que são igualmente apresentados pela concessionária, ora Recorrente, que a fonte do atraso no aproveitamento assenta também em factos objectivos, alguns até factos notórios, pelo que o atraso no aproveitamento não é culposamente imputável à concessionária.
51) A segunda série de hipóteses hipóteses de fundamentação do acto recorrido assenta na conjectura de que este acto buscaria fundamento, ainda que meramente formal, no n.º 2 e na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima-terceira do contrato de concessão.
52) Nesta segunda série de hipóteses, o acto recorrido está viciado por erro nos pressupostos,
53) Já por a realidade factual relativamente ao lote da Recorrente não verificar a situação prevista na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima-terceira do contrato, visto que, nomeadamente:
I. A concessionária nunca foi notificada para intervir ou para se pronunciar relativamente à eventual aplicação de uma multa diária nos termos da cláusula sexta do contrato;
II. A concessionária nunca pagou e nunca foi notificada para pagar uma multa prevista na cláusula sexta do contrato;
III. A concessionária nunca foi notificada de que iria iniciar-se, estaria a correr ou já teria findo algum prazo fixado pelo contraente público nos termos previstos no n.º 1 da cláusula sexta do contrato.
54) Já por ter havido, na execução das tarefas materiais e jurídicas de interpretação do contrato, violação das regras e critérios legais de interpretação das cláusulas contratuais, conduzindo, de facto, a uma representação errónea do regime contratual;
55) Seja ainda por, em lugar de realizarem as tarefas materiais e jurídicas de interpretação do contrato de concessão que tem por objecto o lote aqui em crise, os órgãos administrativos terem aplicado no procedimento as instruções internas que, a partir de 2010, passaram a aplicar, de modo uniformizado e sem atender aos concretos clausulados, nos procedimentos relativos aos terrenos que a DSSOPT iria tentar reaver para a RAEM sem indemnizações aos seus legítimos detentores.
56) Instruções internas que os colaboradores da DSSOPT supuseram vinculativas já que aprovadas por um despacho do Chefe do Executivo de 31 de Maio de 2010, na sequência de proposta do SOPT elaborada com base na informação n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio de 2010, do Departamento da Gestão de Solos da DSSOPT, mas
57) Tais instruções internas violam o disposto no n.º 1 do artigo 173.º do CPA e são nulas por vício de usurpação do poder, na modalidade de usurpação do poder judicial, poder que só aos tribunais compete exercer nos termos dos artigos 82.º e 83.º da Lei Básica.
58) Salvo o devido respeito, para além de revelarem a infracção das normas jurídicas aplicáveis, as diversas causas de erro nos pressupostos acima expostas inquinam o acto recorrido com várias invalidades porque representam urna clara violação dos princípios da legalidade, da prossecução do interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes, consagrados nos artigos 3.º e 4.º do CPA, e urna ofensa aos princípios da separação de poderes e da independência dos tribunais acolhidos na Lei Básica.
Questões da violação de lei por violação do princípio da imparcialidade:
59) A Recorrente entende que o acto administrativo impugnado incorre em manifesta violação do princípio da imparcialidade previsto no artigo 7.º do CPA, pelo que enferma de vícios de violação de lei que determinam a sua anulação nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
60) A predeterminação do resultado que veio a inquinar o acto administrativo tomou forma logo em 2010, quando, em cumprimento de directivas internas, os colaboradores da DSSOPT iniciaram procedimentos administrativos para dar forma jurídica à decisão de se reaverem determinados terrenos.
61) Afigura-se plausível que a tramitação desses procedimentos terá somente visado criar uma aparência de satisfação das formalidades legais, talvez por se supor que a determinação e o propósito de reaver determinados terrenos identificados num mapa já estavam definitivamente assentes, porque tinham sido aprovados por um despacho do Chefe do Executivo de 31 de Maio de 2010, na sequência de proposta do SOPT elaborada com base na informação n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio de 2010, do Departamento da Gestão de Solos da DSSOPT.
62) Foi assim no processo do acto ora impugnado, no qual toda a tramitação ocorrida em 2010 e 2011 serviu somente para criar uma aparência de satisfação das formalidades legais, sem qualquer efeito prático real,
63) E, salvo o devido respeito, a Recorrente entende que a violação do princípio da imparcialidade prosseguiu agora em 2015, com o teor do Parecer do SOPT de 14 de Maio de 2015,
64) Não apenas porque esse Parecer subtraiu à entidade competente para a decisão final, o conhecimento dos factos ocorridos relativamente ao lote em crise, em especial aqueles que se verificaram após 2011,
65) Mas também porque esse Parecer subtraiu à entidade competente para a decisão final, o conhecimento do sentido global da pronúncia da Comissão de Terras;
66) Com efeito, no parecer que é mencionado no considerando 12 do Parecer de 14 de Maio de 2015 do SOPT, a Comissão de Terras pronuncia-se em termos dubitativos, pois, pese embora comece por acompanhar a DSSOPT na proposta de declaração de caducidade da concessão, termina sublinhando que as decisões do Chefe do Executivo em casos semelhantes são noutro sentido:
«Esta Comissão entende que deve sublinhar que nos procedimentos sobre o incumprimento dos contratos de concessão dos terrenos com as áreas de 15823m2, 8124m2 e 13517m2, situados na ilha da Taipa, junto à Estrada Governador Albano de Oliveira, titulados pelo Despacho n.º 173/SATOP/97, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 53, II Série, de 31 de Dezembro de 1997, Despacho n.º 13/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau 10, II Série, de 11 de Março de 1998 e Despacho n.º 32/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 17, II Série, de 29 de Abril de 1998, a decisão foi no sentido de não declarar a caducidade da concessão e, por conseguinte, de conceder um novo prazo para execução do respectivo aproveitamento, apesar de se considerar o não cumprimento do contrato imputável às concessionárias.»
67) Portanto, na parte agora transcrita, a pronúncia da Comissão de Terras tem o sentido de reconhecer que a prática seguida pelo Chefe do Executivo na resolução de casos semelhantes e na interpretação dos mesmos princípios e preceitos legais tem conduzido a decisões de sentido oposto àquilo que está a ser proposto pela DSSOPT;
68) Todavia, no texto do “Parecer” de 14 de Maio de 2015, assinado pelo SOPT, que foi submetido a ponderação e despacho do CE, os órgãos administrativos omitem a transcrição ou a referência, mormente no ponto 12 do respigo de elementos do processo, desta avisada pronúncia da Comissão de Terras.
69) Outra ilustração da violação ostensiva do princípio da proporcionalidade é o facto de se deixar transparecer, nas peças processuais e no referido Parecer de 14 de Maio de 2015, a dúvida sobre se alguma vez foram apresentados estudos e anteprojectos para aqueles terrenos quando, de facto,
70) A pessoa que agora assina o parecer de 14 de Maio de 2015 na qualidade de Secretário para as Obras Públicas e Transportes já tinha tido anteriormente intervenção em estudo técnico bem como participou em reuniões em nome e representação da anterior concessionária do lote, factualidade que representa, por si só, causa de anulação do acto recorrido, por violação da alínea d) do n.º 1 do artigo 46.º do CPA.
Questão da violação de lei por violação do princípio da igualdade
71) A Recorrente entende que o acto administrativo impugnado incorre em manifesta violação do princípio da igualdade previsto no artigo 5.º do CPA, pelo que enferma de vício de violação de lei que determina a sua anulação nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
72) Quando os primeiros processos da longa série de procedimentos que foram organizados e instruídos pela DSSOPT, com aquela intenção predeterminada de reaver os terrenos identificados no mapa, independentemente das especificidades factuais e jurídicas de cada caso, subiram ao Gabinete do Chefe do Executivo, os respectivos assessores detectaram as deficiências de instrução, a falta de neutralidade na apreciação de factos notórios e relevantes, assim corno a falta de independência na avaliação do relevo para os atrasos nos aproveitamentos das acções e omissões imputáveis aos próprios serviços.
73) Em todos esses processos, a decisão final do Chefe do Executivo foi de sentido oposto ao sentido que a DSSOPT predeterminara e, em lugar da declaração da caducidade, a final houve fixação de novo prazo para aproveitamento do terreno, geralmente acompanhado de aplicação de multa à concessionária.
74) Há muitas semelhanças relevantes entre a situação dos terrenos visados nesses processos, mormente aqueles que a Comissão de Terras expressamente identifica no supra referido parecer, e a situação do lote objecto da concessão em crise:
I. Nos motivos do protelamento do aproveitamento, os quais se prendem com a repercussão de factos notórios e de factos conhecidos da Administração;
II. Na circunstância de todos os processos terem sido organizados e instruídos pelos mesmos órgãos administrativos;
III. Na identidade de pressupostos, tipo de procedimento administrativo e forma observada;
III. No regime jurídico e nas soluções abstractamente disponíveis para a decisão final em cada processo: continuidade da concessão; continuidade através da fixação de novo prazo; continuidade através da fixação de novo prazo acompanhado da aplicação de multa contratualmente prevista; declaração de caducidade.
75) É patente, por exemplo, o leque de semelhanças significativas entre o procedimento que conduziu ao acto recorrido e o procedimento administrativo sobre o incumprimento do contrato de concessão do terreno com a área de 15823m2, situado na ilha da Taipa, junto à Estrada Governador Albano de Oliveira, titulado pelo Despacho n.º 173/SATOP/97, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 53, II Série, de 31 de Dezembro de 1997:
I. Também aí a instrução culminou na proposta do SOPT, na sequência de proposta da DSSOPT, com base na informação n.º 191/DSODEP/2010, de 24 de Setembro, de que fosse declarada a caducidade da concessão do terreno pelo Chefe do Executivo e que todo o prémio e juros pagos, assim como o terreno e todas as benfeitorias aí introduzidas revertessem para a posse da RAEM, não havendo lugar a qualquer indemnização;
II. O teor daquela referida informação n.º 191/DSODEP/2010, de 22 de Julho da DSSOPT é similar ao teor das informações e pareceres emitidos no presente processo.
III. Os factos notórios que os assessores do Gabinete do Chefe do Executivo ponderaram e a que foram sensíveis, por se tratar de motivos objectivos ou de circunstâncias de força maior para impedir o aproveitamento desse terreno, coincidem com a factualidade que também teve repercussão negativa no caso do terreno objecto da concessão em crise;
76) Não obstante, a decisão do procedimento administrativo, tomada por despacho do Chefe do Executivo de 26 de Maio de 2011, foi no sentido de não declarar a caducidade da concessão do terreno, antes conceder novo prazo de aproveitamento e aplicar multa à concessionária;
77) As semelhanças são igualmente nítidas quando se compare com o procedimento administrativo sobre o incumprimento do contrato de concessão do terreno com a área de 8124m2, situado na ilha da Taipa, junto à Estrada Governador Albano de Oliveira, titulado pelo Despacho n.º 13/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 10, II Série, de 11 de Março de 1998:
I. Também aí a instrução culminou na proposta do SOPT, na sequência de proposta da DSSOPT, com base na informação n.º 207/DSODEP/2011, de 18 de Agosto, de que fosse declarada a caducidade da concessão do terreno pelo Chefe do Executivo e que todo o prémio pago, assim como o terreno e todas as benfeitorias aí introduzidas revertessem para a posse da RAEM, não havendo lugar a qualquer indemnização;
II. O teor daquela referida informação n.º 207/DSODEP/2011, de 18 de Agosto da DSSOPT é similar ao teor da informação n. informações e pareceres emitidos no presente processo.
III. Os factos notórios que os assessores do Gabinete do Chefe do Executivo ponderaram e a que foram sensíveis, por se tratar de motivos objectivos ou de circunstâncias de força maior para impedir o aproveitamento desse terreno, coincidem com a factualidade que também teve repercussão negativa no caso do terreno objecto da concessão em crise;
78) E o certo é que a decisão do procedimento administrativo, tomada por despacho do Chefe do Executivo de 19 de Agosto de 2011, foi no sentido de não declarar a caducidade da concessão do terreno, antes conceder um novo prazo para aproveitamento do terreno e aplicar multa à concessionária.
79) Dois casos semelhantes ao do acto impugnado e, contudo, a decisão recorrida foi de sentido oposto ao das decisões finais daqueles casos semelhantes.
80) Em síntese, o acto administrativo recorrido não usou critérios substancialmente idênticos aos usados naqueles casos semelhantes e é esta mudança de critérios, sem qualquer fundamento material, que viola ostensivamente o princípio da igualdade consagrado no artigo 5.º do CPA e gera a invalidade por vício de violação de lei.
Questão da violação de lei por violação do princípio da proporcionalidade e do princípio da protecção dos direitos e interesses dos residentes
81) A Recorrente entende que o acto administrativo impugnado incorre em manifesta violação do princípio da proporcionalidade previsto no artigo 5.º do CPA, pelo que enferma de vício de violação de lei que determina a sua anulação nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
82) Com efeito, do lado da concessionária estão reunidas todas as condições para o efectivo aproveitamento do terreno:
I. O contraente público aceitou o pagamento do prémio, o qual se encontra totalmente pago;
II. Em cumprimento de obrigação adicional imposta pela Administração, a concessionária ora Recorrente declarou expressamente o seu interesse no aproveitamento do lote objecto da concessão e prestou garantia bancária comprovativa da sua capacidade financeira;
III. Os órgãos administrativos estão a apreciar, há vários anos, os estudos e projectos para empreendimento de aproveitamento do lote objecto da concessão;
83) Por outro lado, os termos contratuais e a lei prevêem diversas vias para o contraente público não apenas decidir do modo de execução do contrato e fiscalizar a actuação da concessionária mas também para aplicar, se necessário, sanções pecuniárias, mormente sanções pecuniárias compulsórias, à concessionária;
84) As estipulações do contrato estão aliás redigidas, em especial o n.º 1 da cláusula sexta e a alínea a) do n.º 1 da cláusula décima-terceira, em termos que alicerçam a expectativa e o interesse da concessionária em não sofrer os efeitos sancionatórios que a declaração de caducidade acarreta sem que antes tenha havido a aplicação de qualquer multa ou a determinação de um prazo para concluir o aproveitamento.
85) À verificação do atraso no aproveitamento do terreno deveria ter-se seguido, como de resto sucedeu nos outros processos, a determinação de um novo prazo para a concessionária realizar as prestações que lhe incumbem para efectivar o aproveitamento do terreno, eventualmente acompanhado da aplicação da multa diária contratualmente prevista.
86) É manifesta a ofensa ao princípio da necessidade: não era exigível, nem necessário lesar os direitos e interesses da concessionária, ora recorrente, com a intensidade que resultará da eficácia do acto administrativo impugnado.
87) E é ostensiva a ofensa ao princípio da proporcionalidade em sentido estrito: a concessionária é quem está na posição de mais rapidamente e com menos despesa realizar as obras e concretizar o aproveitamento do terreno; não há, no caso, qualquer benefício para o interesse público que compensasse a lesão sofrida pela concessionária.
88) O que tudo revela, do mesmo passo, que o modo como o acto recorrido prossegue o interesse público não respeita os direitos e interesses legalmente protegidos da concessionária, como exige o artigo 4.º do CPA, pelo que está inquinado de vício de violação de lei que determina a sua anulação nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC.
Nestes termos e nos melhores de Direito, que V. Exas. doutamente hão-de suprir, deve o presente recurso contencioso ser julgado totalmente procedente, por provado e, em consequência, deve o acto recorrido ser declarado nulo ou anulado».
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A entidade recorrida contestou pugnando pela improcedência do recurso, cujos termos aqui damos por integralmente reproduzidos.
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Houve lugar a alegações facultativas, tendo as partes reiterado no essencial as posições antes assumidas.
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O digno Magistrado do MP pronunciou-se do seguinte modo acerca do mérito do recurso:
«Objecto do presente recurso contencioso é o despacho de 15 de Maio de 2015, da autoria do Exm.º Chefe do Executivo, que declarou a caducidade da concessão por arrendamento do terreno com a área de 2209 m2, situado na Avenida de Kwong Tung, na Ilha da Taipa, designado por lote BT11, e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 23188.
A recorrente, “Companhia de Investimento Predial Pak Lok Mun, Limitada”, imputa ao acto a bateria de vícios expressos na petição de recurso e repisados e reformulados nas suas alegações facultativas, no que é contraditada pela autoridade recorrida, que assevera a legalidade do acto.
No que toca a vícios de forma, começa a recorrente por colocar em causa a existência do acto declarativo de caducidade e a sua publicação nos termos inculcados pelo artigo 167.º da Lei de Terras. Diz que, em bom rigor, não foi editado e publicado o acto administrativo tal como exigido naquele artigo 167.º, pois a declaração formal expressa da caducidade não consta do próprio despacho do Chefe do Executivo, tendo-se este limitado a apor a fórmula “concordo” num parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, onde este solicita que seja declarada a caducidade da concessão do terreno visado.
Crê-se que o recurso à fórmula “concordo”, para sancionar a declaração de caducidade sugerida ou impetrada pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas, com os fundamentos que este arregimentou e outros para que remeteu, constitui uma forma válida de declarar a caducidade. Esta maneira de decidir, mediante apropriação ou homologação de propostas ou pareceres exarados por elementos situados na estrutura hierárquica em que, se insere a autoridade competente, é típica e usual nos regimes de administração executiva, como é o nosso, e tem sido invariavelmente aceite pelos tribunais.
Havendo, como há, despacho escrito, de inequívoca concordância com um pedido claro de declaração de caducidade, que foi objecto de publicação em Boletim Oficial, afiguram-se cumpridos os requisitos de forma pressupostos na norma do artigo 167.º da Lei de Terras.
Improcede este alegado vício de forma.
Seguidamente, a recorrente sustenta que o acto de declaração de caducidade padece de nulidade por falta de elemento essencial, nos termos conjugados dos artigos 122.º, n.º 1, e 113.º, n.º 1, alínea f), do Código do Procedimento Administrativo. Faltar-lhe-ia o conteúdo ou o sentido da decisão e o respectivo objecto.
Adentro dos vícios de forma, a recorrente autonomizou este vício, em sede de alegações. Mas, para o caracterizar, parte do pressuposto de que o acto se esgota na asserção “concordo”. Ora já vimos que não é assim. A decisão apropriou o parecer/proposta do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que, por isso, passou a constituir parte integrante do acto, juntamente com os pareceres e informações insertos no processo instrutor, para os quais remete. Esse parecer/proposta e os elementos procedimentais para que remete afloram e esclarecem devidamente o objecto, o conteúdo e o sentido decisório do acto.
Soçobra igualmente este vício de forma.
Vem também assacado ao acto o vício de forma por falta de fundamentação.
Mais uma vez a recorrente encara o acto numa perspectiva redutora, ao arrepio daquela dimensão abrangente com que supra o abordámos.
Se consultarmos o relatório de 30 de Novembro de 2011, subsequente à audiência dos interessados, objecto de aprovação pelo parecer de 02 de Dezembro de 2011, da Chefe do DJUDEP (fls. 322 e seguintes do processo instrutor 45/2010), cuja fundamentação, de facto e de direito, foi expressamente convocada, quer pela Comissão de Terras, no seu parecer de 19 de Janeiro de 2012, quer pelo parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 14 de Maio de 2015 (fls. 359 e seguintes e 388 e seguintes do processo instrutor 45/2010), pareceres que viriam a ser incorporados, por apropriação, no acto recorrido, toma-se óbvia a fundamentação e a sua suficiência. Aí consta o histórico da postura da concessionária, ora recorrente, em matéria de (não) satisfação dos compromissos contratuais a que estava obrigada quanto ao aproveitamento do terreno e seu timing. Nomeadamente, está invocada e esgrimida a sua conduta relapsa quanto ao impulso do projecto, início das obras, sua execução e conclusão; está também aflorada a falta de pagamento dos prémios; está abordada a culpa e a tentativa, sem sucesso, de justificação do atraso; enfim, está apontada a caducidade como a consequência para aquela postura tida por relapsa e as normas de direito que caucionam essa consequência. Tanto basta para que o acto se tenha por suficientemente fundamentado nos moldes preconizados nos artigos 114.º e 115.º do Código do Procedimento Administrativo. Se as razões avançadas, de facto e de direito, são boas ou más, certas ou erradas, isso já tem a ver com o fundo, constituindo questão que não releva em matéria de fundamentação.
Também este vício é improcedente.
Ainda no âmbito dos vícios de forma, sustenta a recorrente que não lhe foi facultada a exercitação do direito de audiência. Diz, com efeito, que em 2010 e 2011, a Administração apenas procurou criar a aparência formal da concretização desse passo procedimental, mas que, em rigor, não ouviu e não considerou os motivos e argumentos aduzidos pela ora recorrente. Além disso, após essa “audição”, ainda terão sido realizadas outras diligências de instrução, pelo que a recorrente deveria ter sido ouvida novamente antes da tomada da decisão.
Em primeiro lugar, cabe dizer que a pronúncia da recorrente em sede de audição foi objecto de análise específica e pormenorizada, como se depreende, desde logo, dos despachos exarados na própria exposição (ver fls. 312 verso do processo 45/2010), e como melhor resulta do relatório inserto a fls. 323 e seguintes do referido processo instrutor, o qual viria a ser considerado e ponderado nos pareceres que antecederam a decisão e na própria decisão que, como já se referiu, se fundou nesses pareceres.
Depois, há que notar que, após a pronúncia da recorrente, não foi efectuado acto relevante de instrução, que alterasse substancialmente a base fáctica anteriormente carreada para o procedimento e a solução de direito que nele se perfilava, ao ponto de justificar uma nova audição. A circunstância de haver decorrido um lapso considerável de tempo entre a audiência e a decisão apresenta-se de todo irrelevante.
Improcede também este vício.
Acrescenta a recorrente, em sede de alegações, que a consideração conjunta e global de todos os vícios de forma isoladamente equacionados importa uma carência tal em matéria de forma e conteúdo que o acto não pode deixar de se considerar nulo por falta desses elementos essenciais.
Já vimos supra que o acto não padece de qualquer vício quanto à forma e conteúdo. Toma-se, pois, ocioso discretear sobre a essencialidade ou não desses elementos.
Claudica igualmente este vício.
Seguidamente, sob a designação de erro nos pressupostos por violação dos artigos 59.º e 86.º do Código do Procedimento Administrativo, a recorrente diz que o acto padece de défice de instrução, dado que, em violação do princípio do inquisitório, não teriam sido averiguados factos relevantes e também não foram levados ao procedimento factos de que a Administração tinha conhecimento.
São dois os processos administrativos remetidos a tribunal em cumprimento da imposição resultante do artigo 55.º do Código de Processo Administrativo Contencioso: o processo 6319 da DSSOPT e o processo 45/2010 da Comissão de Terras. Visto o conteúdo destes processos instrutores, onde se evidencia o acervo de diligências e actos procedimentais efectuados, não se crê que assista razão à recorrente nas críticas que agora formula. Tais processos contêm a base fáctica essencial e bastante para respaldar a decisão adoptada, a qual foi precedida dos estudos, informações e pareceres necessários à ponderação do (in)cumprimento do clausulado do contrato de concessão. Aliás, como se vê da exposição efectuada pela recorrente em exercitação do direito de audição, não foi aí suscitada qualquer omissão instrutória. Em sede de audiência, a recorrente percebeu o que estava em causa, aceitou mesmo haver incumprimento da sua parte, defendeu-se como entendeu mais adequado, invocando, então, embora extemporaneamente, à luz do contrato, factos tendentes a caracterizar situações de força maior susceptíveis de a exonerar da responsabilidade pelo incumprimento dos prazos contratualmente clausulados. Não se vislumbra, pois, fundamento plausível para vir agora sustentar, entre o mais, que os prazos não tinham importância e que o Governo e os seus representantes recomendaram o protelamento do aproveitamento, e que tal devia ter sido objecto de averiguação... É até estranho pretender sobrepor a um contrato escrito supostas vontades que o próprio procedimento e a decisão impugnada desmentem.
Não detectamos, em suma, falhas instrutórias ao nível da recolha oficiosa dos elementos fundamentais para a decisão.
Fracassa também este vício.
Depois, vem assacado ao acto mais um erro nos pressupostos, desta feita por violação do artigo 215.º da Lei de Terras.
Segundo cremos, a recorrente coloca o enfoque deste vício na circunstância de o acto não patentear qualquer referência à nova lei de Terras, e, em particular, ao seu artigo 215.º. Mas, salvo melhor juízo, esta falta não substancia, só por si, qualquer vício, nomeadamente qualquer erro nos pressupostos, importando ter presente que o artigo 215.º da Lei de Terras é uma norma transitória. De resto, a recorrente esgrime uma panóplia de generalidades, de questionável relevância para os fins do recurso contencioso, tal como assinala a entidade recorrida, indo ao ponto de questionar a exequibilidade prática das obrigações resultantes das cláusulas contratuais, nomeadamente em matéria de prazos, na tentativa de caracterizar o invocado erro nos pressupostos. Trata-se de argumentos que, decisivamente, não colhem, semelhantes, aliás, a outros anteriormente invocados, a propósito do alegado défice de instrução, segundo os quais os prazos não tinham qualquer importância e o Governo teria recomendado o protelamento do aproveitamento. É estranha, na verdade, a desconsideração a que a recorrente tenta agora votar um contrato escrito, a que se vinculou, que nunca pôs em causa, judicial ou extrajudicialmente, e que, em sede de audição, até admitiu ter violado.
Soçobra também este vício.
A recorrente argui também o acto de padecer de violação de lei por errada interpretação das cláusulas contratuais (cláusulas 5.ª, 6.ª e 13.ª do contrato) e ainda de usurpação do poder, dado que essa errada interpretação resulta de instrução interna, a fixar o sentido e alcance das cláusulas, chamando a si poderes que cabem aos tribunais.
É manifestamente errada a argumentação da recorrente.
A interpretação que preconiza para aquelas cláusulas não faz qualquer sentido. O intérprete deve começar obviamente pelo texto, na tentativa de surpreender o verdadeiro alcance da normação compreendida nas cláusulas. Ora, temos por seguro que o texto das cláusulas não cauciona a interpretação e o esquema procedimental que a recorrente sugere, nem a contagem de prazos que efectua e, em particular, o termo a quo da contagem dos prazos das multas, nem os períodos de multa (dois de multas simples e um terceiro de multa agravada) que preconiza.
O que se retira das cláusulas em questão é que o excesso dos prazos fixados na cláusula 5.ª para a apresentação dos projectos e para o início e conclusão das obras, se não for especialmente justificado, dá lugar a multa. Esta é graduável até 5 000 patacas por cada um dos primeiros 60 dias de atraso, e é agravável, até ao dobro, ou seja, até ao limite de 10 000 patacas, por cada um dos seguintes 60 dias de atraso. Findo o prazo da multa agravada, há lugar à caducidade do contrato.
Foi esta a interpretação que esteve na base da declaração de caducidade e que não se afigura merecer reparo.
É possível argumentar, a partir da natureza dos contratos e das obrigações e direitos das partes, que tem que haver lugar à prévia aplicação das multas para se poder avançar para a caducidade respaldada no termo do prazo da multa agravada. Já chegámos a defendê-lo em parecer exarado num processo idêntico. Não estamos, todavia, seguros da bondade dessa posição. Face aos prazos curtos contratualmente previstos para os dias de atraso admissíveis, no caso 60 dias mais 60 dias, é bem possível que, mesmo detectado precocemente o atraso, a multa ou multas possam vir a ser aplicadas após o termo do prazo máximo de 120 dias de atraso. Ou seja, quando a multa é aplicada já está ultrapassado o prazo cujo termo implica a caducidade, o que sugere que a declaração de caducidade não pode estar condicionada por uma prévia aplicação de multa ou multas. Por outro lado, a letra dos contratos, em consonância com a lei, faz depender a caducidade do contrato do termo do prazo da multa (findo o prazo da multa agravada), não inculcando, ao menos de forma clara e explícita, a obrigação de aplicação da multa como passo prévio para a declaração de caducidade, limitando-se a aludir ao final do seu prazo. A Lei de Terras de 2013 até dispensa expressamente a necessidade de aplicação da multa.
Por outro lado, e passando para a questão da usurpação do poder, há seguramente equívoco da recorrente. Pretende esta que, ao fixar parâmetros ou instruções de apreciação dos processos relativos a concessão de terras, que pressupõem alguma actividade de interpretação dos contratos, a Administração, por intermédio do Despacho de 31 de Maio de 2010, do Exm.º Chefe do Executivo - cf. documento 67 -A, junto com a petição de recurso -, estaria a invadir o espaço de competência própria dos tribunais, com a inerente usurpação de poder. Nada de mais errado. A Administração realiza as suas atribuições e competências interpretando diariamente a lei e todo o bloco de legalidade por que se pauta a sua actuação, incluindo contratos. A utilização de instruções internas - que aliás não são actos administrativos, o que logo as exclui da alçada do artigo 173.º do Código do Procedimento Administrativo - destinadas a orientar a apreciação e o tratamento de uma pluralidade de casos semelhantes tem um fito disciplinador e uniformizador, que, para além de em nada brigar com as competências dos tribunais, até é louvável pelo potencial nivelamento de bitolas que proporciona no tratamento de casos semelhantes e pelo incremento de justiça relativa que isso representa.
Improcedem, assim, as suscitadas violação de lei e usurpação do poder.
Em seguida, sustenta-se que o acto não se conforma aos ditames dos princípios da igualdade e da imparcialidade.
A recorrente entende ter sido injustiçada, em violação do princípio da igualdade, porque o seu caso teve um tratamento diferente, desigual, daquele que a Administração conferiu a outros casos semelhantes, nomeadamente aqueles a que se reportam os processos 36/2011 e 40/2011, da Comissão de Terras. O diagrama comparativo que estabelece, no ponto 362 da sua petição de recurso, para ilustrar as semelhanças dos casos, não se apresenta inteiramente conclusivo, no sentido de caracterizar situações substancialmente idênticas e, por isso, necessariamente merecedoras de tratamento idêntico. Como quer que seja, tem-se entendido - e este Tribunal de Segunda Instância já se pronunciou nesse sentido, v.g., no acórdão de 02/03/2017, no âmbito do recurso contencioso n.º 433/2015 - que, verificada a culpa da concessionária pelo incumprimento do aproveitamento no prazo contratual, a Administração está vinculada a declarar a caducidade sanção por incumprimento. Assim, estando em causa um poder vinculado, a igualdade tem que ceder perante a legalidade. Se porventura a Administração decidiu mal noutros casos, não se pode, a coberto do princípio da igualdade, reclamar o nivelamento da actuação administrativa pela bitola da ilegalidade.
Quanto à questão da imparcialidade, tenta a recorrente demonstrar que, no procedimento, a Administração deu primazia a interesses próprios em detrimento de interesses juridicamente protegidos da concessionária, o que teria sucedido por motivos não legítimos, como os de reaver certos terrenos concessionados sem pagar as indemnizações devidas e induzir os concessionários a pagar voluntariamente prémios relativos a concessões cuja caducidade já estava projectada pela Administração. Além disso, aduz que o Secretário para os Transportes e Obras Públicas teria intervindo no procedimento numa situação de impedimento, pois, como engenheiro responsável designado, já tinha tido anteriormente intervenção em estudo técnico e participado em reuniões em nome e representação da anterior concessionária do lote. O primeiro dos argumentos não passa de uma mera suposição conclusiva da recorrente, pois nada demonstra ou evidencia que a actuação administrativa haja padecido da falta de isenção que a recorrente lhe atribui. E também o segundo é manifestamente improcedente. Desde logo, estão em causa diferentes procedimentos - um que remonta a 1995, relativo ao processo de apreciação e aprovação de projectos, licenciamento e fiscalização de obras de construção civil previsto no Regulamento Geral da Construção Urbana (RGCU) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto, outro relativo ao procedimento de declaração de caducidade, impulsionado em 2010. Acresce que a intervenção outrora protagonizada, enquanto engenheiro civil, pelo ora Secretário para os Transportes e Obras Públicas, sendo de carácter eminentemente técnico e em nada interferindo no processo de decisão propriamente dito, foi solicitada para uma concessão e por um concessionário diversos daquele que agora figura no procedimento de caducidade e relativamente aos quais foi adoptada a decisão aqui escrutinada. Ademais, a elaboração de projecto de construção e memória descritiva, bem como a responsabilização pelo projecto, não integram qualquer das situações previstas na invocada norma de impedimento (artigo 46.º, n.º 1, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo). O Sr. Eng. não actuou no procedimento como perito, não foi chamado a peritar, e não peritou, o que quer que fosse; não actuou como mandatário no procedimento, não se vislumbrando qualquer elemento que aponte para a existência de constituição de uma relação ou de um contrato de mandato, tendo-se limitado a efectuar os trabalhos de projecto de que foi incumbido e a assumir a respectiva responsabilidade, nos termos previstos e exigidos pelos artigos 8.º e seguintes do RGCU, e também está fora de questão que tenha emitido algum parecer para o procedimento, em vista da resolução de qualquer questão que nele se colocasse.
Revela-se, assim, igualmente improcedente a invocada violação dos princípios da igualdade e da imparcialidade.
Finalmente, vem suscitada a violação dos princípios da proporcionalidade e da protecção dos direitos e interesses dos residentes.
Enquanto corolário do princípio da justiça, o princípio da proporcionalidade postula que as decisões administrativas que colidam com direitos e interesses legítimos dos particulares apenas possam afectar as posições destes na justa medida da necessidade reclamada pelos objectivos de interesse público a prosseguir. Ora, estando em causa a falta de aproveitamento tempestivo de um bem escasso, de valia incomensurável, cuja importante finalidade social só através do aproveitamento se realiza, a declaração de caducidade apresenta-se como imperativo da salvaguarda do interesse público, na medida em que vai abrir a porta a um novo processo de aproveitamento que dê satisfação à concretização do fim social que lhe está inerente. Não restava à Administração alternativa para dosear a sua decisão de forma a minorar o respectivo impacto na esfera jurídica da recorrente. De resto, como já se referiu supra, constatada uma actuação culposa da concessionária pelo incumprimento do aproveitamento no prazo contratual, a Administração está vinculada a declarar a caducidade, pelo que falece qualquer acuidade aos princípios agora em análise.
Claudica também a imputada violação dos princípios da proporcionalidade e da protecção dos direitos e interesses dos residentes.
Ante o exposto, vai o nosso parecer vai no sentido do não provimento do recurso”.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão bem representadas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
Damos por provada a seguinte factualidade:
1 - A Recorrente é uma sociedade comercial que se dedica, entre outras actividades, ao investimento no sector imobiliário.
2 - A Recorrente é titular do direito resultante da concessão do arrendamento incluindo a propriedade de construção do terreno conhecido como Lote BT11.
3 - Este lote, ao qual se refere o acto administrativo ora impugnado resultou de operações de anexação e desanexação dos prédios descritos sob os números 20670, 20671 e 20672 (a fls. 92v, 93 e 93v, respectivamente, do livro B45) na Conservatória do Registo Predial.
4 – Os prédios descritos sob os números 20670, 20671 e 20672 haviam sido concedidos por arrendamento à “Fábrica de Artigos de Vestuário “estilo”, Limitada”, tendo sido revertidos para o Território duas parcelas de terreno com as áreas de 4872 m2 e 6800 m2 em 3 e 5 de Maio de 1966.
5 – A finalidade de tal concessão era a construção de uma fábrica de fiação e tecelagem, anexos e moradias para os seus empregados e tinha uma duração de 50 anos.
6 – De acordo com o despacho nº 125/SATOP/99 e do contrato respectivo, o lote BT11 concedido à recorrente visava a implantação de um edifício em regime de propriedade horizontal, com finalidade habitacional, comercial, estacionamento e creche, constituído por um pódio de 4 pisos (incluindo o piso de cobertura) e uma torre com 29 pisos (cláusula 3ª do contrato: fls. 148).
7 – O arrendamento era válido por 50 anos, contados de 29 de Outubro de 1964, podendo ser renovado, nos termos da legislação aplicável, até 19 de Dezembro de 2049 (cláusula 2ª do contrato; fls. 148).
8 – O aproveitamento do terreno deveria operar-se no prazo global de 42 meses, contados a partir da data da publicação do despacho nº 125/SATOP/99, que se veio a verificar no dia 17/12/1999 (cláusula 5ª do contrato: fls. 148).
9 – A economia de Macau começou a sentir crise imobiliária em 1966.
10 - Em 15 de Janeiro de 2002, as concessionárias dos lotes BT8 e BT9 fizeram um pedido formal ao SOPT no qual respectivamente solicitaram o reescalonamento das prestações do prémio em dívida e a isenção de qualquer penalização, nos termos dos documentos que se juntam sob os docs. no. 40 e 41, com o seguinte teor:
«…3. As condições económicas actuais, aliadas ao excesso de oferta prevalecente no mercado imobiliário, desaconselham, pelo menos por enquanto, o aproveitamento situado na ilha da Taipa que exigiria elevados investimentos, acrescidos do montante do prémio Concessão ainda por liquidar.
4. Face ao exposto, seja-nos permitido apelar à compreensão de Vossa Excelência para as nossas dificuldades, solicitando, por isso, se digne conceder-nos uma ampla moratória, isenta de qualquer penalização, para a liquidação do montante referido em no. 1 do presente pedido.»
11 - Consta de documentos internos da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes o ofício com a Ref. 6321.1 e 6322.1/DSODEP/2002, sugestivamente intitulado “Incumprimento dos prazos para o pagamento de prestações dos prémios fixados nos contratos de concessão de terrenos”, no qual se pode ler:
«Sobre o assunto e sendo ainda significativo o valor global das prestações dos prémios em atraso aos quais há a acrescentar o montante correspondente aos juros de mora e tendo em conta várias solicitações transmitidas formal ou informalmente quanto à possibilidade de a questão vir a ser objecto de alguma medida que vise, sem prejuízo das receitas do Território, uma diferente forma de pagamento e que ao mesmo tempo constitua um estímulo para que as concessionárias procedam aos respectivos pagamentos, solicita-se que nos informem se está prevista alguma intervenção nessa área. [...]
Ainda no que se refere ao incumprimento dos contratos mas quanto às cláusulas relativas aos prazos para conclusão dos aproveitamentos informa-se que tem sido prática nesta Direcção de Serviços e com conhecimento da Comissão de Terras a prorrogação dos prazos fixados nos contratos sem aplicação de multas tendo em conta a situação actual do mercado imobiliário que se traduz numa grande oferta de fracções autónomas para as finalidades: habitação; comércio; escritórios; e estacionamento, e numa fraca procura das mesmas o que permite aos concessionários reprogramar os seus investimentos e respectivos encargos financeiros». (doc. 42)
12 - Por outro lado, consta da Informação 022/DSODEP/2002 o seguinte:
«…9. Apesar do acima proposto relativamente aos lotes de terreno anteriormente concedidos à Fábrica de Artigos de Vestuário Estilo, Limitada, julga-se de, tendo em conta a informação prestada pela DSF, o facto de ser significativo o valor global das prestações dos prémios em atraso devidas pelos concessionários de terrenos ($989.780.370,00), conhecidas as dificuldades que atravessa o sector imobiliário que se traduz numa grande oferta de fracções autónomas para as finalidades de habitação, comércio, escritórios e estacionamento, na fraca procura das mesmas para além das dificuldades de obtenção dos necessários financiamentos, levantar a questão da procura de uma solução, no âmbito de um grupo de trabalho, com participação para além de representantes de instituições do Território (DSF, DSSOPT, IPIM, etc.) de representantes das várias entidades ligadas ao sector (Associações de empresários ou de empresas ligadas ao investimento, construção e fomento imobiliário, bancos, etc.), que, sem prejuízo das receitas do Território e das concessionárias que têm cumprido atempadamente as suas obrigações pagando as suas prestações bem como os respectivos juros de mora, apresente propostas que constituam um estímulo para que as concessionárias que se encontram em dificuldades possam satisfazer os respectivos pagamentos.» - destaque nosso (cfr. Doc. nº 43 junto com a p.1i)
13 - As referidas concessionárias nunca tiveram qualquer resposta formal dos Serviços, apesar de nessa informação constar expressamente:
«julga-se de indeferir os pedidos e de informar as requerentes de que devem regularizar os pagamentos em dívida admitindo-se apenas, após a apresentação dos respectivos comprovativos, a prorrogação dos prazos de aproveitamento de cada um dos lotes.» (doc. cit.).
14 – Por despacho do Chefe do Executivo de 26/11/2010, relativo à Informação 215/DSODEP/2010, da DSSOPT, foi dado início ao procedimento tendente à declaração de caducidade da concessão do referido terreno (fls. 4-9 do Proc. nº 45/2010 da Comissão de Terras).
15 - No processo nº 40/2011 foi proferido pela Comissão de Terras Parecer com o seguinte teor:
«-Respeitante ao pedido feito pela Companhia de Investimento Jockey, Limitada, de concessão de um novo prazo de aproveitamento do terreno concedido, por arrendamento, com a área de 8124 m2, situado na ilha da Taipa, na Estrada Governador Albano de Oliveira (designado por parcela 3), para construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 5 pisos, destinado a habitação e estacionamento, cujo contrato de concessão foi titulado pelo Despacho n.º 13/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 10/98, de 11 de Março de 1998.
Proposta de aplicação de uma multa máxima de $900 000,00 patacas, pelo incumprimento do prazo de aproveitamento do terreno, e de fixação de um último prazo por mais 48 meses para conclusão do aproveitamento, contados a partir do dia da recepção da notificação da respectiva decisão,
[...]
6. De acordo com a cláusula terceira do contrato o terreno concedido é aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 5 pisos, destinado a habitação e estacionamento.
7. O prazo global de aproveitamento do terreno é de 30 meses, contados a partir da data da publicação do Despacho n.º 13/SATOP/98, ou seja, até ao dia 10 de Setembro de 2000. E o prazo de arrendamento do terreno é de 25 anos, também contados a partir da data da publicação do mesmo, ou seja, até ao dia 10 de Março de 2023.
8. Conforme a cláusula sexta do contrato da concessão, a concessionária assumiu a obrigação de proceder à desocupação do terreno concedido e à elaboração dos projectos de todas as infra-estruturas correspondentes às parcelas «.Fc» e «Jc»,
9. O montante do prémio é de $10 328 338,00 patacas, a concessionária já pagou a totalidade do prémio por prestações. [...]
Em cumprimento do despacho superior, o DSODEP da DSSOPT enviou à concessionária o Ofício n.º 183/6295.01/DSODEP/2010, em 23 de Março de 2010, solicitando a apresentação de justificação sobre o não aproveitamento.
Na sequência disto, a concessionária apresentou dois requerimentos, respectivamente em 23 de Abril de 2010 e 13 de Maio de 2010, justificando as seguintes razões do incumprimento do contrato e apresentando os seguintes pedidos:
Após as autorizações da transmissão do direito resultante da concessão, aconteceram respectivamente as crises financeiras asiáticas em 1997 e 1998, e a ameaça da doença designada por síndrome respiratória aguda severa em 2003 e 2004. Por isso, a economia da Ásia, incluindo a economia de Macau, esteve em situação difícil nos anos seguintes.
Embora em 2005 e 2006 a economia de Macau se tenha desenvolvido aceleradamente no sector imobiliário, de turismo e jogo, encontrou-se um outro grave problema que é o da insuficiência dos trabalhadores no sector da construção civil e os custos do aproveitamento do terreno também aumentaram exponencialmente, pelo que a requerente teve dificuldades a proceder ao aproveitamento do terreno nas referidas circunstâncias.
Porém, passou-se a uma nova crise financeira global desde 2007, e o financiamento do aproveitamento do referido terreno também foi influenciado negativamente apenas vindo melhorar ultimamente.
Posto isto, a concessionária referiu que ainda continuava com interesse no aproveitamento do respectivo terreno, tinha fundos financeiros próprios suficientes e tinha concluído o financiamento preliminar do projecto de desenvolvimento. Foi pago integralmente o prémio. Já tinha sido solicitado aos respectivos departamentos a emissão da planta cadastral e da Planta de Alinhamento Oficial (PAO) para elaboração dos projectos. Posteriormente, iria apresentar os projectos de arquitectura e de obras e o calendário de execução das obras para dar início à execução das mesmas após os mesmos terem sido autorizados.
Além disso, a concessionária solicitou á anexação do seu terreno com dois terrenos (as parcelas 1 e 2) que pertenciam a um sócio e administrador para serem aproveitados com a construção de edifícios luxuosos para fins habitacionais, no sentido de satisfazer necessidades do mercado e do desenvolvimento social e a concessão de um novo prazo de aproveitamento do terreno não inferior a 72 meses. O DSODEP da DSSOPT elaborou a informação n.º 130/DSODEP/2011, de 6 de Julho de 2011, analisando as justificações apresentadas pela concessionária:
- Após a publicação do Despacho n.º 32/SATOP/98, embora a economia de Macau tivesse sofrido da crise financeira asiática e da síndrome respiratória aguda severa, mesmo assim, a concessionária não podia alegar esses factos como pretextos para alijar responsabilidades pelo não aproveitamento do terreno de acordo com os termos contratuais e pela não apresentação de projecto. Por outro lado, a concessionária devia entender que no investimento imobiliário há sempre riscos e devia ter disponibilizado as respectivas soluções.
A concessionária referiu que no período entre 2005 e 2006 devido à insuficiência de recursos humanos no sector da construção não realizou o aproveitamento do terreno. No entanto, a concessionária nunca apresentou à Administração quaisquer justificações sobre isso ou solicitou a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno.
Conforme os “Critérios para a Classificação de Gravidade” definidos na Informação n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio, para tratamento dos terrenos não aproveitados, a concessionária do presente processo cometeu uma infracção considerada “muito grave” (a falta de apresentação do projecto de aproveitamento do terreno após a concessão do mesmo) e uma infracção considerada “grave” (decorrido a prazo de aproveitamento de terrenos e sem apresentação do requerimento de prorrogação). Caso a concessionária não apresente uma justificação adequada, poderá a entidade concedente iniciar de imediato o procedimento da devolução do terreno.
Este departamento referiu na informação que o atraso no aproveitamento do terreno se devia à carência do capital necessário ao aproveitamento do terreno e do interesse por parte da concessionária, no entanto, face a uma eventual reclamação e/ou recurso por parte da concessionária sobre a declaração da caducidade/da rescisão do contrato, este departamento propôs superiormente o envio do processo em causa ao Departamento Jurídico (DUJDEP) para ser analisado pormenorizadamente a fim de se emitir um parecer jurídico sobre a constituição ou não do impedimento à realização dos procedimentos de devolução do terreno na situação em que o prémio já tinha sido pago pela concessionária e a PAO já tinha sido emitida à concessionária, tendo o director da referida Direcção de Serviços concordado em 11 de Julho de 2011 com o proposto.
Assim, foi emitido parecer jurídico através da informação n.º 35/DJUDEP/2011, de 11 de Agosto, se concluiu que tendo em consideração que a concessionária apenas tinha alegado os factos notórios, designadamente, a crise financeira e a síndrome respiratória aguda severa, para justificar sobre o seu incumprimento, no entanto, não apresentou quaisquer esclarecimentos sobre as questões relativas aos factos que constituíram impedimentos ao aproveitamento do terreno. Além disso, a concessionária aceitou da sua livre vontade as cláusulas do contrato numa altura em que a situação económica era má, assim sendo, era evidente que já tinha tido em conta os eventuais riscos existentes, portanto, poder-se-ia declarar assim a caducidade da concessão do terreno nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula 13ª do contrato e na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 166.º da Lei da Terras n.º 6/80/M, de 5 de Julho. Apesar de a nova PAO ter sido emitida, mesmo assim, isso não constitui impedimento à declaração de caducidade da concessão do terreno porque tal emissão não confere qualquer direito à concessionária.
Por último, através da informação n.º 207/DSODEP/2011, de 18 de Agosto, o DSODEP afirmou que concordava com o parecer jurídico constante da informação do DJUDEP e uma vez que o incumprimento do prazo de aproveitamento podia ser inteiramente imputado à concessionária, nos termos do contrato de concessão e das respectivas disposições da Lei de Terras, propunha-se que fosse declarada a caducidade da concessão do terreno pelo Chefe do Executivo e que todo o prémio pago no valor de $10 634 793,00 patacas, assim como o terreno e todas as benfeitorias aí introduzidas passassem para a posse da RAEM, não havendo lugar a qualquer indemnização por parte da concessionária e propôs superiormente autorização para o desencadeamento do procedimento da declaração da caducidade da concessão do terreno. O director da referida Direcção de Serviços manifestou a sua concordância com a respectiva proposta.
O SOPT também concordou com a proposta constante da referida informação e propôs superiormente autorização para o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer e prosseguimento dos trâmites ulteriores. Através do parecer n.º 473/CCP/GCE/2011, de 19 de Agosto de 2011, o assessor do Gabinete do Chefe do Executivo emitiu um parecer jurídico sobre a informação apresentada pela DSSOPT, do seguinte teor:
Apesar de a concessionária não ter conseguido apresentar provas, mesmo assim, os motivos de incumprimento alegados pela concessionária (designadamente, a síndrome respiratória aguda severa e a crise financeira de 2007) eram factos notórios, imprevisíveis e incontroláveis ainda que o nível de impacto dos mesmos fosse diferente consoante os casos.
As situações difíceis de exploração naquela altura por parte da concessionária foram demonstradas na informação n.º 17/DA/2011 da Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos relativa à isenção de imposto, anexada ao ofício n.º 0160/GSEF/2011 do Gabinete do Secretário para a Economia e Finanças.
Apesar disso, é de referir que a concessionária pagou integralmente o prémio no prazo estabelecido.
Actualmente em Macau existe ainda uma insuficiência de recursos humanos resultante do desenvolvimento muito rápido da economia, pelo que essa situação constituiu na altura um impedimento para o cumprimento do prazo de aproveitamento por parte da concessionária.
Apesar disso, o Governo da RAEM ainda insiste em aplicar o mecanismo de importação de trabalhadores não residentes estabelecido de acordo com o princípio de que os trabalhadores não residentes são importados para suprir a insuficiência de trabalhadores residentes, com vista a assegurar o direito ao emprego dos residentes de Macau.
Tendo em consideração os referidos factos objectivos, o incumprimento do contrato no âmbito do aproveitamento do terreno não é imputável plenamente à concessionária.
Devido à complexidade do processo e a alguns factos que não são imputáveis à concessionária e tendo em consideração uma eventual reclamação e/ou recurso por parte da concessionária sobre a declaração da caducidade ou da rescisão do contrato, propôs-se superiormente que não fosse autorizado o desencadeamento de procedimentos da declaração da caducidade da concessão, no entanto, a concessionária deveria cumprir o contrato num prazo de 48 meses. Este parecer mereceu a concordância do Chefe do Executivo por despacho de 19 de Agosto de 2011. Nestes termos, a DSSOPT propôs superiormente através da informação n.º 215/DSODEP/2011, de 24 de Agosto, a concessão de um novo e último prazo de aproveitamento de 48 meses, contados a partir da data da recepção da comunicação da respectiva decisão e a aplicação à concessionária de uma multa máxima de $900000,00 patacas, nos termos da cláusula 8.ª do contrato de concessão, bem assim corno a eventual audiência. O superior hierárquico concordou com a proposta. [...] Por todo o exposto, após ter analisado o processo, esta Comissão considera que apesar da responsabilidade pela não conclusão do aproveitamento do terreno dentro do prazo ser imputada à concessionária, todavia, tendo em conta que a proposta de declaração de caducidade da concessão não mereceu a aprovação do Chefe do Executivo e que a concessionária manifestou possuir capital suficiente e que irá apresentar os projectos de arquitectura e obra e o calendário para a execução das obras, o que demonstra que pretende concluir o aproveitamento do terreno, concorda com a proposta da DSSOPT, de aplicação à concessionária de uma multa máxima de $900000,00 patacas, nos termos da cláusula 8.ª do respectivo contrato e de concessão de um novo prazo de aproveitamento do terreno de 48 meses para a conclusão do aproveitamento do terreno, contados a partir da data da recepção da comunicação da respectiva decisão.
II
Reunida em sessão em 3 de Novembro de 2011, esta Comissão, analisado o processo e tendo em consideração as propostas apresentadas nas informações n.º 130/DSODEP/2011, 35/DJUDEP/2011, 207/DSODEP/2011, 215/DSODEP/2011 e 242/DSODEP/2011 respectivamente de 6 de Julho, 11 de Agosto, 18 de Agosto, 24 de Agosto e 15 de Setembro de 2011 e os pareceres nelas emitidos pelo SOPT respectivamente em 19 de Agosto de 2011, 1 de Setembro de 2011 e 20 de Setembro de 2011, assim como o despacho exarado na informação n.º 207/DSODEP/2011 pelo Chefe do Executivo, em 19 de Agosto de 2011, esta Comissão concorda com a proposta da DSSOPT de que seja concedido um novo e último prazo de aproveitamento de 48 meses para a conclusão do aproveitamento do terreno, contados a partir da data da recepção da comunicação da respectiva decisão, e de aplicação à concessionária de uma multa máxima de $900 000,00 patacas.
Comissão de Terras, aos 3 de Novembro de 2011.»
16 - No processo nº 42/2014 foi emitido pela Comissão de Terras Parecer o seguinte teor:
«- Respeitante ao pedido feito pela Sociedade Hoteleira Macau - Taipa Resort, Limitada, de prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno concedido, por arrendamento, com a área de 15 823m2, situado na ilha da Taipa, na Estrada Governador Albano de Oliveira (designado por parcela 2), destinado à construção de um hotel de cinco estrelas, compreendendo um pódio com 3 pisos e uma torre com 10 pisos, cuja concessão foi titulada pelo Despacho n.º 173/SATOP/97.
Proposta de aplicação de uma multa máxima de $900 000,00 patacas, pelo incumprimento do prazo de aproveitamento do terreno, e de prorrogação do prazo de aproveitamento por mais 48 meses, a contar de 25 de Maio de 2015, ou seja, até 24 de Novembro de 2016.
1. Pelo Despacho n.º 173/SATOP/97, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 53, de 31 de Dezembro de 1997, a Companhia de Corridas de Cavalos de Macau, SARL desistiu da concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 17 004 m2, situado na ilha da Taipa, junto da Estrada Governador Albano de Oliveira, designado por parcela 2. [...]
7. O prazo global de aproveitamento do terreno é de 42 meses, contados a partir da data da publicação do Despacho n.º 173/SATOP/97, ou seja, até 30 de Junho de 2001. E o prazo de arrendamento do terreno é de 25 anos, também contados a partir da data da publicação do mesmo, ou seja, até 31 de Dezembro de 2022.
8. Conforme a cláusula sexta do contrato de concessão, a concessionária assumiu a obrigação de proceder à desocupação do terreno concedido, à elaboração dos projectos das infraestruturas das zonas envolventes, bem como à execução das respectivas infraestruturas.
9. Da leitura das informações da folha de acompanhamento financeiro constante da fls. 14 do processo, a concessionária já pagou a totalidade do prémio fixado no contrato. [...]
12. Em cumprimento do despacho superior, o DSODEP da DSSOPT enviou à concessionária o oficio n.º 18216277.01/DSODEP/2010, em 23 de Março de 2010, solicitando a apresentação de justificação sobre o não aproveitamento.
13. Na sequência disto, a concessionária apresentou dois requerimentos, respectivamente em 23 de Abril e 13 de Maio de 2010, justificando as seguintes razões do incumprimento do contrato e apresentando os seguintes pedidos:
- Após as autorizações da transmissão do direito resultante da concessão, aconteceram respectivamente as crises financeiras asiáticas em 1997 e 1998, e a ameaça da doença designada por síndrome respiratória aguda grave em 2003 e 2004. Por isso, a economia da Ásia, incluindo a economia de Macau, esteve em situação difícil nos anos seguintes.
- Embora em 2005 e 2006 a economia de Macau se tenha desenvolvido aceleradamente no sector imobiliário, de turismo e jogo, encontrou-se um outro grave problema que é o da insuficiência dos trabalhadores no sector da construção civil e os custos do aproveitamento do terreno também aumentaram exponencialmente, pelo que a requerente teve dificuldades em proceder ao aproveitamento do terreno nas referidas circunstâncias.
- Porém, passou-se a uma nova crise financeira global desde 2007, e o financiamento do aproveitamento do referido terreno também foi influenciado negativamente apenas vindo a melhorar ultimamente.
- Posto isto, a concessionária referiu que ainda continuava com interesse no aproveitamento do respectivo terreno, tinha fundos financeiros próprios suficientes e tinha concluído o financiamento preliminar do projecto de desenvolvimento. Foi pago integralmente o prémio em dívida. Já tinha sido solicitado aos respectivos departamentos a emissão da planta cadastral e da planta de alinhamento oficial (PAO) para elaboração dos projectos. Posteriormente, iria apresentar os projectos de arquitectura e de obras e o calendário de execução das obras para dar início à execução das mesmas após os mesmos terem sido autorizados.
Além disso., a concessionária solicitou a anexação do seu terreno com dois terrenos (as parcelas 1 e 3) que pertenciam a um sócio e administrador para serem aproveitados com a construção de edifícios luxuosos para fins habitacionais, no sentido de satisfazer necessidades do mercado e do desenvolvimento social e a concessão de um novo prazo de aproveitamento do terreno não inferior a 72 meses.
14. O DSODEP elaborou a informação n.º 119/DSODEP/2010, de 22 de Julho, analisando as justificações apresentadas pela concessionária e referindo que a mesma não efectuou o pagamento do prémio desde a publicação do Despacho n.º 173/SATOP/97, no entanto, nunca solicitou à Administração um tratamento específico por estar numa situação difícil, quer em termos financeiros quer em termos económicos. Por outro lado, após lhe te sido comunicado em 12 de Dezembro de 1994 que o respectivo estudo prévio tinha sido considerado passível de aprovação condicionada, a concessionária nunca mais apresentou quaisquer projectos para apreciação por partes das entidades competentes, não deu início ao aproveitamento do terreno de acordo com as disposições do contrato nem apresentou justificações para o não aproveitamento do terreno. Caso a concessionária tivesse apresentado o projecto de aproveitamento do terreno nessa altura e assim tivesse obtido condições para a emissão da licença de obra, não teria acontecido a situação de insuficiência de recursos humanos que se verificou depois.
15. Conforme os “Critérios para a Classificação de Gravidade” definidos na informação n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio, para tratamento dos terrenos não aproveitados, a concessionária do presente processo cometeu duas infracções consideradas “muito graves” (a falta de pagamento do prémio e a não apresentação do projecto de aproveitamento do tecreno) e uma infracção considerada “grave” (o facto de não ter sequer apresentado requerimento para prorrogação do prazo de aproveitamento após o termo do prazo de aproveitamento conjugado com o facto de não ter dado acompanhamento após o termo da validade do projecto apreciado). Caso a concessionária não apresente uma justificação adequada, poderá a entidade concedente iniciar de imediato o procedimento da devolução do terreno.
16. O DSODEP afirmou na informação que uma vez que a concessionária apenas efectuou em 29 de Abril e 6 de Julho de 2010 o pagamento integral do prémio global e dos juros de mora em dívida ($78 128 520,00 patacas e $74 314 274,00 patacas, Guias n. 2010-88-900006-9 e 2010-88-900007-7), após ter recebido a comunicação da DSSOPT, o que não constitui impedimento à declaração de caducidade da concessão do terreno, portanto o atraso no aproveitamento do terreno podia ser inteiramente imputado à concessionária, no entanto, face à grande possibilidade da concessionária apresentar/ou interpor reclamação e/ou recurso da caducidade do contrato de concessão/rescisão do contrato, propôs o envio do processo em causa ao Departamento Jurídico (DJUDEP) para que procedesse a uma análise detalhada, rendo o director destes Serviços concordado em 23 de Julho de 2010 com a respectiva proposta.
17. O parecer jurídico solicitado foi emitido através da informação n.º 50/DJUDEP/2010, de 16 de Setembro, no qual se concluiu que todos os prazos contratualmente fixados tinham já terminado, mesmo os de multa agravada previstos na cláusula oitava e não sendo de aceitar os motivos invocados pela concessionária para justificar o não aproveitamento do terreno, deve a mesma ser considerada responsável pelo não cumprimento, o que justifica a aplicação das penalidades previstas no contrato, mormente as relativas à caducidade da concessão do terreno, nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato bem como nos termos do n.º 2 do artigo 166.º da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho, ficando o prémio já pago na posse da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), nos termos do artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004.
18. Por último, através da informação n.º 191/DSODEP/2010, de 24 de Setembro, o DSODEP afirmou que concordava com o parecer jurídico constante da informação do DJUDEP e uma vez que o incumprimento do prazo de aproveitamento pode ser inteiramente imputado à concessionária, nos termos do contrato de concessão e das respectivas disposições da Lei de Terras, propunha-se que fosse declarada a caducidade da concessão do terreno pelo Chefe do Executivo e que todo o prémio e juros pagos no valor de $152 442 794,00 patacas, assim como o terreno e todas as benfeitorias ali introduzidas revertessem para a posse da RAEM, não havendo lugar a qualquer indemnização por parte da concessionária e propôs superiormente autorização para o desencadeamento do procedimento da declaração da caducidade da concessão do terreno. A subdirectora e o director da referida Direcção de Serviços manifestaram a sua concordância com a respectiva proposta.
19.1 SOPT também concordou com a proposta constante da referida informação e propôs superiormente autorização para o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer e prosseguimento dos trâmites ulteriores.
20. Através do parecer n.º 256/CCP/GCE/2011, de 25 de Maio, o assessor do Gabinete do Chefe do Executivo emitiu parecer jurídico sobre a informação apresentada pela DSSOPT, do seguinte teor:
Visto que em 23 de Março de 2010 a Administração procedeu ao relaxe do prémio e dos juros de mora que, em resposta, a concessionária pagou integralmente os respectivos montantes, fazendo isto sem dúvida que a concessionária tivesse a esperança de que a Administração lhe iria solicitar cumprir o contrato uma vez que o contrato era ainda válido (não tinha ainda sido rescindido).
A Administração nunca respondeu expressamente aos vários pedidos feitos pela concessionária, designadamente o pedido de Setembro de 1998.
Devido à complexidade e especificidade do processo e ao facto de existirem partes que não podem ser imputadas à concessionária, assim, tendo em consideração o principio de boa fé estipulado no artigo 8.º do «Código do Procedimento Administrativo» (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M, de 11 de Outubro e o princípio da desburocratização e da eficiência estipulado no artigo 12.º do mesmo Código, o autor do parecer propõe superiormente que não seja autorizado o desencadeamento do processo de declaração da caducidade da concessão, dando-se continuidade ao cumprimento do contrato. Este parecer mereceu a concordância do Chefe do Executivo, por despacho de 26 de Maio de 2011, que determinou o reenvio do processo para se dar acompanhamento.
21. Nestes termos, a DSSOPT propôs superiormente através da informação n.º 181/DSODEP/2011, de 19 de Julho, a concessão de um novo e último prazo de aproveitamento de 42 meses (idêntico ao prazo fixado no contrato de concessão), contados a partir da data da recepção da comunicação da respectiva decisão e a aplicação à concessionária de uma multa máxima de $900 000,00 patacas nos termos da cláusula oitava do contrato de concessão, bem assim como a eventual audiência. O superior hierárquico concordou com a proposta.
22. Através do ofício n.º 548/6277.02/DSODEP/2011, de 8 de Agosto, o DSODEP da DSSOPT notificou à concessionária da intenção de tomada da decisão para, querendo, se pronunciar por escrito sobre a mesma, nos termos do artigo 93.º e seguintes do CPA. [...]
26. Relativamente ao assunto acima referido (Processo nº 36/2011 da Comissão de Terras), a Comissão de Terras emitiu em 3 de Novembro de 2011, com votos de vencido da vogal chefe do DJUDEP da DSSOPT e da vogal conservadora do Registo Predial, o Parecer n.º 98/2011, nos termos do qual considera que apesar da responsabilidade pela não conclusão do aproveitamento do terreno dentro do prazo deve ser imputada à concessionária, todavia, tendo em conta que a proposta de declaração de caducidade da concessão não mereceu a aprovação do Chefe do Executivo e que a concessionária manifestou possuir capital suficiente e que irá apresentar os projectos de arquitectura e obra e o calendário para a execução das obras, o que demonstra que pretende concluir o aproveitamento do terreno, concorda com a proposta da DSSOPT, de aplicação à concessionária de uma multa máxima de $900 000,00 patacas, nos termos da cláusula oitava do respectivo contrato e de concessão de um novo prazo de aproveitamento do terreno de 42 meses para a conclusão do aproveitamento do terreno, contados a partir da data da recepção da comunicação da respectiva decisão. O referido parecer tinha sido homologado em 18 de Novembro de 2011 pelo Chefe do Executivo.
27. A concessionária pagou em 29 de Novembro de 2011 a respectiva multa na Recebedoria da Repartição de Finanças de Macau e o prazo de aproveitamento do terreno é de 25 de Novembro de 2011, até 24 de Maio de 2015.
28. Urna vez que o prazo de aproveitamento do terreno estava quase a expirar, a concessionária solicitou à DSSOPT através de requerimento de 5 de Agosto de 2014, autorização para a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno por mais 18 meses. A concessionária alegou que de acordo com processos similares relativos a hotéis (hotéis de cinco estrelas com 13 pisos, sendo 3 pisos em cave), o prazo de aproveitamento do terreno é normalmente de 60 meses, ou podendo ir até ao 80 meses, no entanto, o prazo de aproveitamento deste projecto é de apenas 42 meses, tempo que é obviamente insuficiente. Embora o prazo de aproveitamento possa ser diferente, dependendo da área bruta de construção do hotel, no entanto, na sua globalidade o tempo que será necessário para a obra não será alterado devido à área ser pequena, nomeadamente, na apreciação e aprovação do projecto de obra em que o tempo não será, pela mesma razão, encurtado.
29. Por outro lado, depois da DSSOPT ter emitido em 3 de Outubro de 2013 a licença de obra (de fundações) n.º 704/2013, a concessionária iniciou imediatamente a obra e envidou rodas os esforços para concluir a mesma dentro do prazo de aproveitamento, no entanto, por diversos motivos, a data da sua conclusão ficou adiada, nomeadamente devido à falta de recursos humanos, ao tempo que foi despendido para apreciar e aprovar o projecto de obra, aos tufões e às chuvas, à aposta na edificação como uma imagem de marca da cidade e devido à instalação de equipamentos complementares dentro e fora do hotel.
30. Mesmo assim, a concessionária afirmou que o rés-do-chão do edifício já tinha ficado concluído em Junho do corrente ano e estava a envidar todos os esforços para acelerar o andamento da obra. Caso o requerimento para a execução da superestrutura pudesse a curto prazo ser autorizado, estimava que antes do final de Dezembro do corrente ano, a obra de acabamento do edifício poderia ficar basicamente concluída. Além disso, a concessionária previa que antes do prazo de aproveitamento do terreno expirar, a obra integral de decoração poderia ficar concluída em 60% e que iria tentar que algumas partes do hotel entrassem em funcionamento. As obras restantes ficariam concluídas de acordo com o andamento programado. Para além disso, a concessionária celebrou um acordo de cooperação com um grupo de gestão de hotéis de cinco estrelas de renome mundial, pelo que isso poderia elevar a posição de Macau como uma cidade internacional de turismo.
31. Por fim, a concessionária afirmou no pedido que tinha já feito um grande investimento no empreendimento hoteleiro e assinado protocolos de cooperação e contratos de aquisição com várias empresas de gestão hoteleira e fornecedores de hotelaria. O eventual adiamento da inauguração do hotel provocará prejuízos à reputação da concessionária e perda de dinheiro. A concessionária manifestou que acelerará efectivamente a conclusão do empreendimento hoteleiro envidando todos os esforços necessários, portanto, solicita a autorização da prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno até 24 de Novembro de 2016, isto é, um prazo global de aproveitamento do terreno de 60 meses, contados a partir de 25 de Novembro de 2011. E a mesma declarou a aceitação do pagamento da multa aplicada devido ao atraso no aproveitamento do terreno.
32. Quanto ao pedido da concessionária, o DSODEP solicitou em 5 de Agosto de 2014, através da comunicação de serviço interno (CSI) n.º 42116277.0212014, ao Departamento de Urbanização (DURDEP) a emissão de parecer, sobretudo o relativo à situação das respectivas licenças e da obra do processo.
33. Em 29 de Agosto de 2014, o DURDEP disponibilizou através da CSI n.º 1522/DURDEP/2014 as informações sobre a situação da apreciação e aprovação das licenças após a autorização de um novo prazo de aproveitamento do terreno concedido (25 de Novembro de 2011), ficando-se ciente de um atraso de 5, 99, 58 e 15 dias na apreciação e aprovação do anteprojecto de obra, do projecto de obra, da licença para a obra de fundações e do pedido de autorização para o início da obra, respectivamente, ou seja, um atraso total de 177 dias. Todavia, a concessionária nunca mais submeteu nenhum projecto após a apresentação em 16 de Julho de 2014 do pedido de autorização para o início da obra.
34. O DSODEP analisou o respectivo pedido, em 5 de Novembro de 2014, através da proposta n.º 269/DSODEP/2014. Segundo as informações disponibilizadas pelo DURDEP, verificou-se que a concessionária só submeteu em 28 de Março de 2013, ou seja, volvidos mais de 16 meses após a autorização de um novo prazo de aproveitamento em 25 de Novembro de 2011, o anteprojecto de obra e outros projectos de obra de construção. Embora exista um atraso na apreciação e aprovação dos respectivos projectos por parte do DURDEP (o qual causou um atraso de apenas cerca de 6 meses no andamento da obra), o tempo de prorrogação do prazo solicitado pela concessionária para aproveitamento do terreno (18 meses) é evidentemente mais longo do que o atraso verificado na apreciação e aprovação dos respectivos projectos.
35. A concessionária exprimiu no requerimento que o prazo do aproveitamento do terreno era apenas de 42 meses e que em comparação com o prazo de pelo menos 60 meses, contados a partir do estudo prévio até a conclusão da obra para construção de um hotel de cinco estrelas, o referido prazo era curto, no entanto, a concessionária não tinha indicado essa situação na resposta à audiência através da qual lhe tinha sido concedido um novo prazo de aproveitamento, assim sendo, esse facto não constitui justa causa para pedido de prazo de aproveitamento adicional. Além disso, as razões de carência de recursos humanos e da necessidade de criar um hotel de cinco estrelas de marca internacional que afectaram o andamento de execução da obra invocadas pela concessionária não são consideradas eventos imprevisíveis e irresistíveis nem outros factos relevantes cuja produção esteja comprovadamente fora do controlo referidos no contrato de concessão do terreno.
36. Assim, o DSODEP exprimiu na proposta que o atraso no aproveitamento do terreno, mais uma vez, deve ser imputável à concessionária, no entanto, tendo em consideração que a concessionária estava a acompanhar activamente os procedimentos de apreciação e aprovação do projecto de obra de construção, tinha concluído a respectiva obra de fundações e iniciado a execução da obra de superestrutura e que o referido atraso na apreciação e aprovação do projecto de obra de construção se devia à Administração, pelo que o mesmo propôs que fosse aplicada à concessionária a multa máxima no valor de $900 000,00 patacas e fosse prorrogado o prazo de aproveitamento do terreno por mais de 18 meses, a contar de 25 de Maio de 2015, ou seja, até 24 de Novembro de 2016. Além disso, tendo em consideração que a concessionária declarou no requerimento a aceitação do pagamento da multa aplicada devido ao atraso no aproveitamento do terreno, assim sendo, nos termos das respectivas disposições do CPA, propôs-se superiormente que fosse dispensado o procedimento de realização de audiência.
37. Depois de se ter tido em consideração a análise constante da proposta, a chefe do DSODEP considerou que o atraso no aproveitamento do terreno devia ser imputável à concessionária, no entanto, tendo em consideração que a concessionária estava a acompanhar activamente o aproveitamento do terreno e tinha declarado a aceitação do pagamento da multa aplicada devido ao atraso no aproveitamento do terreno, pelo que concordou com o proposto, ou seja, a proposta de autorização superior para a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno por mais de 18 meses, aplicação da multa máxima e seguimento de tramitações ulteriores.
38. Na sequência da concordância da directora subs. da DSSOPT com a referida proposta, o SOPT referiu na proposta que de acordo com o referido nos pontos 10 e 11 da proposta, o processo seria enviado à Comissão de Terras para efeitos de parecer sobre a proposta de prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno e aplicação de multa.
39. Face ao exposto, esta Comissão, tendo analisado o processo, considera exceptuando os 177 dias de atraso da Administração na apreciação dos projectos e aprovação dos pedidos, o período restante de atraso no aproveitamento do terreno, mais uma vez, deve ser imputável inteiramente à concessionária, sendo que esta se limitou a alegar, sem comprovar, a falta de recursos humanos como um motivo do atraso. No entanto, tendo em consideração que a concessionária está a acompanhar activamente os procedimentos de apreciação e aprovação do projecto de obra de construção, concluiu a obra de fundações e iniciou a execução da obra de superestrutura, o que manifesta que a concessionária tem vontade de concluir o aproveitamento do terreno, esta Comissão concorda com o proposto pela DSSOPT, isto é, que seja aplicada à concessionária a multa máxima no valor de $900 000,00 patacas nos termos do disposto na cláusula oitava do respectivo contrato e seja prorrogado o prazo de aproveitamento do terreno por mais de 18 meses, a contar de 25 de Maio de 2015, ou seja, até 24 de Novembro de 2016.
IV
Reunida em sessão de 22 de Janeiro de 2015, a Comissão de Terras, analisado o processo e tendo em consideração a proposta n.º 269/DSODEP/2014, de 5 de Novembro, e o parecer nela emitido, bem como o despacho nela exarado pelo SOPT, em 19 de Novembro de 2014, devido ao atraso no aproveitamento do terreno dever ser imputável à concessionária, esta Comissão concorda com o proposto pela DSSOPT, isto é, que lhe seja aplicada a multa máxima no valor de $900 000,00 patacas e seja prorrogado o prazo de aproveitamento do terreno por mais de 18 meses, a contar de 25 de Maio de 2015, ou seja, até 24 de Novembro de 2016.
Comissão de Terras, aos 22 de Janeiro de 2015.»
17 – A recorrente não procedeu ao aproveitamento no prazo de 42 meses acima referido.
18 – A recorrente teve intervenção no procedimento administrativo que a si dizia respeito (Proc. nº 45/2010) nos seguintes moldes:
“A - Entrega em 8 de Fevereiro de 2007 da memória descritiva e justificativa, a declaração de responsabilidade do arquitecto, a ficha técnica, a planta de alinhamento oficial, a planta cadastral e cópia do despacho 125/SATOP/99 (fls. 110 do p.a.)
B - 24-Jul-08: Na sequência da falta de resposta ao pedido de Aprovação de Estudo Prévio T-1521, foi pedida uma explicação para a demora e indicação sobre o estado do processo; -cfr. Fls. 275 do processo instrutor.
C - 25-Jan-2008: Carta da DURDEP na qual se refere: “Em referência ao assunto acima referido, informa-se de que por despacho do Sr. Director de 03/01/2008, de acordo com artigo 36º estes Serviços necessitam de mais algum tempo para emissão do parecer final sobre o estudo em causa.”
D - 23-Set-08: Carta 10316/DURDEP/2008: a apresentação T-1520 ainda não foi apreciada porque o DURDEP ainda se encontra a verificar;
E - 23-Jan-09: Notificação 650/DURDEP/2009 - junta ofícios da Autoridade de Aviação Civil, Corpo de Bombeiros, IACM e CEM e convite à correcção do projecto: deve ser requerida nova Planta de Alinhamento Oficial;
F - 14-Mai-09: Resposta à notificação da DSSOPT 650/DURDEP/2009
G - 05-Ago-09: Pedido de Planta de Alinhamento Oficial;
H - 23-Mar-10: Notificação para apresentar, ao abrigo do número dois da carta, os documentos à DSSOPT no prazo de 30 dias para efeitos de análise, sob pena de aplicação de multa e declaração de caducidade ou rescisão unilateral nos termos de cláusulas de contrato de concessão;
I - 17-Mai-10: Resposta à DSSOPT (302/6319.02/DSODEP/2010). Apresenta as razões justificativas de aproveitamento adiado e compromete-se a pagar o prémio restante e juros de mora contanto que o Governo solicite. Compromete- se também a apresentar o projecto de arquitectura em 90 dias após aprovação do estudo prévio, juntando:
1. Declaração de capacidade financeira;
11. Certidões do Registo Predial e Comercial;
J - 27-Abr-11: Pedido de esclarecimentos sobre o andamento do pedido de Aprovação de Estudo Prévio;
K - 12-Nov-12: Fornecimento de informações adicionais;
L - 23-Mai-13: Concessionárias solicitam ao Chefe do Executivo uma reunião para apresentar as idéias e concepção de desenvolvimento do terreno.
19 - Reunida em sessão de 19 de Janeiro e de 24 de Fevereiro de 2011, respectivamente, a Comissão de Terras concluiu o seu Parecer n.º 32/2011 do modo seguinte:
«tendo em consideração a apreciação e valoração dos pressupostos do acto, efectuadas através das informações nºs 95/DSODEP/2010, 155/DSODEP/2010, 62/DJUDEP/2010 e 215/DSODEP/2010, de 12 de Maio, 6 de Outubro, 27 de Outubro e 3 de Novembro, respectivamente, bem como os despachos nelas exarados pelo Chefe do Executivo, em 31 de Maio de 2010 e 23 de Novembro de 2010, e o despacho do SOPT, em 8 de Março de 2010, considera que deve proceder-se à declaração de caducidade do respectivo contrato nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato de revisão da concessão, titulado pelo Despacho n.º 125/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau, n.º 50, II Série, suplemento, de 17 de Dezembro de 1999, ou à declaração de rescisão do respectivo contrato ao abrigo da línea d) do n.º 1 da cláusula décima quarta do contrato e da alínea c) do n.º 1 do artigo 169.º da “Lei de Terras”, e consequente reversão do terreno, livre de quaisquer ónus ou encargos, à posse da RAEM com todas as benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária, sem prejuízo do direito de audiência prévia da interessada (…)». (cfr. fls. 167 a 183 do Processo n.º 45/2010 da Comissão de Terras).
20 - Através do ofício n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011, a DSSOPT submeteu o sentido provável da decisão (declaração de caducidade da concessão) a audiência prévia da Concessionária, tendo esta disposto de um prazo de 10 dias a contar da notificação para se pronunciar por escrito (cfr. fls.190 e 191 do Processo n.º 45/2010 da Comissão de Terras).
21 - Em 26 de Maio de 2011, a Concessionária, ora Recorrente, apresentou pronúncia escrita sobre a provável declaração de caducidade da concessão do terreno aqui em causa (cfr. fls. 312 a 314 do Processo n.º 45/2010 da Comissão de Terras).
22 - Em 2 de Dezembro de 2011 a Chefe do DJUDEP proferiu despacho de concordância com o «relatório da audiência dos interessados, elaborado nos termos do artigo 98.º do Código do Procedimento Administrativo» que consta de fls. 322 a 340 do Processo n.º 45/2010 da Comissão de Terras, e que aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual se concluiu do seguinte modo: « (...) não tendo a concessionária, na sua resposta à audiência dos interessados, logrado afastar a presunção de culpa que onera o seu comportamento faltoso, consubstanciado na inexecução da obra que constitui o aproveitamento do terreno denominado lote BT11, objecto da concessão, deve a Administração manter o sentido da sua decisão de declarar a caducidade da concessão, comunicada à concessionária através do oficio n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011» (cfr. fls. 322 a 340 do Processo n.º 45/2010 da Comissão de Terras).
23 – A Comissão de Terras, em 19/01/2012, emitiu o seguinte parecer (fls. 361 a 363 do p.a. nº 45/2010):
«Proc. n.º 45/2010 - Proposta de declaração da caducidade da concessão provisória, por arrendamento, do terreno com a área de 2 209m2, situado na ilha de Taipa, na Avenida Kwong Tung, na Baixa da Taipa, designado por lote BT11, a favor da Companhia de Investimento Predial Pak Lok Mun, Limitada, pelo incumprimento do aproveitamento do terreno no prazo fixado. A concessão provisória é titulada pelo Despacho n.º 125/SATOP/99, cuja caducidade determina a reversão do terreno, livre de quaisquer onús ou encargos, à posse da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) com todas as benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
I
1. De acordo com o despacho do Chefe do Executivo, através da informação n.º 215/DSODEP/2010 da Direcção de Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), foi aprovada a proposta de iniciar o procedimento de declaração de caducidade da concessão, por arrendamento, a favor da concessionária Companhia de Investimento Predial Pak Lok Mun, Limitada, do terreno com a área de 2 209m2, situado na ilha da Taipa, designado por lote BT11, titulado pelo Despacho n.º 125/SATOP/99, por incumprimento das cláusulas quinta, sétima e oitava do contrato da concessão e decidido submeter o processo à Comissão de Terras, para análise e parecer.
2. Reunida em sessões de 19 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2011, a Comissão de Terras, pelo parecer n.º 32/2011, e em concordância com a proposta da entidade concedente, propôs a declaração de caducidade da concessão, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e da alínea a) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei de Terras, ex vi do n.º 2 do mesmo artigo, ou a declaração de rescisão do contrato, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 da cláusula décima quarta do contrato e na alínea c) do n.º 1 do artigo 169.º da referida Lei, e a consequente reversão do terreno, livre de quaisquer ónus ou encargos, à posse da RAEM, com todas as benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
3. Propôs ainda aquela Comissão que, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), a concessionária seja notificada para, no prazo de 10 dias a contar da data da notificação, se pronunciar por escrito sobre o sentido provável da decisão.
4. Submetido o parecer da Comissão de Terras a homologação do Chefe do Executivo, decidiu esta entidade, por despacho de 24 de Março de 2011, que antes da tomada da decisão final neste procedimento de declaração de caducidade da concessão deveria ser realizada a audiência da concessionária e solicitado parecer ao Ministério Público.
5. Nos termos do disposto nos artigos 93.º e 94.º do CPA, a DSSOPT, através do ofício n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011, submeteu o sentido provável da decisão (declaração de caducidade da concessão) a audiência prévia do interessado, tendo este disposto de um prazo de 10 dias a contar da data da notificação - 18 de Maio de 2011 - para se pronunciar por escrito.
II
6. A concessionária apresentou em 27 de Maio de 2011 a sua resposta escrita, as quais fazem parte integrante deste parecer e dão-se aqui como reproduzidas, para todos os efeitos legais.
7. Assim, recebida a resposta da concessionária, foi produzido pelo Departamento Jurídico da DSSOPT um relatório, datado de 2 de Dezembro de 2011, que faz parte integrante do presente parecer e dá-se aqui como reproduzido, para todos os efeitos legais.
8. O referido relatório conclui propondo que seja mantido o sentido da decisão de declarar a caducidade da concessão, comunicada à concessionária através do ofício n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011, tendo em conta que a concessionária, na sua resposta à audiência dos interessados, não logrou afastar a presunção de culpa que onera o seu comportamento faltoso, consubstanciado na inexecução da obra que constitui o aproveitamento do terreno denominado lote BT11, objecto da concessão.
9. Em cumprimento do despacho do director da DSSOPT, de 2 de Dezembro de 2011, o referido relatório foi enviado ao DSODEP para tramitação subsequente.
10. O DSODEP elaborou a informação n.º 344/DSODEP/2011, de 2 de Dezembro de 2011, na qual propõe superiormente autorização para o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, proposta esta que mereceu a concordância da subdirectora e do director da referida Direcção de Serviços.
11. Sobre esta informação o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu despacho em 27 de Dezembro de 2011, ordenando o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer.
III
Reunida em sessão de 19 de Janeiro de 2012, a Comissão de Terras, analisado o processo e tendo em consideração o teor do relatório sobre a audiência dos interessados, datado de 2 de Dezembro de 2011, é de parecer que deve ser declarada a caducidade da concessão do terreno designado por lote BT11, com os fundamentos de facto e de direito constantes do sobredito relatório, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e da alínea a) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei de Terras, ex vi do n.º 2 do mesmo artigo.
Contudo, esta Comissão entende que deve sublinhar que nos procedimentos sobre o incumprimento dos contratos de concessão dos terrenos com as áreas de 15 823m2, 8 124m2 e 13 517m2, situados na ilha da Taipa, junto à Estrada Governador Albano de Oliveira, titulados pelos Despacho n.º 173/SATOP/97, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 53, II Série, de 31 de Dezembro de 1997, Despacho n.º 13/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 10, II Série, de 11 de Março de 1998 e Despacho n.º 32/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 17, II Série, de 29 de Abril de 1998, a decisão foi no sentido de não declarar a caducidade da concessão e, por conseguinte, de conceder um novo prazo para execução do respectivo aproveitamento, apesar de se considerar o não cumprimento do contrato imputável às concessionárias.
Comissão de Terras, aos 19 de Janeiro de 2012.
委員會
A COMISSÃO
賈利安
JAIME ROBERTO CARION
  陳漢平 梁美玲 譚偉文
CHAN HON PENG LEONG MEI LENG TAM VAI MAN
  潘德玲 陳榮喜 陳鍵賜
MARIA NAZARÉ PORTELA CHAN WENG HEI CHAN KIN T'CHI »
24 – O Secretário Para os Transportes e Obras Públicas pronunciou-se da seguinte maneira em 14/05/2015 (fls. 391-393 do apenso nº 45/2010):
«Proc. n.º 45/2010 - Proposta de declaração da caducidade da concessão provisória, por arrendamento, do terreno com a área de 2 209m2, situado na ilha de Taipa, na Avenida Kwong Tung, na Baixa da Taipa, designado por lote BT11, a favor da Companhia de Investimento Predial Pak Lok Mun, Limitada, pelo incumprimento do aproveitamento do terreno no prazo fixado. A concessão provisória é titulada pelo Despacho n.º 125/SATOP/99, cuja caducidade determina a reversão do terreno, livre de quaisquer onús ou encargos, à posse da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) com todas as benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
1. De acordo com o despacho do Chefe do Executivo, através da informação n.º 215/DSODEP/2010 da Direcção de Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), foi aprovada a proposta de iniciar o procedimento de declaração de caducidade da concessão, por arrendamento, a favor da concessionária Companhia de Investimento Predial Pak Lok Mun, Limitada, do terreno com a área de 2 209m2, situado na ilha da Taipa, designado por lote BT11, titulado pelo Despacho n.º 125/SATOP/99, por incumprimento das cláusulas quinta, sétima e oitava do contrato da concessão e decidido submeter o processo à Comissão de Terras, para análise e parecer.
2. Reunida em sessões de 19 de Janeiro e 24 de Fevereiro de 2011, a Comissão de Terras, pelo parecer n.º 32/2011, e em concordância com a proposta da entidade concedente, propôs a declaração de caducidade da concessão, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e da alínea a) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei de Terras, ex vi do n.º 2 do mesmo artigo, ou a declaração de rescisão do contrato, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 da cláusula décima quarta do contrato e na alínea c) do n.º 1 do artigo 169.º da referida Lei, e a consequente reversão do terreno, livre de quaisquer ónus ou encargos, à posse da RAEM, com todas as benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
3. Propôs ainda aquela Comissão que, nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), a concessionária seja notificada para, no prazo de 10 dias a contar da data da notificação, se pronunciar por escrito sobre o sentido provável da decisão.
4. Submetido o parecer da Comissão de Terras a homologação do Chefe do Executivo, decidiu esta entidade, por despacho de 24 de Março de 2011, que antes da tomada da decisão final neste procedimento de declaração de caducidade da concessão deveria ser realizada a audiência da concessionária e solicitado parecer ao Ministério Público.
5. Nos termos do disposto nos artigos 93.º e 94.º do CPA, a DSSOPT, através do ofício n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011, submeteu o sentido provável da decisão (declaração de caducidade da concessão) a audiência prévia do interessado, tendo este disposto de um prazo de 10 dias a contar da data da notificação - 18 de Maio de 2011 - para se pronunciar por escrito.
6. A concessionária apresentou em 27 de Maio de 2011 a sua resposta escrita.
7. Assim, recebida a resposta da concessionária, foi produzido pelo Departamento Jurídico da DSSOPT um relatório, datado de 2 de Dezembro de 2011.
8. O referido relatório conclui propondo que seja mantido o sentido da decisão de declarar a caducidade da concessão, comunicada à concessionária através do ofício n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011, tendo em conta que a concessionária, na sua resposta à audiência dos interessados, não logrou afastar a presunção de culpa que onera o seu comportamento faltoso, consubstanciado na inexecução da obra que constitui o aproveitamento do terreno denominado lote BT11, objecto da concessão.
9. Em cumprimento do despacho do director da DSSOPT, de 2 de Dezembro de 2011, o referido relatório foi enviado ao DSODEP para tramitação subsequente.
10. O DSODEP elaborou a informação n.º 344/DSODEP/2011, de 2 de Dezembro de 2011, na qual propõe superiormente autorização para o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, proposta esta que mereceu a concordância da subdirectora e do director da referida Direcção de Serviços.
11. Sobre esta informação o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu despacho em 27 de Dezembro de 2011, ordenando o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer.
12. A Comissão de Terras, reunida em sessão de 19 de Janeiro de 2012, analisado o processo, foi de parecer que deve ser declarada a caducidade da concessão do terreno designado por lote BT11, com os fundamentos de facto e de direito constantes do relatório sobre a audiência dos interessados, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e da alínea a) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei de Terras, ex vi do n.º 2 do mesmo artigo.
Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto pelas razões indicadas naquele, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno.
Aos 14 de Maio de 2015
O Secretário para os Transportes e Obras Públicas,
Raimundo Arrais do Rosário»
25 – O Chefe do Executivo proferiu a seguinte decisão em 15/05/2015:
“Concordo” (fls. 388 do p.a. apenso nº 45/2010).
26 – Não chegou a ser aplicada à recorrente nenhuma multa.
***
IV – O Direito
A – DA RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA (fls. 1013).
Vem a reclamação apresentada do despacho do relator de fls. 1010, o qual, reiterando o já expendido a fls. 999, considerava não haver necessidade de ouvir as testemunhas arroladas para decidir o recurso.
A conferência acolhe o teor do referido despacho, não obstante o que, em contrário, a reclamante (recorrente) aduz na peça de fls. 1013 e sgs.
Vejamos, então.
Pouco importa que a concessionária tivesse interesse no aproveitamento: o que interessa é que não o fez!
Igualmente não releva que houvesse num certo período de tempo escassez de mão-de-obra, uma vez que quando a concessionaria assinou o contrato já sabia (ou devia saber) dessa circunstância.
Do mesmo modo não interessa que tivesse pago a totalidade do prémio; isso não influencia minimamente a decisão administrativa, pois o sentido desta nunca poderia ficar dependente do pagamento dos prémios, sob pena de a caducidade ficar nas mãos do concessionário através desse simples estratagema. Nem mesmo os estudos e anteprojectos durante os anos “noventa e tal” (sic) invocados no art. 244º da p.i. e as reuniões e contactos mencionados no art. 245º do mesmo articulado parecem decisivos, uma vez que esses elementos não são mais do que a observância dos deveres do contratante interessado na concessão. Ou seja, são passos procedimentais que se tornavam necessários, eram a base do cumprimento, ao passo que verdadeiramente relevante é o final do período, momento em que se apuraria se houve ou não aproveitamento, se houve ou não a realização da finalidade da concessão, ou seja, a execução da obra. E quanto a isso, o que sabemos é que ele não ocorreu!
Ou seja, os factos que a recorrente a este respeito invoca – mesmo que tivessem sido melhor escrutinados e depurados pela Administração em termos procedimentais, no quadro do seu poder inquisitivo - não seriam de molde a afastar a caducidade, em virtude ter já decorrido o respectivo prazo sem que o aproveitamento tivesse sequer efectivamente iniciado do ponto de vista construtivo.
Por outro lado, todos os factos, diligências, requerimentos, ocorrências procedimentais, estudos, reuniões, etc., etc. que tenham tido lugar posteriormente, e aos quais a recorrente quer atribuir um peso decisivo, não podiam já ter, em nossa opinião, qualquer influência quanto à decisão de caducidade que veio a ser tomada. É que tudo isso que a recorrente invoca ocorreu após o termo do prazo do aproveitamento. E esta asserção é, para nós, fulcral!
E, finalmente, não podemos dar valor especial ao facto de as relações entre a Administração de então e a concessionária se pautarem por mecanismos informais, como diz a reclamante (fls. 1025). A informalidade destes casos não pode interferir com o juízo da culpa que sobre a concessionária recai, sempre que não ela não leva a cabo o dever de observância dos prazos de aproveitamento. E quanto a nós, nenhum dos argumentos por si aduzidos afasta o dever de cumprimento da referida obrigação contratual de aproveitamento. Razão para que não vejamos necessidade para proceder à inquirição de testemunhas.
Improcede, pois, a reclamação.
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B – DO RECURSO CONTENCIOSO
1 - A declaração de caducidade ora impugnada teve por fundamento o não aproveitamento do terreno no prazo de 42 meses estabelecido no contrato na cláusula 2ª. Prazo que iniciava a sua contagem no dia 17/12/1999 (dia da publicação do contrato e do despacho que o titulava no Boletim Oficial) e terminava no dia 17/06/2003.
Quanto a isto, entendamo-nos: quando a lei se refere ao prazo de aproveitamento ou, simplesmente, ao aproveitamento é à realização da finalidade do prazo contratual fixado (que, geralmente, varia entre 24 meses e 48 meses) dentro do prazo geral da concessão (que, geralmente é de 25 anos) que se refere.
Sabemos nós, por outro lado, que o prazo da concessão era de 50 anos, cuja contagem se iniciava no dia 29 de Outubro de 1964 e terminava em 29/10/2014.
E seguro é, por fim, que o acto que declarou esta caducidade pelo não aproveitamento é datado de 15/05/2015.
Ora bem. Estamos face a uma decisão administrativa que, num momento em que devia ter declarado a caducidade da concessão pelo decurso do prazo da concessão (“caducidade-preclusão”), optou por declarar a caducidade da concessão pelo não aproveitamento inicial (aquilo a que alguma doutrina chama “caducidade-sanção”).
Como este TSI já teve oportunidade de dizer noutra ocasião, a decisão administrativa com base no termo do prazo da concessão a que respeita o art. 175º da Lei de Terras nº 10/2013, de 2/09, sendo obrigatória e de carácter vinculado para o Chefe do Executivo, desde que verificados os respectivos pressupostos de facto, não tem carácter constitutivo, antes simplesmente declarativo ou verificativo e com uma função enunciativa (Ac. do TSI, de 2 de Junho de 2016, Proc. nº 179/2016/A).
Ou seja, não é através dessa decisão administrativa que essa caducidade verte os seus efeitos sobre o contrato de concessão, pois ela, como se sabe, ocorre ope legis e automaticamente (v.g., no direito comparado, Acs. do STA de 16/11/2000, Proc. nº 045902 e de 16/12/1993, Proc. nº 031065), portanto, sem necessidade de externação da vontade de alguma das partes, logo que decorra o prazo dentro do qual o direito (de construir no terreno nos termos acordados contratualmente) deveria ter sido exercido.
Quer dizer, tal caducidade repousa a sua eficácia extintiva no facto objectivo do mero decurso do tempo (Oliveira Ascensão, “Direito Civil – Teoria Geral”, III, pág. 343-344; Rodrigues Bastos, “Notas ao Código Civil”, II, pág. 95; Cabral de Moncada, “Lições de Direito Civil”, pág. 739), por isso, cego e independentemente de outros factores, como o da culpa, por exemplo.
Por esta razão, com frequência se vem chamando a ela “caducidade preclusiva” ou “caducidade-preclusão” (ver Parecer da PGR, nº PGRP00002046, de 26/09/2002, relatado por Fernanda Maçãs; desta autora, ver também “A caducidade no direito administrativo – breves considerações” em Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra, 2005, pág. 129; também Rogério Soares, “Direito Administrativo”, Coimbra, 1978, pág. 12; Maria da Nazaré Portela, in A Caducidade no contrato de concessão de terras, 3ªs jornadas de direito e cidadania da Assembleia Legislativa da RAEM, edição de 2016, pág. 419 e sgs.).
Claro que se pode perguntar para que serve, então, a declaração do Chefe do Executivo nesta declaração preclusiva, se os efeitos da caducidade operam por si e automaticamente?
Mas uma parte da resposta está na lei:
- É que há sempre efeitos colaterais a favor da concedente que não se repercutem favoravelmente na esfera deste sem a dita declaração. É o caso da reversão em favor da RAEM dos prémios pagos e as benfeitorias incorporadas no terreno pelo concessionário, sem que este tenha direito a ser compensado ou indemnizado (art. 168º, n. 1, Lei de Terras).
A outra parte da resposta está no próprio instituto:
- Em primeiro lugar, apesar de a situação jurídica de caducidade não ficar definida/constituída pela declaração, esta tem, ao menos, o efeito imediato de tornar certa e indúbia a situação jurídica inter-partes. O concessionário saberá que, ao menos a partir do conhecimento desse acto declarativo, não pode continuar - muito menos iniciar - a obra que eventualmente estivesse a erguer nesse momento.
- Em segundo lugar, esta declaração tem também uma eficácia geral, no sentido de que a partir dela podem irradiar ad omnes, indirectamente, efeitos para a esfera de quem (terceiros, em relação ao concedente) tenha porventura estabelecido relações jurídicas contratuais com o concessionário. Percebe-se, aí, a razão pela qual a declaração deva ser publicada no Boletim Oficial (art. 167º). A partir dessa publicação todos - incluindo os terceiros - ficam avisados da cessação da concessão, ficando ao seu cuidado e responsabilidade as mais prudentes cautelas.
- Em terceiro lugar, a declaração tem um propósito que não pode deixar de atender ao interesse público. E porquê? Porque a caducidade, em si mesma, gera a cessação do vínculo entre as partes, de tal modo que o concessionário já não pode prosseguir o objecto da concessão. Só que, enquanto não for declarada expressamente, embora o objecto da concessão não possa ser prosseguido, a concessionária pode acabar, na prática, por permanecer no local, fazendo deste um uso para o qual deixa de ter legitimação. É o caso, por exemplo, de o aproveitar para o seu estaleiro e até mesmo, em situações possíveis, de transformar o terreno, por exemplo, destinado à construção, num espaço com outra finalidade, como seja o do parqueamento automóvel pago pelos automobilistas com benefícios para si, mas que não têm jamais qualquer justificação e atentam contra o contrato e contra a lei. E tudo isso, veja-se, ao abrigo de uma situação jurídica precária (como é a da permanência no local sem título) sem que o justifique e sem que o permita o interesse público subjacente. É também para evitar este tipo de situações e de abusos que a lei também impõe a declaração expressa1.
Mas, independentemente da ausência da imposta declaração no caso em apreço – cujas consequências, porém, aqui não estão em discussão – a verdade é que os efeitos primários da caducidade estão obtidos. Assim pensamos, pelo menos.
E se o estão, para quê discutir uma caducidade (caducidade-sanção, para alguma doutrina) sita a montante, se a jusante já ocorreu inquestionavelmente uma outra caducidade que torna aquela inútil.
Repare-se nisto: que pode o concessionário recorrente fazer no caso em apreço, mesmo que venha a “ganhar” o recurso? Pensará ele por acaso que pode retomar a concessão? Admitirá que se pode voltar a pôr a zero o contador da caducidade? Admitirá que ainda pode voltar a ter esperança de convencer a Administração a conceder-lhe agora uma prorrogação do prazo de aproveitamento inicial?
Se assim o julga desiluda-se: tal não é possível. Basta ler o art. 166º, nº1, al. 1), da Lei de Terras para isso mesmo se concluir. Esgotado o prazo da concessão provisória (e não definitiva, porque o aproveitamento nunca foi realizado) já não há lugar a qualquer prorrogação do prazo de aproveitamento inicial desta concessão.
Abrimos aqui um parêntesis para observar o seguinte: É claro que a Lei de Terras anterior (Lei nº 6/80/M) não previa a prorrogação. Mas, isso não quer dizer que também a excluísse, ou seja, que ela não fosse possível nos termos gerais de direito e no quadro das relações inter-partes.
E por assim ser, tanto ao abrigo da lei pretérita - mesmo que não previsse a caducidade pelo decurso do prazo da concessão, mas sem que isso obstasse ao regime geral da caducidade previsto no Código Civil -, como à luz da lei nova, cremos que o facto de já ter decorrido o prazo da concessão implica necessariamente a caducidade desta. E isso reflecte-se na desnecessidade de apreciar eventual ilegalidade da caducidade declarada pelo não aproveitamento.
É esta a nossa firme convicção.
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2 – De qualquer maneira, e concedendo que outra tese possa vingar, passemos a estudar o acto administrativo na perspectiva da recorrente.
Nesse sentido, é forçoso prioritariamente indagar se o acto em causa se inscreve no âmbito de uma actividade vinculada ou discricionária. Assim: Devia a entidade recorrida declarar a caducidade? Ou podia simplesmente fazê-lo?
Quanto a nós estamos em presença de uma actividade vinculada. Porquê?
Porque sendo esta uma concessão provisória (repetimos, porque não concluída no prazo total da concessão), a ela se aplica a nova Lei de Terras, face ao disposto no art. 215º, al. 3). E sendo assim, versa sobre este contrato o disposto no nº3 do art. 104º e no art. 166º, desde que tenha expirado o prazo do aproveitamento (que era, recorde-se, de 42 meses) sem este ter sido realizado. É o caso!
Na verdade, a recorrente nem realizou o aproveitamento naquele prazo de 42 meses, nem durante esse prazo pediu a sua prorrogação2. Logo, incumpriu o contrato, o que legitimaria à declaração da caducidade ou de uma multa, em termos que mais à frente explanaremos.
Não foi aplicada nenhuma multa, é certo. Contudo, na medida em que o art. 215º, al. 3) da Lei também manda aplicar o disposto no art. 166º a esses casos, é para nós claro que a concessão caduca3 perante a circunstância prevista na alínea 1), deste artigo, isto é, desde que se verifique a “não conclusão do aproveitamento ou reaproveitamento nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no artigo 104º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa” (destaque nosso).
Por conseguinte, pensamos que a caducidade ao abrigo destas disposições destinadas a regular o não aproveitamento durante o prazo previsto de 42 meses se torna uma actividade vinculada, uma vez que não cabe à entidade competente (Chefe do Executivo) declarar ou deixar de declarar a caducidade. Se a lei diz que as concessões caducam no caso de não aproveitamento (art. 166º, n-1, al.1)) e que a caducidade é declarada pelo Chefe do Executivo (art. 167º)4, então parece-nos que não haver lugar a dúvidas de que a declaração se impunha, que era indispensável e imperativa. O mesmo é dizer que o exercício desta competência era vinculado.
A única condição para essa declaração é a verificação dos factos que sejam ou não reveladores de culpa da concessionária, pois esse é um pressuposto de facto vinculado que decorre do art. 215, al. 3), do diploma. Portanto, desde que os factos (verdadeiros) revelem culpa desta, então estarão verificados os pressupostos de facto necessários ao exercício vinculado do poder administrativo.
É certo que tal declaração só recentemente foi produzida, quando o podia (deveria) ter sido feita logo que o incumprimento (não aproveitamento) teve lugar. Contudo, esse facto não torna as coisas diferentes. É que estamos no domínio contratual e em lado nenhum é previsto que essa declaração devesse ser tomada em prazo certo, sob pena de preclusão ou de sanação da ilicitude contratual verificada.
Portanto, a circunstância de naquela ocasião não ter sido declarada a caducidade por incumprimento:
a) Não afasta o dever de a declarar a todo o momento;
b) Nem faz transferir para o contraente público a culpa do não aproveitamento.
Em suma, se estamos perante uma actividade de natureza vinculada (também neste sentido, v.g., o Ac. do TSI, de 2/03/2017, Proc. nº 433/2015), nada do que se tenha passado após o prazo do incumprimento do dever de aproveitamento por parte do contraente privado, importa já à economia e eficácia do acto em apreciação. Ou seja, quaisquer pedidos posteriores destinados à alteração da finalidade da concessão ou à prorrogação após o decurso do referido prazo inicial de aproveitamento é já potencialmente apto para transformar um dever (vinculação) num poder (discricionariedade) de aplicação da sanção contra o incumprimento contratual.
Apenas poderíamos falar em discricionariedade no tocante à decisão sobre tais pedidos, desde que houvesse um prazo para a aplicação das referidas sanções, cuja não observância pudesse fazer “sanar” o incumprimento por parte do concessionário, a ponto de ser aberto a partir de então uma nova fase procedimental que permitisse ao concedente a utilização dos seus poderes administrativos nesta matéria (cfr. art. 167º do CPA).
Deste modo, não se pode aceitar que se diga que o não aproveitamento do terreno se deva a motivos de atraso da própria Administração.
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2.1 - Mas há algo mais por dizer.
Se é certo que a declaração de caducidade por não aproveitamento é, na nossa óptica, imposta à Administração, e se esta a ela podia proceder até, pelo menos, ao termo do prazo da concessão, que novos efeitos podem nascer na relação contratual estabelecida entre as partes com eventuais pedidos de prorrogação apresentados após o decurso do prazo do aproveitamento?
Quanto a nós, nenhuns.
Como já se disse, o pedido de prorrogação deve ser feito antes de decorrido o respectivo prazo. Se o prazo de aproveitamento tiver sido consumido sem qualquer realização construtiva e sem qualquer pedido de prorrogação, o que se pode dizer é que a Administração (concedente) está constituída no dever de declarar a caducidade, com ou sem multa.
Por isso, se o pedido de prorrogação do aproveitamento pudesse ser feito após o decurso do respectivo prazo, então estaria aberta uma nova porta que anularia, na prática, o efeito vinculado do não aproveitamento dentro do período previsto. Quer dizer, se um pedido de prorrogação nessas circunstâncias fosse possível, isso equivaleria a transformar algo que era um dever legal e contratual numa espécie de poder discricionário. E então o caso transfiguraria todo o regime aplicável, ao ponto de se poder dizer que, perante um tal pedido de prorrogação, a Administração (concedente) estaria obrigada a decidi-lo, o que geraria um indeferimento tácito em caso de silêncio.
Mais, nesse pressuposto, geraria na Administração (concedente) um dever de indemnizar se acabasse por dizer que a finalidade da concessão nunca mais poderia ser executada por já dispor, ou estar a projectar, para a área um novo plano de urbanização que em caso algum permitira uma construção nos termos inicialmente consensualizados.
Só que nós entendemos que nada do que se passar após o respectivo prazo sem o aproveitamento e sem prorrogação tempestivamente peticionada faz transferir para o concedente uma culpa que sempre, e só, foi do concessionário (a menos que tenha factos que demonstrem que o não aproveitamento não decorre de culpa sua, mas de alguma força maior ou eventualidade irresistível e imprevisível). Sempre que a culpa no não aproveitamento pertença unicamente ao concessionário, da Administração (concedente) espera-se que accione os seus deveres contratuais e legais. E por isso, já não tem mais que decidir pedidos de prorrogação extemporâneos, nem se concebe a partir daí nenhum novo poder discricionário que implique ou possibilite a criação de actos administrativos expressos ou tácitos nesta matéria, cujo indeferimento (expresso ou tácito) gere danos indemnizáveis. Estaríamos perante uma subversão do regime legal e contratual se tal fosse possível por essa via.
Portanto, e em resumo:
- O pedido de prorrogação deve ser efectuado dentro do prazo do aproveitamento;
- Este pedido de prorrogação pode ser replicado (nas mesmas condições de tempestividade) mais do que uma vez dentro do prazo máximo da concessão;
- Se não for apresentado dentro do prazo do aproveitamento, nasce para o concedente o dever de proceder como manda o contrato e a lei: a caducidade é um dos efeitos que tem que ser declarada, excepto nas situações em que se não verifique culpa do concessionário;
- E esta declaração deve ser produzida o mais cedo possível, mas não está estabelecido para ela um prazo de preclusão;
- Mesmo que não seja declarada logo – e enquanto não for declarada – não se enxerta uma nova relação jurídica dentro da relação contratual já ofendida pelo incumprimento imputável ao concessionário;
- Assim, se não nasce para o concedente um dever de prorrogar algo já caducado (pelo decurso do prazo do aproveitamento sem pedido de prorrogação tempestivo), qualquer pedido extemporâneo que venha a ser feito posteriormente não coloca o concedente no dever de decidir, pelo que a não decisão nem parece traduzir um acto tácito de indeferimento, nem responsabiliza o concedente pelos danos que o concessionário queira invocar com fundamento em que apenas não realizou a obra por não lhe ter sido concedida uma prorrogação do prazo de aproveitamento (lembre-se, extemporânea) ou lhe ter sido dito que não era o momento para decidir um tal pedido enquanto não estivesse concluído um plano de reordenamento para a zona de implantação da obra projectada ou que já não era possível realizar a obra prevista dentro da finalidade inicial contemplada no contrato por razões supervenientes de protecção ambiental, de amparo ao edificado histórico e classificado, de respeito pelo espaço aéreo, de compromissos com a Unesco, de servidão geral de vistas, de manutenção de corredores de vento ou de acesso ao espelho de água do delta e às margens do rio, da necessidade de reordenamento do plano de urbanização etc., etc., etc.
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2.1 – Em vista do que acaba de ser concluído, resta dizer que todos os vícios imputados ao acto e que tenham o seu campo de aplicação vocacionado exclusivamente aos actos administrativos integrados em actividade discricionária terão que ser julgados improcedentes.
Tal é o caso dos vícios invocados respeitantes a violação do princípio da igualdade, imparcialidade, proporcionalidade, protecção dos direitos e interesses dos residentes.
Ao invés, cumpre-nos conhecer os de forma da decisão, de falta de fundamentação e de falta de audiência prévia, o do erro sobre os pressupostos, deficit instrutório, o de violação do art. 215º da Lei de Terras, bem como o de usurpação de poder.
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2.2 – Vício de forma da decisão
Crê a recorrente que o despacho do Chefe do Executivo, simplesmente de “concordo”, não cumpre as exigências do art. 167º da Lei de Terras, uma vez que a) não afirmou expressamente que declarava a caducidade, b) não o reduziu a escrito e c) não foi publicado no Boletim Oficial.
Não tem razão. O “concordo” é um despacho escrito que está aposto sobre o parecer do Secretário para as Obras Públicas e Transportes de 14/05/2015, o qual por seu turno acolhe os fundamentos do parecer 11/2012 da Comissão de Terras, onde com argumentos abundantes e mais que suficientes para se perceber o seu alcance, são expostas razões para a caducidade. Portanto, este despacho de concordância, ao receber, por remissão, a fundamentação dos actos procedimentais referidos, cumpre o disposto no art. 115º, nº1, do CPA. Em suma, esse despacho de concordância é, na sua essência, um despacho que declara a caducidade.
Quanto à questão da sua publicidade, o sentido do acto foi publicado por determinação do SOPT no BO nº 20, II série, 2º suplemento, de 20 de Maio de 2015.
Assim, está cumprido o disposto no art. 167º de Lei de Terras.
E o que é certo é que, ainda que este sentido não estivesse completo ou não fosse suficiente para cumprir a exigência do art. 167º citado, a verdade é que nunca isso seria causa de invalidade do acto, mas sim, quando muito, fonte de ineficácia, pois a publicidade, sendo posterior e extrínseca ao acto, jamais pode ser erigida como fundamento de validade do acto a publicitar, mas simplesmente impedimento à produção de efeitos de eficácia (cfr. art. 120º, n.3, do CPA.
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2.3 – Do vício de forma por falta de fundamentação (Continuação)
Nos arts. 174º e sgs da p.i., a recorrente invoca o disposto no art. 114º e 115º do CPA, para defender que o acto em crise não está fundamentado.
Com o devido respeito, não concordamos com essa posição, tal como de resto já atrás adiantamos. Tanto no parecer da Comissão de Terras, como no acto do Secretário para as Obras Públicas e Transportes estão plasmadas com total evidência e clareza as razões da caducidade. O despacho do Chefe do Executivo limitou-se a fazer seus os fundamentos explanados naqueles actos procedimentais para que implicitamente remete.
E quando é invocado naqueles actos procedimentais a alínea a), do nº1 do art. 166º da Lei de Terras, ex vi nº2, desse artigo (Lei 6/80), bem como a alínea a), da cláusula 13ª do contrato, fica-se a saber perfeitamente qual a causa para a caducidade declarada.
Por isso mesmo, deve concluir-se que o acto está fundamentado e a recorrente mostrou, aliás, conhecer todas as razões ali expostas, pois que apresentou uma petição de recurso contencioso sem mácula a esse respeito, quer dizer, sem revelar o mais pequeno sinal de tibieza ou fragilidade nos argumentos que desferiu contra ele.
Mas, o facto de não ter sido invocada no acto (e elementos procedimentais para que remete) o art. 215º da Lei de Terras não significa que o acto não esteja fundamentado. Esse argumento que a recorrente aduz, quando muito apenas pode revelar no quadro de outro fundamento, qual seja o de violação de lei.
Improcede, pois, este vício.
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2.4 – Do vício de forma por falta de audiência prévia
No entender da recorrente, não foi observado o disposto no art. 93º do CPA.
Não é verdade, conforme decorre do teor do ofício n.º 332/6319.03/DSODEP/2011, de 17 de Maio de 2011, pelo qual foi a recorrente notificada para se pronunciar em audiência prévia sobre a projectada declaração de caducidade da concessão (fls.190 e 191 do Processo n.º 46/2010 da Comissão de Terras), na sequência do que aquela, em 26/05/2011, apresentou pronúncia sobre o caso. E depois desta pronúncia, foi elaborado um relatório pelo Departamento Jurídico da DSSOPT onde foram apreciados os argumentos da recorrente (fls. 322-340 do Processo nº 45/2010)
Deve dizer-se, entretanto, e ao contrário do que sustenta a recorrente, que após esta pronúncia e do relatório citado, o procedimento se encaminhou para a fase decisória, no que foi precedido de uma posição do Ex.mo Secretário de 19/11/2014, a que se seguiu o parecer de 22/01/2015 da Comissão de Terras de 22/01/2015 e logo a seguir a decisão aqui impugnada de 15/05/2015.
Ora, nessa fase decisória nada de novo e relevante em termos factuais e jurídicos foi aportado ao procedimento que devesse ser levado ao conhecimento da recorrente a fim de sobre eles se pronunciar. Assim sendo, não acolhemos a tese da recorrente.
E, mesmo que, porventura, se pudesse dizer que teria havido novo desenvolvimento instrutório, nem por isso a eventual falta de uma audiência de interessados complementar teria no caso em apreço qualquer efeito invalidante. É que se, como dissemos, estamos perante uma actividade vinculada – no sentido da imperiosidade de declarar a caducidade por falta de aproveitamento – então a omissão dessa formalidade não seria causa de anulação do acto desde que, como é o caso, se conclua que ele observou a lei no seu sentido decisório substantivo, ou seja, que, mesmo sem a formalidade, a decisão foi a única possível do ponto de vista legal (neste sentido, entre tantos, o Ac. do TUI, de 25/07/2012, Proc. nº 50/2012; do TSI, de 19/03/2015, Proc. nº 818/2013).
Improcede, pois, o vício.
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2.5 – Do erro sobre os pressupostos (“déficit instrutório”)
Chamando-lhe “erro sobre os pressupostos”, entende a recorrente que o acto ofende o disposto nos arts. 59º e 86º do CPA, violando, concomitantemente, o princípio do inquisitório. No fundo, o que está em causa é, pois, a omissão do dever de proceder às investigações necessárias ao conhecimento dos factos essenciais ou determinantes à decisão. Ou seja, o procedimento padeceria de “deficit instrutório”, o que seria redutível em nossa opinião a um vício de violação de lei.
Com o devido respeito, quem tinha que afastar a culpa era a concessionária, pois a caducidade por falta de aproveitamento só deixaria de ser declarada caso o Chefe do Executivo tivesse elementos para considerar justificado incumprimento contratual da concessionária. Quer isto dizer, que estando o procedimento em apreço sujeito a prova de factos, estes deveriam ter sido trazidos aos autos para serem devidamente valorados, sujeitos a demonstração e contemplados na decisão administrativa.
Ora, os factos que a concessionária aporta aos autos neste capítulo (cfr. arts. 234-262), salvo melhor opinião, mesmo que alegados e até colhidos (alguns deles) no procedimento, não seriam de molde a interferir com o sentido da decisão.
Se estivermos certos, uma vez que a situação é vinculada para o concedente no sentido da declaração da caducidade, o facto de não ter sido declarada imediatamente não apaga, nem sana, a ilicitude contratual do concessionário, não elimina o dever de o concedente a todo o momento declarar a referida caducidade, nem abre um novo capítulo das relações contratuais ao abrigo do qual o concedente passa a discricionariamente poder prorrogar algo que já terminou (a prorrogação, como se sabe, deve ser pedida ainda dentro do prazo da obrigação).
Não esqueçamos o que foi dito atrás: Qualquer prorrogação depende sempre de um pedido tempestivo, ou seja, apresentado antes do termo do respectivo prazo (1ª condição), da alegação de factos que afastem a culpa do concessionário, como sejam os que revelem uma situação de força maior ou de acontecimentos imprevisíveis ou irresistíveis (cláusula 6ª do contrato e art.104º, n.5, da Lei nº 10/2013)) e, por fim, de uma decisão do Chefe do Executivo que considere justificados os motivos invocados (art. 104º, nº5, cit. “fine”). Nada, porém, disto aconteceu.
São razões para julgar improcedente o vício.
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2.6 – Do erro nos pressupostos (continuação)
Olhemos agora para os termos do contrato, cuja cláusula 6ª prescreve o seguinte:
CLÁUSULA SEXTA - MULTAS
1. Salvo motivos especiais devidamente justificados e aceites pelo primeiro outorgante, pelo incumprimento dos prazos fixados na cláusula anterior, relativamente à apresentação dos projectos, início e conclusão das obras, o segundo outorgante fiça sujejto a multa que pode ir até $5.000,00 (cinco mil) patacas, por cada dia de arraso até 60 (sessenta) dias; para além desse período e até ao máximo global de 120 (cento e vinte) dias, fica sujeito a multa que poderá ir até ao dobro daquela importância.
2. O segundo outorgante fica exonerado da responsabilidade referida no
número anterior em casos de força maior ou de outros factos relevantes que estejam, comprovadamente, fora do seu controlo.
3. Consideram-se casos de força maior os que resultem exclusivamente de
eventos imprevisíveis e irresistíveis.
4. Para efeitos do disposto no número dois desta cláusula, o segundo outorgante obriga-se a comunicar, por escrito, ao primeiro outorgante, o mais rapidamente possível, a ocorrência dos referidos factos.
Pelo texto transcrito logo se detecta que o incumprimento do aproveitamento sujeita o concessionário a multa em dias (simples e agravada), salvo nos casos considerados de força maior e os que resultem de eventos imprevisíveis e irresistíveis. Ou seja, escapa à multa o concessionário que não tiver culpa no incumprimento de prazos. Por isso se diz que esta é uma “penalidade” contratual que carece de culpa do incumpridor.
O mesmo decorre, aliás, do art. 105º, nº3, da Lei de Terras nº 6/80/M, onde é dito que “A inobservância dos prazos sujeita o concessionário às penalidades estabelecidas no respectivo contrato ou, sendo este omisso, à multa de cem patacas por cada dia de atraso, até cento e vinte dias, e, para além deste período mas até ao máximo de sessenta dias, ao dobro daquela importância”.
Mas é caso para perguntar:
De acordo com a Lei de Terras anterior e com o contrato, era obrigatória a imposição da multa? A multa constituiria um pressuposto necessário da caducidade? E não tendo a multa sido aplicada, será que podia ser declarada a caducidade?
Estas perguntas fazem sentido, face ao disposto no art. 166º, al. a), da mesma Lei de Terras (6/80/M).
É que ali é dito que:
“As concessões…caducam….quando ocorra qualquer das seguintes circunstâncias, imputáveis ao concessionário:
a) Falta do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo do pagamento da multa agravada previsto no nº3 do artigo 105º; ….” (destaque nosso)
Como se vê, numa apressada leitura, parece que a multa deveria ser aplicada e só decorrido o prazo do pagamento da multa em dias agravada é que poderia passar o concedente para a caducidade.
E esta conclusão poderia ter até algum apoio no teor da cláusula 13º do contrato, cujo nº1, al. a) contempla que:
“O presente contrato caduca nos seguintes casos:
a)Findo o prazo da multa agravada previsto na cláusula sexta;
…….”.
Mas não cremos que seja assim.
Quando a cláusula 6ª do contrato e o artigo 105º, nº3 da Lei de Terras referida sujeitam o concessionário a uma multa em dias, colocam-no, sim, num estado de sujeição que confere ao concedente um direito potestativo de a aplicar. Daí não se segue, porém, que nasça um dever (um estado de vinculação) de a aplicar por parte do concedente. Isso, pelo menos, não resulta dos termos explícitos do contrato, nem da referida norma do art. 166º transcrita.
Mas essa norma não estabelece um poder disjuntivo? Não confere ela um poder “alternativo” de aplicar a caducidade ou a multa? Qual será a razão de ser para esta alternativa? Ficará a bel-prazer da Administração a escolha da medida: multa ou caducidade? Aparentemente, uma tal “alternativa” fará pouco sentido. Mas será mesmo assim?
Pensamos que, para fazer sentido, esta “alternativa” do texto da lei só pode significar que a multa não é de imposição obrigatória. Mas, por outro lado, também equivale a dizer que a sua aplicação dependerá de uma análise sobre a possibilidade de a concessionária ainda poder cumprir o prazo de aproveitamento, embora estando atrasado. Ou seja, a multa surge como sanção para o atraso, o qual, apesar de tudo, ainda pode ser recuperado pela via da atribuição de mais dias de prazo – que são os dias de multa e que podem ir até 120 dias (nos termos da cláusula 6ª) e até 180 dias (nos termos do art. 105º, n.3, da Lei nº 6/80/M). Realmente, se a obra não estivesse sequer começado ou estivesse muito atrasada – a ponto de se já não ser concluída nem dentro do prazo dos dias da multa – não haveria qualquer lógica na aplicação dessa sanção.
Caso não seja possível a recuperação do atraso através da multa, então o contratante público deve avançar para a declaração de caducidade.
Por conseguinte, quando a cláusula 13ª prevê a multa agravada e a caducidade findo o prazo desta, não parece que esteja a transformar a multa num pressuposto de verificação obrigatória da caducidade, ao contrário do que o defende a recorrente. Quando essa cláusula assim se manifesta não pode deixar de se ater com a cláusula 6ª do contrato (para a qual, de resto, ela remete) e com o próprio art. 105º da anterior Lei de Terras. Quer dizer, quando prescreve “….findo o prazo da multa agravada” o que está a dizer é que a caducidade será declarada “findo o prazo…” da multa que tiver sido efectivamente aplicada desde que o aproveitamento mesmo assim não tiver sido concluído com êxito dentro dele (prazo de multa).
Cremos ser esta a melhor, mais lógica e coerente forma de interpretar o texto da alínea a), do art. 166º da Lei de Terras nº 6/80/M.
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2.6.1 – Ora bem. Porquê esta breve incursão aos referidos preceitos da anterior Lei de Terras?
Por uma razão bem simples: é que nenhum dos actos preparatórios do acto administrativo do Chefe do Executivo (parecer da Comissão de Terras, despacho do Ex.mo Secretário, etc.) chegou a ter em conta a nova legislação. Quer dizer, eles sempre trataram o caso sob a égide da Lei de Terras anterior e nem uma palavra dedicaram à nova Lei nº 10/2013.
Ora, quando o acto administrativo aqui sindicado foi praticado (15/05/2015) já a nova Lei estava em vigor (entrou em vigor no dia 1 de Março de 2014, conforme art. 223º).
Temos, assim, um despacho decisor que aplicou a lei antiga, quando ela já estava revogada pela nova mais de um ano antes, sem que aparentemente ninguém se tivesse apercebido disso (cfr. art. 222º, al. 1)).
Isto coloca-nos um problema, que é este:
Por um lado, os vícios devem ser apreciados em função da sua expressa e contextual fundamentação (não é possível a fundamentação a posteriori, como se sabe).
Mas, por outro, na análise dos vícios deve ser tomada em consideração a realidade fáctica existente no momento da prática do acto e no quadro normativo então em vigor, segundo o conhecido brocardo tempus regit actum (no direito comparado, por exemplo, ver Acs. de 17/02/2002, Proc. nº 048295; do STA, de 3/04/2003, Proc. nº 02046/02; 5/02/2004, Proc. nº 01918/02; 22/06/2004, Proc. nº 01577/03; 30/11/2011, Proc. nº 0663/2011).
É por tal motivo que, em princípio, não é lícito invalidar um acto administrativo com base num quadro legal não vigente à data da sua prática (neste sentido, no direito comparado, entre outros, os Acs. deste STA, de 20-11-69 (Pleno) - AD 97, a págs. 144, de 22-7-76 (Pleno) AD 160-1672, de 17-12-80 (Pleno) - AD 233-637 e de 23-1-86 (Pleno) - AD 299-1379 e da Secção de 27-9-88 - AD 351-285, de 10-1-89 - AD 303, de 29-1-91 - Rec. 028831, de 2-12-93 - Rec. 031797 e de 30-3-95 - Rec. 026880; tb. 7/02/2002, Proc. nº 048295).
Ora, isto quer dizer que, em tais hipóteses, estamos perante um vício: o de erro nos pressupostos de direito (assim o qualificou um Ac. do STA, de 22/10/2003, Proc. nº 01423/02), ou o de violação de lei. Vício que, porém, não foi expressamente invocado com este fundamento.
Quid iuris, então? Qual a consequência prática desta errada aplicação da lei? Quanto a nós não faz sentido dizer que o acto sofre de falta de fundamentação de direito por não aplicar as normas da Lei 10/2013. A fundamentação de que o acto se serviu pode estar é errada, mas esse é um problema diferente do de falta de fundamentação. Fundamentado está.
Qual a solução, então?
O referido aresto (Proc. nº 01423/02), inspirado em outros acórdãos que cita, deu a resposta:
“Tal vício é, por força do princípio “utile per inutile non vitiatur”, irrelevante, caso as normas que deviam ter sido aplicadas tenham conteúdo exactamente igual às que foram ilegalmente aplicadas…”.
Pensamos ser uma boa saída para esta “vexata quaestio”, cuja solução também fica a dever ao princípio do aproveitamento do acto administrativo.
Ora, no caso que nos ocupa, há perfeita identidade de normas no que elas têm de essencial. Basta ver o que prescreve o art. 166º, nº1, al. 1), da nova Lei de Terras, para logo se concluir dessa maneira:
“1. ….as concessões provisórias caducam….quando se verifique….a não conclusão do aproveitamento ….do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no nº3, do artigo 104º….”. Há até aqui uma flagrante convergência dispositiva.
A única diferença está no inciso legal introduzido na parte final dessa alínea 1): “…independentemente de ter sido aplicada ou não multa”.
Mas, este inciso, em vez de reforçar uma interpretação da Lei anterior que olhe para a multa como sanção de aplicação necessária e pressuposta da concessão, até mais nos parece que tem antes um sentido clarificador (de algum modo, quase interpretativo) de alguma dúvida que pudesse resultar do correspondente texto da Lei anterior (art.166º, nº1, al. a)).
Aliás, o próprio art. 215º, al. 3), da Lei nº 10/2013, ao remeter directamente para o disposto nos arts. 104º e 166º precedentes, acaba por deixar o intérprete na mesma situação em que ficaria, se tivesse que olhar apenas para a Lei revogada. Ou seja, teria sempre que fazer a análise sobre a aplicação prévia da multa. E haveria que concluir, tal como o concluímos nós acima, que a multa em dias só é de aplicar se ela ainda tiver alguma utilidade para a composição dos interesses envolvidos: os do concessionário, que ainda disporá de mais alguns meses para concluir o aproveitamento já em fase terminal, e os do concedente, representante do interesse público em causa, que assim vê a esperança de ver o contrato concluído e realizada a finalidade que ditou a sua celebração.
Portanto, estamos perante normas de conteúdo e fins semelhantes. Daí que eventual violação de lei (erro nos pressupostos de direito, como lhe chamou o citado aresto), alem de não ter sido invocado com essa dimensão, também não pode ser operante, uma vez que a nova legislação nesse aspecto não é inovador em relação à revogada.
Daí que iremos apreciar os restantes vícios de acordo com a nova lei.
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2.6.2 – (Continuação)
Não deixa, aliás, de ser curioso que a própria recorrente tenha arguido a violação do art. 215º da Lei nº 10/2013, o que parece sinal de que ela mesma defende que a legalidade do acto deve ser apreciada à luz dos factos e do direito aplicável à data da prolação do acto administrativo decisor.
Para si os pressupostos de facto e de direito não permitiriam aplicar o art. 215º, pois a realidade fáctica não se ajustava a nenhuma das hipóteses previstas nas suas diversas alíneas.
Mas até neste campo lhe falece a razão.
Com efeito, antes de mais, é bom que se repita o que já acima afirmámos – nem isso está posto em crise no recurso pela recorrente – que a nova lei se mostra aplicável ao caso, não apenas porque esta concessão era ainda provisória, mas porque a situação de facto se enquadra na previsão da alínea 3) do referido artigo (as restantes não se encaixam na situação concreta).
E esta conclusão é fácil de alcançar, não só porque o prazo fixado no contrato para o aproveitamento já tinha expirado havia muito tempo, mas também porque a culpa desse não aproveitamento se deve imputar à concessionária.
Para encontrar a resposta a esta pergunta, ater-nos-emos para já apenas ao art. 215º citado, que fala expressamente na culpa do concessionário (alínea 3)).
*
2.6.3 – (Continuação)
Por que motivo damos ênfase a esta referência à culpa?
Porque nada do que a recorrente aqui trouxe mostra utilidade, pertinência e relevância para o afastamento da sua culpa. Na verdade, o argumento invocado da crise não lhe dá qualquer apoio, uma vez que, se a crise estava em Macau desde 1996, como ela própria reconhece nos arts. 57º e 63º da p.i., e se durou até 2004 (art. 75º, da p.i.), então qual o motivo por que aceitou a revisão do contrato e se comprometeu a cumpri-lo na data da sua celebração (1999)? Já previa que não podia cumprir e aceitou a mesmo assim a celebração do contrato?
Bom. Estamos no domínio contratual e da sempre necessária e omnipresente boa fé negocial. Não podia – não era legítimo, para não dizer lícito – o contraente aproveitar-se dos benefícios de uma concessão para logo a seguir dizer que não respeitava as razões de interesse público – as quais tinham certamente levado a Administração a permiti-la - por motivos pessoais que se poderiam reflectir negativamente na sua esfera de interesses privados.
Ou seja, não podia o contraente privado fruir dos benefícios de uma concessão a longo prazo e ao mesmo tempo alegar que não podia realizar já a finalidade que esteve na base dela, reservando para si, e por seu livre alvedrio, o momento mais conveniente para a concretizar (numa espécie de “o melhor de dois mundos”, se nos é permitido dizer assim, sem qualquer quebra de respeito pela parte).
Havia crise? Então, não aceitava o contrato, pelo menos naqueles moldes.
Havia crise e aceitou o contrato em tais termos? Então, tem que se concluir que, estando de boa fé, ponderou todos os “pros e contras”, as vantagens e desvantagens, as conveniências e inconveniências, o “bem” e o “mal” fundado da sua declaração contratual.
Havia naquela ocasião excesso de oferta de fracções imobiliárias? Não deveria ter aceitado a concessão.
Portanto, tem que se admitir que a contratante aceitou os riscos do negócio, os quais fazem, aliás, parte da essência da concessão a entidades privadas.
É comummente sabido que esses riscos5, num quadro menos favorável de edificação dentro do tão propalado “mercado”, oferecem aos investidores condições de melhor aquisição de bens e materiais que hão-de utilizar na construção (melhores preços, melhores condições de pagamento, etc.) que acabam por se reflectir numa construção a menor custo e que, terminado o período de crise e iniciado um outro de recuperação e crescimento, proporcionarão desse modo mais altos rendimentos e lucros. Isto é facto notório, toda a gente o sabe.
O que se depreende é que a concessionária não levou por diante o aproveitamento por alegadas razões conjunturais, num quadro de crise do sector imobiliário, para o levar a efeito numa altura mais favorável. Ou seja, por razões próprias, transferiu a decisão de construir para outra altura, sem tomar em consideração o movimento cíclico de “alta” e “baixa” do sector.
Se isto é assim, não é aceitável que a contratação em período de crise seja factor de afastamento de culpa no não aproveitamento.
Por isso, os pressupostos de facto e de direito previstos no artigo 215º citado, nomeadamente o da culpa, mostram-se ajustados à situação em apreço.
E não se diga, por outro lado, que os prazos da cláusula 5ª eram física e legalmente impossíveis, uma vez que para o aproveitamento do lote BT11 era necessário, segundo diz, concretizar a “nova forma jurídica do terreno” (sic: art. 278º da p.i.), ou seja, desanexar e constituir uma nova descrição no cadastro e no registo predial. A partir do despacho do Secretário 125/SATOP/99 podia desde logo a concessionária tomar as providências necessárias ao aproveitamento, sem necessidade de inscrição no registo predial. E mesmo que o fosse, com aquele título logo lhe seria fácil proceder ao registo. Nunca seria por isso que o aproveitamento se deixaria de fazer dentro do prazo previsto.
Logo, porque verificados os referidos pressupostos de facto, tal preceito não se pode dar por violado.
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2.8 - Da usurpação de poderes
Invoca a recorrente, por fim, o vício de usurpação de poderes. Isto, na pressuposição de o acto se ter servido de instruções internas da DSSOPT sem a sua audiência e sem o seu acordo.
Não tem razão, mais uma vez. Qualquer tarefa de interpretação pode ser levada a cabo pelos próprios internos da Administração, aos quais se pode auto-vincular sob a forma de ordens e directivas. Nada disso ofende os poderes judiciais próprios da função do poder judicial. Se a Administração, uma vez fixadas as regras de aplicação de normas em virtude de um processo prévio de interpretação, aplicar de futuro as referidas ordens internas, instruções ou directivas, o único risco que corre é o de estar a aplicar indevidamente as normas jurídicas em causa se o sentido da interpretação em que elas assentaram estiver errado. Ou seja, o facto de a Administração proceder a um exercício de interpretação que depois vaza em actos de vinculação com carácter regulamentar ou similar, por si só não é ilegal, nem ofende o princípio da separação de poderes e, por isso, os actos que as aplicam não ficam feridos de usurpação do poder judicial.
Improcede, pois, o vício invocado.
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3- Como os restantes vícios – violação dos princípios da igualdade, imparcialidade, proporcionalidade, protecção dos direitos e interesses dos residentes - são relativos a matéria discricionária, o que não é o caso, fatalmente improcedem, como já se disse. Mas, mesmo que fossem de conhecer, em virtude de alguma discricionariedade que nós não divisamos, mesmo assim, eles se têm que dar por improcedente.
É que, como bem se tem repetido nos tribunais da RAEM, as decisões tomadas ao abrigo dos poderes discricionários, salvo os momentos vinculados deles (competência, fundamentação, observância da audiência prévia de interessados, pressupostos de facto) só são escrutináveis nas situações de erro grosseiro e manifesto (v.g., Acs. do TUI, de 28/01/2015, Proc. nº 123/2014;Ac. do TSI, de 26/05/2016, Proc. nº 325/2015). Apenas nessas ocasiões se pode dar por violados os princípios invocados pela recorrente.
Contudo, no caso concreto não detectamos nenhum erro manifesto na aplicação dos poderes administrativos.
Razão pela qual, subsidiariamente, e cautelarmente, somos a entender que, até na perspectiva de um exercício discricionário dos poderes administrativos, os vícios invocados não procedem.
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V – Decidindo
Face a todo o exposto, acordam em julgar improcedente o recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 8 UC.
TSI, 21 de Setembro de 2017
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa

1 Já a exigia o próprio contrato, na cláusula 13ª, n.2.
2 Qualquer pedido de prorrogação fora desse prazo parece só ter efeito de pedido de renovação (“ex novo”).
3 O nº1 do art. 166º preceitua que as concessões caducam – e não que podem caducar.
4 Assim também era no domínio da Lei nº 6/80 nos arts. 166º e 167º.
5 Na concessão o particular desempenha a actividade por sua conta e risco, ainda que observando as condições e cláusulas impostas pela Administração (neste sentido, Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, I, 10ª ed. 9ª reimpressão, pág. 583; Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III, ed. 1989, pág. 442; também José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José C. Pinho, Código do Procedimento Administrativo – anotado e comentado, 5ª ed., pág. 36.
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672/2015 99