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Processo n.º 662/2017 Data do acórdão: 2017-9-21 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– suspensão da pena de prisão
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal

  
S U M Á R I O
Se não se verificar o pressuposto formal exigido na parte inicial do n.o 1 do art.o 48.o do Código Penal, é inviável a suspensão da execução da pena de prisão.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 662/2017
(Autos de recurso penal)
Recorrente (4.a arguida): A




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com o acórdão proferido a fls. 794 a 813 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR4-16-0427-PCC do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que a condenou como co-autora material (em co-autoria com os 1.o, 2.o, 3.o e 5.a arguidos desse processo) de um crime consumado de usura para jogo com exigência de documentos, p. e p. pelos art.os 13.o, n.o 1, e 14.o da Lei n.o 8/96/M, de 22 de Julho, e com a circunstância agravante prevista no art.o 22.o da Lei n.o 6/2004, de 2 de Agosto, na pena de dois anos e nove meses de prisão, e como co-autora material (em co-autoria com os 2.o, 5.a, 6.o, 7.o e 8.o arguidos do mesmo processo) de um crime consumado de sequestro, p. e p. pelo art.o 152.o, n.o 1, do Código Penal (CP), e com a mesma circunstância agravante prevista no art.o 22.o da Lei n.o 6/2004, na pena de um ano e nove meses de prisão, e, em cúmulo jurídico dessas duas penas, finalmente na pena única de três anos e sete meses de prisão, para além da pena acessória de proibição de entrada em casinos pelo período de três anos, a ser executada após a soltura prisional, veio a 4.a arguida A, aí já melhor identificada, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), alegando (no essencial) e pretendendo (na sua motivação de recurso apresentada a fls. 861 a 867 dos presentes autos correspondentes) que:
– ela só agiu como cúmplice, e não como co-autora, no crime de usura para jogo com exigência de documentos, pois ela se limitou a procurar jogador para receber empréstimo para jogar, e a chegar a tirar, na mesa de jogos, à pessoa jogadora ofendida dos autos, juros do empréstimo para os entregar ao 3.o arguido para os guardar, pelo que não tinha ela qualquer poder de decisão ou de orientação nos assuntos de concessão de empréstimos para jogos, mas os 1.o e 2.o arguidos já tinham esse poder, e o título de confissão de dívida e os documentos identificativos da pessoa jogadora ofendida em causa eram guardados pelo 3.o arguido;
– de maneira que ela deve passar a ser condenada como cúmplice no crime de usura para jogo com exigência de documentos, em pena de prisão não superior a um ano, e a sua pena de prisão do crime de sequestro deve ser reduzida para um ano e seis meses, e, em cúmulo jurídico, deve ser ela punida com pena de prisão única não superior a dois anos e seis meses, e com suspensão da execução da pena por um período não superior a três anos, isto tudo sobretudo por ser ela uma delinquente primária e haver que evitar os efeitos estigmatizantes da pena de prisão efectiva.
Ao recurso respondeu o Digno Procurador-Adjunto junto do Tribunal a quo no sentido de improcedência da argumentação da recorrente (cfr. a resposta de fls. 902 a 907v).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 923 a 925), pugnando também pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame do processo, sabe-se que o acórdão ora recorrido se encontra proferido a fls. 794 a 813 dos autos, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido, incluindo-se a fundamentação fáctica e probatória aí escrita.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Da questão da alegada cumplicidade na prática do crime de usura para jogo com exigência de documentos: perante a matéria de facto julgada por provada em primeira instância, não pode proceder a tese de cumplicidade, pois a factualidade descrita como assente no acórdão recorrido (cfr. sobretudo os factos provados 3 a 7, 9 e 21) deixa nítida a intervenção da arguida ora recorrente como um dos co-autores deste crime.
Outrossim, assaca a recorrente à decisão condenatória recorrida o excesso na medida da pena.
Pois bem, o crime de usura para jogo com exigência de documentos é punível com pena de dois a oito anos de prisão, e o crime de sequestro em causa é punível com pena de um a cinco anos de prisão.
Assim sendo, após tudo ponderado (com consideração de todas as circunstâncias fácticas já apuradas pelo Tribunal a quo e descritas como provadas no texto da decisão recorrida com pertinência à medida da pena (sendo de frisar que a recorrente era pessoa indocumentada em Macau à data dos factos, situação essa que releva como circunstância agravante na medida da pena, por comando do art.o 22.o da Lei n.o 6/2004, de 2 de Agosto), por um lado, e, por outro, das inegáveis exigências de prevenção geral desses dois delitos penais) à luz dos padrões vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, 65.º, n.os 1 e 2, e 71.º, n.os 1 e 2 do CP, realiza-se que as duas penas parcelares e a pena única de prisão achadas no aresto recorrido para a recorrente já não admitem mais redução, ainda que a recorrente seja delinquente primária em Macau.
Do exposto, resulta inviável a pretendida suspensão da execução da pena única de prisão, devido à inverificação do pressuposto formal exigido na parte inicial do n.o 1 do art.o 48.o do CP.
Em conclusão, improcede o recurso, sem necessidade de abordagem, por estar logicamente prejudicada pela análise das coisas acima feita, do mais alegado pela recorrente na sua motivação.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso.
Custas do recurso pela recorrente, com três UC de taxa de justiça.
Macau, 21 de Setembro de 2017.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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