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Processo n.º 53/2017 Recurso jurisdicional em matéria penal
Recorrente: A.
Recorridos: B e C.
Assunto: Seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel. Exclusão da garantia do seguro. Empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado. Alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 57/94/M.
Data do Acórdão: 8 de Novembro de 2017.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO
Estão excluídos da garantia do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel os empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
Por Acórdão do Tribunal Judicial de Base, de 24 de Abril de 2015, foi decidido, além do mais, que agora não releva:
a) Absolver na totalidade o 1.º réu B e a 2.ª ré, A, do pedido cível;
b) Condenar a 3.ª ré, C, no pagamento ao lesado, autor do pedido cível, D, a quantia de MOP$2.314.133,00. (dois milhões trezentas e catorze mil e cento e trinta e três patacas), acrescida dos juros legais a contar da sentença de 1.ª instância.
Em recurso interposto pela vencida para o Tribunal de Segunda Instância (TSI), decidiu este, por acórdão de 1 de Junho de 2017, absolver do pedido a 3.ª ré, C e condenar, solidariamente, o 1.º réu B e a 2.ª ré, A a pagar ao autor a mencionada quantia de MOP$2.314.133,00 (dois milhões trezentas e catorze mil e cento e trinta e três patacas), acrescida dos juros legais a contar do acórdão.
Recorre, agora, para este Tribunal de Última Instância (TUI) a 2.ª ré, A, sustentando que o acórdão recorrido interpretou mal o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 57/94/M, de 28 de Novembro, pelo que as vítimas de acidentes de viação que sejam empregados ao serviço do segurado não estão excluídas da garantia do seguro, pedindo assim a revogação do acórdão recorrido para ficar a valer a decisão de 1.ª instância.

II – Os factos
Estão provados os seguintes factos:
1. No dia 21 de Agosto de 2012, por volta das 12h33, o Arguido, B, conduzia o autocarro, de matrícula MP-XX-XX, circulando na faixa de rodagem subterrânea D da Praça das Portas do Cerco e estando a preparar-se para encostar à paragem de autocarro. Naquele momento, encontrava-se parado em frente do referido veículo um outro autocarro, de matrícula MP-XX-XX, (cujo condutor era E) que estava em tomada de passageiros (vide fls. 7, 7v., 9 e 37v.).
2. Após a encosta do autocarro conduzido pelo Arguido à paragem, o chefe de estação, D, (ofendido) entrou no dito autocarro pela porta dianteira e comunicou ao Arguido o assunto relativo à reunião marcada para a parte da tarde, posteriormente, saiu pela porta dianteira e caminhou para a frente do autocarro, verificando a placa frontal do autocarro (placa de itinerário). Naquele momento, o Arguido saiu do assento do condutor, caminhando para a porta dianteira, e, por este não ter puxado bem o freio de mão, de repente, o autocarro escorregou para frente e bateu na parte direita do corpo do ofendido, empurrando-o contra o autocarro de matrícula MP-XX-XX, que estava à sua frente, tornando-o preso entre os dois autocarros e causando-lhe fracturas da clavícula esquerda, do estemo, da pelve e da escápula esquerda, bem como contusões nos pulmões e no fígado (vide fls. 34 a 36 e 37v.).
3. Reparada a situação, o Arguido correu logo para o assento do condutor, puxando bem o freio de mão e fazendo marcha atrás, com vista a liberar espaço para salvar o ofendido (vide fls. 34 a 36 e 37v.).
4. Na dada altura, F que estava a caminhar no abrigo afecto a autocarros, sito na parte subterrânea da Praça das Portas do Cerco, presenciou o acidente.
5. O impacto causou ao ofendido as lesões mencionadas e averiguadas no parecer clínico de medicina legal constante de fls. 66 dos autos, que são compatíveis com a ofensa grave prevista nas alíneas c) e d) do art.º 138º do Código Penal – provocar-lhe doença permanente e perigo para a vida, cujas lesões se dão aqui por integralmente reproduzidas.
6. O acidente ocorreu na parte da manhã, o tempo estava bom, o pavimento estava seco e a densidade do trânsito era normal (vide fls. 7v.).
7. O Arguido sabia perfeitamente que um condutor devia, em qualquer momento, controlar o veículo que estava a conduzir, e não podia praticar qualquer acto ou actividade prejudicial à segurança na condução de veículo, mas continuou a desobedecer às respectivas regras.
8. O Arguido não conduziu com prudência nem atenção para evitar a ocorrência do acidente de viação.
9. O Arguido também tinha perfeito conhecimento de que a conduta supra mencionada era proibida e punida por lei.

Factos provados descritos no pedido de indemnização civil:
10. O impacto causou, directa e necessariamente, ao ofendido lesões graves em várias partes do corpo, dores severas e dificuldade em respirar. Consequentemente, o ofendido foi encaminhado ao Hospital para ser socorrido.
11. Após ter chegado ao Hospital, o ofendido foi socorrido na urgência e, na altura, sofria lesões externas em várias partes do corpo acompanhadas da dificuldade em respirar, bem como desmaiou uma vez. (Vide relatório médico, constante de fls. 76 dos autos)
12. O impacto causou quebra dos pára-brisas dianteiros e deformação da alavanca da limpa pára-brisas dianteira do lado esquerdo do autocarro pesado de matrícula MP-XX-XX (vide relatório de inspecção do veículo envolvido no acidente e respectivas fotografias do veículo, constantes de fls. 47 e 48 dos autos).
13. Após o acidente, através do exame de raio X, verificou-se que o ofendido teve manchas brancas nos lobos pulmonares inferiores e, em conjugação com a história clínica do mesmo, considerou-se que este sofreu contusões pulmonares; sem signo de fractura manifesto da vértebra cervical; teve uma mancha da densidade óssea triangular na parte frontal superior da vértebra cervical 4, com esclerose na borda e osteoepífise permanente; sofreu fractura múltipla das costelas de dois lados e fractura do meio da clavícula esquerda; a extremidade plana do tubo interior para perfuração do lado direito a nível vertebral T5, a extremidade plana do tubo interior para drenagem da cavidade torácica do lado direito na linha superior da 11ª costela traseira; ruptura e hemorragia na extremidade superior do lobo direito do fígado e embolia arterial na extremidade superior do lobo direito do fígado. (Vide relatório médico, constante de fls. 76 dos autos)
14. Através do exame de CT, verificou-se que o ofendido teve exsudação múltipla nos pulmões, principalmente nos lobos pulmonares inferiores, bem como sangue e hemorragia activa na extremidade dorsal do lobo pulmonar inferior do lado direito e no hilo pulmonar, considerando-se que este sofreu rompimento pulmonar (pulmão húmido traumático); neumotórax na cavidade torácica de dois lados, com compressão de cerca de 5% no pulmão direito e de cerca de 10% no pulmão esquerdo; tubo de drenagem na parte direita do tórax; rompimento de grande dimensão no lobo direito frontal do fígado, com a área de cerca de 7,5X6,2X4,8, e hemorragia activa numa parte de pequena dimensão no interior, correspondente a ruptura superficial do fígado; acúmulo de grande quantidade de sangue e de líquido ao redor do fígado e do baço, nas valas dos dois lados do cólon e na cavidade pélvica; fractura do meio da clavícula esquerda, sem transposição manifesta nem separação na parte fracturada; fractura linear da 1ª costela traseira e da parte inferior da escápula do lado direito, sem transposição nem ângulo na parte fracturada; fractura da parte axilar da 2ª costela do lado direito, com transposição manifesta na parte fracturada, fractura da 3ª costela frontal do lado esquerdo, com transposição na parte fracturada, fractura da 8ª costela traseira do lado esquerdo, sem transposição manifesta nem separação na parte fracturada; fractura cominutiva das partes superior e inferior do lado esquerdo do púbis, com transposição na parte fracturada e fragmento ósseo múltiplo; enfisema nos tecidos moles da parte frontal e externa da parede torácica do lado direito; grande alvéolo apical, grande alvéolo na parte dorsal do lobo inferior do pulmão direito, com a dimensão máxima de cerca de 1,2X1,4CM; pequeno quisto na parte inferior do rim direito, com dimensão de cerca de 0,2CM; pouca sombra de gás na bexiga; ampliação do lobo direito da tireóide; sem anormalidade manifesta no coração, na glândula X, no baço, no rim esquerdo e na glândula adrenal de dois lados, e sem fractura do tórax e da vértebra lombar. (Vide relatório médico, constante de fls. 76 dos autos)
15. Devido ao acidente de viação em causa, o ofendido foi diagnosticado pelo médico com: 1. Rompimento pulmonar acompanhado neumotórax na cavidade torácica de dois lados; 2. Rompimento no lobo direito frontal do fígado: Pós-embolia arterial do fígado; 3. Fractura do meio da clavícula esquerda; 4. Fractura linear da parte inferior da escápula esquerda; 5. Fractura múltipla das costelas (1ª costela traseira do lado direito, parte axilar da 2ª costela do lado direito, 3ª costela frontal do lado esquerdo, 8ª costela traseira do lado esquerdo); 6. Fractura cominutiva das partes superior e inferior do lado esquerdo do púbis; 6. Laceração na pele do dorso da mão direita; 7. Hemorragia na parte inferior da conjuntiva bulbar de dois lados. (Vide relatório médico, constante de fls. 76 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos jurídicos).
16. Devido ao acidente em causa, o ofendido teve baixa hospitalar desde 21 de Agosto de 2012 até 14 de Janeiro de 2013, num total de 147 dias, período esse foi submetido a várias espécies de tratamentos e exames. (Vide Doc. 1 – Certidão de doença, Doc. 2 – parte dos recibos de exame e Doc. 3)
17. Durante a estadia no Hospital, o ofendido submeteu-se, sucessivamente, aos tratamentos cirúrgicos de drenagem da cavidade torácica do lado direito, de embolia arterial interna do lobo direito do fígado e de anti-choque, bem como, posteriormente, seria acompanhado na Consulta externa do mesmo Hospital. (Vide parecer clínico de medicina legal, constante de fls. 66 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos jurídicos)
18. Após a alta hospitalar, o ofendido ainda precisa de se submeter aos tratamentos e ir às consultas constantemente, bem como continua a sentir muitas dores nas partes lesadas do corpo. De acordo com a certidão médica, o ofendido necessita de descansar ao longo do período compreendido entre 15 de Janeiro e 25 de Junho de 2013. (Vide Doc. 1 – Certidão de doença).
19. Do acidente em causa resultaram as despesas hospitalares e de assistência médica, no montante global de MOP263.745,00, que não seriam pagas pelo ofendido, mas sim directamente pela 2ª Ré ao hospital. (Vide Doc. 3)
20. Durante a estadia no hospital e na primeira semana após a alta hospitalar, o ofendido foi cuidado pela sua esposa, G. Visando a tomada de conta do ofendido, a esposa do ofendido pediu, várias vezes, licença sem vencimento no período compreendido entre 21 de Agosto de 2012 e 19 de Janeiro de 2013, num total de 675 horas, cujo salário por hora era de MOP94,28, perfazendo uma quantia global de MOP63.639,00 de perda de rendimentos. (Vide Doc. 4)
21. Ademais, por esposa do ofendido precisar de trabalhar, não podia pedir, permanentemente, licença sem vencimento, por conseguinte, o ofendido pediu à esposa que recrutasse uma empregada doméstica não residente para, exclusivamente, tomar conta do ofendido no hospital, ao longo do período entre 6 e 30 de Outubro de 2012, num total de 25 dias, e, em consequência, pagou uma quantia de MOP3.200,00, a título de salário, e uma quantia de MOP1.800,00, a título de comissão de intermediário destinada a agência de emprego; posteriormente, o ofendido recrutou uma outra empregada que trabalhou no período entre 30 de Outubro e 7 de Novembro de 2012, num total de 7 dias, e pagou-lhe um salário de MOP940,00, enfim, gastou um montante global de MOP5.940,00. (Vide Doc. 5 e 6)
22. Após a alta hospitalar, o ofendido tinha de ser cuidado pela empregada doméstica e, por seu turno, a empregada tinha de tomar conta do ofendido além de efectuar os trabalhos domésticos, pelo que pediu o aumento do salário mensal, passando de MOP3.000,00 para MOP4.000,00, isto é, o ofendido tinha de pagar mais MOP1.000,00 em cada mês, a título de salário da empregada doméstica, ou seja, pagou mais uma quantia global de MOP16.000,00 (5.000,00+6.000,00+5.000,00), a título de salário da empregada doméstica, referente ao período compreendido entre 14 de Janeiro de 2013 e final do mês de Abril de 2014.
23. Durante o período de tratamento, o ofendido comprou os seguintes artigos de assistência médica, gastando uma quantia global de MOP108,00:
a) 10 fraldas para adultos, de marca “Pride”, MOP44,00; (vide Doc. 8)
b) 2 caixas de cooling patch para adultos, de marca “Netsusamashito”, MOP64,00; (vide Doc. 9)
24. Durante a estadia no hospital, conforme a sugestão dada pelo médico, o ofendido comprou os seguintes suplementos nutricionais, gastando uma quantia global de MOP214,40:
a) 1 lata de ENSURE, MOP183,60; (vide Doc. 9)
b) 4 garrafas de POCARI SWEAT, MOP30,80; (vide Doc.9)
25. Após a alta hospitalar, o ofendido ainda necessita de se submeter aos tratamentos na Consulta externa do Hospital e pagou uma parte das despesas medicamentosas, no valor de MOP1.648,00, enquanto a parte remanescente das despesas foi escriturada pelo hospital e seria paga pela 2ª Ré. (Vide Doc. 10)
26. Além disso, o ofendido submeteu-se ao tratamento e exame no centro médico, gastando uma quantia global de MOP960,00. (Vide Doc. 18)
27. Após o acidente, o estado físico do ofendido era consideravelmente fraco, pelo que, conforme a sugestão dada pelo médico, o ofendido pediu à sua esposa que comprasse ophiocordyceps sinesis naturais de alta qualidade (MOP2.290,00), panax notoginseng de alta qualidade (MOP270,00), panax quinquefolius (MOP120,00) e sopas tónicas para homem (MOP450,00), gastando uma quantia global de MOP3.130,00, com vista a reabastecer nutrientes do corpo do ofendido para que este pudesse ser recuperado com maior brevidade possível. (Vide Doc. 11 e 12)
28. Após a alta hospitalar, o ofendido, por precisar de continuar a ir consulta ao hospital, tinha de apanhar táxi na ida e volta do hospital, gastando mensalmente, em média, uma quantia de MOP180,00, a título de despesas de transporte, e, desde a alta hospitalar, uma quantia global de MOP900,00.
29. Ademais, o ofendido tinha de apresentar à sociedade comercial em que trabalhava os atestados médicos e a cópia da certidão de doença, pelo que gastou uma quantia global de MOP930,00 (420,00+300,00+210,00), a título de despesas com requerimento da certidão de doença ao Hospital. (Vide Doc. 10 de fls. 197 a 206, Doc. 1 de fls. 507 a 517, Doc. 3 de fls. 519 a 523 e Doc. 3 de fls. 658 a 662)
30. Por não poder trabalhar após o acidente, o ofendido sofreu dedução de salário por faltas de presença no serviço, apenas percebendo, mensalmente, uma quantia de MOP7.076,70, no período entre Agosto de 2012 e Junho de 2014, e uma quantia de MOP8.035,00, no período entre Julho de 2014 e Março de 2015. (Vide Doc. 13 de fls. 209 a 212, Doc. 4 de fls. 524 a 531, Doc. 4 e 5 de fls. 663 a 671 e Doc. 1 e 2 de fls. 781 a 798)
31. Na ocorrência do acidente, o ofendido foi embatido de frente por um autocarro pesado e, enfim, ficou preso entre dois autocarros pesados. Daí se vislumbra que a força do impacto e a pressão imposta ao ofendido pelos dois autocarros pesados foram enormes, e que, na altura, o ofendido sentiu dores severas e dificuldade em respirar, não só sofrendo lesões físicas graves, mas também lesões psíquicas graves.
32. Tal acidente causou lesões físicas graves ao ofendido e até perigo para a vida deste, e, em consequência, foi o mesmo socorrido, tratado e observado na Unidade de Cuidados Intensivos, bem como foi submetido a várias cirurgias e tratamentos.
33. A par disso, durante a estadia no hospital, a pedido do médico, o ofendido não só se submeteu, constantemente, aos exames de raio X, de CT, de ultra-sonografia, de sangue, dentre outros, mas também ao exame de fluído de punção hepática e tratamento e ao exame de fluído de punção torácica e tratamento. (Vide Doc. 2)
34. Durante os aludidos exames de punção e tratamentos, o punção foi introduzido no interior do corpo do ofendido, apenas com anestesia local, para retirar líquido, pelo que o ofendido sentiu, consideravelmente, dores no momento do exame e posterior a este (vide Doc. 2), além disso, num dos exames de punção, o ofendido até sentiu bastante desconforto ao respirar.
35. Durante o socorro e a estadia no hospital, por existir lesões em vários órgãos e partes do corpo, o ofendido doeu e sofreu constantemente, sustentando não só as dores físicas, mas também a preocupação, o receio, entre outras enormes pressões espirituais, emergentes das lesões graves. (Vide Doc. 14)
36. Após a alta hospitalar, o ofendido ainda não está recuperado das lesões e tem de continuar a submeter-se, periodicamente, ao tratamento medicamentoso na Consulta externa.
37. Por não estar recuperado das lesões de várias partes do corpo e por ser fraco o estado físico, o ofendido adoece facilmente devido à infecção por patógeno, mormente sofre facilmente desconforto na traqueia e na pele que são partes mais sensíveis do corpo.
38. Durante a estadia no hospital e o tratamento, devido à forte pressão espiritual e à má resistência, o ofendido teve, constantemente, comichão e vermelhidão na pele da cara que não foram curadas após a alta hospitalar, por conseguinte, submeteu-se à consulta de dermatologia. (Vide Doc. 3, 15 e 16)
39. Posteriormente, em Maio e Junho de 2013, o ofendido foi à consulta médica por ter bronquite aguda. (Vide Doc. 17 e 18)
40. Devido às lesões nos órgãos internos e às fracturas ósseas em várias partes do corpo, após a alta hospitalar, o ofendido sofre, constante e frequentemente, dores pungitivas na escápula direita e no púbis da pelve esquerda, convulsão e dores no tórax do lado direito e desconforto em respirar.
41. Assim sendo, o ofendido não tem certeza se as referidas lesões provocam ou não demais doenças e deixam ou não sequela, nem sabe se pode ou não ser completamente recuperado, causando-lhe frequentemente preocupação e receio.
42. Antes da ocorrência do facto, o ofendido teve boa feição, esteve física e psiquicamente saudável, teve uma vida feliz e comportou-se com autoconfiança.
43. Agora, o ofendido sofre de eczema em grande parte da pele da cara, pelo que está frequentemente com baixa auto-estima e falta de confiança, tendo, portanto, poucos contactos e comunicações com outras pessoas.
44. Antes do acidente, o estado físico do ofendido era muito bom e não costumava estar doente mesmo que tivesse tomado banho com água fria no Inverno, porém, actualmente, tem de ir, frequentemente, à consulta hospitalar devido a vários desconfortos físicos, além disso, ele só pode sentar-se nas cadeiras estofadas devido às dores nas lesões resultantes do acidente, e, na altura em que sente dores severas, por não ter força na cintura, não consegue levantar-se depois de ficar sentado.
45. Além do mais, o ofendido exercia funções de chefe de estação, responsabilizando-se principalmente pela mobilização e gestão dos veículos encontrados na paragem de autocarro, inspecção dos equipamentos dos veículos, coordenação do tempo de descanso dos motoristas e dos demais assuntos relativos à paragem de autocarro. Antes do acidente de viação, o ofendido era capaz de realizar as tarefas que lhe tinham sido atribuídas.
46. Presentemente, devido ao enfraquecimento do estado físico, o ofendido não pode ficar de pé por longo período de tempo, nem caminhar constantemente, bem como fica traumatizado com veículos, não sendo ainda capaz de voltar ao trabalho.
47. Ademais, mesmo no futuro, o ofendido poderá não conseguir voltar a exercer as funções de chefe de estação, portanto, não só se afecta gravemente a oportunidade de promoção do mesmo, mas também se preocupa com a demissão deste pela empresa no futuro próximo.
48. Aliás, o ofendido tem baixo nível de habilitações académicas, tendo como habilitações académicas apenas o 1º ano do ensino secundário geral, e, antes do acidente, só podia exercer funções de natureza física para obter remuneração com vista a sustentar a vida. Actualmente, piorou bastante a capacidade física, por isso, o ofendido está muito preocupado com as funções que poderão vir a exercer.
49. Desde a ocorrência do acidente, a vida quotidiana do ofendido foi afectada pelas lesões sofridas. O ofendido mora no 2º andar dum edifício antigo, necessitando de descansar duas vezes no meio do caminho da escada para poder chegar a sua casa, a par disso, devido à insuficiência da capacidade física e às lesões resultantes das fracturas ósseas, o ofendido não consegue levar a sua filha ao colo, levando-o a sentir que é incapaz de cuidar e proteger os seus familiares, ficando frequentemente desanimado e esmorecido.
50. Antes do acidente, o estado físico do ofendido era muito bom, gostava muito de praticar desporto, corria frequentemente ou jogava basquetebol, mas, agora, devido às lesões resultantes do acidente, ele é obrigado abandonar as suas preferências e interesses.
51. O mais grave é que o ofendido ainda vive no meio do receio provocado pelo acidente em causa, bem como fica amedrontado e aterrorizado logo quando haja veículo a aproximar-se dele, fazendo-lhe lembrar do sentimento que tinha na ocorrência do acidente, e do medo mantido até agora.
52. Devido ao acidente em causa, o ofendido ficou com medo de veículo e sente dificuldade em respirar mesmo que tenha cheirado o fumo deitado por veículo.
53. O pior é que, frequentemente, o ofendido acorda amedrontado por ter sonhado com o acidente, não consegue se acalmar durante muito tempo, bem como os seus familiares são afectados pela emoção negativa do mesmo.
54. Nesta conformidade, o ofendido sofre de grande pressão psicológica, preocupa-se em ser encargo da família por precisar de se submeter ao tratamento de longo prazo, bem como está receado de que o seu mau estado físico e psicológico afectará a relação entre ele e seus familiares.
55. O estado físico e a flexibilidade corporal actuais do ofendido são muito diferentes aos do mesmo antes do acidente, sendo gravemente afectados o trabalho e a vida quotidiana dele. Na ocorrência do acidente, o ofendido teve apenas 33 anos de idade, levando-o a preocupar-se altamente com a sua vida futura.
56. Em 21 de Junho de 2013, o ofendido ainda precisava de se submeter ao tratamento no Hospital (vide Doc. 19).
57. Na ocorrência do acidente, o 1º Réu era condutor de autocarro pesado da A. (ora 2ª Ré).
58. No dia em que ocorreu o acidente, o veículo conduzido pelo 1º Réu era segurado pela 3ª Ré (C) através da apólice de seguro de responsabilidade civil n.º XXXXXXXXXXXX. (Vide original da apólice de seguro, constante de fls. 267 dos autos).
59. O ofendido continuou a submeter-se ao tratamento na Consulta externa do Hospital, pelo que se registou um aumento das despesas medicamentosas, cuja quantia de MOP1.004,00 foi paga pelo ofendido e o valor remanescente das despesas medicamentosas foi pago pela 2ª Ré por forma da escrituração. (Vide Doc. 1 de fls. 507 a 517)
60. O ofendido submeteu-se ao tratamento e exame no centro médico, gastando mais uma quantia de MOP130,00. (Vide Doc. 2 de fls. 518)
61. O ofendido continuou a submeter-se ao tratamento na Consulta externa do Hospital, de que resultou uma quantia global de MOP3.501,00 de despesas medicamentosas que foi paga pela 2ª Ré por forma da escrituração. (Vide Doc. 2 de fls. 654 a 657)
62. Na classificação do relatório de incapacidade emitido pelo médico assistente do Autor, atendendo-se sinteticamente à deficiência esquelética, articular e torácica, bem como à sequela sofridas pelo Autor, concluiu-se que o mesmo foi classificado com 38% da taxa de deficiência, relativamente à alínea b) do art.º 71º do Capítulo III (Nevralgias intercostais), à subalínea 3) da alínea d) do art.º 18º do Capítulo V (Cintura escapular) e à alínea b) do art.º 42º do Capítulo XII (Bacia) (vide certidão de doença de fls. 722).
63. Face ao presente acidente de viação e trabalho, no processo n.º LB1-13-0137-LAE, o Autor percebeu uma quantia global de MOP528.247,00, a título de indemnização, com fundamento nos 38% da taxa de deficiência sofridos e nas despesas médicas despendidas pelo mesmo (vide fls. 804 e 805).
Mais se provaram os seguintes factos:
64. Conforme o certificado de registo criminal, o Arguido é delinquente primário.
65. O Arguido confessou voluntariamente e sem reservas os factos criminosos que lhe foram imputados.
66. Seguem as condições pessoais e familiares do Arguido:
67. O Arguido exercia funções de motorista, auferindo, em média, um salário mensal de MOP9.000,00.
68. O Arguido tem a mãe a seu cargo.
69. Tem como habilitações académicas o 3º ano do ensino primário.
Factos não provados:
1. Os restantes factos constantes do pedido de indemnização civil e da contestação ao pedido de indemnização civil.


III – O Direito
1. As questões a resolver
Importa apurar a questão suscitada pela recorrente, atrás identificada.

2. Seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel. Exclusão da garantia do seguro
O disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 57/94/M, diploma regulador do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, exclui da garantia do seguro quaisquer danos causados aos representantes legais das pessoas colectivas ou sociedades comerciais responsáveis pelo acidente, quando no exercício das suas funções, bem como aos empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado.
O acórdão recorrido, aplicando o que resulta da interpretação literal da norma, decidiu que o lesado, no exercício de funções ao serviço da empresa segurada, transportadora de passageiros, como chefe de estação, não estava coberto pelo seguro de responsabilidade civil automóvel da sua entidade patronal.
A mencionada empresa transportadora de passageiros considera que a interpretação correcta da norma não resulta da letra da lei, dado que subjacente à exclusão da garantia do seguro pela mencionada alínea, está a ideia de co-responsabilidade patrimonial daqueles que poderão vir a responder concomitante ou subsidiariamente com o condutor, o que não seria o caso do lesado, que era mero funcionário da empresa, tal como o lesante, também funcionário na mesma empresa. Para tal cita uma autora que escreveu com base no direito vigente em Portugal.
Só que, como bem veio mostrar a ora recorrida seguradora, a lei portuguesa, na norma comentada pela mencionada jurista, não prevê a exclusão da garantia do seguro dos empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado. Na verdade, a alínea d) do n.º 2 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto (lei portuguesa), apenas exclui da garantia do seguro quaisquer danos materiais causados às sociedades ou representantes legais das pessoas colectivas responsáveis pelo acidente, quando no exercício das suas funções. E nenhuma outra norma deste diploma legal ou outro exclui da garantia em causa empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado.
Quer isto dizer que o único argumento utilizado pela recorrente, baseada na opinião doutrinal referida, porque baseado em norma não vigente em Macau, fica sem nenhum apoio.
Não se mostra, por outro lado, que a lei quis dizer menos do que efectivamente diz ao excluir da garantia do seguro os empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado.
Na verdade, o que resulta do disposto no artigo 4.º do mencionado Decreto-Lei n.º 57/94/M1, é que só se quis garantir os danos sofridos por terceiros, alheios ao veículo, ao condutor do veículo, seus proprietários e usufrutuários e detentores legítimos, incluindo aqui os cônjuges, familiares e empregados destes. Mesmo os danos sofridos por terceiros são excluídos em consequência de operações de carga e descarga.
Prevaleceu aqui a ideia de que nestes casos não se estende a obrigação de cobertura do seguro, cabendo a responsabilidade civil ao causador do acidente e ao que tiver a sua direcção efectiva e utilizar o veículo no seu próprio interesse.
Por outro lado, ainda no que concerne aos empregados do segurado, a lei ao excluí-los da garantia do seguro automóvel obrigatório, teve certamente em atenção que eles beneficiam, em regra, do seguro por acidentes de trabalho, pelo que não faria sentido uma duplicação de indemnizações para ressarcir os mesmos danos. Aliás, no caso dos autos, o lesado já recebeu, a título de indemnização por incapacidade permanente calculada em 38%, proveniente do acidente de trabalho, a quantia de MOP$528.247,00.
Logo, improcede o recurso, em virtude de o acórdão recorrido não merecer censura.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Macau, 8 de Novembro de 2017.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai
1 Artigo 4.º
(Exclusões)
1. Excluem-se da garantia do seguro quaisquer danos causados às seguintes pessoas:
a) Condutor do veículo e titular da apólice;
b) Todos aqueles cuja responsabilidade é garantida, nos termos do n.º 1 do artigo anterior, nomeadamente em consequência da compropriedade do veículo seguro;
c) Cônjuge, ascendentes, descendentes ou adoptados das pessoas referidas nas alíneas anteriores, assim como outros parentes ou afins até ao 3.º grau das mesmas pessoas, mas, neste último caso, só quando com elas coabitem ou vivam a seu cargo;
d) Representantes legais das pessoas colectivas ou sociedades comerciais responsáveis pelo acidente, quando no exercício das suas funções, bem como os empregados, assalariados e mandatários ao serviço do segurado;
e) Àqueles que, nos termos do Código Civil, beneficiem de uma pretensão indemnizatória decorrente de vínculos com alguma das pessoas referidas nas alíneas anteriores.
2. Excluem-se igualmente da garantia do seguro quaisquer danos:
a) No próprio veículo seguro;
b) Nos bens transportados no veículo seguro, quer se verifiquem durante o transporte, quer em operações de carga e descarga;
c) A terceiros em consequência de operações de carga e descarga;
d) Aos passageiros, quando transportados em contravenção ao disposto nas normas do Código da Estrada relativas ao respectivo transporte;
e) Devidos, directa ou indirectamente, a explosão, libertação de calor ou radiação provenientes de desintegração ou fusão de átomos, aceleração artificial de partículas ou radioactividade;
f) Ocorridos durante provas desportivas e respectivos treinos oficiais, salvo se houver cobertura específica nos termos deste diploma.

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Processo n.º 53/2017

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Processo n.º 53/2017