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Processo nº 638/2017-I
(Autos de recurso penal)
(Incidente)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A e B, 1° e 3° arguidos, e recorrentes nos autos supra identificados, vieram requerer a aclaração do acórdão por esse Tribunal proferido em 28.09.2017.

Para tanto, alegaram que:

“1 - O acórdão desse douto tribunal de 28/09/2017, a fls. 186, diz o seguinte:
“– Aqui chegados, resta emitir pronúncia quanto ao pedido de “revogação da declaração de perdimento”.
E, sem prejuízo do muito respeito por opinião em sentido diverso, há que reconhecer que o decidido não é de manter.
Ora, como bem se nota do douto Parecer, a decisão de se declararam perdidos os bens apreendidos, (com excepção dos veículos automóveis e computadores), não tem qualquer “suporte factual”, preenchidos não estando também os seus pressupostos legais para o efeito; (cfr., art. 101° e 102° do C.P.M.).
Dest’arte, e nesta parte, concede-se provimento aos recursos dos (2° e 3°) arguidos C e B, sendo que o assim decidido produz também efeitos em relação aos restantes co-arguidos dos autos por força do art. 392°, n.° 2, al. a) e 393°, n.° 3 do C.P.P.M.”.
2 - Por sua vez, o acórdão condenatório proferido em 05/05/2017 pelo TJB, a fls. 244, em relação à matéria do perdimento de bens, decidiu da seguinte forma:
Apreendido:
Dinheiro: devolve aos arguidos, sem prejuízo do pagamento prioritário de custas.
Carros: devolve aos seus arguidos.
Computadores: devolve aos arguidos.
Restante apreendido: declarado perdido a favor da RAEM, nos termos do disposto nos artigos 101° e 102° do CPM. Após trânsito em julgado, destrua.
3 - Ora, perante o assim estatuído nesses dois acórdãos, afigura-se ao espírito do arguido a existência de ambiguidade e obscuridade sobre o sentido exacto e a abrangência do provimento do recurso na parte que diz respeito ao perdimento de bens.
Efectivamente,
4 - A 1ª instância decidiu que a totalidade do apreendido que integra o grupo de “Restante apreendido” é declarada perdida a favor da RAEM;
5 - Enquanto que o acórdão do TSI diz que “a decisão de se declararem perdidos os bens apreendidos, (com excepção dos veículos automóveis e computadores), não tem qualquer “suporte factual”, preenchidos não estando também os seus pressupostos legais para o efeito.
6 - Quererá o acórdão do TSI dizer que a totalidade dos bens apreendidos que integram a classe dos “Restante apreendido” são devolvidos aos respectivos arguidos?
7 - Ou se quererá o acórdão do TSI dizer que apenas se devolvem aos arguidos aqueles bens que eles especificadamente identificaram em suas peças de recurso interposto?
8 - E significará que se mantém a decisão da 1ª instância na parte que ordenou a devolução da totalidade do apreendido que integram as classes de “Dinheiro”, “Carros” e “Computadores”?
9 - E, em que termos concretos tal parte decisória sobre o perdimento de bens é aplicável aos demais co-arguidos nos termos do disposto nos artigos 392 n.° 2 alínea a) e 393° do CPPM?
(…)”; (cfr., fls. 7212 a 7217 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Respondendo diz o Ministério Público o que segue:

“O Ministério Público, notificado do pedido de aclaração formulado pelos recorrentes A e B, relativamente ao acórdão de 28 de Setembro de 2017, inserto a fls. 7102 e seguintes, vem pronunciar-se quanto ao assunto pela forma que segue:
Alegam os requerentes que o teor do segmento decisório que concedeu provimento aos recursos, atinente à questão do perdimento de bens, quando confrontado com o que, nessa matéria, fora decidido em primeira instância, pode prestar-se a ambiguidade, o que os leva a formular, a tal propósito, as dúvidas equacionadas nos pontos 6 a 9 dos seus requerimentos.
Crê-se que a alegada ambiguidade radica na circunstância de se haver feito alusão às excepções à declaração de perda em primeira instância, consignando-se que entre elas, excepções, estavam as viaturas e os computadores, e olvidando-se, cremos que por mero lapso, que nelas igualmente se integrava o numerário.
Todavia, porque se afigura inequívoco que o acórdão apenas revogou o segmento decisório que decretara a perda, ou seja, o segmento decisório relativo ao restante apreendido – todo o restante apreendido –, temos como seguro que deixou incólumes os demais vectores, através dos quais haviam sido mandados devolver o dinheiro, os carros e os computadores.
Não podia, aliás, ser de outra forma, pois a decisão que, em primeira instância, determinou a devolução do dinheiro, dos carros e dos computadores, não foi objecto de impugnação.
Em suma, apesar de não vislumbrarmos razões ponderosas para se poder falar propriamente de ambiguidade ou obscuridade, não repugna que, a confirmar-se o nosso entendimento sobre o alcance do acórdão aclarando nesta matéria, se deixe expresso que a falta de referência ao dinheiro, como integrante dos bens não declarados perdidos em primeira instância, se deve a lapso manifesto”; (cfr., fls. 7219 a 7219-v).

*

Cumpre decidir.

Fundamentação

2. Repetidamente temos afirmado que “A aclaração de uma decisão apenas se justifica quando a mesma seja ininteligível – o que se verifica quando aquela apresente aspectos de significação inextrincável, em termos de não ser possível apurar o que se quis dizer – ou se mostra passível de se lhe atribuir dois (ou mais) sentidos”; e que,
“O pedido de aclaração destina-se a permitir que uma decisão pouco clara, de percepção difícil ou dicotómica, seja apreendida pelo destinatário, que não a questionar eventuais erros de julgamento ou pôr em causa a bondade do julgado”; (cfr., o Ac. de 19.05.2011, Proc. n.° 1022/2010-II).

Em face do até aqui exposto, pouco há a dizer.

Com efeito, pronunciando-se sobre o “pedido de revogação da declaração de perda” pelo T.J.B. proferida, decidiu este T.S.I. que a mesma não era de manter, (por “não ter suporte factual, preenchidos não estando também os seus pressuposto legais …”).

E, perante isto, cremos que nada há a aclarar.

Na verdade, e como se apresenta evidente, o objecto da decisão por este T.S.I. proferida e agora em questão foi apenas e tão só o segmento decisório do Acórdão do T.J.B. que “declarou a perda de bens”, e, nesta conformidade, óbvio é que o decidido apenas produz efeitos em relação aos “bens declarados perdidos”, não incidindo sobre quaisquer outros, (nomeadamente, aos que “não foram declarados perdidos”).

Basta ver que a decisão deste T.S.I. é proferida no âmbito do “pedido de revogação da declaração de perdimento”.

Como – bem – observa o Exmo. Magistrado do Ministério Público: “Não podia, aliás, ser de outra forma, pois a decisão que, em primeira instância, determinou a devolução do dinheiro, dos carros e dos computadores, não foi objecto de impugnação”.

Daí que, (e sem prejuízo do muito respeito por outro entendimento), pouco perceptíveis se nos apresentam as razões do ora peticionado, (que raia a má-fé processual).

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Pretendem também os ora requerentes que se esclareça “em que termos o decidido por este T.S.I. quanto ao perdimento de bens é aplicável aos demais co-arguidos …”; (cfr., o alegado no ponto 9° dos expedientes pelos requerentes apresentados).

Ora, uma vez mais, temos para nós que nenhuma dúvida existe, pois que com o segmento decisório em questão apenas se deu aplicação prática aos comandos legais aí referidos, (art. 392°, n.° 2, al. a) e 393°, n.° 3 do C.P.P.M.), estendendo-se os efeitos do por esta Instância decidido a pedido dos (2° e 3°) arguidos C e B aos “restantes arguidos do processo” que não suscitaram a questão e que, em conformidade com os aludidos preceitos, podem aproveitar da decisão proferida.

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Aqui chegados, um aspecto importa tratar.

Como se opina na douta Resposta do Ministério Público, reconhece-se que no veredicto deste T.S.I., ao se excepcionar os bens que, estando apreendidos, não foram declarados perdidos, se não fez referência às “quantias monetárias apreendidas”.

E, assim sendo, e ainda que sejamos de opinião que tal lapso em nada afecta a boa e total compreensão do aresto proferido, considera-se, (já agora), oportuno proceder-se à sua rectificação em conformidade.

Dito isto, e nada mais se nos apresentando de consignar, resta decidir.

Decisão

3. Nos termos que se deixaram expostos, acordam indeferir a pretensão apresentada, procedendo-se, oficiosamente, à rectificação que se deixou consignada.

Custas pelos requerentes, com taxa de justiça individual que se fixa em 2 UCs.

Registe e notifique.

Macau, aos 26 de Outubro de 2017
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
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