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Processo nº 827/2015
(Autos de recurso contencioso)

Data: 14/Dezembro/2017

Assuntos: Concessão de Terras
      Despejo/desocupação
      Acto de execução – Recorribilidade
      Incompetência – Delegação de poderes

SUMÁRIO
Não obstante ser um acto de execução, não sendo, em princípio, contenciosamente recorrível, mas imputando-lhe ilegalidades próprias, como, por exemplo, vícios resultantes da falta de audiência de interessados e da incompetência para a sua prática, o acto passa a ser recorrível.
Tendo o Chefe do Executivo delegado no Secretário para os Transportes e Obras Públicas as competências executivas do primeiro em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 6.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, o segundo tem competência para a ordenar o despejo do terreno cuja concessão foi declarada caducada.

O Relator,

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Tong Hio Fong

Processo nº 827/2015
(Autos de recurso contencioso)

Data: 14/Dezembro/2017

Recorrente:
- Companhia de Investimento Predial Setefonte, Limitada

Entidade recorrida:
- Secretário para os Transportes e Obras Públicas

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
Companhia de Investimento Predial Setefonte, Limitada, sociedade com sede em Macau, com sinais nos autos, inconformada com o despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas que lhe ordenou o despejo, na sequência do despacho do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015 que havia declarado a caducidade da concessão do terreno identificado nos autos, interpôs o presente recurso contencioso de anulação, formulando na petição do recurso as seguintes conclusões:
“1. O despacho de que ora se recorre foi proferido na sequência do despacho de Sua Exa. o Chefe do Executivo da RAEM, de 14 de Abril de 2015, que declarou a caducidade da concessão do terreno dos autos.
2. Sem prejuízo do recurso contencioso já instaurado contra o referido despacho de Sua Exa. o Chefe do Executivo, a Recorrente não pode conformar-se com o acto ora recorrido, pois o mesmo padece de diversas ilegalidades que o contaminam e que o tornam autonomamente recorrível, nos termos dos artigos 28º, n.ºs 1 e 2, e 30º, n.º 2 do CPAC e do artigo 138º, n.º 4 do CPA.
3. Nos termos do artigo 93º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), “salvo o disposto nos artigos 96º e 97º, (…) concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.”
4. Não se enquadrando o acto recorrido nos artigos 96º e 97º do CPA, deveria a Administração ter notificado a ora Recorrente do projecto de decisão devidamente fundamentado, para que sobre o mesmo a mesma pudesse pronunciar-se, em cumprimento do princípio da participação dos interessados na formação das decisões que lhes digam respeito, nos termos dos artigos 10º e 93º e segs. do CPA, só depois devendo a Administração tomar a decisão final.
5. Assim não tendo procedido a Administração, o acto recorrido deve ser objecto de declaração de nulidade, caso se considere que o direito de audiência prévia é um direito fundamental procedimental, ou objecto de anulação, nos termos dos artigos 122º, n.º 2, al. d) e 124º do CPA e do artigo 21º, n.º 1, al. c) e d) do CPAC, respectivamente.
6. Nos termos do artigo 179º da Nova Lei de Terras, o despejo do concessionário ou do ocupante deve ser ordenado por despacho de sua Ex.ª o Chefe do Executivo.
7. Todavia, o acto recorrido foi praticado pelo Exmo. Senhor SOPT, sem que o mesmo acto caiba no âmbito das competências que lhe foram delegadas através da Ordem Executiva n.º 113/2014, de 20 de Dezembro de 2014.
8. Com efeito, analisado o teor da referida Ordem Executiva, chega-se à conclusão de que a mesma não especifica suficientemente os poderes que são delegados, uma vez que não faz uma menção concreta, expressa e específica sobre a matéria em causa, nomeadamente para ordenar o despejo do concessionário, nos termos do artigo 179º da Nova Lei de Terras – o que resulta na falta de competência do Exmo. Senhor SOPT para o efeito.
9. Assim, verificando-se que o Exmo. Senhor SOPT não é competente para a prática do acto recorrido, deve este ser anulado, nos termos do artigo 124º do CPA e do artigo 21º, n.º 1, alínea b) do CPAC.
10. Para além dos casos em que a lei especialmente o exija, nos termos do artigo 114º, n.º1, al. a) do CPA, devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente, neguem, extingam, restrinjam ou afectem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções – o que é, manifestamente, o caso do acto recorrido.
11. Determina ainda o artigo 115º, n.º 1 do CPA, que “a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto”.
12. O acto recorrido faz tábua rasa e é absolutamente omisso quanto ao facto de se encontrar pendente um recurso contencioso do acto que declarou a caducidade da concessão e quanto às repercussões que a eventual procedência do mesmo pode ter para a concessão dos autos, para a Administração e para o interesse público em geral.
13. Termos em que, verifica-se que o acto recorrido não se encontra devidamente fundamentado, devendo o mesmo ser anulado, nos termos do artigo 124º do CPA e do artigo 21º, n.º 1, alínea c) do CPAC.
14. Nos termos do artigo 70º do CPA, da notificação devem constar: o texto integral do acto administrativo; a identificação do procedimento administrativo, incluindo a indicação do autor do acto e a data deste; a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso; e a menção do órgão competente para apreciar a impugnação do acto e o prazo para esse efeito.
15. Ora, verificando-se que a notificação enviada à ora Recorrente não só não contém o texto integral do acto administrativo, como é absolutamente omissa quanto à indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso e quanto ao órgão competente para apreciar a impugnação do acto e ao prazo para esse efeito, no acto recorrido deve ser anulado, nos termos do 124º do CPA e do artigo 21º, n.º 1, alínea d) do CPAC.
16. Por outro lado, nos termos do artigo 113º, n.º 1 do CPA, sem prejuízo de outras referências especialmente exigidas, devem sempre constar do acto: a indicação da autoridade que o praticou; a menção da delegação ou subdelegação de poderes, quando exista; a identificação adequada do destinatário ou destinatários; a enunciação dos factos ou actos que lhe deram origem, quando relevantes; a fundamentação, quando exigível; o conteúdo ou o sentido da decisão e o respectivo objecto; a data em que é praticado; e a assinatura do autor do acto ou do presidente do órgão colegial de que emane.
17. Assim, verificando-se que o acto recorrido omite não só qualquer menção a uma hipotética delegação de poderes e à fundamentação do acto, como também omite a assinatura do respectivo autor, deve o acto recorrido, também por esta via, ser anulado, nos termos do artigo 124º do CPA e do artigo 21º, n.º 1, alínea c) do CPAC, salvo mais douta opinião.”
*
Regularmente citada, apresentou a entidade recorrida contestação, nela formulando as seguintes conclusões:
“1. O acto recorrido não é um acto de execução como sustenta a Recorrente, é um acto conexo com o acto do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015, que declarou a caducidade da concessão do terreno dos autos e que lhe serviu de base ou pressuposto, verificando-se entre ele e este um nexo de dependência necessária já que não pode subsistir nem ser compreendido sem o acto precedente.
2. A ordem de desocupação prolatada pelo STOP surge face à caducidade da concessão, como uma decorrência da própria lei – alínea 1) do n.º 1 do art.º 179º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras).
3. Verificado o pressuposto da caducidade da concessão, a Administração limita-se a ordenar à ex-concessionária a desocupação do terreno e a sua entrega à RAEM, fixando-lhe um prazo para o fazer voluntariamente.
4. O acto de declaração de caducidade da concessão representa, assim, elemento essencial da emissão do acto recorrido porque constitui o fundamento da sua prática, inserindo-se ambos num procedimento complexo.
5. Caracterizando-se como um acto conexo (acto consequente) o acto posto em crise não é contenciosamente recorrível, a não ser que padeça de vícios próprios, o que não se verifica, devendo por isso o Tribunal rejeitar liminarmente o presente recurso, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 46º do CPAC.
6. O acto recorrido não padece do vício de violação de lei por falta de audiência dos interessados porquanto assenta na emissão do acto que declarou a caducidade da concessão, inserindo-se no mesmo procedimento no qual a Recorrente se pronunciou extensamente, em 2 de Abril de 2012, sobre a intenção da Administração de declarar a caducidade da concessão e seus fundamentos, ficando ciente dos efeitos do acto.
7. Declarada a caducidade da concessão não é necessário haver nova pronúncia sobre a obrigação de entregar o terreno, livre e desimpedido à entidade concedente uma vez que a mesma tinha, nos termos legais, de ser necessariamente ordenada.
8. In casu, a decisão proferida era a única concretamente possível visto decorrer do exercício de um poder vinculado, atento o disposto no art.º 179º, n.º 1, alínea 1) da Lei de terras.
9. A audição da Recorrente em nada relevaria em termos de eficácia prática, dado que as razões por si invocadas certamente seriam as mesmas que apresentou na sua petição de recurso, não tendo a virtualidade de alterar a decisão tomada degradando-se a formalidade em não essencial.
10. O acto do STOP que ordenou a desocupação do terreno estriba-se na Ordem Executiva n.º 113/2014, de 20 de Dezembro, que conferiu aquele membro do governo as competências executivas do Chefe do Executivo em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 6º do Regulamento Administração n.º 6/1999 e, bem assim, os relativos ao seu Gabinete.
11. A matéria da gestão e utilização dos solos na RAEM está afecta à DSSOPT, competindo-lhe nesse domínio, entre outros poderes, zelar pelo cumprimento dos contratos de concessão, bem como fiscalizar os terrenos concedidos (cfr. Decreto-Lei n.º 29/79/M, de 7 de Julho).
12. O acto recorrido, praticado pelo STOP, ordem de desocupação do terreno, cabe no âmbito das competências executivas que lhe foram delegadas pela Ordem Executiva n.º 113/2014, de 20 de Dezembro, não se descortinando que essa delegação não possa ser feita através de uma referência genérica aos assuntos respeitantes a determinadas entidades.
13. Atenta a natureza vinculada do acto recorrido e a relação de dependência, de carácter substantivo, entre ele e o acto precedente que declarou a caducidade, o motivo e a causa do seu conteúdo dispositivo reside neste acto precedente, que lhe serve de fundamento.
14. Não obstante a alegada falta de fundamentação, a Recorrente accionou correctamente os meios legais de impugnação, pelo que a mesma se deve considerar regularmente notificada.
15. A Recorrente podia, no prazo de dez dias, ter requerido à Administração, a notificação das indicações ou dos elementos em falta na notificação, ou a passagem de certidão ou fotocópia autenticada que os contivesse, ficando nesta hipótese suspenso, a partir da data da apresentação do requerimento e até à daquela notificação ou passagem, o prazo para interposição de recurso cuja contagem se tenha iniciado.
16. Constituem elementos essenciais da notificação do acto administrativo a indicação do autor do acto e do sentido e data da decisão, sendo que estes elementos se encontram na notificação efectuada.
17. A notificação é um acto exterior ao acto notificado, as irregularidades daquela relevam apenas para a eficácia do acto notificado e não constituem fundamento da impugnação do acto.
Termos em que requer a V. Exa se digne rejeitar o presente recurso contencioso, nos termos da alínea c) do n.º 2 do art.º 46º do CPAC, ou, caso assim não se entenda, seja o mesmo considerado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, nos seus precisos termos.”
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Notificadas para querendo apresentarem alegações facultativas, ambas as partes reiteraram as suas posições anteriormente assumidas.
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Aberta vista inicial ao Digno Magistrado do Ministério Público, foi emitido o seguinte douto parecer:
“Na petição inicial e nas alegações de fls. 247 a 262 dos autos, a ora recorrente assacou, ao despacho em escrutínio, sucessivamente a violação de lei por falta de audiência dos interessados, a incompetência do Exmo. Sr. STOP para a prática do acto recorrido, o vício de forma por falta de fundamentação e, afinal, o vício de forma relativo ao conteúdo da notificação e por falta de menções obrigatórias no Acto Administrativo.
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1. Antes de mais, vale realçar, desde já, que o acto ora em causa se destina a executar o despacho proferido pelo Exmo. Senhor Chefe do Executivo, que é objecto do recurso no Processo n.º 499/2015 do TSI. Daí decorre que o despacho do Exmo. Sr. STOP é acto de execução e, desde modo, o acto consequente do despacho do Exmo. Sr. Chefe do Executivo – constituindo este o correlativo acto de pressuposto.
Em observância da delimitação sinteticamente consignada no n.º 2 do art. 30º do CPAC, e em homenagem com a jurisprudência fixada pelo Venerando TSI no aresto emanado no Processo n.º 707/2013, colhemos que os vícios assacados ao despacho exequendo não constituem causa de pedir do recurso em apreço, e vamos pô-los fora da consideração.
2. Repare-se que tendo sido notificada do despacho declarativo da caducidade por via do ofício n.º 125/DAT/2015, e até à data do despacho em causa, a recorrente nunca realizara a espontânea desocupação do terreno cuja concessão por arrendamento tinha sido declarada caduca. Nos termos da alínea 1) do n.º 1 do art. 179º da Lei n.º 10/2013, o despejo tem de ser considerada uma decorrência vinculada e normal.
Ora, a Proposta n.º 136/DSODEP/2015 mostra que tal despacho foi proferido ao abrigo das disposições na alínea 1) do n.º 1 do art. 179º da Lei n.º 10/2013 bem como nos arts. 55º e 56º do D.L. n.º 79/85/M, sem se ter efectuado instrução prévia e nem ser obrigatório efectuá-la.
À luz do preceito no n.º 1 do art. 93º do CPA e em harmonia com a jurisprudência praticamente unânime, no sentido de que não há lugar a audiência de interessados se não tiver havido instrução, temos por certo que não existe in casu a preterição indevida da audiência prévia.
3. É verdade que na Lei n.º 10/2013 não há norma de habilitação da delegação das competências consagradas nos arts. 179º e 208º deste diploma legal, no entanto, não é menos verdade que nenhuma norma determina ser indelegáveis estas competências legalmente do Chefe do Executivo.
No actual ordenamento jurídico de Macau, prevê o n.º 1 do art. 3º do D.L. n.º 85/84/M que o Chefe do Executivo pode delegar nos Secretários ou nos directores dos serviços dele directamente dependentes as suas competências executivas em relação a todos ou a alguns dos assuntos relativos aos serviços públicos. Isto constitui a norma de habilitação.
Por sua vez, o n.º 1 da Ordem Executiva n.º 113/2014 prescreve que no STOP são delegadas as competências executivas do Chefe do Executivo em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no art. 6º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, bem como aos relativos ao seu Gabinete.
Em face a este enquadro legal, inclinamos a entender que no STOP são delegadas, pelo Exmo. Senhor Chefe do Executivo, as competências previstas nos arts. 179º e 208º da Lei n.º 10/2013 para ordenar o despejo e a desocupação, pelo que não se verifica in casu a invocada incompetência do STOP para ordenar o despejo no despacho em exame.
4. Do disposto no n.º 1 do art. 115º do CPA podem-se extrair os seguintes requisitos cumulativos da fundamentação: a)- a explicitude que se traduz na exposição expressa dos fundamentos; b)- a contextualidade no sentido de constar da mesma forma em que se exterioriza a decisão tomada; c)- a clareza; d)- a congruência e, enfim, e)- a suficiência. (Lino Ribeiro e José Cândido de Pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau – Anotado e Comentado, pp. 637 a 642)
A jurisprudência autorizada adverte-nos: «A fundamentação é um conceito relativo que depende do tipo legal do acto, dos seus termos e das circunstâncias em que foi proferido, devendo dar a conhecer ao seu destinatário as razões de facto e de direito em que se baseou o seu autor para decidir nesse sentido e não noutro, não se podendo abstrair da situação específica daquele e da sua possibilidade, face às circunstâncias pessoais concretas, de se aperceber ou de apreender as referidas razões, mormente que intervém no procedimento administrativo impulsionando o itinerário cognoscitivo da autoridade decidente.» (Acórdão do STA de 10/03/1999, no processo n.º 44302)
No caso sub judice, do despacho em escrutínio consta exactamente e só a palavra «Concordo». A qual representa uma expressa declaração de concordância e, de acordo com o n.º 1 do art. 115º do CPA, comporta uma fundamentação por remissão, pelo que a Proposta n.º 136/DSODEP/2015 constitui a parte integrante do despacho em causa.
Ponderando a Proposta n.º 136/DSODEP/2015 em consonância com a prudente jurisprudência atrás citada, colhemos que o despacho recorrido se encontra cabalmente fundamentado por permitir suficientemente a recorrente a compreender os seus fundamentos, não padecendo do invocado vício de forma por falta de fundamentação.
5. Ora bem, importa ter presente que «Fundamentação e notificação são conceitos distintos. A fundamentação é intrínseca ao acto, ao passo que a notificação (também a publicação) é já acto extrínseco ao acto administrativo decisor e a ele necessariamente posterior. A notificação é um veículo ou instrumento de comunicação, por isso se dizendo instrumental. E na medida em que cumpre essa singela função, não visa senão conferir eficácia externa ao objecto comunicado, dotando-o da necessária aptidão para a produção de efeitos, por isso também se intitulando integrativo de eficácia. Deste modo, um acto deficientemente notificado não é necessariamente ilegal, embora seja ineficaz.» (Acórdãos do TSI nos Processos n.º 287/2011 e n.º 569/2011)
Por seu turno, o Venerando TUI assevera peremptoriamente que o recurso contencioso não é a sede própria para suscitar a falta de notificação de fundamentação, pois essa falta não afecta a validade do acto, mas apenas a sua eficácia, e a deficiente notificação do acto administrativo não é causa de invalidade do acto. (Acórdãos nos Processos n.º 1/2004 e n.º 25/2012)
Em conformidade, podemos extrair tranquilamente que a deficiência imputada pela recorrente à notificação do acto recorrido materializada no ofício n.º 601/6249.03/DSODEP/2015 é irrelevante, não tendo a menor virtude de invalidar o despacho in questio.
6. O teor da proposta n.º 136/DSODEP/2015 patenteia que o art. 27º da petição desfigurado. Com efeito, do despacho ora recorrido constam a fundamentação por remissão e a assinatura do respectivo autor, o que se omite aí se reporta apenas a menção da delegação da competência.
À luz do preceituado no n.º 3 do art. 113º do CPA, a publicação no Boletim Oficial da Ordem Executiva n.º 113/2014 conduz a que não seja obrigatória a menção da delegação de poderes. Nesta medida, a falta da menção expressa da delegação de poderes não germina, em bom rigor, a omissão ou lacuna, nem pode determinar a invalidade do acto em crise.
***
Por todo o exposto acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.”
*
Corridos os vistos, cumpre decidir.
O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Resulta provada dos elementos constantes dos autos, designadamente do processo administrativo, a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão do recurso:
Por despacho do Chefe do Executivo de 14.4.2015, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 7324m2, situado na ilha da Taipa, na Estrada de Lou Lim Ieok, junto ao Jardim de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 22508. (fls. 113 e 114 dos autos)
Foi elaborado a 5 de Maio de 2015 pelo técnico dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes a seguinte proposta:
“Assunto: Sobre o despejo da concessionária do terreno cuja concessão foi declarada caduca, por despacho do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015. (Proc n.º 6249.03)
Proposta N.º: 136/DSODEP/2015
Data: 05/05/2015
1. Por despacho do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015, exarado sobre o parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 17 de Março de 2015, que concordou com o proposto no processo n.º 68/2013 da Comissão de Terras, pelas razões nele indicadas, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 7324m2, situado na ilha da Taipa, na Estrada de Lou Lim Ieok, junto ao Jardim de Lisboa, descrito na CRP sob o n.º 22508 a folhas 7 do livro B47K, ao abrigo da alínea a) do número um da cláusula décima terceira do contrato de concessão, e nos termos da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras».
2. A declaração de caducidade da concessão acima referida foi publicada, por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 39/2015, no suplemento ao n.º 16 do Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau, II Série, de 22 de Abril de 2015, e que foi notificada à concessionária, a sociedade «Companhia de Investimento Predial Setefonte, Limitada» através do ofício n.º 125/DAT/2015 de 29 de Abril de 2015. (Anexo)
3. Enfrentando o seguimento da caducidade de concessão, deve se considerar o seguinte:
3.1 Nos termos do artigo 117º e do n.º 1 do artigo 136º do «Código do Procedimento Administrativo» (CPA) em vigor, o acto administrativo produz os seus efeitos desde a data em que for praticado e é executório logo que eficaz, não obstando à perfeição do mesmo por qualquer motivo determinante de anulabilidade, salvo os actos previstos no artigo 137º do mesmo código;
3.2 Por outro lado, ao abrigo das disposições do artigo 22º do «Código de Processo Administrativo Contencioso» em vigor, o recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido;
3.3 Assim sendo, quer a concessionária em apreço interponha o recurso contencioso quer não, o acto administrativo feito pelo Chefe do Executivo pode ser executado;
3.4 Então, de acordo com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras» e com o artigo 55º do Decreto-Lei 79/85/M, o Chefe do Executivo pode ordenar no prazo determinado, o despejo da concessionária do terreno cuja concessão foi declarada caduca;
3.5 Além disso, quando a concessionária não abandone o terreno no prazo determinado, o referido despejo pode ser realizado pela DSSOPT segundo o artigo 56º do mesmo Decreto-Lei.
4. Em face do exposto, em conformidade com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras» e com os artigos 55º e 56º do Decreto-Lei 79/85/M, submete-se a presente proposta à consideração de V. Exa, a fim de:
4.1 Ordenar, no prazo de 60 dias a contar da data da notificação, o despejo da concessionária, a sociedade «Companhia de Investimento Predial Setefonte, Limitada», do terreno com a área de 7324m2, situado na ilha da Taipa, na Estrada de Lou Lim Ieok, junto ao Jardim de Lisboa, descrito na CRP sob o n.º 22508 a folhas 7 do livro B47K, cuja concessão foi declarada caduca por despacho do Chefe do Executivo de 14 de Abril de 2015;
Caso não se execute no prazo de 60 dias,
4.2 Autorizar o Departamento de Urbanização da DSSOPT a realizar o respectivo despejo de acordo com o artigo 56º do Decreto-Lei n.º 79/85/M;
4.3 Proceder à audiência prévia sobre a decisão referida no ponto 4.1 no prazo de 10 dias, nos termos dos artigos 93º e 94º do CPA.
À consideração superior.”
Submetida a proposta a vários órgãos superiores na hierarquia administrativa, foi proferido pelo Secretário para os Transportes e das Obras Públicas, a 29.5.2015, o seguinte despacho:
“Concordo com os propostos em 4.1 e 4.2.”
*
Questão prévia: da irrecorribilidade do acto
Defende a entidade recorrida que a produção de efeitos jurídicos externos na esfera jurídica da recorrente que ordenou a desocupação do terreno não teve lugar por via do acto recorrido, mas sim por efeito do acto anterior que declarou a caducidade do contrato de concessão, pelo que entende que a recorrente devia recorrer contenciosamente deste último acto praticado pelo Chefe do Executivo, pugnando pela rejeição liminar do presente recurso.
Consagra-se no artigo 30.º do CPAC que os actos de mera execução ou aplicação de actos administrativos são irrecorríveis, salvo os actos previstos no n.º 2 do artigo anterior e nos n.os 3 e 4 do artigo 138.º do Código do Procedimento Administrativo, bem como aqueles que não tenham sido legitimados por acto administrativo prévio nos termos do n.º1 do artigo 138.º do Código do Procedimento Administrativo.
E prevê-se no n.º 4 do artigo 138º do CPA que são também susceptíveis de recurso contencioso os actos ou operações de execução arguidos de ilegalidade, desde que esta não seja consequência da ilegalidade do acto exequendo.
No fundo, não obstante o acto recorrido ser um acto de execução, não sendo, em princípio, contenciosamente recorrível, mas imputando-lhe ilegalidades próprias, como acontece no vertente caso, por exemplo, vícios resultantes da falta de audiência de interessados e da incompetência para a sua prática, o acto passa a ser recorrível.
Posto isto, julga-se improcedente a excepção de irrecorribilidade do acto suscitada pela entidade recorrida.
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Do vício de forma por preterição da audiência prévia
A recorrente entende que o acto recorrido padece do vício de forma por preterição da audiência prévia, alegando não ter oportunidade para se pronunciar sobre o sentido provável da decisão que lhe ordenou o despejo.
Prevê o n.º 1 do artigo 93º do CPA que, salvo o disposto nos artigos 96º e 97º, uma vez concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
Ora bem, o que se pretende com a audiência dos interessados é assegurar o direito do contraditório dos interessados, evitando a chamada decisão-surpresa, e permitir os mesmos, no caso de se ter realizado alguma diligência instrutória, manifestarem os seus pontos de vista adquiridos no procedimento, visando, no fundo, dotar a Administração de elementos necessários para poder dar uma decisão acertada.
No caso vertente, de acordo com o disposto no artigo 179º da Lei de Terras, o despejo é uma consequência necessária decorrente da declaração da caducidade da concessão, isto é, uma vez declarada a caducidade da concessão, a recorrente sabe ou não pode deixar de saber que inelutavelmente irá haver lugar a despejo, pelo que o acto recorrido é um acto vinculado e não lhe constitui qualquer decisão-surpresa.
Por outro lado, mesmo que se entenda que a ordem de despejo foi dada na sequência de um procedimento autónomo, podemos verificar que neste procedimento administrativo não foi realizada qualquer diligência instrutória, daí que entendemos ser desnecessária a dita audiência prévia de interessados, por que nenhum elemento novo foi trazido ao procedimento que possa exercer influência sobre a decisão da entidade recorrida.
Desta forma, julga-se improcedente o vício invocado.
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Do vício de incompetência
Defende a recorrente que a entidade recorrida é incompetente para praticar o acto recorrido, por falta de delegação de poderes.
Sobre a questão em apreço, foi já objecto de apreciação pelo TUI no seu Acórdão de 7.6.2017, no Processo 10/2017, pelo que, por razões de celeridade e economia processuais, transcreve-se a seguir parte do referido aresto:
“…
A terceira questão suscitada pela recorrente é a seguinte:
O acto recorrido sofre de incompetência do Secretário para as Obras Públicas e Transportes, já que a competência está prevista no artigo 179.º, n.º 1, da Lei n.º 10/2013, competindo ao Chefe do Executivo.
Não teria o Secretário para as Obras Públicas e Transportes competência para praticar o acto?
Antes de mais, é exacto que a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da actual Lei de Terras comete ao Chefe do Executivo a competência para ordenar o despejo do concessionário quando tenha havido declaração de caducidade da concessão.
Porém, alega a entidade recorrida que o acto foi praticado ao abrigo de delegação de poderes, sendo a lei habilitante da delegação o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 85/84/M, de 11 de Agosto (e não o Decreto-Lei n.º 84/84/M, como se diz no acórdão recorrido) e constituindo o instrumento de delegação a Ordem Executiva n.º 113/2014, publicada no Boletim Oficial, I Série, de 20 de Dezembro de 2014.
O Decreto-Lei n.º 85/84/M estabeleceu as bases gerais da estrutura orgânica da Administração Pública de Macau.
Dispõe o seu artigo 3.º:
“Artigo 3.º
(Delegação de competência)
1. O Chefe do Executivo1 pode delegar no Comandante das Forças de Segurança e nos Secretários3, ou nos directores dos serviços dele directamente dependentes as suas competências executivas em relação a todos ou a alguns dos assuntos relativos aos serviços públicos.
2. A tutela das câmaras municipais4 rege-se pela legislação aplicável e pode ser delegada nos termos do n.º 1.
3. A delegação de competência prevista no n.º 1 envolve a decisão em matérias das atribuições próprias dos serviços públicos, bem como em matérias de gestão dos recursos humanos, financeiros e patrimoniais.
4. O Chefe do Executivo5 pode autorizar a subdelegação das competências delegadas no pessoal de direcção dos serviços.
5. As delegações e subdelegações de competência previstas neste artigo constarão de portarias e despachos, respectivamente, produzirão efeitos a contar da data da publicação no Boletim Oficial e cessarão por revogação expressa ou por exoneração da entidade delegante ou delegadas, mas manter-se-ão em vigor sempre que qualquer daquelas entidades for substituída nos termos legais.
6. A delegação e a subdelegação de competência podem conter directrizes vinculantes para a entidade delegada ou subdelegada e não privam a delegante ou subdelegante dos poderes de avocar processos e de definir orientações gerais”.
Nem o Decreto-Lei n.º 85/84/M foi globalmente revogado nem, em particular, o seu artigo 3.º foi revogado, expressa ou tacitamente, pelo que este preceito vigora na Ordem Jurídica.
Por sua vez, Ordem Executiva n.º 113/2014, estatui o seguinte:
“Usando da faculdade conferida pela alínea 4) do artigo 50.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau e nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 2/1999 e do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 85/84/M, de 11 de Agosto, o Chefe do Executivo manda publicar a presente ordem executiva:
1. São delegadas no Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo Arrais do Rosário, as competências executivas do Chefe do Executivo em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 6.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, bem como aos relativos ao seu Gabinete.
2. São ainda delegadas no Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo Arrais do Rosário, as competências executivas do Chefe do Executivo no âmbito dos assuntos relativos à Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego.
3. As competências executivas ora delegadas abrangem, no âmbito dos procedimentos relativos à realização de obras ou à aquisição de bens e serviços e independentemente do montante em causa, a competência para:
1) Aprovar o caderno de encargos, o programa de concurso e outras peças procedimentais relevantes;
2) Designar os membros das comissões que conduzem os procedimentos de abertura e de apreciação de propostas;
3) Aprovar a minuta do contrato a celebrar e representar a Região Administrativa Especial de Macau na respectiva assinatura.
4. Exceptuam-se do disposto nos números anteriores as competências executivas do Chefe do Executivo que a lei qualifique como indelegáveis.
5. Em matéria de gestão dos recursos financeiros e patrimoniais, as competências executivas ora delegadas têm os seguintes limites:
1) Até ao valor estimado de trinta milhões de patacas, a competência para autorizar a abertura de concursos para a realização de obras ou a aquisição de bens e serviços;
2) Até ao montante de dezoito milhões de patacas, a competência para autorizar despesas com a realização de obras ou a aquisição de bens e serviços;
3) Até ao montante de nove milhões de patacas, a competência referida na alínea anterior quando tenha sido autorizada a dispensa de realização de concurso ou de celebração de contrato escrito.
6. O delegado pode subdelegar nos dirigentes dos Serviços, entidades e Gabinete referidos nos n.os 1 e 2 as competências que julgue adequadas ao seu bom funcionamento.
7. A presente ordem executiva produz efeitos desde 20 de Dezembro de 2014”.
Face ao n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 85/84/M, o Chefe do Executivo pode delegar nos Secretários as suas competências executivas em relação a todos ou a alguns dos assuntos relativos aos serviços públicos.
E o n.º 3 do mesmo artigo 3.º dispõe que a delegação de competência prevista no n.º 1 envolve a decisão em matérias das atribuições próprias dos serviços públicos. O que é o caso do despejo do concessionário, cuja concessão foi declarada caduca, que pertence às atribuições da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes.
Pela Ordem Executiva n.º 113/2014 o Chefe do Executivo delegou no Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Raimundo Arrais do Rosário, as competências executivas do Chefe do Executivo em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 6.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, onde se encontra a área do ordenamento físico do território.
Estava, portanto, delegada no autor do acto recorrido a competência para a ordenar o despejo em questão.
É certo que o acto recorrido não invocou a delegação de poderes, ao abrigo da qual decidiu.
Mas tal irregularidade não torna o acto nulo ou anulável.
Por outro lado, é razoável o exercício delegado da competência para o despejo do concessionário na pessoa do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, visto que ela consiste num mero acto executivo de decisão anterior, isto é, decorre inelutavelmente da declaração da caducidade da concessão.
Improcede a questão suscitada.”
Estamos de acordo com a posição acabada de transcrever e que aqui fazemos nossa para todos os efeitos legais, improcedendo, assim, o vício invocado.
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Do vício de falta de fundamentação
Alega a recorrente que o acto recorrido não está fundamentado
Preceitua o n.º 1 do artigo 115.º do mesmo CPA que a fundamentação do acto administrativo poder consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações, propostas que constituem parte integrante do respectivo acto.
A fundamentação visa assegurar a melhoria da qualidade e a legalidade dos actos administrativos, facilitar o recurso contencioso pelos eventuais lesados pelo acto administrativo, de modo a garantir o exercício efectivo do seu direito ao recurso contra actos lesivos, e tem ainda uma função persuasória e consensual, contribuindo para a uma maior transparência da actividade administrativa.1
No caso vertente, face ao teor da Proposta nº 136/DSODEP/2015, de 5.5.2015, a qual constitui parte integrante do despacho recorrido de 29.5.2015, nela estão discriminadas as razões de facto e de direito em que se baseou a entidade recorrida para decidir da forma como está.
Aliás, resulta claramente do disposto no n.º 1 do artigo 179º da Lei de Terras que a declaração da caducidade da concessão implica necessariamente o despejo do concessionário, salvo havendo lugar a suspensão de eficácia daquele acto, mas não é o caso.
Desta sorte, não se vislumbra o alegado vício de falta de fundamentação que atente contra o disposto nos artigos 114º e 115º do CPA, uma vez que qualquer destinatário comum (por referência à diligência normal do homem médio que tal deve ser aferido) fica a saber as razões de facto e de direito que levaram à decisão da desocupação do terreno em causa.
Improcede, assim, o vício invocado.
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Do vício de falta de menções obrigatórias no acto administrativo
Alega a recorrente que a notificação enviada à recorrente não contém o texto integral do acto administrativo nem a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso, bem como do órgão competente para apreciar a impugnação do acto e do prazo para esse efeito.
Ora bem, parece-nos que a recorrente ter confundido acto recorrido com acto de notificação.
É verdade que o artigo 70.º do CPA exige que da notificação devem constar do texto integral do acto administrativo; a identificação do procedimento administrativo, incluindo a indicação do autor do acto e a data deste; o órgão competente para apreciar a impugnação do acto e o prazo para esse efeito; e a indicação de o acto ser ou não susceptível de recurso contencioso, mas havendo omissão quanto à indicação desses elementos, não acarreta a invalidade do acto recorrido, mas é concedida ao interessado a faculdade de pedir à entidade que praticou o acto de notificação a indicação dos elementos em falta, ficando nesta hipótese suspenso o prazo para interposição do recurso contencioso (artigo 27.º, nº 2 do CPAC).
De facto, apenas estamos aqui em causa a apreciação da legalidade do acto recorrido que ordenou o despejo, e não a invalidade do próprio acto de notificação, o qual não fazia parte do acto administrativo sob escrutínio.
Conforme dito acima, o acto do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas concordou com a proposta formulada pelos seus subordinados, a qual contém todas as referências exigidas pelo artigo 113.º do CPA, pelo que, não estando o acto recorrido inquinado do vício de falta das menções obrigatórias, improcede esta parte do recurso.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso.
Custas pela recorrente, fixando a taxa de justiça em 10 U.C.
Registe e notifique.
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RAEM, 14 de Dezembro de 2017
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Fong Man Chong

Mai Man Ieng
1 Lino José Baptista Rodrigues Ribeiro e José Cândido de Pinho, Código do Procedimento Administrativo de Macau, Anotado e Comentado, FM e SAFP, pág. 623 e 624
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Recurso Contencioso 827/2015 Página 29