打印全文
Processo n.º 80/2017. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para a Segurança.
Assunto: Suspensão da eficácia do acto. Prejuízo de difícil reparação. Desproporção de prejuízos.
Data da Sessão: 15 de Dezembro de 2017.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
Salvo no caso previsto no n.º 3 do artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, basta a falta de prova do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo, para que a suspensão da eficácia do acto seja negada, desde que não sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente (n.º 4 do artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso).
  O Relator,
  Viriato Manuel Pinheiro de Lima
  
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A, requereu a suspensão da eficácia do despacho do Secretário para a Segurança, de 19 de Maio de 2017, que, na sequência de recurso hierárquico, manteve a decisão de o interditar de entrar em Macau, durante 3 anos.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI) indeferiu o requerido, por acórdão de 12 de Outubro de 2017, por entender que o requerente não alegou factos concretos que integrem o requisito dos prejuízos previsíveis de difícil reparação, considerando ainda que a suspensão da eficácia do acto determina grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto.
Inconformado, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), defendendo que alegou factos concretos que integram o requisito dos prejuízos previsíveis de difícil reparação, tendo detalhado a natureza do seu envolvimento com a sociedade B, em particular no que concerne à prestação de serviços de direcção e técnicos e que a prestação dos serviços em causa reclama, de tempos a tempos, a sua presença física em Macau; do mesmo modo, diz o recorrente que explicou que a B se encontra em negociações com os hotéis C e D, tendo por objecto a prestação, por aquela sociedade, dos serviços que constituem o seu objecto social.
Alega, ainda o recorrente que o acórdão recorrido andou mal ao remeter para a fundamentação do Despacho Suspendendo o substrato factual sobre o qual veio a concluir que a suspensão requerida determinaria grave lesão do interesse público prosseguido pelo Despacho Suspendendo e que a interdição de entrada na RAEM imposta ao Recorrente, além de infundada, teve por base o alegado (e falso) facto de aquele ter praticado um crime; E que até ao momento da interposição do presente recurso, no âmbito do Processo de Inquérito nº 6756/2016, não houve ainda acusação formal contra o ora Recorrente.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer em que entende não merecer provimento o recurso, por não se terem demonstrado os requisitos dos prejuízos previsíveis de difícil reparação e que da execução do acto não resulta grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto.

II - Os Factos
Estão provados os seguintes factos relevantes:
- O requerente A é titular do passaporte do Reino Unido;
- Na sequência da aquisição da notícia de crime que se reporta aos factos detectados pelo pessoal da PSP em 15JUN2016, susceptíveis de integrar o crime de emprego ilegal, foi desencadeado no seio da PSP o procedimento administrativo com vista à imposição ao requerente a ordem de interdição de entrada na RAEM num determinado período de tempo;
- Em 08MAR2017, ao tentar entrar na RAEM no terminal marítimo da Taipa, o requerente foi-lhe recusada a entrada por ordem que lhe foi emitida pela PSP com fundamento no disposto no artigo 4.º/1-3) da Lei nº 4/2003;
- Por despacho datado de 19MAIO2017 do Secretário para a Segurança, foi determinada ao requerente a interdição de entrada na RAEM por três anos, com efeito a partir de 21JAN2017, com o seguinte notificação:
“O vosso representado é arguido dum crime de emprego. Em 14 de Junho de 2016, após recebida a participação sobre trabalhadores ilegais, os agentes do CPSP foram fazer investigação para a “Sociedade de Logística B” situada em [Endereço (1)], durante a qual descobriram que os dois indivíduos masculinos em causa estavam a usar computador na secretária para provavelmente fazer trabalhos documentais. Depois de pesquisa, verificou-se que os dois indivíduos masculinos em causa não tinham qualquer prova da autorização de prestação de trabalho em Macau, além disso, de acordo com as declarações dos trabalhadores in loco e dos dois trabalhadores masculinos ilegais, o vosso representado é dono da Sociedade referida, os dois indivíduos masculinos já tinham trabalhado na Sociedade referida por um determinado período, tinham horário fixo, um dos trabalhadores ilegais até confessou que foi empregado directamente pelo vosso representado, pelo que, em 18 de Janeiro de 2017, o vosso representado foi interceptado no Posto Fronteiriço do Terminal Marítimo de Passageiros da Taipa, o processo foi remetido ao Ministério Público.
Em vista dos factos objectivos referidos e circunstâncias criminais, se o vosso representado tiver entrado em Macau, vai constituir perigo para a ordem e a segurança pública. Para defender os interesses públicos de Macau, nos termos do art.º 12.º n.º 2 alínea 2) da Lei n.º 6/2004, em conjugação com o art.º 11.º n.º 1 alínea 3), o Secretário para a Segurança proferiu despacho que inibe o vosso representado de entrar na RAEM por 3 anos (contados a partir de 21 de Janeiro de 2017)”.

III – O Direito
1. As questões a apreciar
São duas as questões a apreciar, as de saber se o acórdão recorrido julgou bem ao considerar não demonstrados pelo requerente os requisitos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, ou seja que a suspensão do acto de interdição de entrada em Macau constitui prejuízo de difícil reparação para o requerente e que o mesmo acto não determina grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto.

2. Prejuízos de difícil reparação
O acórdão recorrido indeferiu o requerido por entender que o requerente não alegou factos concretos que integrem o requisito dos prejuízos previsíveis de difícil reparação.
No caso dos autos é requisito da concessão da suspensão de eficácia do acto administrativo recorrido que a execução deste cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso [alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso].
Como dissemos no acórdão de 14 de Novembro de 2009, no Processo n.º 33/2009, “Mesmo que o interessado sofra danos com a execução de um acto administrativo, se lograr obter a anulação do acto no respectivo processo, pode, em execução de sentença, ser indemnizado dos prejuízos sofridos. E se esta via não for suficiente pode, ainda, intentar acção de indemnização para ressarcimento dos prejuízos. Por isso, só se os prejuízos forem de difícil reparação, isto é, que não possam ser satisfeitos com a utilização dos falados meios processuais, é que a lei admite a suspensão da eficácia do acto”.
O requerente alegou, no essencial, o seguinte, na petição inicial:
“30.º
O ora Requerente é sócio da B Grupo Limitada ("B"), sociedade comercial matriculada na Conservatória dos Registos Comerciais e de Bens Móveis, sob o n.º XXXXX(SO), com sede na [Endereço (2)] em Macau.
31.º
O objecto social da B consiste na prestação de serviços de logística e relativos à instalação de mobiliário, acessórios e equipamento, bem como de outros serviços relacionados com a indústria hoteleira.
32.º
Desde a sua constituição em 2013, os negócios da B têm vindo a crescer, tendo a mesma hoje uma posição importante no sector da logística em Macau.

34.º
A B celebrou um acordo de prestação de apoio técnico e formação com a B Group (Asia-Pacific) Limited ("B Hong Kong"), uma sociedade sediada em Hong Kong, com vista à cessão temporária de trabalhadores especializados da B Hong Kong para prestar serviços de direcção e técnicos à B
35.º
De acordo com o Anexo B do aludido acordo, tais serviços de direcção e técnicos são, entre outros, os seguintes:
a) Supervisionar a estrutura organizativa do negócio desenvolvido pela B;
b) Rever o plano operacional do negócio da B;
c) Rever os orçamentos da B;
d) Prestar orientação técnica relativamente às operações de transporte de mercadoria, armazenagem e instalação;
e) Aconselhar melhores práticas de operações logísticas;
f) Visitar locais de projecto para consultas sobre actividades operacionais;
g) Prestar orientação à equipa da B;
h) Avaliar o nível de satisfação dos clientes através de reunião com os mesmos; e
i) Rever o plano de negócio da B.
36.º
Nos termos da Cláusula 9.1 do Acordo, a prestação de serviços de assistência técnica pelos trabalhadores especializados da B Hong Kong na B está limitada a um prazo máximo de quarenta e cinco dias por cada período de seis meses.
Ora,
37.º
Como resulta do Anexo A do Acordo, o Requerente é justamente um dos trabalhadores especializados da B Hong Kong, que, ao abrigo do Acordo, deveria prestar serviços de direcção e técnicos na B.

40.º
Como facilmente se compreende, a prestação dos serviços em causa exige a presença, de tempos a tempos, do Requerente em Macau.
41.º
Acresce que, a B encontra-se actualmente em negociações com os hotéis C e D, negociações essas que se encontram numa fase crucial, pelo que a presença do Requerente em Macau, enquanto sócio e consultor especializado, é absolutamente imprescindível para o sucesso dessas negociações e para a concretização dos respectivos negócios, os quais, ainda para mais, se inserem numa área de extrema relevância para o desenvolvimento económico da RAEM”.
Ou seja, alega o requerente, que ele é um dos técnicos que viriam de Hong Kong para prestar serviço na B.
Não sabemos quantos técnicos estariam em causa, se muitos, se poucos; não sabemos, portanto, se o requerente seria imprescindível ou não, pelo que esta alegação é pouco relevante para os fins em questão.
Alega, ainda o requerente, que ele seria imprescindível em Macau para o sucesso das negociações da B com os hotéis C e D e para a concretização dos respectivos negócios.
Não parece crível esta alegação.
Actualmente há muitos meios para prosseguir negociações, sem necessidade da presença física: por correio electrónico, por videoconferência, etc.
Por outro lado, estrando o requerente baseado em Hong Kong, certamente seria possível à outra parte deslocar-se a Hong Kong para tais negociações. De resto, sendo Hong Kong um centro económico e financeiro, os negociadores da outra parte certamente se deslocam a Hong Kong para outras finalidades e negócios, pelo que não custa crer que poderiam aproveitar essa ida para concretizar negociações com o requerente, ora recorrente.
Em suma, não se vislumbra prejuízos de difícil reparação para o ora recorrente com a execução do acto administrativo recorrido.
Está prejudicado o exame do outro requisito que o acórdão recorrido considerou não se verificar, dada a necessidade da prova do requisito dos prejuízos de difícil reparação para que o acto pudesse ver a eficácia suspensa, dado que não se vislumbra que sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente (n.º 4 do artigo 121.º do Código de Processo Administrativo Contencioso).
Com o que falece o recurso jurisdicional.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 4 UC.
Macau, 15 de Dezembro de 2017.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa





1
Processo n.º 80/2017

10
Processo n.º 80/2017