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Processo nº 718/2017
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 07 de Dezembro de 2017
Recorrentes: A (Autor)
B (Ré)
Recorridos: Os mesmos

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
  Por despacho de 17/01/2017, deferiu-se o requerimento apresentado pelo Autor A com vista à correcção de diversos erros de cálculo ou de escrita relativos aos valores pagos pela Ré B ao Autor a título de salário de base mensal e de salário normal diário reclamados a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, trabalho em dia feriado, compensação por alojamento, trabalho prestado para além do período normal diário e 30 minutos de trabalho prestados para além do período normal diário.
Dessa decisão vem recorrer a Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
I. A Recorrente não se conforma com o douto despacho proferido pelo Digno Tribunal a quo que admitiu o pedido de correcção de vários erros de escrita quanto aos valores pagos pelas Rés ao Autor a título de salário de base mensal (MOP$7.500,00) e de salário normal diário (MOP$250,00) de Patacas para Hong Kong Dólares.
II. Vem o Recorrido reclamar diversas quantias alegadamente devidas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, trabalho em dia de feriado, compensação por alojamento, trabalho prestado para além do período normal diário e 30 minutos de trabalho prestado para além do período normal diário alegando para tanto que auferia um salário de base mensal de MOP$7.500,00 e de um salário normal diário de MOP$250,00, facto que veio a ser dado por assente em sede de selecção de matéria de facto e vindo-o a fazer quando se encontrava já marcada data para a audiência de discussão e julgamento e a coberto de um lapso de escrita alegar que o salário era de HKD7,500.00 e não de MOP7,500.00, vindo assim, «nos termos do artigo 2440 do Código Civil e do art. 217 nº 2 in fine do CPC, requerer a sua correcção, porquanto se trata de uma consequência do pedido primitivo (...)».
III. Mas aquilo que foi requerido pelo Recorrido carece por completo de fundamento legal, já que resulta do preceituado no artigo 244º do Código Civil que «O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta.» e por sua vez, do art. 217º n° 2 do CPC que: "O pedido pode também ser alterado ou ampliado na réplica; pode, além disso, o autor, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em primeira instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo."
IV. Ora, do que vem declarado pelo Recorrido no seu requerimento ou dos seus articulados anteriores, mormente da petição inicial não resulta que se trate de um erro de escrita ou de cálculo, pois o Recorrido sempre foi muito claro em alegar e calcular todas as parcelas do seu pedido em Patacas, não se referindo nunca a Dólares de Hong Kong.
V. É consabido que a lei permite apenas e tão só que sejam rectificados a todo o tempo os erros materiais que se mostrem ostensivos... e nada mais do que isso, e é pacífico que, a existir um lapso manifesto, tal erro só pode ser ratificado se for ostensivo, evidente e devido a lapso manifesto, sendo necessário que ao ler-se o texto se veja de imediato o erro e que se entenda o que o interessado pretendia dizer, indo neste sentido Vaz Serra, in RLJ, 112°-6,: "Este artigo admite a simples rectificação do erro de cálculo ou de escrita quando ele é ostensivo; exclui assim, a anulação do negócio. Mas se o erro não for ostensivo não é razoável que se sujeite a outra parte à mera rectificação de erro de que não poderia ter-se apercebido." Sendo que os Tribunais da RAEM foram já chamados a discutir esta questão, tendo sido já decidido pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância que: «...a ampliação do pedido, afinal de contas, limitou-se a corrigir quantias indemnizatórias em consequência do valor da alteração do valor do salário diário (que já era conhecido do autor do autor desde o inicio da acção (...) A omissão destas quantias no articulado inicial decorre de culpa do autor da acção: logo sibi imputet. Podia ter formulado esta pedido desde logo, não o fez, nem agora justificou a tardia dedução, nem a impossibilidade da sua inclusão na petição inicial (...)» - neste sentido vide processo 613/2013 de 15.05.2014.
VI. No caso concreto parece evidente que a correcção que o Recorrido pretende não se trata de um mero erro de escrita, e muito menos que tal erro seja ostensivo, evidente e devido a lapso manifesto pois aquilo que o Recorrido pretende é, a despeito de um alegado erro de escrita, alterar a quantia indemnizatória reclamada nestes autos pretendendo fazer uma alteração do seu pedido, mas, como resulta do citado art. 217°, n° 2 do CPC, o pedido só pode ser alterado na réplica e como se sabe a alteração não é o mesmo que ampliação: na alteração do pedido, em vez de se pedir A, passa-se a pedir B; na ampliação do pedido em vez de se pedir A, passa-se a pedir A + B.
VII. E ainda que se tratasse de um requerimento de ampliação do pedido, o que legalmente é permitido até ao encerramento da discussão em primeira instância (art. 217°, n° 2 do CPC), a pretensão do Recorrido carece de qualquer fundamento legal porquanto não se trata de "desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo", nem o Recorrido o fundamenta, pois, se o Recorrido pretendia alegar que auferia a quantia mensal de HK7.500.00 (em vez de o receber em patacas) e deduzir os seus pedidos com base nessa quantia, poderia e deveria tê-lo feito ab initio na sua petição inicial, não podendo admitir-se que o faça agora lançando mão de expedientes processuais a despeito de erros de escrita que, como se viu, não existem.
VIII. Não pode, por isso, o Recorrido vir desdizer aquilo que disse e sobre o qual as partes já tiveram oportunidade de se pronunciar e sobre matéria que foi já aceite pelas partes, sendo o que resulta do princípio da preclusão do processo civil já que a este propósito como bem lembra Manuel de Andrade, este princípio traduz-se no reconhecimento de que um processo contém ciclos processuais rígidos, com finalidades específicas e estanques entre si e por isso, quando os actos não sejam praticados no ciclo próprio, ficam precludidos.
IX. Face a isto, o resultado processual está à vista, os factos em causa foram desde logo enquadrados na factualidade assente, com a alteração motivada sob o pretexto de se tratar de um lapso de escrita, a Recorrente não teve, quanto a tal factualidade, os mesmos meios legais de defesa já que não é o mesmo poder fazer uma impugnação, seguida de um processo de instrução de prova, no âmbito da qual a Recorrente poderia tomar as diligências probatórias adequadas, do que resulta da decisão em crise, na qual se transforma factualidade assente em factualidade diferente, com agravamento económico e aumento material do pedido, e sem os mesmos meios conferidos às Rés, ora Recorrentes para realizar a sua defesa, pelo que e sempre com o devido respeito pelo Tribunal, as Rés sentem-se enganadas pelo Autor, ora Recorrido, pelo meio utilizado para proceder a um agravamento ilegal e injustificado do seu pedido, com a violação dos princípios mais básicos e fundamentais das regras do processo.
X. E apesar de tudo isto, veio o Digno Tribunal a quo em despacho proferido em audiência admitir o requerido pelo Recorrido com o seguinte Despacho:
"Admite-se a correcção requerida pelo Autor aos pedidos formulados na sua petição inicial convertendo-se os valores inicialmente apresentados em patacas e pelos agora concretizados em Hong Kong Dólares, o que se faz em coerência com os documentos juntos aos autos por força do princípio da economia processual, pois se assim se não fizesse previsivelmente teríamos o Juízo Laboral inundado de outras tantas acções, somente por força deste lapso, que assim se admite que seja reparado."
XI. No mesmo despacho invoca o Meritíssimo Juiz a quo o princípio da economia processual e previsibilidade de o Juízo Laboral ser inundado por novas acção a serem intentadas pelo Recorrido mas tais fundamentos, com todo o respeito que é muito, não podem fundamentar a admissão do requerimento do Recorrido, por os mesmos serem manifestamente contrários à lei e à justiça e reflectem-se numa verdadeira denegação de justiça já que o princípio da economia processual é um princípio de simplificação do processo, segundo o qual o processo deve obter o maior resultado com o mínimo de esforço mas sempre mantendo como mastro o princípio da legalidade e pelo direito do acesso à Justiça imparcial não podendo ser utilizado como desculpa ou fundamento de atropelo à lei.
XII. Note-se que no seu despacho o Meritíssimo Juiz a quo nem sequer se pronuncia sobre a legalidade do acto do Autor, ora Recorrido, pois o Tribunal faz tábua rasa da actuação ilegal do Recorrido e a coberto do princípio da economia processual admite um requerimento contrário à lei, que deveria ser sancionado pelo Tribunal através de um indeferimento liminar, por isso com todo o respeito, se considera que não pode o Tribunal usar o argumento "(...) pois se assim se não fizesse previsivelmente teríamos o Juízo Laboral inundado de outras tantas acções (...)" isto porque, ao afirmar isto o Tribunal a quo está a admitir que o procedimento do Recorrido é contrário á lei, por ser inoportuno, pois desse argumento decorre que admite que sendo o requerimento do Recorrido indeferido o Recorrido teria que voltar a usar o Tribunal para corrigir o seu erro.
XIII. Não pode também o Tribunal recorrer à previsibilidade de ver o Juízo Laboral inundado com outras acções, primeiro porque não pode o Tribunal adivinhar se irá ou não haver reacção do Autor, ora Recorrido, ao indeferimento do tribunal através da proposição de novas acções e em segundo porque, mesmo que haja reacção do Autor, não pode ser este um argumento para impedir agora a aplicação da lei e da justiça por parte do Tribunal ao sancionar o requerimento apresentado, motivo pelo qual, entende a Recorrente, sempre com todo o respeito, que enferma tal despacho do vício de erro na aplicação do Direito por violação, designadamente, do artigo 6° do Código de Processo Civil, devendo o mesmo ser revogado e substituído por outro que decrete o indeferimento do requerimento apresentado pelo Autor, ora Recorrido.
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  Por sentença de 02/05/2017, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$109,623.75, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vêm recorrer o Autor e a Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
Do Autor:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao ora Recorrente as quantias pelo mesmo reclamadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, feriados obrigatórios e pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo devida pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal, feriado obrigatórios e prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho e, nesta medida, se mostra em violação ao disposto nos artigos 10.º, 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que atenda à totalidade dos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Em concreto,
3. Ao condenar a Ré a pagar ao Autor apenas uma quantia em singelo pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal não gozado, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na medida em que de acordo com o referido preceito se deve entender que o mesmo trabalho deve antes ser remunerado em dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescido de um outro dia de descanso compensatório, tal qual tem vindo a ser seguido pelo Tribunal de Segunda Instância;
Acresce que,
4. Contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, não parece correcto concluir que pela prestação de trabalho nos dias de feriados obrigatórios se deva proceder ao desconto do valor do salário em singelo já pago;
5. Pelo contrário, salvo melhor opinião, a fórmula correcta de remunerar o trabalho prestado em dia de feriado obrigatório nos termos do disposto no artigo 20.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril – ainda que a determinar em sede de liquidação de execução de Sentença – será conceder ao Autor, ora Recorrente, um "acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito" – o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal – conforme tem vindo a ser entendido pelo Tribunal de Segunda Instância;
Por último,
6. Contrariamente ao entendimento sufragado pelo douto Tribunal a quo, está o ora Recorrente em crer que a situação de "tolerância" de 30 minutos para a conclusão de tarefas não acabadas contante do n.º 4 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, tão-só se justifica para situações ocasionais, isto é, para situações esporádicas, não podendo tal circunstância se transformar em regra, razão pela qual deva a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia pelo mesmo reclamada pela prestação de 30 minutos de trabalho por dia para além do seu período normal diário.
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A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 424 a 434, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Da Ré:
1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção procedente e condenou a Ré, ora Recorrente no pagamento de uma indemnização ao Autor A no valor global de MOP$109.623,75, sendo MOP$15.980,00 a título de subsídio de alimentação, MOP$10.600,00 a título de subsídio de efectividade, MOP$24.462,50 a título de descanso semanais, MOP$24.462,50 a título de não gozo dos dias de descanso compensatório, MOP$20.471,25 a título de comparticipação no alojamento descontadas e MOP$13.647,50 pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho, acrescidas de juros moratórios à taxa legal a contar do transito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório.
2. Mais condenando a Ré, ora Recorrente, a pagar ao Autor o montante correspondente ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatórios e às bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas ao operários residentes, a liquidar em execução de sentença, pelo que não concordando com tal decisão vem a ora Recorrente impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, nomeadamente a matéria fáctica vertida no quesitos 1° a 13° e 15° da Base instrutória, porquanto da prova produzida em sede de julgamento nunca poderiam os referidos quesitos terem sido dados como provados.
3. Impugnado também a matéria constante das alíneas E) e F) da Matéria Assente já que tendo esta matéria sido impugnada pela Ré, considerou o Digno Tribunal inserir nos Factos Assentes, o que originou a Reclamação feita pela Ré à selecção da matéria de facto.
4. Por sua vez o Tribunal veio responder a reclamação feita pelas Rés à selecção da matéria de facto fundamentando da seguinte forma: "Indefere-se a reclamação apresentada uma vez que a matéria que ficou assente tem de se considerar dever ser, não obstante entretanto o tempo decorrido, de natureza pessoal da Reclamante, pelo que o seu desconhecimento equivale à sua confissão, nos termos do disposto no artigo 410º, n° 3 do CPC.'' e desta forma tal matéria veio a ser dada como provada pelo Digno Tribunal de Primeira Instancia na sentença recorrida, tendo sido, salvo devido respeito, incorrectamente julgada pelo Douto Tribunal a quo, como a seguir se demonstrará.
5. Outrossim, também no plano do Direito aplicável ao caso concreto, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece dos vícios de erro de julgamento e erro na aplicação do direito e de nulidade por falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Autor ora, Recorrido.
6. Foram assim dados como provados os seguintes factos: Entre 18 de Outubro de 1996 e 31 de Março de 2003, o Autor esteve ao serviço da Ré (B), prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (A).O Autor foi recrutado pela Sociedade ECONFORCE - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, aprovado pelo Despacho n.°1926/IMO/SACE/96, de 20/11/96 (Cfr. doc. 2 e 3). (B) e ao longo do período que prestou trabalho, o Autor gozou de vários períodos de dispensa ao trabalho remunerados e/ou não remunerados. (C)
7. Durante o período que prestou trabalho, a Ré pagou ao Autor a quantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal. (D) Durante todo o período da relação de trabalho com a Ré, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (E) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia: Turno A: (das 08h às 16h). Turno B: (das 16h às 00h) e Turno C: (das 00h às 08h) (F) .
8. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de "(...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação". (1º). Entre 18/10/1996 e 31/03/2003, a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.°) Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, que "(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território". (3.°)
9. Entre 18/10/1996 e 31/03/2003; a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (4.°) Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n." 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) "(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço". (5.°). Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré. (6.°). Entre 18/10/1996 e 31/03/2003; a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (7.°)
10. Entre 18/10/1996 e 31/12/2002, a Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição (8.°). A Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (9.°). A Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (10°). A Ré nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (11.°). Entre 18/10/1996 e 31/03/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a Ré. (12.º). A Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (13.°) e ainda que a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (15.°).
11. Pela relevância que ocupa na leitura das seguintes alegações não pode deixar de se transcrever os fundamentos aduzidos pelo douto Tribunal na resposta à matéria de facto no qual se lê: ''Concretamente, atendemos ao depoimento prestado pela testemunha apresentada pelo Autor, com a razão de ciência que melhor resulta da acta da audiência, que revelou conhecimento directo dos factos sobre que depôs, num depoimento que se revelou sóbrio e não comprometido, tendo explicado que não era política da Ré permitir o gozo de descansos semanais (não sendo tal trabalho sido pago alem de um dia normal); explico ainda, a este propósito, que nunca foi dado qualquer dia de descanso compensatório. Explicou ainda a testemunha que não foi pago qualquer subsídio de efectividade ou qualquer compensação pela prestação de trabalho em dias de feriado obrigatório; quanto a estes últimos, a resposta restritiva decorre da circunstância de a testemunha ter explicado que o Autor (à sua semelhança) gozava 24 dias de férias anuais, não tendo, no entanto, conseguido concretizar exactamente o período em que tal sucedia até porque esses dias podiam ser utilizados ao longo do ano quando havia alguma razão forte que o fizesse por exemplo ir ao país deles, razão por que não houve prova suficiente dos dias de feriado obrigatório em que o Autor prestou trabalho."
12. Mais se diz no citado aresto que: "Explicou ainda a testemunha que nunca foram pagas quaisquer quantias a título de subsídio de alimentação, gorjetas ou outras remunerações além do salário. Mais explicou a testemunha que a Ré não forneciam refeições mas tão só um local - que não era assim uma cantina - onde os trabalhadores podiam tomar a refeição que traziam de casa. A testemunha inquirida afirmou ainda que, a título de alojamento, a Ré cobrava a quantia mensal de 750 HKD mesmo que os trabalhadores optassem por residir fora das residências fornecidas pela Ré. Mais relatou ainda a testemunha, de forma detalhada, como se processavam os turnos de trabalho e a sua rotatividade, precisamente nos termos que ficaram provados. Cumpre ainda referir que nenhuma prova de sentido contrário foi produzida, quer testemunhal, quer documental, que permitisse pôr em causa o depoimento prestado em audiência pela testemunha, nomeadamente nenhum registo que comprove ter o autor alguma vez faltado ao serviço ou que lhe tivesse sido paga qualquer quantia, e a que titulo, além do que resultou provado (...).
13. Entendeu o Digno Tribunal a quo em levar para os Factos Assentes a matéria vertida nos quesitos E) e F), facto que a ora Recorrente reclamou por entender que face à impugnação feita em Contestação e ao facto de não disporem de dados para determinarem a efectivação de tais turnos e atento o estipulado no artigo 13°, n° 2 da Lei 7/2008 das Relações de Trabalho, a lei apenas obriga o empregador a manter e conservar os registos dos trabalhadores durante a vigência da relação de trabalho e por um período de três anos após a sua cessação a qual no caso concreto ocorreu há mais de 13 anos e por isso a Ré não mais tinha em seu poder, elementos que lhe permitissem confirmar tal facto.
14. Pelo que a Recorrente não concorda e impugna tal decisão considerando que tal matéria devera passar a fazer parte da Base Instrutória e nunca da matéria Assente, pelo que violou a dota sentença recorrida a aplicação da lei e o disposto no artigo 13°, n° 3 da Lei 7/2008, pelo que deverá a sentença proferida ser revogada e substituída por outra que declare a passagem da matéria vertida nos pontos E) e F) para a Base Instrutória com as demais consequências legais.
15. Mas ainda que assim não seja entendido, da prova produzida em sede de julgamento à resposta aos quesitos 1° a 13° e 15 ° da Base Instrutória e a decisão relativamente aos pontos E) e F) da especificação e a fundamentação supra transcrita teriam necessariamente de ser diferentes, pelo que estamos perante um claro erro de julgamento, pois no vertente processo, foi deferida a documentação das declarações prestadas na audiência de julgamento, existindo por isso suporte de gravação, o que permitirá ao douto Tribunal de Segunda Instância melhor avaliar, e decidir, sobre o ora invocado erro na apreciação da prova, aqui expressamente se requerendo a reapreciação da matéria de facto, nos termos admitidos no art. 629° do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art. 1° do Código de Processo do Trabalho.
16. A Recorrente, ao invocar no presente recurso o erro na apreciação da prova, que, na sua óptica, inquina a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo, não pretende apresentar apenas uma simples discordância relativamente à interpretação dos factos feita por aquele douto Tribunal, tendo bem presente o dispositivo do art. 558º do Código de Processo Civil, e a natureza insindicável da livre convicção relativamente à apreciação da prova efectuada pelo Tribunal recorrido, e estando bem ciente da jurisprudência afirmada nos Tribunais Superiores da RAEM.
17. A verdade é que é entendimento da Recorrente que tal erro de julgamento se verifica na situação dos autos, e que o vício apontado à decisão recorrida resulta dos próprios elementos constantes dos autos, que por si só são contraditórios ou com recurso às regras da experiência comum, isto porque nos presentes autos foi ouvida apenas uma única testemunha, C, cujo testemunho se encontra gravado, cujo testemunho se encontra na Passagem gravada em 17.01.2017, CD 1 Tradutor 1 Excerto 2 - 10.01.44 do minuto 18:51 Excerto 3 - 10.20.56, do minuto 00:08 ao minuto 03:39, Excerto 4 10.24.56 - do minuto 00:18 ao 00:57, Excerto 5 10.26.42 do minuto 00:19 ao minuto 0027, excerto 6 - 10.27.38 do minuto 00:11 ao minuto 00:49, Excerto 7 - 10.28.58 do minuto 0011 ao 0016, Excerto 8 - 10.29.39 do minuto 00:07 ao 02:22 e Excerto 9 - 10.32.13 do minuto 0010 ao minuto 10:50.
18. E cujo testemunho se encontra transcrito nestas alegações e os quais se dão por reproduzidos, e do qual se retira que o seu depoimento, sendo a única testemunha ouvida em julgamento, é genérico sem que tivesse a testemunha conseguido concretizar se em relação ao Autor as coisas se passavam como se haviam passado em relação a si mesma tendo até declarado em relação ao Autor que não tinha trabalhado com ele, "Declarou até que em relação ao Autor não tinha trabalhado com ele, "não tenho trabalho junto com ele, só de vez em quando ele trabalhava no Jai Alai ou Hotel Lisboa (00:19), e encontramos e só depois que eu destacado para o New Century, é que tenho contacto com ele (00:27)", (CD1 - tradutor 1 Excerto 5-10.26.42 ( minuto 00:27) não se sabendo sequer se o Autor e testemunha viviam no mesmo apartamento ou eram suficientemente íntimos para responder às questões com tal precisão e certeza.
19. O depoimento da testemunha mais parece um verdadeiro depoimento de parte, pois só fala dela própria, não se podendo olvidar que a aludida testemunha fora Autor numa acção em tudo semelhante àquela em que veio depor, o que tende a revelar a parcialidade do seu depoimento, aliás tal como pode ser comprovado pela afirmação do mandatário do Autor quando diz no início do depoimento da testemunha: "Sr. Lam, bom dia! Se o Meritíssimo me permitir estas palavras que o Sr. Lam tem vindo repetidamente e no fundo a ideia é falar dos colegas todos, de uma vez, fazer uma pergunta quanto a um Autor e responder por todos eles (00:34). As perguntas as perguntas são mais ou menos as mesmas." (Cfr. CD1 Tradutor 1, Excerto 8, 10.29.39, minute 00:34).
20. Por isso nunca poderia o Tribunal a quo ter dado como provado que o Autor não recebeu os subsídios a que alega ter direito, ou que nunca faltou sem conhecimento e autorização da Ré, ou que aquele nunca gozou dias de descanso semanal e feriados obrigatórios, ou se ainda, a cada 21 dias, trabalhava 16 horas em cada período de 24, tanto mais que o próprio Autor ora afirma na petição inicial que não teve nenhum descanso semanal (quesito 9) nem gozou qualquer feriado obrigatório (quesitos 12 e 13) ora reconhece ter falta do algumas vezes com autorização prévia da Ré (quesito 6), afirmando o Recorrido, ao longo do seu articulado inicial que gozou de períodos de ausência ao trabalho para a testemunha vir depois dizer em audiência que trabalhavam continuamente nos descansos semanais e feriados (Cfr. passagem gravada em 17.01.2017, CD 1 Tradutor 1 Excerto 9 - 10:32 13, minuto 07:29).
21. E parece insuficiente admitir que a procedência do pedido do Autor seja feita com base num único depoimento genérico e indirecto e sem que a testemunha tivesse trabalho diariamente a par com o Autor, tal como afirma em audiência (CD 1, excerto 5 tradutor 1 10.26.42, minutos 00.19 a 00.27) concluindo-se com isto que esta só pode desconhecer, por isso, a verdadeira situação do mesmo não sendo por isso o seu testemunho bastante para dar por provado os quesitos 1° a 13º e 15° da Base Instrutória.
22. Salientando-se que à Ré se tornou impossível contradizer documentalmente o depoimento da testemunha porquanto a presente demanda só se iniciou volvidos mais de 13 anos sobre o termo da relação laboral, não dispondo mais de documentos sobre este trabalhador e não estando a mesma portanto obrigada a manter nos seus arquivos a documentação atinente a todos os seus trabalhadores.
23. E também quanto às gorjetas o Tribunal a quo pecou ao dar como provado os quesitos 3º e 4° pois a pergunta que foi feita em audiência à testemunha foi "Alguma vez o senhor sabe se alguns desses colegas, e o senhor também, que recebeu gorjetas da B?" Tendo sido a resposta dada que: "Não houve, nunca recebemos." (CD 1 tradutor 1, excerto 9, 10.32.13 minutos 07:14), e o Digno Tribunal deu como provado que "Entre 18/10/1996 e 31/03/2003 a 1ª Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo-se as gorjetas (4º)" sem que alguma vez em audiência tenha sido questionado à testemunha se os trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança tinham recebido gorjetas. (Cfr. (Passagem gravada 17.01.2017, CD1, Tradutor 1 Excerto 9 - 10.32.13 minutos 07:14) e se tal facto não foi sequer comprovado pela testemunha como é que o Tribunal teve provas suficientes para dar tal matéria como provada? A verdade, é que não foi a mesma prova suficiente para dar como provado tal facto e tal quesito, pelo que, também aqui falhou o Digno Tribunal a quo, devendo tal quesito ser dado como não provado e após reapreciação da prova efectuada em juízo por parte desse Venerando Tribunal da Segunda Instância deverá ser proferido douto Acórdão que julgue procedente o invocado vício de erro de julgamento ao dar por provados os quesitos 1° a 13° e 15° da Douta Base Instrutória, os quais serão de dar por não provados.
24. Mas ainda que improceda o recurso na parte respeitante à impugnação da decisão que dirimiu a matéria de facto, urge ainda questionar se o Autor teria direito a receber todos os créditos que reclama nos termos em que a sentença ora posta em crise os concedeu e a resposta só pode ser em sentido negativo, isto porque a título de subsídio de alimentação e do subsídio de efectividade o Tribunal a quo condenou ora Recorrente a pagar ao Autor a quantia de MOP$15.980,00 a título de subsídio de alimentação e a quantia de MOP$10.600,00 a título de subsídio de efectividade e com relevo para a apreciação de tais pedidos deu o douto Tribunal a quo provado os supra transcritos quesitos 1°, 2°, 5° e 7°, tendo o Tribunal a quo fundamentado a decisão afirmando que «a pretensão do Autor assenta no regime legal de contratação de trabalhadores não residentes regulado no Despacho n° 12/GM/88 de 01 de Fevereiro, cujas condições mínimas de contratação estarão, segundo defende, incorporadas no contrato de prestação de serviços que a Ré celebrou tal como exigido pela alínea c) do n° 9 desse diploma legal e na qualificação jurídica deste contrato como sendo a favor de terceiro.
25. E ainda que "[...] Relativamente à questão jurídica fundamental, ao enquadramento da relação estabelecida entre as partes outorgantes dos mencionados contratos de prestação de serviços e à sua repercussão na esfera jurídica do Autor, o Tribunal de Segunda Instância já firmou jurisprudência unânime no sentido de que estamos na presença de um contrato a favor e terceiro que tem como beneficiário o Autor, citando-se como exemplo, o mais recebente Acórdão datado de 25.07.2013, cujo sumário parcial aqui nos permitimos reproduzir. Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, como parte beneficiária do contrato de prestação de serviços dado como assente, o Autor tem direito a prevalecer-se do clausulado mínimo nele constante.
26. E que [...] Quanto ao subsídio de alimentação resulta provado em 7) que a Ré se comprometeu a pagar 20 patacas diárias a tal título. Resulta ainda provado que entre 22 de Janeiro de 2001 (...) e 31 de Março de 2003 a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (cf. Facto 8) pelo que tem o Autor direito a receber a tal titulo a quantia de MOP$15.980,00 (799 dias x MOP$20). Quanto ao subsídio de efectividade resulta este previsto no Contrato de Prestação de Serviços n° 5/96 (cfr. facto 11) e não foi pago pela Ré ao Autor sendo que entre 22 de Janeiro de 2001 (...) e 31 de Março de 2003 o Autor não deu qualquer falta ao serviço sem conhecimento e autorização prévia da Ré (cf. Facto 12) pelo que lhe é devida a quantia de MOP100 x 4 dias x 26,5 meses, isto é MOP10.600,00».
27. Ora, numa situação como à dos autos em que à data da contratação do Autor estava em vigor o Despacho n.º 12/GM/88, de 1 de Fevereiro - o qual regia a contratação de trabalhadores não residentes - o Venerando Tribunal de Segunda Instância pronunciou-se do seguinte modo: «Tendo sido celebrado um contrato de prestação de serviços entre a Ré e a Sociedade [...] Lda., em que se estipula, entre outros, o mínimo das condições remuneratórias a favor dos trabalhadores que venham a ser recrutados por essa sociedade e afectados ao serviço da Ré, estamos em face de um contrato a favor de terceiro, pois se trata de um contrato em que a Ré (empregadora do Autor e promitente da prestação) garante perante a Sociedade [...] Lda. (promissória) o mínimo das condições remuneratórios a favor dos trabalhadores estranhos ao contrato (beneficiários). »
28. Isto é o contrato de prestação de serviços funciona como uma garantia do mínimo das condições remuneratórias a cumprir por parte da entidade promitente ou empregadora, sendo portanto de analisar se aquando do início da relação laboral os trabalhadores ficaram individualmente prejudicados face ao resultado que teriam se a entidade empregadora cumprisse apenas com aqueles mínimos das condições remuneratórias. Isto é, se o Recorrente se tivesse limitado a cumprir com os mínimos a que se obrigou, o Autor teria auferido um salário idêntico ao nível médio dos salários praticados para desempenho equivalente, num mínimo de $100.00 patacas diárias, acrescida de $20,00 patacas diárias por pessoa a título de subsídio de alimentação, ou seja, MOP$3,600.00 mensais, ao qual poderia acrescer um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço,
29. Mas a verdade é que o Autor, por força do contrato de trabalho que celebrou com a ora Ré, auferiu mensalmente o valor de MOP7500.00, ou seja, mais do dobro dos aludidos montantes, ficando assim devidamente cumpridas e verificadas as condições remuneratórias mínimas previstas no contrato de prestação de serviços, por isso, salvo devido respeito por melhor opinião, tendo no caso concreto a ora Ré efectivamente proporcionado ao Autor uma remuneração muito superior àquela a que se comprometeu por força do contrato de prestação de serviços, não se vislumbra em que medida se possa ter o referido contrato de prestação de serviços por violado e nem em que medida possa o Autor considerar-se prejudicado, pelo que nunca poderia proceder os pedidos formulados pelo Autor a titulo de subsídio de alimentação e de efectividade.
30. Mas ainda que assim não se entenda sempre se diga que, o pedido formulado a título de subsídio de alimentação não poderia proceder, pois entendeu o douto Tribunal a quo que o Autor teria direito a receber MOP20 por 799 dias de trabalho que mediaram entre o dia 22 de Janeiro de 2001 (atenta a prescrição dos créditos reclamados pelo Autor) e 31 de Março de 2003, mas não se comprovou que entre estas datas o Autor tenha trabalhado 799 dias, o que se provou foi que durante o período em que o Autor prestou trabalho nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré resultando assim assumido pelo Autor que "...nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da 1ª Ré." (quesito 6° e que gozou vários períodos de dispensa (Facto assente C)).
31. Pergunta-se então quantos dias o Autor faltou ao trabalho? É que o direito invocado pelo Autor não se pode presumir como certo, e o Tribunal terá que apreciar com base nos factos alegados pelo Autor e conforme o Direito, e não o faz e a parca matéria fáctica alegada pelo Autor não pode conduzir, sem mais, à procedência do pedido, isto porque resultou apurado que o Autor teve férias, que deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização da Ré mas não se comprova (nem tão pouco foi alegado) quais e quantos são esses dias, e se não foram alegados esses dias, e sendo os subsídios de alimentação e de efectividade atribuídos em função da efectiva prestação de trabalho, como poderá o Tribunal determinar quais os dias em que o Autor trabalhou e quais efectivamente os dias em que o Autor tem direito a tais subsídios?
32. É que o subsídio de alimentação, conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário tal como se pode aferir do Processo 414/2012 de 13.04.2014 deste Venerando Tribunal e de acordo com tal decisão para que houvesse condenação da Ré, ora Recorrente, no pagamento desta compensação, deveria o Autor ter alegado e provado quantos foram os dias de trabalho efectivamente por si prestados, o que não aconteceu estando, por isso, a decisão em contradição com a factualidade provada (cfr. resposta ao quesito 2°),
33. Pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, não tendo sido alegados nem provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em o fez, padecendo assim a douto sentença nesta parte do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento de compensação a título de subsidio de alimentação.
34. Quanto ao subsídio de efectividade veio a apurar-se que o mesmo fazia parte do contrato de prestação de serviços 5/96 e ainda que o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré (quesito 3), mas resulta do aludido contrato de prestação de serviços, que o subsídio de efectividade visa premiar a efectiva prestação do trabalho já que nesse contrato previsse que o subsidio de efectividade pressupunha que "[...] no mês anterior não tenha dada qualquer falta ao serviço." (Sombreado nosso), sendo irrelevante que o trabalhador tenha faltado por motivo justificado ou mesmo sob autorização prévia, e nos presentes autos não foi feita qualquer prova relativamente à assiduidade do Autor, não se tendo apurado quantos dias de trabalho efectivo ele prestou e nem quantas vezes faltou ao serviço, não tendo porém sido tais faltas quantificadas, nem se determinando quando foram dadas.
35. Neste pressuposto se questiona como foi possível ao Tribunal a quo fixar os dias que fixou para cálculo das compensações se não sabe quantos foram os dias de faltas justificadas ou quando foram dadas? Na verdade, não estava o Tribunal a quo em condições de concluir que em cada um dos meses em que durou a relação laboral o Recorrido não deu faltas ao serviço por forma a concluir que tinha o mesmo direito a perceber um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias. Mais uma vez deixou a decisão recorrida escapar que o próprio Autor alega não ter trabalhado todos os dias. Ou seja, é insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permita ao Tribunal a quo sustentar a condenação da Recorrente a pagar ao Recorrido qualquer montante a título de subsídio de efectividade. Devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado.
36. Ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrido a compensação a título de subsídio de efectividade e de subsídio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
37. Quanto á compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal o Tribunal a quo por provado o constante nos quesitos 8°, 9°, 10° e 11°, mas tendo resultado que o recorrido foi expressamente dispensado do trabalho (com ou sem remuneração) e que teve faltas justificadas, como pode o Tribunal entender decidir o número de dias devidos e não gozados pelo Recorrido a que se faz alusão a fls. 275 da sentença? É que estando provadas as dispensas para o trabalho remuneradas sem que a testemunha conseguisse determinar em que dias o Autor gozou tais dias nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente ao pagamento da quantia de MOP$24.462,50 + MOP$24.462,50 (descansos compensatórios) sem que se provasse o número de dias concretos que o Autor deixou de gozar o seu descanso semanal.
38. E quanto a isto a testemunha apenas respondeu genericamente que nunca tinham descansos semanais (Cfr. CD1 Tradutor 1 Excerto 9 - 10.32.13 minuto 07:29, 02:58, 03:10), vindo tal facto colidir com o alegado pelo Autor de que tinham dispensas ao trabalho (Facto Assente C)), verificando-se assim uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dias feriados, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art. 5° do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17º e 19° do DL 24/89/M, devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrida a compensação a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
39. Quanto ao trabalho por turnos e trabalho extraordinário no que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas deu o Tribunal como provado os factos constantes do quesito 15° e à semelhança do ocorrido com o subsídio de alimentação o Recorrente limitou-se a invocar factos genéricos, não alegando o Recorrido na sua petição inicial especificadamente quais os factos que permitam concluir que tenha direito a pedir qualquer tipo de compensação a esse título, nem a própria testemunha o faz em audiência, pois todo o testemunho é genérico e indirecto sem conhecimento real e concreto da situação do recorrido, pois até declara que não trabalhou sempre junto com o Recorrido (Cfr. CD 1, Tradutor 1, Excertos 10.26.42, minuto 00:27), não sendo por isso possível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de alegação do Autor, ora Recorrido, e da falta de prova em audiência.
40. Isto porque nem o Recorrido nem a testemunha especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias, quais o meses e quais os anos, e se ficou provado que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) ou pedia dispensas, como pode o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que o Autor estava de turno, ou ainda se eram ou não despendidas horas extraordinárias? Não sendo possível ao Tribunal determinar quais as horas extraordinárias que o trabalhador efectuava, motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao dar o quesito 15°, e os factos alegados nos pontos E) e F) da Especificação como provados, e em condenar a Recorrente, em violação do art. 5° do CPC e do art. 10° do DL 24/89/M.
41. Salientando-se mais um facto importante que o Tribunal deveria ter tido também em consideração, já que se reporta à relação laboral, in totum, que são as férias anuais gozadas pelo Autor, pois o Tribunal para o cômputo de todas as compensações devidas pelos créditos reclamados pelo Recorrido tem que ter em conta todos os dias de trabalho bem como todos os dias de férias, feriados e descansos gozados para efectivamente proceder ao cálculo das mesmas e face a esta falta de previsão por parte do Digno Tribunal no apuramento das compensações a atribuir ao Recorrido entende a Recorrente, sempre com todo o respeito, que padece a douta decisão dos vícios de erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito, devendo esta ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado, ou caso não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene a Recorrente a pagar ao Recorrido a compensação a título de trabalho extraordinário que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564° do CPC.
42. Ainda quanto às bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas entendeu o Tribunal a quo que tendo em conta o ponto 3.3 do Contrato de prestação de Serviços 5/96 teria o Autor direito a perceber as bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas aos operários residentes a liquidar em execução de sentença, ora, relativamente a esta questão pode ler-se na decisão recorrida que, "Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviço n° 5/96 que "(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor) este terá direito, para além da remuneração supra referida às bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª Outorgante (leia-se a primeira Ré) paga aos operários residentes no território" (sublinhado e destacado nossos).
43. Mais resultando da douta sentença que: "Entre 22/01/2001 e 31/03/2003 a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas que pagou a todos os demais trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança (4º)" (sublinhado e destacado nossos). No entanto, entende a Recorrente que o Tribunal a quo interpretou mal a aludida cláusula no que ao pagamento das gorjetas diz respeito, pois resulta claramente da supra transcrita cláusula que os trabalhadores não residentes teriam direito às bonificações ou remunerações adicionais PAGAS pela Recorrente aos operários residentes já que as gratificações pagas pela entidade patronal, tem carácter de recompensa, visando premiar e incentivar o trabalhador face ao seu bom desempenho, mas no caso concreto ficou por alegar e comprovar quais foram as bonificações ou remunerações adicionais que a Recorrente pagou aos trabalhadores residentes. (Cfr. Passagem gravada em 17.01.2017, CD1, Tradutor 1, Excerto 9 - 10.32.13 minuto 07:14).
44. Ao contrário do que o Autor pretendeu transparecer e veio a ser erradamente admitido pelo Tribunal, as gorjetas não correspondem a uma prestação do empregador mas sim de um terceiro e como tal não estão abrangidas pela sobredita cláusula, salientando-se ainda que a nova lei das relações de trabalho (Lei 7/2008) enquadra as gorjetas no conceito de "remuneração variável" (cfr. artigo 2° alínea 5) e não como remuneração de base o que reforça o argumento que a sua distribuição não constitui uma verdadeira obrigação para a entidade patronal, pelo que nunca poderia o Tribunal ter condenado a Recorrente ao pagamento das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, por falta de preenchimento do requisito para tal, pelo que não poderá a Recorrente senão ser absolvida do sobredito pedido.
45. Face a todo o acima exposto se concluiu também que a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação nos termos do artigo 571°, n° 1, alínea b) do CPC, pois mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios tais como: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e dispensas? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 3 ao art.º 36° da petição inicial? (iv) Que factos suportam esta conclusão? E mais, (v) Onde se encontram tais factos, bem como as férias anuais, na Base Instrutória? E por isso se questiona como foi possível ao Tribunal a quo fixar os dias que fixou para cálculo das compensações se não sabe quantos foram os dias de faltas justificadas?
46. Ou seja, com todo o respeito, as incoerências e violação do ónus de alegação por parte do recorrido só poderia, em nossa modesta opinião, ser resolvida pelo Tribunal de Primeira Instância de uma de duas formas: (i) Ou dava a oportunidade ao Autor para aperfeiçoar a petição inicial, apresentando nova peça consistente e coerente que permitissem uma decisão clara e esclarecida; (ii) Ou dava por provado apenas e tão só os factos que se encontram efectivamente provados e suficientemente alegados, não podendo o Tribunal factualizar as conclusões do Autor (não suportadas em factos) e os factos incoerentes e contraditórios que se mantêm na íntegra, padecendo por isso esta decisão do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus de alegação por parte do Recorrido, sendo, por isso, nula.
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O Autor respondeu à motivação do recurso da Ré, nos termos constantes a fls. 436 a 450, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. Entre 18/10/1996 e 31/03/2003, o Autor esteve ao serviço da Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
2. O Autor foi recrutado pela Sociedade ECONFORCE – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, aprovado pelo Despacho n.º 1926/IMO/SACE/96, de 20/11/96 (Cfr. doc. 2 e 3). (B)
3. Ao longo do período que prestou trabalho, o Autor gozou de vários períodos de dispensa ao trabalho remunerados e/ou não remunerados. (C)
4. Durante o período que prestou trabalho, a Ré pagou ao Autor a quantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal. (D)
5. Durante todo o período da relação de trabalho com a Ré, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (E)
6. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h) (F)
7. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (1.º)
8. Entre 18/10/1996 e 31/03/2003, a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.º)
9. Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, que “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território”. (3.º)
10. Entre 18/10/1996 e 31/03/2003, a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (4.º)
11. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (5.º)
12. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré. (6.º)
13. Entre 18/10/1996 e 31/03/2003, a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (7.º)
14. Entre 18/10/1996 e 31/12/2002, a Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição (8.º)
15. A Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (9.º)
16. A Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (10.º)
17. A Ré nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (11.º)
18. Entre 18/10/1996 e 31/03/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a Ré. (12.º)
19. A Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (13.º)
20. Durante o período em que o Autor prestou trabalho, a Ré procedeu a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (14.º)
21. Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (14.º-A)
22. A referida dedução (de HK$750.00) no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (14.º-B)
23. A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (15.º)
24. Por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (16.º)
25. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (17.º)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A. Do recurso interlocutório:
Estabelece o artº 583º/1 do CPC que “salvo disposição em contrário, o recurso ordinário só é admissível nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre, desde que a decisão impugnada seja desfavorável à pretensão do recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal; em caso, porém, de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, atende-se somente ao valor da causa”.
Por outro lado, nos termos do disposto no artº 18º do LBOJM, em matéria cível e laboral, a alçada dos Tribunais de Primeira Instância é de MOP$50.000,00.
No caso em apreço, a decisão recorrida lhe não é desfavorável em valor superior à metade da alçada dos tribunais de primeira instância, pelo que não é de admitir o recurso interlocutório.
Custas pela Ré com 2UC de taxa de justiça.
B. Do recurso final da Ré:
1. Da impugnação da decisão da matéria de facto:
1.1. Da matéria assente
Entende a Ré que não deveria ter dado como assente a matéria de facto constante das alíneas E) e F) dos Factos Assentes, visto que o desconhecimento que alegou relativamente a essa matéria não pode ser tido por confissão, uma vez que não é obrigada a conservar os documentos alusivos ao Autor e à vida da sociedade.
Não lhe assiste razão, já que aquela matéria diz directamente respeito à relação jurídica estabelecida entre ela e o Autor. Portanto, sendo facto que também lhe é pessoal e de que não pode deixar de ter conhecimento, o simples modo de impugnar dizendo desconhecer genericamente tal factualidade equivale a confissão da mesma – cfr. artº 410°, nº 3, do CPC.
Nesta conformidade, o recurso não deixará de se julgar improvido nesta parte.
1.2. Da matéria julgada provada
Para a Ré, face à prova existente nos autos, o Tribunal a quo “nunca poderia ter dado por provados os quesitos 1º a 13º e 15º da base instrutória, os quais terão necessariamente de ser tidos por não provados”.
Não lhe assiste razão.
Como é sabido, segundo o princípio da livre apreciação das provas previsto n° 1 do artigo 558.° do CPC, “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
A justificar tal princípio e aquilo que permite a existência do mesmo, temos que o Tribunal a quo beneficia não só do seu prudente juízo e experiência, como da mais-valia de um contacto directo com a prova, nomeadamente, a prova testemunhal, o qual se traduz no princípio da imediação e da oralidade.
Sobre o princípio da imediação ensina o Ilustre Professor Anselmo de Castro (in Direito Processual Civil, I, 175), que “é consequencial dos princípios da verdade material e da livre apreciação da prova, na medida em que uma e outra necessariamente requerem a imediação, ou seja, o contacto directo do tribunal com os intervenientes no processo, a fim de assegurar ao julgador de modo mais perfeito o juízo sobre a veracidade ou falsidade de uma alegação”.
Já Eurico Lopes Cardoso escreve que “os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe.” (in BMJ n.º 80, a fls. 220 e 221)
Por sua vez Alberto dos Reis dizia, que “Prova livre quer dizer prova apreciada pelo julgador seguindo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei. Daí até à afirmação de que o juiz pode decidir como lhe apetecer, passando arbitrariamente por cima das provas produzidas, vai uma distância infinita. (...) A interpretação correcta do texto é, portanto, esta: para resolver a questão posta em cada questão, para proferir decisão sobre cada facto, o tribunal aprecia livremente as provas produzidas, forma sua convicção como resultado de tal apreciação e exprime-a na resposta. Em face deste entendimento, é evidente que, se nenhuma prova se produziu sobre determinado facto, cumpre ao tribunal responder que não está provado, pouco importando que esse facto seja essencial para a procedência da acção” (in Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora IV, pago 570-571.)
É assim que “(...) nem mesmo as amarras processuais concernentes à prova são constritoras de um campo de acção que é característico de todo o acto de julgar o comportamento alheio: a livre convicção. A convicção do julgador é o farol de uma luz que vem de dentro, do íntimo do homem que aprecia as acções e omissões do outro. Nesse sentido, princípios como os da imediação, da aquisição processual (art. 436º do CPC), do ónus da prova (art. 335º do CC), da dúvida sobre a realidade de um facto (art. 437º do CPC), da plenitude da assistência dos juízes (art. 557º do CPC), da livre apreciação das provas (art. 558º do CPC), conferem lógica e legitimação à convicção. Isto é, se a prova só é "livre" até certo ponto, a partir do momento em que o julgador respeita esse espaço de liberdade sem ultrapassar os limites processuais imanentes, a sindicância ao seu trabalho no tocante à matéria de facto só nos casos restritos no âmbito do arts. 599º e 629º do CPC pode ser levada a cabo. Só assim se compreende a tarefa do julgador, que, se não pode soltar os demónios da prova livre na acepção estudada, também não pode hipotecar o santuário da sua consciência perante os dados que desfilam à sua frente. Trata-se de fazer um tratamento de dados segundo a sua experiência, o seu sentido de justiça, a sua sensatez, a sua ideia de lógica, etc. É por isso que dois cidadãos que vestem a beca, necessariamente diferentes no seu percurso de vida, perante o mesmo quadro de facto, podem alcançar diferentes convicções acerca do modo como se passaram as coisas. Não há muito afazer quanto a isso.” (Ac. do TSI de 20/09/2012, proferido no Processo n° 551/2012)
Deste modo, “A reapreciação da matéria de facto por parte desta Relação tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada, nomeadamente quando não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação” (Ac. do STJ de 21/01/2003, in www.dgsi.pt)
Com efeito, “não se trata de um segundo julgamento até porque as circunstâncias não são as mesmas, nas respectivas instâncias, não bastando que não se concorde com a decisão dada, antes se exige da parte que pretende usar desta faculdade a demonstração da existência de erro na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efectivamente, no caso, foram produzidos.(...).” (Ac. do RL de 10/08/2009, in www.dgsi.pt.)
Ou seja,
Uma coisa é não agradar à Ré o resultado da avaliação que se faz da prova, o que parece ser o caso, e outra bem diferente é detectarem-se no processo de formação da convicção do julgador erros claros de julgamento, incluindo eventuais violações de regras e princípios de direito probatório.
Em face da prova efectivamente produzida e atentas as regras e entendimento acima enunciados, não assiste razão à Ré ao colocar em causa a apreciação e julgamento da matéria de facto realizada pelo Tribunal a quo.
Improcede o recurso também nesta parte.
2. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:
Entende a Ré que a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação uma vez que não contém todos os factos necessários para a sua condenação dos créditos reclamados a título dos subsídios de alimentação e de efectividade, da compensação da prestação das horas extraordinárias, dos dias de descanso semanal, incluindo os respectivos dias de descano compensatório, e dos feriados obrigatórios não gozados, especialmente não tendo alegado e provado o nº de dias de trabalho efectivo e o nº de dias do descanso semanal e dos feriados obrigatórios não gozados.
Sobre a questão suscitada, a jurisprudência (Ac. de 29/06/2017, Proc. nº 326/2017) recente deste TSI é no sentido seguinte:
  “…Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
  A recorrente coloca bem a questão, ao imputar o vício à sentença proferida - independentemente do enquadramento jurídico efectuado – nos seguintes termos:
  “(…) a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Recorrido já que mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios tais como: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art. 22° da petição inicial? Que factos suportam esta conclusão?”
  De certa forma pode-se dizer que o Mmo Juiz terá efectuado o seu cálculo com base na alegação do A. que ressalva na nota ao art. 27º da p.i. de que o A. não trabalhou 30 dias por cada ano civil, após o desconto do tempo relativo à prescrição. Mas se se se baseia nesse pressuposto de facto, logo a douta sentença peca por não se saber em que bases assentou essa fixação da matéria de facto – presumida apenas a partir da fundamentação de direito na sentença proferida, já que essa factualidade não está concretizada no capítulo em que se dá por assente a matéria de facto -, sendo certo que se trata de matéria que foi impugnada pelo A. e é certo que o A. não trabalhou durante todo o período em que esteve ao serviço do A., de forma ininterrupta, pois foi autorizado a ausentar-se. Dir-se-á que que o período de ausência era de 30 dias por ano. Mas onde está a comprovação de que assim era e que assim era de facto? O A. alegou e formulou o pedido nessa base, mas comprovou-o?
  Estamos em crer que essa incompleição não pode deixar de ser suprida, havendo que aditar, se necessário, o ou os quesitos necessários referentes à concretização dos dias de trabalho efectivo prestado e desconto dos 30 dias em cada ano, tal como alegado na nota ao artigo 27º da p.i.
  Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC1 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
  Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça.
  Perante esta insuficiência, perante esta incompreensão sobre a forma como se atingiu aquele facto com que se jogou no cálculo efectuado, mais do que a falta a que alude o art. 571º, b) do CPC estaremos perante a situação prevista no art. 629º, n.º 4 do mesmo Código, o que implica a anulação da decisão proferida na parte relativa à concretização de quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado pelo Mmo Juiz, tendo em conta a necessidade de saber os dias concretos de trabalho e ausência para se poderem determinar as diferentes compensações. Ou seja, por exemplo, para efeitos de compensação de feriados obrigatórios, como está bem de ver, só há compensação se houve trabalho nesses dias. Mas independentemente dessa necessidade concretização, contemplada aliás, na decisão proferida, há uma outra quantificação que se tem de provar.
  Compreende-se que possa não ser fácil, mas aí o A. tem o ónus de provar, não se podendo remeter para uma alegação conclusiva de que trabalhou todos os dias menos 30 por ano. Tem de provar que assim foi e esmerar-se na prova que produz. Admite-se que essa alegação seja pobre, mas não se deixa de considerar que ela ainda consubstancia um facto que se mostra essencial e como tal tem de ser comprovado, na certeza de que o tribunal não pode suprir de todo a insuficiência de alegação das partes.
  Daqui decorre que, em todos os momentos em que ao longo da fundamentação expendida fazíamos alusão à necessidade de apurar o número de dias, se conclui que esse apuramento deve ser efectuado em sede de repetição do julgamento na parte pertinente e já não em sede de liquidação em execução de sentença, na medida em que se fica por perceber como se encontrou o número de dias de base do cálculo, descontados os dias de ausência, matéria que não foi levada à base instrutória, mas, ainda que incipientemente, foi alegada.”
Somos a reiterar o que já anteriormente decidimos sobre esta matéria.
3. Do subsídio de alimentação:
Sobre esta matéria, este TSI, no âmbito do Proc. nº 709/2017, já se pronunciou pela forma seguinte:
  “O contrato de prestação de serviços com a empresa de importação de mão-de-obra vai balizar os montantes dos subsídios que devem ser pagos pelos empregadores e esse valor não tem que ser imputado à conta dos valores auferidos globalmente.
  Os montantes valerão para cada um dos subsídios em si e não é porque o empregador paga mais a outros títulos que se justifica que deixe de satisfazer os valores individualizados e concretamente considerados”.
Quanto ao seu quantum, também já decidimos nos processos congéneres que este subsídio depende da prestação efectiva de trabalho, tendo em vista a sua natureza e os fins a que se propõe (ex.: Ac. de 14/06/2012, Proc. nº 376/2012).
Assim, no caso em apreço, importa proceder ao apuramento do número exacto de dias efectivamente prestado em conformidade com o decidido no ponto nº 2.
4. Do subsídio de efectividade:
No que respeita ao pedido do pagamento do subsídio de efectividade, prevê a cláusula 3.4 do Contrato de Prestação em referência que o trabalhador tem direito a um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço.
Ora, é já jurisprudência assente ao nível deste TSI de que a sua atribuição não está excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho.
Pois, “se o patrão autoriza uma falta seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade.” (cfr. Ac. do TSI, de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013).
Face ao expendido e tendo sido dado como provado que o Autor nunca, sem conhecimento e autorização prévia da Ré, deu qualquer falta ao trabalho, o recurso não deixa de se julgar não provido nesta parte.
5. Da compensação de descanso semanal e do dia compensatório:
Quanto à fórmula de compensação do descanso semanal, considerando que se trata de matéria mais do que analisada e decidida por este TSI2, vamo-nos remeter para a Jurisprudência quase uniforme deste Tribunal no sentido de que o trabalhador tem o direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da remuneração correspondente, para além do salário-base já recebido, ou seja, o quantum compensatório é calculado pela fórmula seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 2.
Em relação aos feriados obrigatórios, a fórmula é a seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 3, para além do salário-base já recebido.
Para o dia de descanso compensatório, a fórmula é: Nºs de dias não gozados X salário diário X 1.
Porém, como já referimos anteriormente, há-de proceder ao apuramento do número exacto de dias efectivamente prestado em conformidade com o decidido no ponto nº 2 para determinar o quantum compensatório.
6. Dos turnos e horas extraordinárias:
Quanto à compensação da prestação das horas extraordinárias, o nº 1 do artº 10º do DL nº 24/89/M prevê que “Nenhum trabalhador deve normalmente prestar mais do que oito horas de trabalho por dia e quarenta e oito por semana, devendo o período normal de trabalho ser interrompido por um intervalo de duração não inferior a trinta minutos, de modo a que os trabalhadores não prestem mais de cinco horas de trabalho consecutivo”.
Ficou provado que o Autor prestou 16 horas de trabalho para além do seu período normal de trabalho (de 8 horas por dia e 48h por semana), em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo.
Assim, o Autor tem o direito de ser compensado pela prestação de trabalho nestas horas extraordinárias.
No entanto, a quantificação do montante dependerá do concreto apuramento do número de dias de trabalho efectivo em conformidade com o decidido no ponto nº 2.
7. Da bonificação extra e gorjetas:
No caso em apreço, o Autor formulou o pedido no sentido de que a Ré fosse condenada a pagar-lhe “o montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas que a Ré pagou aos operários residentes, a determinar nos termos do artigo 392º, nº 1, alínea c) ou alínea b) a liquidar em execução da sentença, por força do disposto no artigo 564º, nº 2 do Código de Processo Civil, ex vi artº 1º do CPT”.
Estamos perante um pedido genérico cuja admissibilidade depende da verificação duma das condições previstas no artº 392º do CPC, a saber:
1. É permitido formular pedidos genéricos:
a) Quando o objecto mediato da acção seja uma universalidade;
b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 563.º do Código Civil;
c) Quando a fixação do quantitativo esteja dependente de prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu.
2. Nos casos das alíneas a) e b) do número anterior o pedido pode concretizar-se em prestação determinada por meio do incidente de liquidação, quando para o efeito não caiba o processo de inventário; não sendo liquidado na acção declarativa, observa-se o disposto no n.º 2 do artigo 564.º
Já no âmbito do processo congénere nº 326/2017, este TSI, por acórdão de 29/06/2017, decidiu a sua inadmissibilidade nos seguintes termos:
  “…Da matéria provada não resulta quais sejam as bonificações ou remunerações adicionais que a 1ª ré tenha pago aos seus trabalhadores residentes, embora se tenha provado que a ré vinha pagando bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas.
  Não só não resulta da matéria provada a sua definição material e quantificação, como nem sequer tal matéria vem alegada.
  Estamos em crer que mais do que uma dificuldade no cômputo daquilo que é devido, o que poderia passar por uma operação de liquidação em execução de sentença, como determinou o Mmo Juiz, na essência, estará mesmo em causa a especificação de um pedido que nem sequer está definido na sua génese.
  Será aceitável a parte pedir que o tribunal condene o patrão a pagar os suplementos que paga aos outros trabalhadores residentes, sem dizer em que é que esse pedido se traduz e se concretiza? Sem dizer a que suplementos se refere, qual a categoria dos beneficiados, a analogia de funções e qual o serviço dos beneficiários desses suplementos, partindo do facto comprovado de que a Ré pagou? Aceitar-se-ia que a parte trabalhadora pedisse ao tribunal que condenasse a pagar-lhe os salários em dívida pelo período por que perdurou a relação laboral sem os especificar?
  A factualidade em que vai radicar o pedido mostra-se crucial.
  Como salienta Alberto dos Reis, “… não pode ligar-se maior importância à formulação do pedido, do que à exposição dos fundamentos de facto. Que a menção das razões de direito ocupe lugar secundário, já o assinalámos; mas que a narração dos fundamentos de facto possa relegar-se para plano inferior ao da enunciação do pedido é proposição que temos por inexacta. O êxito da acção tanto depende da correcção do pedido, como da pertinência e suficiência dos fundamentos de facto; o advogado não tem que pôr maior cuidado na formulação do pedido, do que na apresentação do aspecto de facto da acção.”3
  A insuficiência que se assinala, neste caso, perpassa até pelos dois vectores: narração e pedido. Não dizendo quais esses suplementos remuneratórios ou abonatórios, os termos e qualidade dos destinatários das bonificações ou remunerações adicionais que pagou a todos os trabalhadores residentes (art. 13 dos factos), está bem de ver que o pedido formulado fica necessariamente inquinado.
  A questão que se equaciona estará essencialmente dependente da admissibilidade da formulação de pedidos genéricos, enquadrada no art. 392º do CPC.
  Não se estando perante um caso de universalidade (al.a) do n.º1); não se estando perante um caso de impossibilidade de determinação, de modo definitivo, das consequências do facto ilícito, nem se configurando uma situação prevista no art. 563º do CC (al. b) do n.º1); nem estando a fixação do quantitativo dependente da prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo réu – pelo menos nada se requer nesse sentido – (al. c) do n.º 1) parece não ser aceitável o pedido nos termos em que o foi na acção.
  Nesta conformidade, por falta de pedido certo e concreto, ao abrigo do disposto nos artigos 139º, n.º 1 e n.º 2, al. a) e 230º, n.º 1, al. b) do CPC, absolver-se-á a Ré da instância, por se tratar de um pressuposto processual inominado,4 o que impede a apreciação de mérito, não se sufragando aqui o entendimento que configura o caso como de improcedência do pedido.5
  Esta insuficiência da petição mereceria, desde logo, um convite ao aperfeiçoamento, em tempo oportuno, a fim de evitar um desfecho do teor acima contemplado.6”
É de manter a posição já assumida, pelo que o recurso não deixará de se julgar provido nesta parte.
C. Do recurso final do Autor:
1. Da compensação de descanso semanal e dos feriados obrigatórios:
O recurso não deixará de se julgar provido nesta parte face à jurisprudência unânime deste TSI já citada anteriormente.
Assim, a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido.
Em relação aos feriados obrigatórios, a fórmula é a seguinte: Nºs de dias não gozados X salário diário X 3, para além do salário-base já recebido.
2. Da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário:
Ficou provado que por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno e durante esses 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais.
Serão que esses 30 minutos também contam para o efeito do cômputo da compensação de horas extraordinárias?
Nos termos do nº 4 do artº 10º do DL nº 24/89/M, o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados não é contado para efeitos da prestação das horas extraordinárias, desde que no seu conjunto não ultrapassem a duração de trinta minutos diários.
Assim, num primeiro momento e na letra da lei, parece que os referidos 30 minutos não devam ser considerados como horas extraordinárias de trabalho.
Salvo o devido respeito, achamos que a resposta não é tão linear.
Para nós, o legislador prevê simplesmente uma situação de tolerância de 30 minutos para os casos ocasionais de necessidade à preparação para o início do trabalho ou à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados, não tendo portanto qualquer intenção legislativa no sentido de permitir a entidade patronal a transformar como regra, exigindo o trabalhador a comparecer no local de trabalho sempre com antecedência de 30 minutos em todos os dias de trabalho, que é o caso.
Nesta conformidade, esses 30 minutos devem ser contados para o cômputo da compensação da prestação de trabalho em horas extraordinárias.
*
Porém, pelas razões já acima expendidas e na falta de determinação dos dias de serviço efectivo – tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas -, somos a considerar que importa apurar os dias de trabalho efectivo para determinar o quantum compensatório, tanto para descanso semanais e feriados obrigatórios, como para as horas extraordinárias.
*
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em:
1. não admitir o recurso interlocutório interposto pela Ré.
2. conceder parcial provimento ao recurso final interposto pela Ré, decidindo-se:
a) anular parcialmente o julgamento de facto de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
b) julgar procedente o recurso, revogando-se o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas e, em consequência, absolver a Ré da instância nessa parte;
c) julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
3. conceder provimento ao recurso final do Autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a Ré ao pagamento das horas extraordinárias, incluindo os 30 minutos de trabalho para além do período normal diário, bem como ao acatamento das fórmulas acima referidas, no tocante aos dias de trabalho prestado em dias de descanso semanal e aos feriados obrigatórios, quantum, em conformidade com o que vier a ser decidido após a repetição parcial do julgamento, nos termos acima definidos.
*
  Vai a Ré ainda condenada nos juros de mora nos termos definidos no Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010.
Custas dos recursos finais pelas partes em função do decaimento.
Notifique e D.N..
*
RAEM, aos 07 de Dezembro de 2017.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong (com declaração de voto que se segue)



落敗聲明

針對合議庭裁判中關於周假日的補償問題,根據《勞資關係法律制度》(第24/89/M號法令)第17條第6款a項的規定,在每周休息日提供工作的工作者,雇主須向其支付平常報酬的雙倍,而所謂“報酬的雙倍”,應理解為本身日工資加上另一日的補償。另外,根據《勞資關係法律制度》第17條第4款的規定,如在每周休息日提供工作,工作者亦有權享受一天補假。

至於強制性假日的補償方面,根據《勞資關係法律制度》第19條第3款及20條第1款的規定,如在強制性假日提供工作,除了本身的日工資外,工作者亦有權收取不少於兩倍平常報酬的補充工資。

合議庭大多數意見認為工作者在周假日提供工作,除了本身的日工資外,還有權多收取兩天的工資補償,同時亦有權享受一天補假,換言之,如工作者在上述假日提供工作,變相有權收取“四工”。

合議庭大多數意見認為同時認為在強制性假日提供工作,除了本身的日工資外,還有權多收取三天的工資補償,換言之,如工作者在上述假日提供工作,變相有權收取“四工”。

通過以下例子相信比較容易理解:
按照合議庭大多數意見的理解,假設工作者的每月收入為9000元,如其在周假日提供工作而沒有享受補假,或者在強制性假日提供工作,除了每月的固定月薪外,工作者還可向雇主要求支付900元的補償(日計,300元x3)。

在充分尊重不同見解的情況下,本人認為根據法律規定,工作者在周假日提供工作而沒有享受補假或在強制性假日提供工作,僅有權收取“三工”(當中包含本身的日工資),而並非除了本身原有的工資外,可再收取“三工”,因為後者變相讓工作者收取“四工”。

引用上述例子,假設工作者的每月收入為9000元,如其在周假日提供工作,本人認為他有權多收取一天工資即300元及享受一天補假,但倘若雇主不讓他享受補假,則工作者有權在提供工作後多收取兩天工資即600元的補償,即是所謂的“三工”(本身日工資+一天工資補償+一天補假);如在強制性假日提供工作,本人認為工作者有權多收取不少於兩倍平常報酬的補充工資即600元,即是所謂的“三工” (本身日工資+兩天工資補償)。

有見及此,本人不同意合議庭裁判中對周假日及強制性假日工作所定出的賠償金,因此作出本落敗聲明。

唐曉峰
07.12.2017
1 Na linha de uma interpretação pioneira de Alberto dos Reis, CPC Anot, V, 71
2 Os Acs. do TSI, de 30/10/2014, Proc. nº 396/2014; de 23/10/2014, Proc. nº 338/2014; de 27/11/2014, Proc. nº 654/2014.
3 CPC Anot, II, Reim. 2005, 363

4 Ac. STJ, de 8/2/1994, CJ, Acs STJ 1994, 1º tomo, 95; Ac. do STJ, de 22/3/2007, Proc. n. 06S3961; Ac. RP, de 15/5/2006, Proc. n.º 0545375; Ac RC, de 30/1/2001, Proc. n.º 2183/2000. No mesmo sentido, Abrantes Geraldes, Temas da Ref…, Almedina, 1997, 155 e 156 e Viriato Lima, Manual de DPC, CFJJ, 2005, 145

5 Alberto dos Reis, Com., 3º vol., 186 e 187

6 Vd. autores e jurisprudência acima citada
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718/2017