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Proc. nº 626/2016
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 30 de Novembro de 2017
Descritores:
- Contrato de Concessão
- Caducidade
- Fundamentação por remissão
- Acto de execução
- Delegação de poderes
- Audiência de interessados

SUMÁRIO:

I. Quando o acto é um simples “concordo”, tanto a sua fundamentação, como a sua dispositividade, são aquelas que constam da informação, do parecer ou da proposta sobre que ele recai.

II. O acto de execução do acto administrativo que declara a caducidade da concessão, sem que se interponham novos elementos relevantes em relação ao acto declarativo, não carece de ser precedido da audiência de interessados.

III. Não precisa de ser feita menção à delegação de poderes no acto do Secretário do Governo que procede à execução do acto declarativo da caducidade do Chefe do Executivo desde que este tenha sido objecto de publicação no Boletim Oficial, face ao disposto no art. 113º, nº 3, do CPA.

IV. Não há lugar a audiência de interessados se não houver instrução e se, sem novos elementos, o acto que manda despejar o concessionário do terreno ocupado se limita a dar execução ao acto que declara a caducidade da concessão.

Proc. nº 626/2016

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I - Relatório
A “A, Limitada”, em chinês A有限公司 , com sede em Macau, Avenida XX, n.º XX, XX Comercial Central, XXº andar XX, recorre contenciosamente para este Tribunal de Segunda Instância ----
Do despacho de 14 de Julho de 2016 proferido pelo Secretário para os Transportes e Obras Públicas na proposta n.º 283/DSODEP/2016, que ordenou a desocupação no prazo de 60 dias do terreno situado na Estrada Marginal da Ilha Verde, na sequência do despacho do Chefe do Executivo de 21/03/2016, que tinha declarado a caducidade da concessão do referido terreno.
Na petição inicial a recorrente formulou as seguintes conclusões:
“1. O acto recorrido a que respeita o presente recurso contencioso é o despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 14 de Julho de 2016 exarado na proposta n.º 283/DSODEP/2016.
2. O referido acto administrativo produziu efeitos externos contra a recorrente, bem como efeitos lesivos dos interesses desta.
3. Nos termos do art.º 179.º, n.º 1 da Lei de Terras, o despejo é ordenado por despacho do Chefe do Executivo.
4. O Secretário para os Transportes e Obras Públicas só tem competência para ordenar o despejo quando seja lhe delegado o poder pelo Chefe do Executivo.
5. No acto recorrido, a entidade recorrida não mencionou se foi lhe delegado o poder pelo Chefe do Executivo.
6. Se a entidade recorrida praticasse, na falta de delegação de poderes do Chefe do Executivo, o acto para qual é apenas competente o Chefe do Executivo nos termos legais, o acto recorrido incorreu no vício de incompetência e é anulável.
7. O acto recorrido pode ser qualificado como acto de homologação, quer dizer, a entidade recorrida apenas proferiu despacho na proposta n.º 283/DSODEP/2016 homologando o seu conteúdo, pelo que a proposta é a fundamentação do acto recorrido.
8. O acto recorrido exigiu que a recorrente se desocupasse do terreno no prazo de 60 dias a contar da recepção da notificação, ou seja impôs deveres à recorrente, sendo a autoridade administrativa obrigada a fundamentar o seu acto.
9. O art.º 179.º da Lei de Terras não fixa um prazo para a desocupação do terreno, e no ponto 5.4 da proposta em causa, limitou-se a dizer que o Chefe do Executivo podia ordenar o despejo do concessionário do terreno cuja concessão já foi declarada caduca no prazo fixado.
10. Mas a proposta não explicou o critério segundo qual o prazo de despejo foi fixado em 60 dias.
11. Perante terrenos diferentes, pode ser diversa a duração do prazo de despejo, e será prejudicado, sem dúvida, o interesse da recorrente se esta não consegue saber o critério da fixação do prazo.
12. A autoridade administrativa não explicou concretamente qual o motivo que a levou a fixar o prazo em 60 dias, pelo que o acto administrativa deve ser considerado não fundamentado e é anulável.
13. Nos termos do art.º 93.º, n.º 1 do CPA, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final.
14. Tem a recorrente o direito de pronunciar-se sobre a decisão e o prazo de despejo, de forma a defender os seus interesses.
15. A supracitada situação não é enquadrável nos casos previstos nos art.ºs 96.º e 97.º do CPA, em que não há lugar ou pode ser dispensada a audiência dos interessados.
16. É anulável o acto recorrido por falta da audiência dos interessados.”
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Na sua contestação, a entidade recorrida apresentou as seguintes conclusões:
“1.ª - O objecto do presente recurso contencioso é o despacho de “concordo” do STOP, de 14 de Julho de 2016, exarado na proposta n.º 283/DSODEP/2016, de 11 de Julho de 2016, que ao abrigo do disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras) e nos artigos 55.º e 56.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto, ordenou à Recorrente o despejo/desocupação do terreno dos autos;
2.a - Alega a Recorrente que o acto recorrido padece do vício de incompetência por falta de competência do órgão que o praticou (STOP), sendo por isso anulável;
3.a - Contudo, o acto do STOP que ordenou a desocupação do terreno vai colher fundamento na delegação de competências executivas efectuada pelo Chefe do Executivo no STOP através da Ordem Executiva n.º 113/2014;
4.a - Com efeito pela Ordem Executiva n.º 113/2014, o Chefe do Executivo delegou todas as competências em relação a todos os assuntos respeitantes à DSSOPT (cfr. artigo 6.º e Anexo VI do Regulamento Administrativo n.º 6/1999);
5.a - A delegação de poderes ali efectuada engloba a matéria da desocupação dos terrenos do Estado, afecta à DSSOPT e em relação à qual aquela ordem executiva não estabelece qualquer reserva;
6.a - Embora o órgão delegado deva nos termos do artigo 40.º do CPA, mencionar essa qualidade para efeitos de determinar os meios de reacção que contra os seus actos podem ser usados, no caso sub judice a Ordem Executiva n.º 113/2014 foi publicada no Boletim Oficial, portanto estava dispensada a menção da delegação de poderes;
7.ª - Assim, nos termos do preceituado no n.º 1 da Ordem Executiva n.º 113/2014 em conjugação com o estipulado no artigo 6.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999, não se verifica a alegada incompetência do STOP para a prática do acto recorrido;
8.a - As razões de facto e de direito da ordem de desocupação ora posta em crise fundam-se na declaração de caducidade da concessão, ao abrigo do disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013;
9.a - Os motivos da ordem de desocupação encontram-se explicitados de forma acessível e coerente na informação n.º 283/DSODEP/2016, de 11 de Julho de 2016, e no ofício de notificação n.º 0703/904.03/DSODEP/2016, de 20 de Julho de 2016;
10.ª - O prazo concedido para a desocupação é mais longo que o previsto na lei que é de 45 dias, conforme resulta das disposições conjugadas do n.º 2 do artigo 179.º da Lei de terras com o n.º 2 do artigo 55.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto;
11.ª - Os fundamentos apresentados para a ordem de desocupação/despejo não são ambíguos, contraditórios ou insuficientes, pelo que não se verifica o alegado vício de forma por falta de fundamentação;
12.ª - O acto impugnado não enferma do assacado vício de forma por preterição da audiência prévia, porquanto é evidente que não havia que cumprir essa formalidade;
13.ª - Desde logo porque tendo o acto recorrido assentado na emissão do acto que declarou a caducidade da concessão pelo decurso do prazo, a ser necessário ouvir a Recorrente teria que ser antes de proferido o acto do Chefe do Executivo, de 21 de Março de 2016, que declarou a caducidade da concessão do terreno ora em questão;
14.ª - Por outro lado, não se pode perder de vista que in casu está em causa uma caducidade preclusiva, com efeitos meramente declarativos que operam automaticamente como consequência do decurso do prazo máximo de 25 anos, não se vendo por isso que outros elementos poderia a Recorrente trazer que conseguissem influir numa conformação para mais do prazo estabelecido pela própria lei e pelo contrato;
15.ª - Se relativamente ao acto que declarou a caducidade da concessão pelo decurso do seu prazo não havia que cumprir a formalidade da audiência prévia, por maioria de razão essa formalidade se mostrava desnecessária e inútil no tocante ao acto recorrido;
16.ª - Caso se entenda que na situação vertente deveria ter sido realizada a audiência prévia relativamente ao acto que ordenou a desocupação do terreno, não podemos perder de vista que o acto em crise (despacho do STOP a ordenar a desocupação do terreno), face ao estipulado na alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013, era o único concretamente possível;
17.ª - Pelo que tendo a Entidade Recorrida actuado de forma estritamente vinculada e no estrito cumprimento da legislação em vigor, certo é que, em homenagem ao princípio do aproveitamento dos actos, mesmo que alguma omissão tivesse havido, sempre a mesma se teria degradado em mera irregularidade não invalidante;
18.ª - Assim, não se verificam quaisquer dos vícios alegados pela Recorrente que possam fundamentar a declaração de nulidade ou a anulação do acto recorrido.
Nestes termos e nos melhores de direito, com o Douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser considerado improcedente, por não verificação de quaisquer dos alegados vícios, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.”
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Na sua alegação facultativa, a recorrente reiterou no essencial a posição assumida na petição inicial e a entidade recorrida ofereceu o merecimento dos autos.
*
O digno Magistrado do MP emitiu o seguinte parecer:
“Constitui objecto do presente recurso contencioso o despacho de 14 de Julho de 2016, da autoria do Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que ordenou o despejo da recorrente do terreno situado na Estrada XX, com a área de 4.440 m2, cuja concessão fora objecto de declaração de caducidade mediante despacho de 21 de Março de 2016, da autoria de Sua Excelência o Chefe do Executivo.
A recorrente, “A, Limitada”, imputa ao acto os vícios de incompetência, falta de fundamentação e falta de audiência.
Por seu turno, a autoridade recorrida assevera a legalidade do acto.
Vejamos.
Começa a recorrente por sustentar que o acto padece do vício de incompetência, entendendo que a competência para a ordem de despejo pertence ao Chefe do Executivo, que a não teria delegado, pelo que o Secretário para os Transportes e Obras Públicas não estava habilitado a ordenar o questionado despejo.
Não tem razão.
É verdade que, havendo declaração de caducidade da concessão, a Lei de Terras comete ao Chefe do Executivo a competência para ordenar o despejo do concessionário - artigo 179.º, n.º 1, alínea 1). Mas trata-se de competência delegável e que foi objecto de delegação.
A lei de habilitação é o DL 85/84/M (artigo 3.º) e o instrumento de delegação é constituído pela Ordem Executiva 11312014, que se encontra publicada no Boletim Oficial de 20.12.2014, I Série, Número Extraordinário.
Neste caso, o artigo 113.º, n.º 3, do Código do Procedimento Administrativo dispensa a obrigatoriedade de menção, no acto, da delegação de poderes.
Soçobra o arguido vício de incompetência.
Argumenta, em seguida, que o acto está viciado por não se encontrar fundamentado, pois concedeu-lhe um prazo de 60 dias para o despejo e não explica a razão de lhe ter concedido esse prazo e não outro.
Também aqui não lhe assiste razão.
O artigo 179.º, n.º 3, da Lei de Terras dispõe que o despejo se processa nos termos e com as necessárias adaptações do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto. Este diploma prevê, no seu artigo 55.º, um prazo certo para se efectivar o despejo, que é de 45 dias. Estando previsto em lei o prazo concreto a observar, como sucede, o que tem a Administração que fundamentar? Nada. No caso, até aconteceu que a Administração concedeu um prazo superior ao previsto legalmente. Não saiu afectado qualquer direito ou interesse da recorrente. Nada havia a fundamentar.
Improcede também este vício.
Por fim, afirma a recorrente que o acto preteriu a formalidade de audiência prévia.
Crê-se que, no caso, a formalidade não era exigível, pelo que não lhe assistirá razão.
Estamos perante um acto de execução do despacho que declarou a caducidade da concessão. Posto que este acto de execução seja recorrível - não foi, aliás, suscitada qualquer questão quanto a isso, trata-se de um acto situado a jusante da decisão principal, mas que faz parte do mesmo procedimento e constitui uma decorrência normal daquela decisão. É relativamente a essa decisão principal, que se seguiu à fase procedimental da instrução, que pode fazer sentido invocar a necessidade e acuidade da exercitação da audiência prévia. Não quanto ao despejo que, como se referiu, é uma decorrência normal daquela decisão sobre a caducidade. Aliás, mesmo que, em tese, se equacionasse um exercício de autonomização do procedimento de execução, nem assim se imporia a audição, já que não houve uma fase de instrução neste “novo” procedimento - cf. artigo 93.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.
Improcede igualmente o vício de forma por preterição da audiência.
Ante o exposto, improcedem todos os vícios suscitados, indo o nosso parecer no sentido do não provimento do recurso.”
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - No dia 21/03/2016 o Chefe do Executivo da RAEM declarou a caducidade do terreno concedido à ora recorrente com a área de 4 440 m2, sito na península de Macau, na Estrada Marginal da Ilha Verde, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2XXX4 a fls. XX, do livro BXX1, no âmbito do Processo nº 12/2016 da Comissão de Terras com fundamento no decurso do prazo geral da concessão, que terminava em 17/05/2015.
2 - No dia 11/07/2016, foi emitida a Proposta nº 283/DSOPEP/2016, com o seguinte teor:
«Assunto: Respeitante ao despejo do terreno dado que foi declarada a caducidade da respectiva concessão, por despacho do Chefe do Executivo de 21 de Março de 2016. (Proc n.º 904.03)
Proposta n.º: 283/DSODEP/2016
Data: 11/07/2016
1. De acordo com o Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 20 de Maio de 2016, exarado na Proposta n.º 187/DSODEP/2016, “aguarda pela notificação à concessionária da declaração da caducidade”, assim: só se pode proceder ao seguimento de despejo do terreno quando a concessionária ter recebido a respectiva notificação. (anexo 1)
2. Em 12 de Maio de2016, a concessionária «A, Limitada» e o credor hipotecário «Banco B, S.A.», receberam as notificações da declaração da caducidade da concessão do terreno com a área de 4440 m2, situado na península de Macau, na Estrada XX. Entretanto, foi publicada no Boletim Oficial a declaração da caducidade. Assim sendo, actualmente, estão reunidas as condições para acompanhar o despejo do terreno por parte da concessionária. (anexo 2)
3. Pelo Despacho do Chefe do Executivo, de 21 de Março de 2016, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 4440 m2, situado na península de Macau, na Estrada XX, descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º 2XXX4 a fls. XX do livro BXX1, a que se refere o Processo n.º 12/2016 da Comissão de Terras, pelo decurso do seu prazo, nos termos e fundamentos do parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 3 de Março de 2016, os quais fazem parte integrante do referido despacho.
4. A declaração de caducidade da concessão acima referida foi publicada, por despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 24/2016, no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 18, II Série, de 4 de Maio de 2016, e que foram notificadas à concessionária «A, Limitada» e ao credor hipotecário «Banco B, S.A.», respectivamente, através dos ofícios n.ºs 200/DAT/2016 e 201/DAT/2016 de 6 de Maio de 2016.
5. Enfrentando o seguimento da caducidade de concessão, deve se considerar o seguinte:
5.1. Nos termos do artigo 117.º e do n.º 1 do artigo 136.º do «Código do Procedimento Administrativo» (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M de 11 de Outubro, o acto administrativo produz os seus efeitos desde a data em que for praticado e é executório logo que eficaz, não obstando à perfeição do mesmo por qualquer motivo determinante de anulabilidade, salvo os actos previstos no artigo 137.º do mesmo Código;
5.2. Por outro lado, ao abrigo das disposições do artigo 22.º do CPA, o recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido;
5.3. Assim sendo, quer os interessados em apreço interponham o recurso contencioso quer não, o acto administrativo feito pelo Chefe do Executivo pode ser executado;
5.4. Então, de acordo com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de terras» e com o artigo 55.º do Decreto-Lei 79/85/M «Regulamento Geral da Construção Urbana»1 (RGCU), o Chefe do Executivo pode ordenar no prazo determinado, o despejo da concessionária do terreno cuja concessão foi declarada caduca;
5.5. Além disso, quando a concessionária não abandone o terreno no prazo determinado, o referido despejo pode ser realizado pela DSSOPT segundo o artigo 56.º do RGCU.
5.6. Os objectos, materiais e equipamentos abandonados no terreno serão tratados de acordo com as disposições do artigo 210.º da «Lei de terras».
6. Em face do exposto, em conformidade com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da «Lei de terras» e com os artigos 55.º e 56.º do RGCU, submete-se a presente proposta à consideração da V. Ex.ª, a fim de:
6.1. Ordenar, no prazo de 60 dias a contar da data da notificação, o despejo da concessionária «A, Limitada» do terreno com a área de 4 440 m2, situado na península de Macau, na Estrada XX, descrito na CRP sob o n.º 2XXX4 a fls. XX do livro BXX1, uma vez que foi declarada a caducidade da respectiva concessão por despacho elo Chefe do Executivo de 21 de Março de 2016;
Caso não se execute no prazo de 60 dias,
6.2. Executar coercivamente o despejo de acordo com o artigo 56.º do RGCU.
À consideração superior.
O Técnico Superior,

3 - O Subdirector propôs que fosse dado seguimento à referida proposta, no que foi acompanhado pelo Director (fls. 8).
4 - O Secretário para as Obras Públicas e Transportes, em 14/07/2016, proferiu o seguinte despacho:
“Concordo” (loc. cit.).
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IV – O Direito
1 – A recorrente imputa ao acto os seguintes vícios:
- Incompetência do autor do acto impugnado;
- Vício de forma por falta de fundamentação do acto;
- Vício de forma por omissão de audiência prévia.
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2 – Do vício de incompetência
Defende a recorrente que o Secretário para os Transportes e Obras Públicas não dispunha de competência para decretar o despejo, pois essa é uma competência que, nos termos do art. 179º, nº1, da Lei nº 10/2013 (Lei de Terras), cabe ao Chefe do Executivo.
Está equivocada. Se efectivamente a competência primária para ordenar o despejo pertence ao Chefe o Executivo (art. 179º, nº1, da Lei de Terras). Mas, não tendo a lei estabelecido que o exercício dessa competência não podia ser delegado, nenhum obstáculo existia a que o Chefe do Executivo o delegasse no Secretário do Governo (art.37º, nºs 1 e 2 do CPA).
E essa delegação existe, conforme Ordem Executiva nº 113/2014, publicada no Boletim Oficial de Macau, I série, de 20/12/2014, com base no disposto nos arts. 15º, da Lei nº 2/1999 e 3º do DL nº 85/84/M, de 11 de Agosto (Lei de habilitação).
É certo que o acto não alude à existência da delegação. Contudo, precisamente em virtude da referida publicação, é dispensada a menção dessa delegação (cfr. art. 113º, nºs1, al. b) e 3, do CPA).
Improcede, pois, este fundamento do recurso.
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3 – Do vício de forma por fala da fundamentação
Sustenta a recorrente que o acto não fundamenta a razão pela qual foi concedido o prazo de 60 dias.
O acto é um simples “Concordo”. Mas, como é bom de ver, a fundamentação do acto administrativo, neste caso, é a fundamentação que consta da Proposta nº 283/DSOPEP/2016 acima transcrita. É a chamada fundamentação por remissão, expressamente prevista no art. 115º do CPA, caso em que tanto a sua fundamentação, como a sua dispositividade, são aquelas que constam da informação, do parecer ou da proposta sobre que ele recai.
Ora, o despejo do concessionário, segundo o que o prevê o art. 179º, nº2, da Lei de Terras processa-se nos termos do art. 79/85/M, de 21 de Agosto. E este diploma estabelece que o despejo será efectuado administrativamente, no prazo de 45 dias a contar da respectiva notificação.
Ora, o prazo concedido de 60 dias ultrapassou o prazo legalmente previsto (não parece que a lei proíba a fixação de prazo maior: neste sentido, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Código de Procedimento Administrativo, 2ª ed., pág. 366). Sendo “favorável”, portanto, aos interesses da recorrente, nem mereceria fundamentação justificativa do prazo, nem faria esperar a presente impugnação.
De qualquer maneira, mesmo que se entenda que o prazo de 45 dias não se aplica ao caso vertente, uma vez que o art. 179º, nº2 citado apenas manda que o despejo seja “processado” de acordo com o disposto nos arts. 55º e 56º do DL nº 79/85/M (“processamento” que excluiria a matéria da fixação dos prazos), nem por isso se acha que o vício merece proceder.
É que se tem que considerar que a fixação do prazo tem implícita uma ideia de suficiência. Quando um órgão determina um prazo fá-lo por lhe parecer ser suficiente para que o administrado o possa cumprir. Impondo um prazo certo, quando se supõe que é curto para cumprir o dever que impende sobre o particular, então o acto poderá padecer de desrazoabilidade ou desproporcionalidade. E esse será outro fundamento invocável pelo recorrente, que aqui, porém, não suscitou.
Improcede, pois, o recurso quanto a esta alegada causa invalidante.
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4 – Do vício de forma por falta de audiência de interessados
Defende, por fim, a recorrente que deveria ter havido audiência de interessados, por assim o impor o art. 93º do CPA.
Vejamos.
“ (…) Estamos perante um acto de execução do despacho que declarou a caducidade da concessão. (…), trata-se de um acto situado a jusante da decisão principal, mas que faz parte do mesmo procedimento e constitui uma decorrência normal daquela decisão. É relativamente a essa decisão principal, que se seguiu à fase procedimental da instrução, que pode fazer sentido invocar a necessidade e acuidade da exercitação da audiência prévia. Não quanto ao despejo que, como se referiu, é uma decorrência normal daquela decisão sobre a caducidade.
Aliás, mesmo que, em tese, se equacionasse um exercício de autonomização do procedimento de execução, nem assim se imporia a audição, já que não houve uma fase de instrução neste “novo” procedimento - cf. artigo 93.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo”.
É correcto este entendimento. Com efeito, de acordo com o nº1, do art. 93º do CPA, a audiência prévia só tem lugar desde que haja lugar a instrução (“…concluída a instrução…”). E, neste caso, não houve instrução.
E não houve, por desnecessidade, porque a caducidade da concessão tinha sido declarada por despacho do Chefe do Executivo, sendo que apenas bastaria concretizar a dispositividade dessa decisão administrativa num acto de execução, como foi este do Secretário do Governo.
Não esqueçamos que o direito a ser ouvido deve ocorrer “…antes de ser tomada a decisão final…” (art. 93º, nº1, do CPA), do procedimento. E é também por tal motivo que este direito deve ser observado no procedimento de 1º grau, sendo que mesmo no 2º grau (i.é., impugnação administrativa) tal formalidade apenas deve ter lugar sempre que haja superveniência de novos elementos de facto que não tiverem podido ser levados à instrução do procedimento de 1º grau.
Ora, se é assim que pensamos, então do mesmo modo não se vê que tivesse havido imperiosa necessidade de ser cumprida esta formalidade na fase de execução do acto administrativo, uma vez que ele se destina a dar (con)sequência ao acto primário, ou seja à “decisão final” do procedimento, salvo se houvesse alguns elementos novos que fosse preciso ponderar, o que não é o caso, uma vez que a Administração não faz mais do que cumprir a Lei de Terras no que a esta matéria concerne.
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 8 UC.
T.S.I., 30 de Novembro de 2017
_________________________ _________________________
José Cândido de Pinho Joaquim Teixeira de Sousa
_________________________ (Fui presente)
Tong Hio Fong
_________________________
Lai Kin Hong
1 Vide o n.º 2 do artigo 179.º da «Lei de terras».
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