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Processo n. 883/2017 (Recurso Laboral)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 7 de Dezembro de 2017
Descritores:
- Contrato de trabalho
- Salário
- Gorjetas
- Descanso semanal, anual, feriados obrigatórios

SUMÁRIO:

I. Ao abrigo do DL 24/89/M (art. 17º, n.1, 4 e 6, al. a), tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”); mas se nele prestar serviço terá direito ao dobro da retribuição (salário x2).

II. Se o trabalhador prestar serviço em feriados obrigatórios remunerados na vigência do DL 24/89/M, além do valor do salário recebido efectivamente pela prestação, terá direito a uma indemnização equivalente a mais dois de salário (salário médio diário x3).

Proc. nº 883/2017

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
A, casado, de nacionalidade nepalesa, residente habitualmente em Macau, na Rua de XX, Edifício “XX”, Bloco XX, XX andar “XX”, Taipa, titular do Passaporte da República Democrática Federal do Nepal nº 0XXXXX98 de 25 de Junho de 2012, emitido pela autoridade competente da República Democrática Federal do Nepal, instaurou no TJB (Proc. nº LB1-16-0112-LAC) acção de processo comum do trabalho contra: ----
1) B, (adiante, B), com sede na Avenida XX, Hotel XX, XX.º andar, Macau, ----
e
2) C, (adiante, C), com sede na Avenida XX, Hotel XX, XX.º andar, Macau.
Pediu que as rés fossem condenadas a pagar-lhe a importância total de MOP$618.610,00 (428.210,00 e 190.400,00, respectivamente), referente a compensação a título de subsídio de alimentação, de efectividade, de trabalho prestado em dias de descanso semanal, de feriado obrigatório remunerado, de bonificações e outras remunerações adicionais, incluindo gorjetas, de comparticipação no alojamento, trabalho extraordinário, em termos que aqui damos integralmente reproduzidos.
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Por despacho de fls. 202, o tribunal “a quo” admitiu a correcção requerida a fls. 170 pelo autor aos diversos erros de escrita que cometeu na petição inicial, essencialmente concernentes à indicação da moeda em que seriam considerados os valores do salário base mensal e do salário normal diário (erradamente referidos em patacas, quando foram em dólares de Hong kong), bem como da moeda em que devem ser consideradas as indemnizações peticionadas referentes ao descanso semanal, trabalho prestado em dias feriados, compensação por alojamento, trabalho extraordinário e pelos 30 minutos ao serviço da entidade patronal antes do início de cada período de trabalho, que devem ser consideradas em Hong kong e não em patacas.
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Deste despacho foi interposto recurso jurisdicional pelas rés, em cujas alegações formularam as seguintes conclusões:
“I - As Recorrentes não se conformam com o douto despacho proferido pelo Digno Tribunal a quo que admitiu o pedido de correcção de vários erros de escrita quanto aos valores pagos pelas Rés ao Autor a título de salário de base mensal (MOP$7.500,00) e de salário normal diário (MOP$250,00) de Patacas para Hong Kong Dólares.
II - Vem o Recorrido reclamar diversas quantias alegadamente devidas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, trabalho em dia de feriado, compensação por alojamento, trabalho prestado para além do período normal diário e 30 minutos de trabalho prestado para além do período normal diário alegando para tanto que auferia um salário de base mensal de MOP$7.500,00 e de um salário normal diário de MOP$250,00, facto que veio a ser dado por assente em sede de selecção de matéria de facto e vindo-o a fazer quando se encontrava já marcada data para a audiência de discussão e julgamento e a coberto de um lapso de escrita alegar que o salário era de HKD7,500.00 e não de MOP7,500.00, vindo assim, «nos termos do artigo 244º do Código Civil e do art. 217 nº 2 in fine do CPC, requerer a sua correcção, porquanto se trata de uma consequência do pedido primitivo (...)»
III - Mas aquilo que foi requerido pelo Recorrido carece por completo de fundamento legal, já que resulta do preceituado no artigo 244º do Código Civil que «O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta.» e por sua vez, do art. 217º, nº 2 do CPC que: “O pedido pode também ser alterado ou ampliado na réplica; pode, além disso, o autor, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em primeira instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.”
IV - Ora, do que vem declarado pelo Recorrido no seu requerimento ou dos seus articulados anteriores, mormente da petição inicial não resulta que se trate de um erro de escrita ou de cálculo, pois o Recorrido sempre foi muito claro em alegar e calcular todas as parcelas do seu pedido em Patacas, não se referindo nunca a Dólares de Hong Kong.
V - É consabido que a lei permite apenas e tão só que sejam rectificados a todo o tempo os erros materiais que se mostrem ostensivos...e nada mais do que isso, e é pacífico que, a existir um lapso manifesto, tal erro só pode ser ratificado se for ostensivo, evidente e devido a lapso manifesto, sendo necessário que ao ler-se o texto se veja de imediato o erro e que se entenda o que o interessado pretendia dizer, indo neste sentido Vaz Serra, in RLJ, 112º-6: “Este artigo admite a simples rectificação do erro de cálculo ou de escrita quando ele é ostensivo; exclui assim, a anulação do negócio. Mas se o erro não for ostensivo não é razoável que se sujeite a outra parte à mera rectificação de erro de que não poderia ter-se apercebido.” Sendo que os Tribunais da RAEM foram já chamados a discutir esta questão, tendo sido já decidido pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância que: «...a ampliação do pedido, afinal de contas, limitou-se a corrigir quantias indemnizatárias em consequência do valor da alteração do valor do salário diário (que já era conhecido do autor do autor desde o inicio da acção (…) A omissão destas quantias no articulado inicial decorre de culpa do autor da acção: logo sibi imputet. Podia ter formulado esta pedido desde logo, não o fez, nem agora justificou a tardia dedução, nem a impossibilidade da sua inclusão na petição inicial (…)» - neste sentido vide processo 613/2013 de 15.05.2014.
VI - No caso concreto parece evidente que a correcção que o Recorrido pretende não se trata de um mero erro de escrita, e muito menos que tal erro seja ostensivo, evidente e devido a lapso manifesto pois aquilo que o Recorrido pretende é, a despeito de um alegado erro de escrita, alterar a quantia indemnizatória reclamada nestes autos pretendendo fazer uma alteração do seu pedido, mas, como resulta do citado art. 217º, nº 2 do CPC, o pedido só pode ser alterado na réplica e como se sabe a alteração não é o mesmo que ampliação: na alteração do pedido, em vez de se pedir A, passa-se a pedir B; na ampliação do pedido em vez de se pedir A, passa-se a pedir A + B.
VII - E ainda que se tratasse de um requerimento de ampliação do pedido, o que legalmente é permitido até ao encerramento da discussão em primeira instância (art. 217º, nº 2 do CPC), a pretensão do Recorrido carece de qualquer fundamento legal porquanto não se trata de “desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo”, nem o Recorrido o fundamenta, pois, se o Recorrido pretendia alegar que auferia a quantia mensal de HK7.500.00 (em vez de o receber em patacas) e deduzir os seus pedidos com base nessa quantia, poderia e deveria tê-lo feito ab initio na sua petição inicial, não podendo admitir-se que o faça agora lançando mão de expedientes processuais a despeito de erros de escrita que, como se viu, não existem.
VIII - Não pode, por isso, o Recorrido vir desdizer aquilo que disse e sobre o qual as partes já tiveram oportunidade de se pronunciar e sobre matéria que foi já aceite pelas partes, sendo o que resulta do princípio da preclusão do processo civil já que a este propósito como bem lembra Manuel de Andrade, este princípio traduz-se no reconhecimento de que um processo contém ciclos processuais rígidos, com finalidades específicas e estanques entre si e por isso quando os actos não sejam praticados no ciclo próprio, ficam precludidos.
IX - Face a isto, o resultado processual está à vista, os factos em causa foram desde logo enquadrados na factualidade assente, com a alteração motivada sob o pretexto de se tratar de um lapso de escrita, as Recorrentes não tiveram, quanto a tal factualidade, os mesmos meios legais de defesa já que não é o mesmo poder fazer uma impugnação, seguida de um processo de instrução de prova, no âmbito da qual as Recorrentes poderiam tomar as diligências probatórias adequadas, do que resulta da decisão em crise, na qual se transforma factualidade assente em factualidade diferente, com agravamento económico e aumento material do pedido, e sem os mesmos meios conferidos às Rés, ora Recorrentes para realizar a sua defesa, pelo que e sempre com o devido respeito pelo Tribunal, as Recorrentes sentem-se enganadas pelo Recorrido, pelo meio utilizado para proceder a um agravamento ilegal e injustificado do seu pedido, com a violação dos princípios mais básicos e fundamentais das regras do processo.
X - E apesar de tudo isto, veio o Digno Tribunal a quo em despacho proferido em audiência admitir o requerido pelo Recorrido com a seguinte fundamentação:
“Admite-se a correcção requerida pelo Autor aos pedidos formulados na sua petição inicial convertendo-se os valores inicialmente apresentados em patacas e pelos agora concretizados em Hong Kong Dólares, o que se faz em coerência com os documentos juntos aos autos por força do princípio da economia processual, pois se assim se não fizesse previsivelmente teríamos o Juízo Laboral inundado de outras tantas acções, somente por força deste lapso, que assim se admite que seja reparado.”
XI - No mesmo despacho invoca o Meritíssimo Juiz a quo o princípio da economia processual e previsibilidade de o Juízo Laboral ser inundado por novas acção a serem intentadas pelo Recorrido mas tais fundamentos, com todo o respeito que é muito, não podem fundamentar a admissão do requerimento do Recorrido, por os mesmos serem contrários à lei e à justiça, já que o princípio da economia processual é um princípio de simplificação do processo, segundo o qual o processo deve obter o maior resultado com o mínimo de esforço mas sempre mantendo como mastro o princípio da legalidade e pelo direito do acesso à Justiça imparcial não podendo ser utilizado como desculpa ou fundamento de atropelo à lei.
XII - Note-se que no seu despacho o Meritíssimo Juiz a quo nem sequer se pronuncia sobre a legalidade do acto do Autor, ora Recorrido, pois o Tribunal faz tábua rasa da actuação ilegal do Recorrido e a coberto do princípio da economia processual admite um requerimento que é contrário à lei e que deveria ser sancionado pelo Tribunal através de um indeferimento liminar, por isso, sempre com todo o respeito, se considera que não pode o Tribunal usar o argumento “ (...) pois se assim se não fizesse previsivelmente teríamos o Juízo Laboral inundado de outras tantas acções (...) ” isto porque, ao afirmar isto o Tribunal a quo está a admitir que o procedimento do Recorrido é contrário á lei, por ser inoportuno, pois desse argumento decorre que admite que sendo o requerimento do Recorrido indeferido o Recorrido teria que voltar a usar o Tribunal para corrigir o seu erro.
XIII - Não pode também o Tribunal recorrer à previsibilidade de ver o Juízo Laboral inundado com outras acções, primeiro porque não pode o Tribunal adivinhar se irá ou não haver reacção do Autor, ora Recorrido, ao indeferimento do tribunal através da proposição de novas acções e em segundo porque, mesmo que haja reacção do Autor, não pode ser este um argumento para impedir agora a aplicação da lei e da justiça por parte do Tribunal ao sancionar o requerimento apresentado, motivo pelo qual, entende a Recorrente, sempre com todo o respeito repita-se, que enferma tal despacho do vício de erro na aplicação do Direito por violação, designadamente, do artigo 6º do Código de Processo Civil, devendo o mesmo ser revogado e substituído por outro que decrete o indeferimento do requerimento apresentado pelo Autor, ora Recorrido.
Assim, e nestes termos, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser considerado totalmente procedente, devendo o despacho proferido pelo Meritíssimo Juiz a quo ser revogado e substituído por outro que decrete o indeferimento do requerimento apresentado pelo Autor, ora Recorrido, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.”
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O recorrente não respondeu ao recurso.
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Foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e condenadas as rés em montantes já liquidados e outros que vieram a ser liquidados em execução de sentença, em termos que aqui damos por integralmente reproduzidos.
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Contra esta sentença foi interposto recurso jurisdicional pelo autor da acção, o qual concluiu as suas alegações nos seguintes termos:
“1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao ora Recorrente as quantias pelo mesmo reclamadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriados obrigatórios;
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de Direito quanto à concreta forma de cálculo devida pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e de feriado obrigatórios e, nesta medida, se mostra em violação ao disposto nos artigos 17.º, 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que atenda à totalidade dos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Em concreto,
3. Ao condenar ala Ré a pagar ao ora Recorrente apenas uma quantia em singelo pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal não gozado, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na medida em que de acordo com o referido preceito se deve entender que o mesmo trabalho deve antes ser remunerado em dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, acrescido de um outro dia de descanso compensatório, tal qual tem vindo a ser seguido pelo Tribunal de Segunda Instância;
Acresce que,
4. Contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, não parece correcto concluir que pela prestação de trabalho nos dias de feriados obrigatórios se deva proceder ao desconto do valor do salário em singelo já pago;
5. Pelo contrário, salvo melhor opinião, a fórmula correcta de remunerar o trabalho prestado em dia de feriado obrigatório nos termos do disposto no artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril - ainda que a determinar em sede de liquidação de execução de Sentença - será conceder ao Autor, ora Recorrente, um “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito” - o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal - conforme tem vindo a ser entendido pelo douto Tribunal de Segunda Instância.
Nestes termos e nos de mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituída por outra, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!”
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As rés responderam a este recurso, nos seguintes termos conclusivos:
“I. Veio o Recorrente no recurso a que ora se responde insurgir-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base na parte em que julgou parcialmente improcedente os pedidos deduzidos a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e de feriados obrigatórios, por entender que a tal decisão enferma de erro de direito quanto à concreta forma de cálculo das sobreditas compensações e nessa medida mostra-se em violação do preceituado nos artigos 17º, 19º, e 20º do Decreto-lei 24/89/M de 3 de Abril;
II. Quanto à forma de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apuramento da eventual compensação pelo trabalho em dias de descansos semanal e feriados obrigatórios nada há a apontar à decisão recorrida onde é feita uma correcta interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 17º, 19º e 20º do Decreto-lei 24/89/M de 3 de Abril;
III. Nos termos do preceituado no artigo 17º do Decreto-lei 24/89/M estando em causa o pagamento do trabalho em dia de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, tendo o Recorrente sido pago já em singelo, importa ter em conta esse salário já pago e pagar apenas o que falta (e não o dobro);
IV. A tese defendida pelo Recorrente nas suas doutas alegações subverte por completo a letra da lei e, a seguir-se tal tese, onde se lê que o trabalhador que aufira um salário mensal tem o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal quando prestem trabalho nos dias de descanso semanal, ler-se-ia que o pagamento em apreço deveria corresponder ao triplo da retribuição normal;
V. A decisão em recurso para além de encontrar total sustentação na letra da lei, encontra-a também na jurisprudência unânime do Tribunal de Última Instância de Macau, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007 e bem assim naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instancia em Acórdão de 29.03.2001 no processo 46/2001, para cuja fundamentação se remete;
VI. Se o trabalhador já recebeu a remuneração só terá de receber o “equivalente a 100% dessa mesma remuneração a acrescer ao salário já pago (neste sentido vide “Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau”, Miguel Pacheco Arruda Quental, pags. 283 e 284);
VII. Do mesmo modo de acordo com o nº 1 do artigo 20º do DL 24/89/M se o trabalhador prestar trabalho no dia de feriado obrigatório para além do salário que já recebeu em singelo, terá direito a uma compensação equivalente ao dobro desse salário e não ao triplo como pretende o Recorrente.
VIII. Aliás, neste sentido vai o Venerando Tribunal de Última Instância nas decisões proferidas nos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007 para cuja fundamentação se remete e de onde resulta claramente que tendo o trabalhador sido remunerado em singelo pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o mesmo só terá direito a auferir o dobro da sua retribuição;
IX. Assim, caso resulte provado que o Autor, ora Recorrente, tenha trabalhado em feriados obrigatórios e se for possível determinar o número de dias que prestou trabalho em dia de feriado - o que deveras se não concede -, tendo em conta que o Autor foi sempre remunerado pela sua prestação de trabalho em dias de feriados obrigatórios no valor de um dia de salário normal diário, o mesmo apenas teria direito a receber o dobro do salário normal diário por cada dia de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório.
Assim, e nestes termos, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso a que ora se responde ser considerado totalmente improcedente, assim se fazendo a costumada Justiça!”
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Também as rés da acção se inconformaram com a sentença, da qual recorreram nos termos das seguintes conclusões alegatórias:
“I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou, respectivamente, a 1.ª Ré e 2.ª Ré, ora Recorrentes, no pagamento de uma indemnização no valor global de MOP$327.632,50 e de MOP$168.386,25, a título de subsídio de alimentação, de subsídio de efectividade, de descanso semanais, de não gozo dos dias de descanso compensatório, de comparticipação no alojamento, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho, à qual acrescem juros moratórios à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório, e bem assim ao montante correspondente ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório e ao pagamento das bonificações ou remunerações adicionais incluindo as gorjetas pagas ao operários residentes, a liquidar em execução de sentença.
II. As Recorrentes vêm impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto porquanto da prova produzida em sede de julgamento nunca poderiam os quesitos levados à base instrutória ter sido provados pelo que estamos perante um claro erro de julgamento
III. No vertente processo, foi deferida a documentação das declarações prestadas na audiência de julgamento, existindo por isso suporte de gravação, o que permitirá ao douto Tribunal de Segunda Instância melhor avaliar, e decidir, sobre o ora invocado erro na apreciação da prova, aqui expressamente se requerendo a reapreciação da matéria de facto, nos termos admitidos no artigo 629.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1.º do Código de Processo do Trabalho.
IV. O depoimento da testemunha ouvida em julgamento e documentado em 10.01.2017 aos 27 minutos e 45 segundos até 29 minutos e 17 segundos da passagem gravada no cd 1 tradutor 1 excerto 9.54.37, dos 2 minutos ate final do cd 1 tradutor 1 excerto 10.29.35, do início até 5 minutos e 53 segundos no cd 1 tradutor 1 excerto 10.35.04 e aos 6 minutos e 50 segundos até 9 minutos e 6 segundos do cd 1 tradutor 1 excerto 10.35.04 é um depoimento genérico e parcial, sem que a mesma tenha conseguido concretizar se em relação ao Autor as coisas se passavam como se haviam passado em relação a si mesma, mais parecendo um verdadeiro depoimento de parte.
V. Não podendo deixar de se estranhar que a testemunha consiga com certeza dizer as datas de início e termo e os locais de trabalho, salários, horários, turnos, dos Autores cujos julgamentos tiveram lugar no dia 10 de Janeiro de 2017 e bem assim de tantos outros em que já depôs.
VI. Nunca poderia o Tribunal o quo ter dado como provado que o Autor não recebeu os subsídios a que alega ter direito, ou que nunca faltou sem conhecimento e autorização da 1.ª Ré, ou que aquele nunca gozou dias de descanso semanal ou se, a cada 21 dias, trabalhava 16 horas em cada período de 24, ou até que trabalhou em feriados obrigatório apenas com base no depoimento da testemunha e sem que dos documentos juntos aos autos nada resulta sobre os aludidos factos.
VII. Após reapreciação da prova efectuada em juízo por parte desse Venerando Tribunal da Segunda Instância deverá ser proferido douto Acórdão que julgue procedente o invocado vício de erro de julgamento ao dar por provados todos os quesitos da douta Base Instrutória, os quais serão de dar por não provados, e consequentemente serem as Recorrentes absolvidas dos pedidos por total ausência de prova.
VIII. A decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação sendo, consequentemente nula, nos termos do artigo 571.º, n.º 1, al. b), do CPC, por manter na íntegra as conclusões incoerentes aduzidas pelo Autor em sede de petição inicial, ficando por apurar diversas questões relacionadas como o facto de o Autor alegar que trabalhava todos os dias da semana mas reconhecer que faltou algumas vezes com autorização prévia das Rés, sem que se apure quantos dias foram, faltando-lhe concretizar os factos de onde retira tais conclusões.
IX. Da análise de decisão ora posta em crise e do elenco dos factos provados não consta o número de dias de trabalho efectivo que o Autor prestou, nem os dias de descanso que o Autor terá gozado, mas aquando do cálculo das compensações, o Tribunal a quo entende que o Autor trabalhou 2258 dias para a 1ª Ré e 1875 dias para a 2.ª Ré e que não gozou 300 dias de descanso semanal, sendo 6 dias de descanso semanal no período entre 18/10/1996 a 31/12/1996, 49 dias no ano 1997, 49 dias no ano 1998, 49 dias no ano 1999, 49 dias no ano 2000, 49 dias no ano de 2001 e 49 dias no ano de 2002, não se vislumbrando assim de onde retirou o Tribunal a quo as aludidas conclusões, o que necessariamente inquina a decisão do vicio de nulidade por falta de fundamentação.
X. Quanto ao subsídio de alimentação e de efectividade não são os mesmos devidos ao Autor.
XI. Por confrontação entre os valores mínimos prometidos por parte da entidade empregadora - e resultantes do contrato de prestação de serviços - e o montante salarial que o Autor alega que lhe foi pago, resulta evidente que este ficou com condições remuneratórias muito superiores às previstas no aludido contrato de prestação de serviços.
XII. Se as Recorrentes se tivessem limitado a cumprir com os mínimos a que se obrigaram, o Autor teria auferido um salário idêntico ao nível médio dos salários praticados para desempenho equivalente, num mínimo de $100,00 patacos diárias, acrescida de $20,00 patacos diárias por pessoa a título de subsídio de alimentação, ou seja, MOP$3,600.00 mensais, ao qual poderia acrescer um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço.
XIII. Mas a verdade é que o Autor alega que por força do contrato de trabalho que celebrou com as Rés auferiu mensalmente mais do dobro dos aludidos montantes, ficando assim devidamente cumpridas e verificadas as condições remuneratórias mínimas previstas no contrato de prestação de serviços.
XIV. A Justiça terá que ser encontrada por confrontação da remuneração global auferida pelo trabalhador tendo em consideração as duas vertentes contratuais - o contrato de prestação de serviços e o contrato individual de trabalho.
XV. Assim, tendo no caso concreto as ora Recorrentes efectivamente proporcionado ao Autor uma remuneração muito superior àquela a que se comprometeram por força do contrato de prestação de serviços, não se vislumbra em que medida se possa ter o referido contrato de prestação de serviços por violado e nem em que medida possa o Autor considerar-se prejudicado.
XVI. Ademais, uma interpretação parcelar dos contratos procurando retirar “O melhor dos dois mundos” não poderá deixar de se ter por abusiva e, consequentemente, ilegítima nos termos do artigo 326.º do Código Civil, conforme havia sido invocado em sede de contestação, donde nunca poderia proceder os pedidos formulados pelo Autor a título de subsídio de alimentação e de efectividade.
XVII. Sem conceder, sempre se diga que não se comprovou que entre 18 de Outubro de 1996 e 21 de Julho de 2003 o Autor tenha trabalhador 2258 dias para a 1.ª Ré, e que entre 22 de Julho de 2003 e 31 de Março de 2010 tenha trabalhado 1875 dias para a 2.ª Ré, pelo que nunca poderia as Recorrentes terem sido condenadas a pagar o subsídio de alimentação desses dias.
XVIII. O que se provou foi que durante o período em que o Autor prestou trabalho nunca deu qualquer falto ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés (cfr. resposta ao quesito 7.º), resultando assim assumido pelo Autor na sua petição que se gozou de vários períodos de dispensa ao trabalho remuneradas e/ou não remuneradas.
XIX. Ora, o direito invocado pelo Autor não se pode presumir como certo, e o Tribunal terá que apreciar com base nos factos alegados pelo Autor e conforme o Direito, o que não fez, sendo que a parca matéria fáctica alegada pelo Autor não poderia conduzir, sem mais, à procedência do pedido.
XX. O subsídio de alimentação, conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário (vide, entre outros, o acórdão proferido pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância em 13.04.2014 no processo 414/2012).
XXI. Para que houvesse condenação das Recorrentes no pagamento desta compensação deveria o Autor ter alegado e provado quantos foram os dias de trabalho efectivamente por si prestados, o que não sucedeu, estando, aliás, a decisão em contradição com a factualidade provada (cfr. resposta ao quesito 7.º).
XXII. Não tendo sido alegados, nem provados, os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado as Recorrentes nos termos em que o fez, padecendo assim a douto sentença, nesta parte, do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do pagamento de compensação a título de subsídio de alimentação ou, caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagar ao Recorrido a compensação a título de subsídio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 564.º do CPC.
XXIII. Quanto ao subsídio de efectividade, veio a apurar-se que o mesmo fazia parte do contrato de prestação de serviços 2/96 e ainda que o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés.
XXIV. Por definição e conforme resulta do aludido contrato de prestação de serviços, o subsídio de efectividade visa premiar a efectiva prestação do trabalho.
XXV. O Contrato de Prestação de Serviços é claro ao prever que o subsídio de efectividade pressupunha que “[…] no mês anterior não tenha dada qualquer falta ao serviço.”, sendo irrelevante que o trabalhador tenha faltado por motivo justificado ou mesmo sob autorização prévia, sendo que nos presentes autos não foi feita qualquer prova relativamente à assiduidade do Autor, não se tendo apurado quantos dias de trabalho efectivo ele prestou e nem quantas vezes faltou ao serviço.
XXVI. Pelo contrário resulta dos autos (e da matéria de facto provada) que o Autor deu faltas ao serviço, ainda que justificadas, não tendo porém sido tais faltas quantificadas.
XXVII. Não estava o Tribunal a quo em condições de concluir que em cada um dos meses em que durou a relação laboral, o Recorrido não deu faltas ao serviço por forma a concluir que tinha o mesmo direito a receber um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias.
XXVIII. Mais uma vez deixou a decisão recorrida escapar que o próprio Autor alega não ter trabalhado todos os dias.
XXIX. É insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permita ao Tribunal a qua sustentar a condenação das Recorrentes a pagar ao Recorrido qualquer montante a título de subsídio de efectividade, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagar ao Recorrido a compensação a título de subsídio de efectividade e de subsídio de alimentação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 564.º do CPC.
XXX. Da factualidade provada nada resulta quanto ao quantum e ao quando o Autor trabalhou para que se pudesse chegar à conclusão que o Autor tem direito a ser compensado por 300 dias de descansos semanais.
XXXI. Estando provadas as dispensas para o trabalho remuneradas, nunca poderia o Tribunal ter condenado a 1ª Recorrente a pagar ao Autor quantia equivalente a 300 dias de alegados descansos semanais “devidos e não gozados” a que alude o quadro de fls. 14 da sentença e respectivos descansos compensatórios.
XXXII. É que, não se provou, nem tão pouco se alegou, o número de dias concretos que o Autor trabalhou para se poder concluir pelo número de dias de descanso semanal que deixou de gozar.
XXXIII. Novamente se mostra insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permitisse ao Tribunal condenar a 1ª Recorrente pelo alegado trabalho prestado em dias de descanso semanal.
XXXIV. Verifica-se, assim, uma errada aplicação do Direito por parte do Tribunal a quo na condenação da 1ª Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e compensatório, em violação do princípio do dispositivo consagrado no artigo 5.º do CPC e bem assim o disposto nos artigos 17.º do DL 24/89/M.
XXXV. Devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a 1ª Recorrente do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente a condene a pagar ao Recorrido a compensação a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e descanso compensatório que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 564.º do CPC.
XXXVI. No que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas pela prestação de trabalho em regime de turno e trabalho extraordinário, à semelhança do ocorrido com os demais pedidos, o Recorrido limitou-se a invocar factos genéricos.
XXXVII. O Recorrido não especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias, não sendo por isso possível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de alegação do Autor, ora Recorrido e de prova em julgamento.
XXXVIII. E mais, se se comprovou que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) ou pedia dispensas, não se vislumbra como pôde o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que estava de turno e quantas horas extraordinárias foram feitas por dia, motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar as Recorrentes, em violação do artigo 5.º do CPC e do artigo 10.º do DL 24/89/M, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou caso assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se poderá conceder, que tão-somente condene as Recorrentes a pagar ao Recorrido a compensação que se venha a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n.º 2 do artigo 564.º do CPC.
XXXIX. Entendeu o Tribunal a quo que tendo em conta o ponto 3.3 do Contrato de prestação de Serviços 2/96 teria o Autor direito a receber da 1.ª Ré as bonificações ou remunerações adicionais incluindo gorjetas pagas aos operários residentes, a liquidar em execução de sentença.
XL. Do elenco dos factos provados não consta que a 1ª Recorrente tenha pago quaisquer bonificações adicionais ou gorjetas aos guardas de segurança residentes, pelo que, nunca poderia o Tribunal ter chegado a tal conclusão, indo muito além da matéria alegada, seleccionada e discutida em julgamento.
XLI. Com efeito, apenas resultou provado o teor da cláusula 3.3 do contrato de prestação de serviços 2/96 (cfr. resposta ao quesito 4º) e bem assim que entre 18/10/1996 e 21/07/2003 a 1ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas (cfr. resposta ao quesito 5º)
XLII. Não se provou - nem tão pouco se alegou - que foram pagas bonificações ou remunerações adicionais aos trabalhadores residentes pelo que não poderá a 1.ª Recorrente ser condenada a pagá-las ao Autor.
XLIII. Não resultou provado que a 1.ª Ré tenha pago quaisquer bonificações ou remunerações adicionais aos trabalhadores residentes em situação análoga do Autor, pelo que o pedido do Autor terá de se julgar improcedente (neste sentido vide Acórdão do TSI de 27.04.2017 no processo 167/2017).
XLIV. Nunca poderia o Tribunal ter condenado a 1.ª Recorrente ao pagamento das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas, por falta de preenchimento do requisito para tal, pelo que não poderá a 1.ª Recorrente senão ser absolvida do sobredito pedido.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. douta mente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em conformidade, deverá ser declarada nula a sentença recorrida nos termos nos termos do disposto no artigo 571º, n.º 1 al. b), ex vi do artigo 43º do CPT, com as demais consequências legais.
Sem prescindir, e caso assim não se entenda, deverá ser revogada a sentença recorrida nos termos supra explanados, com as demais consequências da lei,
Termos em que farão V. Exas. a costumada Justiça!”
*
Cumpre decidir.
***
II – Os Factos
A sentença deu por provada a seguinte factualidade:
«1) Entre 18 de Outubro de 1996 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (cfr. doc. 2). (A)
2) O Autor foi recrutado pela D, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96 (Cfr. doc. 3 e 4). (B)
3) Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (B) para a 2.a Ré (C), com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. Doc. 5). (C)
4) Desde 22/07/2003 o Autor começou a prestar serviço para a 2.ª Ré (C), como “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (D)
5) Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (E)
6) Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de Mop$7,500.00, a título de salário de base mensal. (F)
7) Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (G)
8) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (B) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h) (H)
9) Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “ (...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (1.º)
10) Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.º)
11) Durante o tempo em que o Autor prestou a sua actividade para a 1ª Ré não existiam cantinas e/ou refeitórios nos Casinos que eram operados pela 1ª Ré (B). (2.º-A)
12) Entre 22/07/2003 e Março de 2010, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.º)
13) Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, que “(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a Rés) paga aos operários residentes no Território”. (4.º)
14) Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (5.º)
15) Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “ (...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (6.º)
16) Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (7.º)
17) Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
18) Entre 22/07/2003 e Março de 2010, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.º)
19) Entre 18/10/1996 e 31/12/2002, a 1.ª Ré (B) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (10.º)
20) A 1.ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (11.º)
21) A 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (12.º)
22) A 1.ª Ré (B) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (13.º)
23) Entre 18/10/1996 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 1.ª Ré. (14.º)
24) A 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (15.º)
25) Entre 22/07/2003 e 31/12/2008 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 2.a Ré. (16.º)
26) A 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.º)
27) Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (18.º)
28) O referido desconto no salário do Autor era operada de forma automática e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela 1ª Ré. (18.º-A)
29) As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (19.º)
30) Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (20.º)
31) Entre o fim da prestação de trabalho no turno C (00h às 08h) e o início da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h), o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período total de 24 horas. (21.º)
32) Entre o fim da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h) e o início da prestação de trabalho no turno A (8h às 16h) o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período limitado de 24 horas. (22.º)»
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III – O Direito
A - Do recurso interlocutório interposto pelas rés
Está em causa o despacho de fls. 202, que deferiu o requerimento de correcção da petição em relação à moeda a ter em consideração na indicação de alguns dos montantes peticionados.
Ora, ao contrário do que este TSI já procedeu em casos semelhantes, entendemos agora que o recurso em apreço não pode ser admitido, na sequência da decisão do Ex.mo Presidente deste tribunal tomada no âmbito de uma reclamação deduzida precisamente com fundamento na não admissão de um recurso similar pelo juiz da 1ª instância. Referimo-nos à reclamação nº 46/2017/R e à respectiva decisão, datada de 13/11/2017.
Efectivamente, nos termos do art. 583º do CPC, a decisão impugnada não é desfavorável à recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal judicial de base, que, nos termos do art. 18º, nº1 da Lei de bases da Organização Judiciária, é de MOP$ 50.000,00.
Assim, sendo, não se conhecerá do recurso.
*
B - Do recurso da sentença interposto pelo autor
1 – Do trabalho prestado em dias de descanso semanal
Insurge-se o recorrente contra a fórmula de cálculo que o tribunal “a quo” utilizou para a compensação devida pelo serviço prestado pelo autor nos dias que deveriam ser de descanso semanal. O tribunal apenas conferiu ao autor um valor de salário em singelo, quando na opinião deste deveriam ser dois.
Tem razão o recorrente.
Sobre este assunto, tem este TSI vindo a decidir de forma insistente (v.g., ver os Acs. TSI de 15/05/2014, Proc. nº 61/2014, de 15/05/2014, Proc. nº 89/2014, de 29/05/2014, Proc. nº 627/2014; 29/01/2015, Proc. nº 713/2014; 4/02/2015, Proc. nº 956/2015; de 8/06/2016, Proc. nº 301/2016; de 6/07/2017, Proc. nº 405/2017) que a fórmula utilizada pelo TJB não é mais correcta.
Com efeito, no que a este assunto concerne, vale o disposto no art. 17º, nºs 1, 4 e 6, al. a), do DL nº 24/89/M.
Nº1: Tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”).
Nº4: Mas, se trabalhar nesse dia, fica com direito a gozar outro dia de descanso compensatório e, ainda,
Nº6: Receberá em dobro da retribuição normal o serviço que prestar em dia de descanso semanal.
Portanto, como o trabalhador trabalhou o dia de descanso semanal terá direito ao dobro do que receberia, mesmo sem trabalhar (n.º 6, al. a)).
Como remunerar, então, este dia de trabalho prestado em dia que seria de descanso semanal?
Ora bem. Numa 1ª perspectiva, se o empregador pagou o valor devido (pagou o dia de descanso que sempre teria que ser pago), falta pagar o trabalho prestado. E como o prestado é pago em dobro, tem o empregador que pagar duas vezes a “retribuição normal” (o diploma não diz o que seja retribuição normal, mas entende-se que se refira ao valor remuneratório correspondente a cada dia de descanso, que por sua vez corresponde a um trinta avos do salário mensal).
Numa 2ª perspectiva, se se entender que o empregador pagou um dia de salário pelo serviço prestado, continuam em falta:
- Um dia de salário (por conta do dobro fixado na lei), e ainda,
- O devido (o valor de cada dia de descanso, que não podia ser descontado, face ao art. 26º, n.º 1);
E, em qualquer caso, sem prejuízo da remuneração correspondente ao dia de “descanso compensatório” a que se refere o art. 17º, nº4 - desde que peticionada, como foi o caso, - quando nele se tenha prestado serviço (neste sentido, v.g., Ac. TSI, de 15/05/2014, Proc. nº 89/2014).
Quanto à remuneração pelo dia de descanso semanal, temos, portanto, que a fórmula a utilizar será sempre AxBx2.
Não faria, aliás, sentido que fosse de outra maneira. Na verdade, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço nesse dia de descanso (v.g., domingo), sempre auferiria o correspondente valor (a entidade patronal não lho poderia descontar, visto que o salário é mensal), não faria sentido que, indo trabalhar nesse dia, apenas passasse a receber em singelo o trabalho efectivamente prestado. Seria injusto que apenas se pagasse ao trabalhador esse dia de serviço, que deveria ser de folga e descanso. Que vantagem teria então o trabalhador por prestar serviço a um domingo, se, além do que receberia mesmo sem trabalhar, apenas lhe fosse pago o valor do trabalho efectivamente prestado nesse dia de folga como se tratasse de uma dia normal de trabalho?!
Por isso é que o legislador previu que o trabalho efectivamente prestado nesses dias pelo trabalhador, além do valor que já lhes seria devido em qualquer caso, fosse compensado em dobro pelo valor da retribuição normal diária. Quando a lei fala em dobro refere-se, obviamente, à forma de remunerar esse serviço efectivamente prestado nesses dias de descanso, sem prejuízo, como é bom de ver, do valor da remuneração a que sempre teria direito correspondente a cada um desses dias de descanso e que já recebeu.
Significa isto, assim, que a 1ª instância não poderia ter descontado o valor em singelo já recebido pelo recorrente.
Mas, por outro lado, não temos a certeza de que este seja o valor correcto, tendo em atenção de que ele não terá em conta os dias de falta ao serviço, conforme facto provado nº 16 (art. 7º da BI).
Assim, e sem deixar de considerar a fórmula de cálculo acima definida, será caso para apuramento em sede própria quanto ao quantum compensatório, face à anulação parcial da sentença com vista à ampliação da matéria de facto e repetição de julgamento nessa parte (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
2 – Do trabalho em dias de feriado obrigatório
A sentença, neste passo, considerou que o autor tinha direito a receber por cada dia de feriado obrigatório não gozado um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro, a que haveria que deduzir-se o montante em singelo já pago por cada dia de serviço efectivamente prestado.
Simplesmente, por não se ter apurado quais os dias de feriado obrigatório em que prestou trabalho, relegou a sua liquidação para execução de sentença.
O autor, ora recorrente, não se insurge contra a circunstância de ter sido relegada a liquidação do valor indemnizatório a este título para execução de sentença, mas sim, e apenas, contra a parte em que o tribunal decidiu que a prestação do trabalho deveria ser compensada apenas com mais um salário diário por cada dia de feriado não gozado.
Repare-se no que foi dito, por exemplo, no acórdão proferido no Proc. deste TSI nº 824/2012, em 15/12/2012:
“Esta lei trouxe inovações: introduziu uma indemnização especial, chamemos-lhe assim, que a lei anterior não previa e alargou o leque dos dias feriados remunerados, pois aos previstos na lei anterior, somaram-se agora os três dias do Ano Novo Chinês (cfr. art. 19º, n.3). Portanto, o gozo desses dias é feito, não apenas sem perda de remuneração (já era assim na lei anterior), como ainda deve ser extraordinariamente compensado.
Se o trabalhador prestar serviço nesses dias, diz o diploma, além da remuneração normal, receberá ainda um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal (art. 20º, n. 1). O que quer dizer “não inferior”? Quer dizer que pode ser igual, mas não descer desse limite. E até pode ser superior, mas nesse caso só o empregador poderá fixar o valor, singularmente ou por acordo com o empregado. O que não pode é o tribunal, arbitrariamente subir acima dessa barreira.
Aqui chegados, de novo pensemos nas duas perspectivas acima avançadas: a de o trabalhador ter sido pago pelo valor do devido e a de ter sido remunerado pelo valor do serviço prestado. É bom que se equacionem estas duas acepções para se ver até que ponto a solução pode diferir.
1ª Perspectiva (pagamento do devido)
O empregador pagou ao trabalhador o valor remuneratório que, pela lei, sempre lhe seria devido (ou seja, pagou a “remuneração correspondente aos feriados…”: art. 19º, n.3, até porque não lhos podia descontar: art.26º, n.1).
Sendo assim, falta pagar ao trabalhador o seguinte: a remuneração do trabalho efectivamente prestado (um dia de salário), mais um acréscimo em dobro, nos termos do art. 20º, n. 1(mais dois dias). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
2ª Perspectiva (pagamento do prestado)
Nesta óptica, o empregador o que fez foi pagar ao trabalhador em singelo o valor do serviço prestado.
Todavia, falta pagar o acréscimo em dobro (2 x salário) e ainda o valor do devido (um dia). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
Como se vê, qualquer que seja o prisma por que se encare a situação, o resultado é o mesmo. A fórmula é, em ambas, salário diário x 3 ”.
Como se vê, a fórmula obriga a ter em consideração 3 dias de remuneração.
Dito de outra maneira, terá que ser pago o dia de trabalho efectivamente prestado (singelo) acrescido do dobro do valor salarial diário.
Procede, pois, o recurso nesta parte.
Simplesmente, o quantum compensatório a este título deverá ser apurado nos termos que mais abaixo se dirão, face à anulação parcial da sentença para apuramento da pertinente matéria de facto (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
C - Do recurso da sentença interposto pelas rés da acção
1 – Do erro no julgamento da matéria de facto
Vislumbram as recorrentes um alegado erro na apreciação da matéria de facto.
Não têm razão, salvo o devido respeito. É que no recurso ora interposto o leitmotiv da fundamentação utilizada reside no facto de o tribunal apenas ter assentado as respostas à factualidade controvertida no depoimento da única testemunha do autor, que as recorrentes tomam como simplesmente genérico e parcial, uma vez que também ela fora autora numa outra acção dirigida contra as rés pelas mesmas razões de índole laboral.
Não podemos concordar. A testemunha sempre foi categórica sobre cada facto a que depôs, dizendo – e convencendo – que a sua situação sempre foi igual à do aqui autor ou vice-versa. Ou seja, essa testemunha deixou claro que ele e todos os seus colegas de trabalho viveram a mesma situação no que concerne aos diversos direitos laborais aqui alegadamente violados.
Tal testemunha mostrou, portanto, conhecer bem o quadro de facto em todos se moviam e em que forneciam a sua prestação de trabalho às rés (utilizou frequentemente o pronome pessoal “nos”, aludindo a si, ao autor e a outro colega devidamente identificado).
Não pode este TSI concluir, em suma, que o tribunal “a quo” fez uma má avaliação da factualidade tida como provada. Se a livre convicção do julgador da 1ª instância dificilmente poderia ser abalada, o elemento de prova testemunhal que as recorrentes sindicam, acaba, em nossa opinião, por confirmar o resultado de tal convicção.
É a posição que este TSI tem tomado uniformemente sobre o assunto em casos similares a este.
Improcede, pois, o recurso nesta parte.
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2 – Do subsídio de alimentação
Acham as recorrentes que pelo facto de terem pago um valor salarial superior ao que resulta dos mínimos estabelecidos no contrato de prestação de serviços nº 2/96 (facto 9 da sentença) não teria que cumprir os valores definidos neste contrato a outros títulos, nomeadamente de subsídio de alimentação e outros.
Sem razão, tal como já foi decidido neste TSI, no Ac. de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013, e aqui reiteramos: “Nada obsta que da relação entre o promitente e o terceiro (agência prestadora de serviços e mão de obra), para além do assumido nesse contrato entre o promitente e o promissário, nasçam outras obrigações como decorrentes de um outro contrato que seja celebrado entre o promitente (Ré, empregadora) e o terceiro (A., trabalhador)”.
Defendem, por outro lado, as recorrentes que o tribunal não podia proceder à sua condenação no pagamento do subsídio de alimentação concernente ao período de 18 de Outubro de 1996 a 21 de Julho de 2003 e entre 22/07/2003 e 31/03/2010, pela simples razão de que se não sabe quantos dias ele terá faltado ao serviço.
Têm razão, quanto a este aspecto.
Sobre o assunto foi dito no Ac. do TSI, de 14/06/2012, Proc. nº 376/2012:
“Ora, este subsídio tem uma função social radicada numa despesa alimentar efectuada por causa da prestação de trabalho efectiva1. E embora tenha havido por parte da jurisprudência alguma tendência para o considerar prestação retributiva, a verdade é que nem por isso outra a associava, mesmo assim, à noção de trabalho efectivo, tal como, por exemplo, foi asseverado no Ac. da Relação de Lisboa de 29/06/1994, Proc. nº 092324 “ Quer a Jurisprudência, quer a Doutrina têm vindo a entender que o subsídio de alimentação, sendo pago regularmente, integra o conceito de retribuição .... Porém, estando ligada essa componente salarial à prestação de facto do trabalho, só será devida quando o trabalhador presta serviço efectivo à entidade patronal…”.2.
Com o art. 260º do Código do Trabalho Português, o panorama mudou de figura, pois o nº2, do art. 260º deixou claro que esse subsídio não devia ser considerado remuneração, salvo nos casos em que o seu valor excede o montante da despesa alimentar. E assim, terá ficado mais claro que ele só é assumido pelo empregador por causa da prestação efectiva de trabalho. Ele “visa compensar uma despesa diariamente suportada pelos trabalhadores quando realiza a sua actividade”3. Ou “…visa compensar uma despesa na qual o trabalhador incorre diariamente, sempre que vai trabalhar…” (destaque nosso)4.
Em Macau, não está regulada a atribuição destes subsídios, mas não cremos que o sentido da sua natureza que melhor se adequa à geografia local é aquele que atrás descrevemos. Por conseguinte, por não estar regulada na lei (DL nº 24/89/M), nem no referido contrato de prestação de serviços nº 45/94 (fls. 137 e sgs. dos autos), deveremos considerá-lo como compensação pela prestação de serviço efectivo.
Logo, da mesma maneira que deverá descontar-se o subsídio nos períodos de férias ou naqueles em que a pessoa está de licença de maternidade, também ele deve ser subtraído quando o trabalhador não prestou serviço por outra qualquer razão5.”
A ré/recorrente manifesta-se contra a sentença, por considerar que o autor, conforme a matéria de facto provada, chegou a faltar alguns dias ao serviço, mesmo com justificação ou autorização.
Mas, o acórdão deste TSI de 29/05/2014 (Proc. nº 627/2013) deu a resposta para esta questão:
«Contrariamente ao sustentado, não será de afirmar que se retira necessariamente do facto de o autor não faltar sem ser autorizado o facto implícito de ter faltado…. Esse facto pode ser compatibilizado … se dele se retirar que aí se enuncia uma regra que não deixou de ser observada: o trabalhador não podia faltar sem autorização; o trabalhador não faltou sem autorização; se faltasse tinha que ser autorizado. Daqui não se pode concluir que faltou autorizadamente, ou seja, que alguma vez tenha usado essa faculdade». Foi uma solução que seguida foi também no Ac. de 19/06/2014, no Proc. nº 189/2014, e no Ac. de 29/05/2014, Proc. nº 627/2013.
Sucede, contudo, que tal solução não dá resposta segura às situações em que tenha havido gozo efectivo dos dias de descanso anual e de feriados obrigatórios. Por outro lado, estamos em crer que uma leitura mais objectiva da resposta ao art. 7º da BI permite concluir que o trabalhador terá dado algumas faltas ao serviço, ainda que com autorização.
Assim, a melhor solução é aquela que propende para remeter a fixação da indemnização a este título para execução de sentença (assim foi decidido, por exemplo, nos Acs. de Ac. de 13/03/2014, Proc. nº 414/2012, 24/04/2014, Proc. nº 687/2013, 29/05/2014, Proc. nº 168/2014, 24/07/2014, Proc. nº 128/2014)”.
Não seguiremos, neste caso, porém, a tese de relegar a liquidação em execução de sentença, visto que há matéria que deverá ser de novo quesitada, tal como melhor se dirá mais adiante (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
3 – Do subsídio de efectividade
Por entenderem não se ter provado quantos dias de trabalho efectivo o autor prestou serviço, as recorrentes defendem que não podia o tribunal condená-las no pagamento desta indemnização, a qual, na sua óptica, carece de serviço prestado em cada mês sem qualquer falta, justificada ou não. Se assim, não se entender, defende que se deveria deixar para execução de sentença a liquidação do “quantum” indemnizatório respectivo.
Este TSI tem entendido que a sua atribuição carece de uma prestação de trabalho regular e sem faltas (v.g., Acs. proferidos nos Procs. Nºs 376/2012; 189/2014).
E diz mais este tribunal: “Em relação a este subsídio, vista a sua natureza e fins - já não se manifestam as razões que levam a considerar que a sua atribuição esteja excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho. Se o patrão autoriza uma falta seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade” (Ac. de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013).
Assim, “… se o trabalhador falta porque autorizado, por razões de descanso ou de férias, tal não implica que se considere que o trabalhador não foi assíduo e se lhe retire uma componente retributiva que resulta da própria redacção que atribui uma retribuição extra em função do mês anterior e já não de um determinado número de dias de trabalho efectivo.” (cit. ac.).
Ora sendo assim, face à matéria do facto 16) (resposta ao art. 7º da BI), segundo a qual “durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés”, parece ser claro que as eventuais ausências, porque consentidas, não podem relevar negativamente na esfera do trabalhador.
Razão pela qual não pode merecer provimento o recurso nesta parte, ficando desde já, tal como o liquidou a sentença recorrida, as rés a pagar ao autor da acção as quantias de 32.400,00 e 32.200,00, respectivamente pela B e C a título de subsídio de efectividade.
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4 – Do trabalho prestado em dias de descanso semanal, compensatório e feriado obrigatório
Vêm as recorrentes manifestar-se também contra a atribuição do valor liquidado a título de trabalho nos dias de descanso semanal, compensatório e nos feriados obrigatórios.
Em sua opinião, uma vez que ficou provado que o autor teve faltas, ainda que justificadas, não seria possível especificar o número de dias devidos e não gozados por ele, ao contrário do que fez a sentença recorrida.
Tem razão, tal como se decidiu no TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017, cujos termos aqui fazemos nossos.
Sucede, porém, que foi alegada matéria concernente aos dias de trabalho a que o autor terá faltado e que não foi quesitada, e que deverá constituir assim factualidade a que o tribunal “a quo” terá que voltar em sede de repetição de julgamento após a necessária quesitação (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
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5 – Do trabalho extraordinário
As recorrentes reiteram a ideia de que o autor da acção deu faltas ao serviço, além de ter gozado férias anuais. Com base nisso, defendem que não podia o tribunal apurar os dias em que ele teria efectuado serviço extraordinário nos turnos.
Tem razão.
Contudo, e ao contrário do que se tem decidido quanto a esta questão (em que se tem relegado a liquidação do valor indemnizatório a este título para execução de sentença, conforme, v.g., Ac. deste TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017), haverá que ampliar a matéria de facto para o que o processo deverá baixar à 1ª instância, nos termos que mais adiante se dirão.
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6 – Das bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas
Defende a recorrente B que não tinha que pagar ao autor quaisquer bonificações ou gorjetas, primeiro por não ter ficado provado quais foram as bonificações ou remunerações adicionais pagas aos trabalhadores residentes, segundo porque as gorjetas não são pagas por si, mas pelos seus clientes, que para o efeito devem ser tidos como terceiros.
Quanto ao primeiro argumento, ele tem que ver com a matéria do ponto 3.3 do Contrato de Prestação de Serviços nº 2/96, segundo o qual o trabalhador, após 30 dias de prestação de serviço, teria direito, para além da remuneração normal, às bonificações adicionais, incluindo as gorjetas, que a 1ª ré paga aos operários residentes em Macau (facto 13 da matéria provada).
Pois bem. A matéria provada não revela quais sejam as bonificações ou remunerações adicionais, que a 1ª ré tenha pago aos seus trabalhadores residentes.
Ora, este TSI teve já o ensejo de afirmar que este seria um ónus que pertencia ao recorrente, concretizando ou especificando quais os suplementos, bonificações e remunerações adicionais concedidas, em que circunstâncias, quais os seus beneficiários e montantes, etc., não lhe bastando assim formular um pedido genérico (Ac. do TSI, de 29/06/2017, Proc. nº 326/2017).
Assim sendo, não tendo sido cumprido esse ónus, sem que o tribunal “a quo” tivesse procedido ao convite à correcção da petição, perante um tal pedido genérico, cumpre-nos proceder à absolvição da instância da 1ª ré.
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7 – Da falta de fundamentação
Por fim, as recorrentes imputam à sentença a nulidade decorrente da falta de fundamentação em virtude de ter assentado nas incoerentes conclusões levadas à petição inicial pelo autor.
Ora, não cremos que este fundamento – se verdadeiramente ocorresse – pudesse gerar a nulidade da sentença. Quando muito, poderia levar à modificabilidade da decisão de facto (art. 629º, do CPC) face à impugnação da respectiva factualidade (art. 599º, do CPC), à anulação da sentença na parte referente à matéria de facto (art. 629º, nº4, do CPC), ou então à improcedência da acção em virtude de os factos provados não revelarem convenientemente a causa de pedir.
Improcede, pois, também este segmento do recurso.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em:
1 - Rejeitar, por inadmissibilidade, o recurso interlocutório interposto pelas Rés B e C
Custas pelas recorrentes, com taxa de justiça em 2 UC cada uma.
2 - Conceder provimento parcial ao recurso da sentença interposto pelas rés e, em consequência:
a) Anular parcialmente a sentença de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
b) Revogar o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas e, consequentemente, absolver a Ré da instância nessa parte;
2.1 - Julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
3 - Conceder provimento ao recurso do autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a 1ª ré B no pagamento dos períodos de trabalho prestado em dias de descanso semanal e aos feriados obrigatórios de acordo com as fórmulas acima referidas, cujo “quantum” concreto, porém, será apurado em conformidade com o que vier a ser decidido após a repetição parcial do julgamento, nos termos acima definidos.
4 - Vão ainda as rés B e C condenadas nos juros de mora nos termos definidos no Ac. do TUI, de 2/03/2011, Proc. nº 69/2010.
Custas pelas partes em função do decaimento.
T.S.I., 7 de Dezembro de 2017
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José Cândido de Pinho
_________________________
Tong Hio Fong
(com declaração de voto que se segue)
_________________________
Lai Kin Hong









落敗聲明

針對合議庭裁判中關於周假日的補償問題,根據《勞資關係法律制度》(第24/89/M號法令)第17條第6款a項的規定,在每周休息日提供工作的工作者,雇主須向其支付平常報酬的雙倍,而所謂“報酬的雙倍”,應理解為本身日工資加上另一日的補償。另外,根據《勞資關係法律制度》第17條第4款的規定,如在每周休息日提供工作,工作者亦有權享受一天補假。

至於強制性假日的補償方面,根據《勞資關係法律制度》第19條第3款及20條第1款的規定,如在強制性假日提供工作,除了本身的日工資外,工作者亦有權收取不少於兩倍平常報酬的補充工資。

合議庭大多數意見認為工作者在周假日提供工作,除了本身的日工資外,還有權多收取兩天的工資補償,同時亦有權享受一天補假,換言之,如工作者在上述假日提供工作,變相有權收取“四工”。

合議庭大多數意見認為同時認為在強制性假日提供工作,除了本身的日工資外,還有權多收取三天的工資補償,換言之,如工作者在上述假日提供工作,變相有權收取“四工”。

通過以下例子相信比較容易理解:
按照合議庭大多數意見的理解,假設工作者的每月收入為9000元,如其在周假日提供工作而沒有享受補假,或者在強制性假日提供工作,除了每月的固定月薪外,工作者還可向雇主要求支付900元的補償(日計,300元x3)。

在充分尊重不同見解的情況下,本人認為根據法律規定,工作者在周假日提供工作而沒有享受補假或在強制性假日提供工作,僅有權收取“三工”(當中包含本身的日工資),而並非除了本身原有的工資外,可再收取“三工”,因為後者變相讓工作者收取“四工”。

引用上述例子,假設工作者的每月收入為9000元,如其在周假日提供工作,本人認為他有權多收取一天工資即300元及享受一天補假,但倘若雇主不讓他享受補假,則工作者有權在提供工作後多收取兩天工資即600元的補償,即是所謂的“三工”(本身日工資+一天工資補償+一天補假);如在強制性假日提供工作,本人認為工作者有權多收取不少於兩倍平常報酬的補充工資即600元,即是所謂的“三工” (本身日工資+兩天工資補償)。

有見及此,本人不同意合議庭裁判中對周假日及強制性假日工作所定出的賠償金,因此作出本落敗聲明。


1 Neste ponto, corrige-se a posição anteriormente tomada no proc. nº 781/2011.
2 No sentido de que só deve ser pago nos períodos de prestação efectiva de serviço, ainda Ac. R.P. de 6/05/1995, Proc. nº 9411201; É por isso que ele não deve ser pago nos subsídios de férias e de Natal (Ac. R.E., de 21/09/2004, Proc. nº 1535/04-2).
3 Luis M. Telles de Meneses Leitão, in Direito de Trabalho, Almedina, 2008, pag. 349. No mesmo sentido, Bernardo da Gama Lobo Xavier, Manual de Direito do Trabalho, Verbo, pag. 547 e Diogo Vaz Marecos, in Código do Trabalho anotado, Coimbra Editora e Wolters Kluver, pag. 662-663.
4 Pedro Romano Martinez e outros, in Código do Trabalho anotado, 5ª edição, 2007, pag. 498.
5 A não ser nas situações em que a não prestação se fica a dever a causa imputável ao empregador e em que, apesar disso, o trabalhador teve que efectuar a despesa alimentar.
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883/2017 40