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Proc. nº 334/2017
Recurso Contencioso
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 30 de Novembro de 2017
Descritores:
- Fundamentação
- Princípio da proporcionalidade
- Despejo de prédio
- Caducidade de concessão

SUMÁRIO:

I – Quando o acto é um simples “concordo”, tanto a sua fundamentação, como a sua dispositividade, são aquelas que constam da informação, do parecer ou da proposta sobre que o respectivo despacho recai.

II – Não viola o princípio da proporcionalidade a fixação de um prazo de 60 dias para a desocupação do terreno por parte do concessionário, na sequência da declaração de caducidade da concessão, se a interessada não comprova que é curto para a tarefa que tem pela frente para cumpri-lo e se os elementos dos autos não mostram que a Administração, ao fixá-lo, incorreu em erro manifesto e grosseiro.

Proc. nº 334/2017

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I - Relatório
A, LIMITADA, em chinês, A有限公司 e, em inglês, A Limited, sociedade comercial por quotas, com sede em Macau, na XXXXXXXXXXXXXXXX, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o n.o XXXX, com o capital de cinquenta milhões de patacas, ---------
Recorre contenciosamente -----------
Do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 15 de Março de 2017, exarado sobre a Proposta n.º 52/DSO/2017, de 13 de Março, que ordena a desocupação do terreno, com a área de 10.154m2, situado na Ilha de Coloane, junto à Estrada de Nossa Senhora de Ká-Hó, no prazo de 60 dias, com a demolição do barracão de ferro e remoção de todos os bens móveis que se encontram naquele terreno, tais como contentores, guindastes e materiais de construção.
Na petição inicial, formulou as seguintes conclusões:
“1. A ora Recorrente vem interpor recurso contencioso do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 15 de Março de 2017, exarado sobre a Proposta n.º 52/DSO/2017, de 13 de Março, que ordena a desocupação do terreno, com a área de 10.154m2, situado na Ilha de Coloane, junto à Estrada de Nossa Senhora de Ká-Hó, no prazo de 60 dias, com a demolição do barracão de ferro e remoção de todos os bens móveis que se encontram naquele terreno;
2. O despacho recorrido, que se limitou a concordar com a Proposta n.º 52/DSO/2017, não fundamentou em que base é que foi decidido a duração do prazo de 60 dias para desocupação do terreno;
3. Uma vez que a Entidade Recorrida está a impor deveres e encargos à Recorrente, no sentido de desocupar o terreno num prazo muito curto, a mesma tem o dever de fundamentação por força do artigo 114.º, n.º 1, al. a) do CPA;
4. Com a leitura do acto recorrido, não é possível perceber o raciocínio de a Administração chegar à sua conclusão no ponto 6 da proposta n.º 052/DSO/2017;
5. Assim, o despacho ora recorrido enferma do vício de falta de fundamentação, o que leva a anulabilidade do mesmo ao abrigo do artigo 124.º do CPA;
6. Por outro lado, a Entidade Recorrida apenas tomou iniciativa ao procedimento de caducidade 1 ano e 8 meses depois do alegado termo do prazo da concessão;
7. Não se percebe a razão de, neste momento, a Administração ter pressa em ter o terreno em causa desocupado, sendo certo que a Administração nunca agiu com prontidão e tomou sempre decisões com atraso, nomeadamente no que diz respeito à alteração da finalidade, à revisão do contrato da concessão, à análise do relatório de avaliação do impacto ambiental, etc.;
8. Pelo que o prazo de 60 dias para desocupação é desproporcional em comparação com a conduta da Entidade Recorrida;
9. Os equipamentos e materiais que se encontram no terreno em causa destinaram-se a preparar o seu desenvolvimento depois da obtenção da prometida autorização da Administração, tendo a Recorrente os utilizado para proceder a trabalhos preliminares;
10. Assim, é difícil retirar todos esses materiais num curto prazo de 60 dias, ou o custo necessário para a desocupação vai ser muito elevado, que não é proporcional ao benefício que a Administração pretende obter;
11. Como a acto recorrido viola o princípio da proporcionalidade previsto no artigo 5.º do CPA, o mesmo é anulável por força do artigo 124.º do CPA;
12. Uma vez que está em causa os vícios próprios do acto de execução, ora em impugnação, o despacho recorrido é recorrível nos termos do artigo 138.º, n.º 4 do CPA.
Termos em que, e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por o acto recorrido estar ferido de ilegalidade, devendo por isso ser anulado, com as consequências legais.”
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A entidade recorrida concluiu a sua contestação do seguinte modo:
“1.ª - O objecto do presente recurso contencioso é o despacho de “concordo” do STOP, de 15 de Março de 2017, exarado na proposta n.º 052/DSO/2017, de 13 de Março de 2017, que ao abrigo do disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 e nos artigos 55.º e 56.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto, ordenou à Recorrente o despejo/desocupação do terreno dos autos;
2.ª - O acto impugnado não enferma do assacado vício de forma por falta de fundamentação, porquanto foi indicado o regime jurídico aplicável ao caso concreto (artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 e artigos 55.º e 56.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M de 21 de Agosto), assim como os factos ocorridos (prévia declaração de caducidade da concessão do terreno), que levaram a Entidade Recorrida a ordenar o despejo.
3.ª - Também não se verifica a alegada violação do princípio da proporcionalidade, pois o acto impugnado foi praticado no exercício de poderes vinculados, e a violação daquele princípio só assume relevo autónomo quando a Administração actua no exercício de poderes discricionários.
4.ª - Assim, não se verificam quaisquer dos vícios alegados pela Recorrente que possam fundamentar a declaração de nulidade ou a anulação do acto impugnado.
Nestes termos e nos melhores de direito, com o Douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser considerado improcedente, por não verificação de quaisquer dos alegados vícios, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.”
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Nas respectivas alegações facultativas, recorrente e recorrida reiteram no essencial as posições já manifestadas na petição inicial.
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O digno Magistrado do MP emitiu o seguinte parecer:
“Constitui objecto do presente recurso contencioso o despacho de 15 de Março de 2017, da autoria do Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que ordenou o despejo do terreno ocupado pela recorrente, com a área de 10.154 m2, situado na Ilha de Coloane, junto à Estrada de Nossa Senhora de Ká-Hó, no prazo de 60 dias, com a demolição do barracão de ferro e remoção de todos os bens móveis que se encontram no terreno, tais como contentores, guindastes e materiais de construção.
A recorrente, “A, Limitada”, imputa ao acto os vícios de falta de fundamentação e de violação do princípio da proporcionalidade.
Por seu turno, a autoridade recorrida assevera a legalidade do acto.
Vejamos.
Começa a recorrente por sustentar que o acto padece do vício de falta de fundamentação, pois concedeu-lhe um prazo de 60 dias para o despejo e não explica a razão de lhe ter concedido esse prazo e não outro.
Não tem razão.
O artigo 179.º, n.º 3, da Lei de Terras dispõe que o despejo se processa nos termos e com as necessárias adaptações do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto. Este diploma prevê, no seu artigo 55.º, um prazo certo para se efectivar o despejo, que é de 45 dias. Estando previsto em lei o prazo concreto a observar, como sucede, o que tem a Administração que fundamentar? Nada. No caso, até aconteceu que a Administração concedeu um prazo superior ao previsto legalmente. Não saiu afectado qualquer direito ou interesse da recorrente. Nada havia a fundamentar.
Soçobra este vício.
Afirma seguidamente a recorrente que o acto incorreu em violação do princípio da proporcionalidade. Isto porque o prazo de 60 dias que lhe foi dado para a desocupação do terreno se mostra desproporcionado no confronto com a conduta morosa da Administração em todo o processo, e porque a desocupação nesse prazo importará um custo demasiado elevado, que não é proporcional ao benefício que a Administração pretende obter. Crê-se que também nesta parte não lhe assiste razão.
O princípio da proporcionalidade é um corolário do princípio da justiça e obriga a que as decisões administrativas que colidam com direitos e interesses dos particulares apenas possam afectar as posições destes na justa medida da necessidade reclamada pelos objectivos a prosseguir.
Dito isto, importa notar, antes de mais, que a eventual mora anterior da Administração em nada contende com a proporcionalidade ou desproporcionalidade do prazo fixado para o despejo. Pois nada permite sustentar a ideia de que os prazos a cumprir pelos particulares têm que ser proporcionais às demoras ocorridas no seio da Administração, nem extrair a conclusão de que estas demoras significam menosprezo, desinteresse ou desvalorização das matérias em que ocorrem.
Por outro lado, e como já se salientou a propósito da questão da fundamentação, o prazo para o despejo está fixado por lei em 45 dias. A Administração concedeu um prazo superior ao fixado em lei, o que pode ser indiciário de que considerou o prazo legal exíguo, tomando por mais justo, ou mais proporcional, o prazo de 60 dias. Mas daqui não decorre que o prazo de 60 dias seja insuficiente para o despejo, nem resulta que os valores/benefícios para o interesse público em que o despejo se efective naquele prazo sejam desproporcionadamente inferiores ao esforço financeiro exigido à recorrente para cumprir aquele prazo. Aliás, a recorrente não esboçou qualquer demonstração dessa alegada desproporcionalidade.
Improcede igualmente o invocado vício de violação do princípio da proporcionalidade.
Ante o exposto, e na improcedência dos vícios alegados, o nosso parecer vai no sentido do não provimento do recurso.”.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - Por despacho do Chefe do Executivo, de 24 de Junho de 2016, tornado público pelo despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 35/2016, publicado no Boletim Oficial n.º 30, II Série, de 27 de Julho de 2016, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 10.154m2, situado na Ilha de Coloane, junto à Estrada de Nossa Senhora de Ká-Hó.
2 - A ora Requerente interpôs recurso contencioso contra esse despacho do Chefe do Executivo em 5 de Setembro de 2016 (pendente neste TSI sob o nº 643/2016).
3 - Durante a pendência desse recurso contencioso, a Requerente foi notificada da intenção de despejo para efeitos de audiência prévia.
4 - Depois da realização da audiência prévia, foi lavrada a seguinte Proposta n.º 052/DSO/2017:
«1. Por despacho do Exmo. Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP), de 30 de Dezembro de 2016, exarado sobre a Proposta n.º 496/DSO/2016 de 19 de Dezembro, que pretende ordenar a A, Limitada (adiante designada por interessada) para o despejo do terreno com a área de 10 154 m2, situado em Coloane, junto à Estrada de Nossa Senhora de Ká-Hó, descrito na CRP sob o n.º 21 769 a fls. 125v do livro B85, cuja concessão foi declarada caduca por despacho do Chefe do Executivo de 24 de Junho de 2016, devendo também demolir o barracão de ferro construído no terreno em causa. (Anexo 1)
2. Nos termos dos artigos 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M de 11 de Outubro, através do ofício n.º 14/8006.03/DSO/2017 de 6 de Janeiro, foi notificada a interessada para se pronunciar por escrito sobre a referida intenção decisória. (Anexo 2)
3. Em resposta ao referido ofício e para efeito da audiência prévia, a interessada apresentou uma alegação escrita com entrada sob o n.º 11 891/2017 de 20 de Janeiro de 2017, solicitando a suspensão do despejo até a decisão a ser proferida pelos Tribunais, com os fundamentos principais seguintes (Anexo 3):
3.1 A partir da data em que foi autorizada a alteração da finalidade da concessão, em 7 de Junho de 1994, constitui erro manifesto, má-fé e abuso de direito o entendimento de que, no termo do prazo contratual, não foi construída a unidade siderúrgica a qual o terreno foi inicialmente concedido;
3.2 Por despacho da DSSOPT de 4 de Abril de 2007 (deve ser o despacho do Sr. Director de 19 de Março de 2007), foi aprovado o estudo prévio de 10 de Novembro de 2006 (T-7473), e foi notificada a interessada, assumindo e então Director dos Serviços o compromisso de proceder à revisão do contrato de concessão, tendo até informado que ia enviar a respectiva minuta;
3.3 A Administração provocou o efeito jurídico impeditivo da caducidade, previsto no n.º 2 do artigo 323.º do «Código Civil», com o reconhecimento expresso dos direitos que assistem à interessada;
3.4 O artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de terras» não determina qualquer prazo para o despejo da interessada, devendo a decisão proposta aguardar pela decisão judicial do recurso contencioso interposto do despacho do Chefe do Executivo de 24 de Junho de 2016, que declarou a caducidade da concessão do terreno em causa.
4. Em 7 de Março de 2017, encontram-se ao local um barracão de ferro, alguns contentores, guindastes veiculares e a grande quantidade de materiais construtivos existentes no terreno em causa (Anexo 4).
5. Enfrentando o seguimento da caducidade de concessão, deve-se considerar o seguinte:
5.1 Os fundamentos alegados nos n.ºs 3.1 a 3.3, estão principalmente relacionados com o acto executado, ou seja, o referido despacho do Exmo. Chefe do Executivo de 24 de Junho de 2016, com efeito, pelo Despacho do STOP n.º 35/2016 de 27 de Julho, foi publicado o mesmo despacho, e através do ofício n.º 292/DAT/2016 de 1 de Agosto, foi notificada a interessada a reclamação e o recurso contencioso, portanto, os referido fundamentos devem ser legalmente formulados através dos meios de impugnação previstos nos CPA e «Código de Processo Administrativo Contencioso» (CPAC) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 101/99/M de 13 de Dezembro;
5.2 Para além disso, de acordo com o n.º 2 do artigo 150.º do CPA, caso necessário, a suspensão da eficácia do acto executado deve ser solicitada simultaneamente na reclamação apresentada;
5.3 Segundo o aviso de recepção, a interessada recebeu em 5 de Agosto de 2016 o referido ofício n.º 292/DAT/2016 de 1 de Agosto (Anexo 5), nos termos do artigo 149.º do CPA, o prazo de apresentação da reclamação terminou em 22 de Agosto de 2016, portanto, o direito de exercício da impugnação administrativa já caducou automaticamente, ou seja, a Administração não está obrigada a se pronunciar sobre os fundamentos contra o acto executado;
5.4 Nos termos do artigo 117.º e do n.º 1 do artigo 136.º do CPA, o acto administrativo produz os seus efeitos desde a data em que for praticado e é executório logo que eficaz, não obstando à perfeição do mesmo por qualquer motivo determinante de anulabilidade, salvo os actos previstos no artigo 137.º do CPA;
5.5 Por outro lado, ao abrigo das disposições do artigo 22.º do CPAC, o recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido;
5.6 Assim sendo, quer a interessada em apreço interponha o recurso contencioso quer não, o acto administrativo feito pelo Chefe do Executivo pode ser executado de acordo com o n.º 1 do artigo 179.º da «Lei de terras»;
5.7 Com base no n.º 2 do artigo 179.º da «Lei de terras», o despejo processa-se nos termos e com as necessárias adaptações do Decreto-Lei n.º 79/85/M de 21 de Agosto «Regulamento Geral da Construção Urbana» (RGCU);
5.8 Por isso, o Chefe do Executivo pode ordenar no prazo de pelo menos 45 dias, o despejo da interessada cuja concessão foi declarada caduca nos termos do n.º 2 do artigo 55.º do RGCU;
5.9 Em caso de a interessada não abandonar o terreno no referido prazo, o despejo pode ser realizado pela DSSOPT, as despesas efectuadas constituem encargos da interessada segundo o artigo 56.º do RGCU;
5.10 Os objectos, materiais e equipamentos abandonados no terreno serão tratados de acordo com as disposições do artigo 210.º da «Lei de terras».
6. Em face do exposto, em conformidade com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da «Lei de terras» e com o artigo 56.º do RGCU, submete-se a presente proposta à consideração da V. Ex.ª, a fim de ordenar, no prazo de 60 dias a contar da data da notificação, o despejo da interessada Sociedade de Investimento e Indústria Sun Fat, Limitada, do terreno com a área de 10 154 m2, situado em Coloane, junto à Estrada de Nossa Senhora de Ká-Hó, descrito na CRP sob o n.º 21 769 a fls. 125v do livro B85, cuja concessão foi declarada caduca por despacho do Chefe do Executivo de 24 de Junho de 2016, devendo também demolir o barracão de ferro existente no local.
À consideração superior.»
5 - O Secretário para os Transportes e Obras Públicas sobre esta Proposta apôs o seu despacho de “Concordo”.
6 - Encontram-se no terreno em causa uma construção edificada para apoio das obras da concessionária, alguns contentores, guindastes e uma grande quantidade de materiais de construção.
7 - Esses materiais destinavam-se a preparar o desenvolvimento do terreno em causa, depois de obter a prometida autorização da Administração.
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IV – O Direito
1 - Os vícios invocados pela recorrente são:
- Vício de forma por falta de fundamentação;
- Vício de violação de lei por ofensa ao princípio da proporcionalidade.
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2 - Do vício de forma por falta de fundamentação
A recorrente centra a sua atenção impugnativa na circunstância de ter sido fixado um prazo de 60 dias para proceder à desocupação do terreno sem qualquer fundamentação para tal.
O acto é um simples “Concordo”. Mas, como é bom de ver, a fundamentação do acto administrativo, neste caso, é a fundamentação que consta da Proposta nº 052/DSO/2017 acima transcrita. É a chamada fundamentação por remissão, expressamente prevista no art. 115º do CPA, caso em que tanto a sua fundamentação, como a sua dispositividade, são aquelas que constam da informação, do parecer ou da proposta sobre que ele recai.
Ora, o despejo do concessionário, segundo o que o prevê o art. 179º, nº2, da Lei de Terras, processa-se nos termos do art. 79/85/M, de 21 de Agosto. E este diploma estabelece que o despejo será efectuado administrativamente, no prazo de 45 dias a contar da respectiva notificação.
Ora, o prazo concedido de 60 dias ultrapassou o prazo legalmente previsto (não parece que a lei proíba a fixação de prazo maior: neste sentido, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Código de Procedimento Administrativo, 2ª ed., pág. 366). Sendo “favorável”, portanto, aos interesses da recorrente, nem mereceria fundamentação justificativa do prazo, nem faria esperar a presente impugnação.
De qualquer maneira, mesmo que se entenda que o prazo de 45 dias não se aplica ao caso vertente, uma vez que o art. 179º, nº2 citado apenas manda que o despejo seja “processado” de acordo com o disposto nos arts. 55º e 56º do DL nº 79/85/M (“processamento” que excluiria a matéria da fixação dos prazos), nem por isso se acha que o vício merece proceder.
É que se tem que considerar que a fixação do prazo tem implícita uma ideia de suficiência. Quando um órgão fixa um prazo fá-lo por lhe parecer ser suficiente para que o administrado o possa cumprir. Impondo um prazo certo, mesmo antevendo ser curto para cumprir o dever que sobre o particular impende, então o acto poderá padecer de desrazoabilidade ou desproporcionalidade. E esse será outro fundamento invocável pelo recorrente, que aqui, por acaso, suscitou e que mais à frente se analisará.
Improcede, pois, o recurso quanto a esta alegada causa invalidante.
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3 - Da violação do princípio da proporcionalidade
Acha a recorrente que o prazo de 60 dias é desproporcional, tendo em conta que precisa de demolir um barracão de ferro, além de remover contentores, guindastes e grande quantidade de materiais de construção.
Vamos admitir que a fixação do prazo é livre e não está sujeito ao limite previsto no art. 55º, nº2, do DL nº 79/85/M. Bem, nesse caso, teremos que supor que a situação será de actuação discricionária, caso em que violação do princípio da proporcionalidade (art. 5º do CPA) só poderia proceder se a actuação administrativa revelasse um erro grosseiro e manifesto, como tem sido jurisprudência uniforme do TUI e do TSI. E tal não está configurado no caso dos autos.
Na verdade, a interessada recorrente não comprova que esse prazo é curto para toda a tarefa que tem pela frente para cumprir o despacho. Por outro lado, à falta de mais elementos nos autos, não se crê que desmontar um barracão de ferro seja uma tarefa técnica tão difícil e morosa (isso, pelo menos, não foi invocado), tal como não se antevê que a remoção de todos os bens móveis que se encontram no terreno, tais como eventuais contentores, guindastes e materiais de construção implique um período de tempo mais longo (também não foi alegada nenhuma dificuldade concreta nesse sentido).
Aliás, se o problema era só esse (o de falta de tempo), não se percebe por que a recorrente não solicitou mais tempo para cumprir a exigência constante da notificação.
E, mais ainda, somos a concluir – é argumento lateral, sim, mas não deixa de ter correspondência com o mundo da realidade dos factos - que com a instauração do recurso contencioso, o prazo para a desocupação mais do que duplicou (já para não falar no tempo que irá decorrer até ao trânsito em julgado do presente aresto). Acaso seria lógico que, depois de todo o tempo por que durou o presente processo até ao momento, mais ainda o que irá durar até ao seu trânsito, ainda fosse legítimo exigir que à Administração a fixação de novo prazo (na óptica da recorrente, mais razoável, i.é., mais longo) para a recorrente calmamente desocupar o terreno?
Enfim, não se acolhe este vício.
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 8 UC.
T.S.I., 30 de Novembro de 2017
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa



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