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Processo nº 183/2017
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 08 de Fevereiro 2018

ASSUNTO:
- Existência do perigo efectivo
- Princípio da proporcionalidade

SUMÁRIO:
- A Entidade Recorrida não pode, com base simplesmente na condenação penal do Recorrente, concluir a existência do perigo efectivo.
- A Entidade Recorrida tem de pegar factos concretos e objectivos para o preenchimento do conceito indeterminado do perigo efectivo.
- A ideia central do princípio da proporcionalidade projecta-se em três dimensões injuntivas: adequação, necessidade e equilíbrio. A adequação impõe que o meio utilizado seja idóneo à prossecução do objectivo da decisão. Entre todos os meios alternativos, deve ser escolhido aquele que implique uma lesão menos grave dos interesses sacrificados. O equilíbrio revela a justa medida entre os interesses presentes na ponderação e determina que, na relação desses interesses entre si, deve a composição ser proporcional à luz do interesse público em causa.
O Relator,

Processo nº 183/2017
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 08 de Fevereiro de 2018
Recorrente: A
Entidade Recorrida: Secretário para a Segurança

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
A, melhor identificado nos autos, vem interpor o presente recurso contencioso contra o despacho do Secretário para a Segurança, de 07/12/2016, que determinou a medida de interdição de entrada na RAEM por um período de 3 anos, concluíndo que:
I. A 21 de Dezembro de 2016 foi o ora Recorrente notificado do despacho proferido pelo Exmo. Senhor Secretário para a Segurança, datado do dia 7 de Dezembro de 2016, que o interditou de entrar na Região Administrativa Especial de Macau, pelo período de 3 anos, nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 alínea 2), n.ºs 3 e 4, da Lei 6/2004, por remissão para o artigo 4.º, n.º 2 alínea 2), da Lei 4/2003
II. Não se conformando igualmente com o teor da decisão, vem apresentar Recurso Contencioso da mesma, sendo o mesmo interposto de um acto definitivo, que produz efeitos externos, e executório, praticado por um órgão com competência para a prática do mesmo.
III. O Recorrente tem legitimidade activa para impugnar o acto em causa.
IV. Considerou a Administração, no seu amplo poder discricionário, que o Recorrente é um "perigo para a segurança ou ordem públicas da RAEM", sendo igualmente um "perigo efectivo" para a mesma segurança ou ordem públicas da RAEM, pelo facto do mesmo ter sido condenado em "peno privativa de liberdade, na RAEM".
V. Na verdade, o Recorrente foi condenado no Tribunal Judicial de Base, em cúmulo jurídico, a 7 meses de prisão - suspensa por um ano -, pelo facto de ter constituído relação de trabalho com indivíduos que não eram titulares de documentos exigidos por lei para serem admitidos como trabalhadores, ou seja, por emprego ilegal
VI. Mas o Tribunal Judicial de Base, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluiu que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizavam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, suspendendo, nesse sentido a execução da pena de prisão.
VII. Optou o Tribunal por uma desvalorização da conduta do ora Recorrente, entendendo que a simples censura do facto, aliada à ameaça da prisão eram suficientes, com o devido respeito por opinião contrária, para a criação de um juízo que afastou, de todo, a existência de qualquer perigo (efectivo) para a segurança ou ordem públicas.
VIII. Não deixa de ser verdade que a Lei n.º 6/2004 ao retratar em dois momentos distintos "perigo para a segurança ou ordem públicas", considera no artigo 11.º um perigo que não é efectivo, sendo que, por seu turno, no artigo 12.º esse perigo tem de ser efectivo.
IX. Ao ter decidido o Tribunal suspender a execução de pena ao ora Recorrente, pelo já supra alegado, não podemos deixar de entender que Tribunal desvalorizou a conduta do ora Recorrente, e que essa mesma conduta não se traduziu na existência de um "perigo efectivo", caso contrário, jamais o Tribunal teria optado pela suspensão da execução da pena de prisão.
X. A tudo isto acresce o facto de estamos igualmente perante um (amplo) poder discricionário da Administração e preenchimento de um (ou vários) conceito indeterminado.
XI. Não estamos, assim, perante uma situação em que seja conferido à Administração um poder vinculado em ordenar a revogação da autorização de permanência e a interdição de entrada na RAEM.
XII. De facto, esse poder vinculado de interditar a entrada na RAEM resulta apenas do n.º 1 do artigo 12.º da Lei 6/2004, ou seja, nas situações em que tenha sido decretada a expulsão, o que não é o caso em apreço.
XIII. O Recorrente não recebeu nenhuma ordem de expulsão da RAEM por parte do Corpo de Polícia de Segurança Pública da RAEM.
XIV. Ao Recorrente foi revogada a autorização de permanência na Região.
XV. Mas, se por um lado, se se atender à suspensão da execução da pena de prisão a que o ora Recorrente foi condenado, não podemos deixar de salientar que o Tribunal entendeu que bastaria a simples ameaça de prisão para que o Recorrente pudesse levar uma vida digna e sem ser considerado um perigo para a sociedade, muito menos um perigo efectivo.
XVI. Contudo, a Administração assim não entendeu e, no preenchimento do conceito indeterminado que é o "perigo efectivo", fundamentou o acto invocando que o Recorrente é considerado um perigo efectivo para a sociedade por ter praticado crime, interditando a entrada do mesmo na Região por um período de 3 anos.
XVII. Acresce ainda que tal como estabelece o normativo legal indicado (artigo 12.º, n.º 4 da Lei 6/2004), o período de interdição de entrada deve ser proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade dos actos que a determinam.
XVIII. Pois bem, não se crê, mesmo considerando o amplo poder discricionário da Administração, a par dos fundamentos legais que invoca, que exista proporcionalidade, adequação e justiça na interdição de entrada por três anos para o Recorrente no caso em apreço.
XIX. Mal se percebe como é que a Administração, no uso de um poder discricionário, preenchendo um conceito indeterminado, entende que um período de interdição de entrada na Região de 3 anos é proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade no caso em apreço
XX. Mostrando-se totalmente desproporcional e desajustada a medida tomada pela Administração, em face da situação concreta.
XXI. O Recorrente tem em sede de recurso, no Tribunal de Segunda Instância da RAEM (Processo n.º 800/2015), um recurso contencioso na sequência do indeferimento do pedido de autorização de residência, do qual ainda não obteve uma decisão final.
XXII. Quando o ora Recorrente foi constituído arguido, à data da prática dos factos que consubstanciaram o processo-crime, o ora Recorrente tinha requerido junto da Administração um pedido de autorização de residência pelo facto de estar casado com uma residente local.
XXIII. Assim, ao longo do normal desenvolvimento da instância criminal, o Recorrente foi requerendo pedidos de prorrogação de visto, que foram sendo concedidos, de forma a poder permanecer junto da esposa, na Região, e junto da filha que entretanto nasceu.
XXIV. Ainda no decurso da instância criminal, foi o aqui recorrente notificado para este processo de interdição de entrada, ao qual respondeu através da referida audiência escrita.
XXV. Contudo, como o mesmo tinha requerido uma prorrogação da autorização de permanência em Macau, que lhe foi concedida pelo Exmo. Sr. Secretário para a Segurança, pelo facto do Recorrente ser casado com uma residente de Macau, e ainda pelo facto de ter de acompanhar a esposa nas vésperas do nascimento da filha de ambos, o procedimento administrativo foi suspenso temporariamente.
XXVI. Contudo, após a condenação no referido processo-crime, o procedimento administrativo de interdição e entrada foi reiniciado e culminou com a interdição de entrada do Recorrente na Região por um período de 3 anos.
XXVII. A verdade é que se mostra, salvo o devido respeito por opinião contrária, totalmente desproporcional e desajustada a medida tomada pela Administração, em face da situação concreta em que o ora Recorrente se vê envolvido, se atendermos bem às "punições" a que o Recorrente já foi sujeito.
XXVIII. Ao Recorrente foi indeferido o pedido de autorização de residência (estando o referido processo em sede de recurso contencioso Proc. n.º 800/2015 TSI), não obstante ser casado com uma residente permanente de Macau.
XXIX. Posteriormente, no plano criminal, foi condenado a uma pena que foi suspensa na sua execução e agora interditado de entrar na Região por um período de 3 anos.
XXX. Em suma, esta interdição na Região, por um período de 3 anos, significa tão só que o Recorrente terá de ficar afastado da família, esposa e filha - com menos de um ano - durante todo esse tempo.
XXXI. É verdade que o Recorrente cometeu crime de emprego ilegal, mas vir a ser punido administrativamente da forma como o está, não é justo.
XXXII. A presença do Recorrente na Região é de todo essencial para que possa continuar a acompanhar a família, em especial a filha nos primeiros anos de vida da criança.
XXXIII. A filha do Recorrente ainda não tem sequer um ano de idade, a esposa e a filha são residentes permanentes da RAEM e o Recorrente tem o seu centro de vida na Região.
XXXIV. Estando agora legalmente impossibilitado de regressar à Região até 06/12/2019.
XXXV. Nessa data a filha do Recorrente terá quase quatro anos de idade e viverá os seus primeiros anos de vida afastada do Recorrente, e o Recorrente da filha.
XXXVI. Com todas as consequências que esse crescimento desacompanhado de um dos progenitores poderá acarretar para a criança, em termos afectivos, sociais e económicos.
XXXVII. Toda e qualquer criança necessita - num momento normal e natural de entendimento parental - de uma situação de "união familiar propiciadora de são e integral desenvolvimento da personalidade, psicossomático, psicológico, afectivo [...]" (Proc. n.º 916/2016 TSI).
XXXVIII. Acresce igualmente que o Recorrente é empresário, sendo proprietário de um restaurante na Região, ficando agora, com esta medida de interdição de entrada por 3 anos, impossibilitado de acompanhar a gestão e o desenvolvimento do investimento que efectuou.
XXXIX. O princípio subjacente ao n.º 2 do artigo 5.º do CPA impõe proibição do excesso e a necessidade de adequação entre o meio empregue e o fim a alcançar numa tripla vertente: a adequação, a necessidade e o equilíbrio.
XL. Com a fixação da interdição de entrada na RAEM por 3 anos, os princípios da proporcionalidade e da adequação mostram-se, assim, violados.
XLI. A medida de interdição de entrada na RAEM, enquanto medida preventiva, tem por fim impedir que, da eventual actividade de certos particulares, provenham danos para a sociedade ou para outros particulares.
XLII. No presente caso, não se vislumbra que o ora Recorrente venha a pôr em risco a ordem pública da Região Administrativa Especial de Macau, nem tão pouco a segurança dos que aqui residem e trabalham, após ter passado já pelas experiencias que passou, ter sido punido e ter "sentido na pele" os resultados pela actuação que teve.
XLIII. A ponderação dos interesses em jogo - união e estabilidade familiar com dois residentes permanentes versus segurança pública - se afigura desadequada, desnecessária e desproporcional, o que configura um erro manifesto.
XLIV. Configurando um erro manifesto por parte da entidade Recorrida, o que configura uma violação do princípio da proporcionalidade na sua vertente da adequação, previsto no artigo 5.º do CPA, bem como o princípio da Justiça.
XLV. Inquinando, assim, a decisão recorrida no vício de violação de lei.
XLVI. O que conduz à anulabilidade do acto recorrido, como estatui o artigo 124.º do CPA, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais.
XLVII. Devendo, de tal modo, a decisão de interdição de entrada na RAEM ser revogada por decisão judicial deste douto Tribunal.
XLVIII. A aplicação da medida de interdição de entrada nesta Região deverá obedecer aos princípios da adequação, proporcionalidade e necessidade, não se assemelhando que exista algum motivo para limitar o direito do ora Recorrente, impedindo-o de entrar nesta Região e por um período de 3 anos, medida extremamente gravosa e desajustada face à situação do ora recorrente, nomeadamente pelo facto de ser casado com uma residente permanente e de ter uma filha, com meses de idade, também ela residente permanente da RAEM.
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Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 69 a 77 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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O Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
   “Na petição inicial, o recorrente assacou a violação dos princípios da proporcionalidade, adequação e justiça ao despacho em escrutínio que lhe aplicou a interdição de entrada na RAEM por período de 3 anos, alegando a suspensão da execução da pena única de sete meses de prisão condenada no Processo n.ºCR3-16-0151-PCS (doc. de fls.26 a 31 dos autos), a carência da afeição do pai pela sua filha nascida em 22/07/2016 (doc. de fls.47 dos autos), e a sua qualidade de ser proprietário dum restaurante.
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   Repare-se que na sentença emanada no Processo n.ºCR3-16-0151-PCS, o recorrente foi condenado na pena única de sete meses de prisão com suspensão da execução no período de um ano e seis meses, por ele ter praticado, em autoria material e na forma consumada, dois (2) crimes de emprego ilegal p.p. pelo n.º1 do art.16º da Lei n.º6/2004.
   Na nossa óptica, a suspensão da execução não opera que uma pena de prisão perca da natureza privativa da liberdade. E perfilhamos inteiramente a prudente jurisprudência que inculca: «A autoridade administrativa é livre de retirar as consequências de uma condenação, ainda que suspensa na sua execução e decorrido já o período de suspensão, bem como de uma investigação criminal, ainda que arquivada por prescrição, para avaliação de uma personalidade em vista dos fins perspectivados, sendo de relevar os interesses referentes à defesa da segurança e ordem públicas.» (Acórdão do TSI no Processo n.º315/2004)
   Afirma ainda a douta jurisprudência que a decisão judicial de não transcrição da sentença condenatória no certificado do registo criminal bem como a não revogação da suspensão de execução da pena não obsta à valorização de antecedentes criminais pela Administração para os devidos efeitos, tais como a recusa de pedido de autorização de permanência ou residência em Macau, ou a interdição de entrada na RAEM.
   A nosso ver, é mutatis mutandis válida para aferir ser legal ou não o acto administrativo de interdição de entrada a sensata tese de «第4/2003號法律第九條規定行政長官或經授權的司長得批給在澳門特別行政區居留的許可,且規定批給時應考慮各種因素,當中包括申請人的犯罪前科,即使上訴人的犯罪已逾若干年數,且判刑亦未見嚴厲,但該犯罪記錄仍不失為一犯罪前科,並可作為批准外地人居留澳門的考慮因素的事實性質。» (Acórdão do TSI no Processo n.º244/2012)
   Sem necessidade de citação dos arestos, o que é incontroverso é que a jurisprudência sedimentada pelos Venerandos TUI e TSI e consolidada no ordenamento jurídico de Macau ensina sempre que o n.º2 do art.4º da Lei n.º4/2003 bem como o n.º2 do art.12º da Lei n.º6/2004 conferem real poder discricionário à Administração, cujo exercício é judicialmente insindicável, salvo se padeçam de erro manifesto ou total desrazoabilidade.
   À luz do deliberado parâmetro preconizado pelo Venerandos TSI no acórdão tirado no Processo n.º127/2012, inclinamos à opinião de não enfermar «de manifesto e ostensivo erro grosseiro e tosco» a subsunção pela Administração daqueles 2 crimes de emprego ilegal imputados ao recorrente no conceito indeterminado de «perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas» contemplado no n.º3 do art.12º da Lei n.º6/2004.
   Sem desprezo do aduzido nas XXXVII e XXXVIII conclusões da petição, e em completa observância da orientação jurisprudencial constante e pacífica dos Venerandos TUI e TSI, afigura-se-nos que o período de 3 anos fixado no despacho recorrido à interdição de entrada não eiva de erro grosseiro ou total desrazoabilidade.
   Na opinião de a segurança e ordem públicas da RAEM sobrepor absolutamente os interesses privados alegados nas XXXVII e XXXVIII conclusões da petição, temos por irrefutável que não se verifica, no caso sub iudice, a assacada ofensa dos princípios da proporcionalidade, e da adequação e justiça, consagrados no n.º2 do art.5º e no art.7º do CPA.
   Afinal, convém referir que o Alto TUI asseverou incansavelmente que «Ao Tribunal não compete dizer se o período de interdição de entrada fixado ao recorrente foi ou não proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade dos actos que a determinam, se tal período foi o que o Tribunal teria aplicado se a lei lhe cometesse tal atribuição. Essa é uma avaliação que cabe exclusivamente à Administração; e o papel do Tribunal é o de concluir se houve erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, por violação do princípio da proporcionalidade ou outro.» (Processos n.º13/2012 e n.º112/2014)
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   Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.”
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é o competente.
As partes possuem a personalidade e a capacidade judiciárias.
Mostram-se legítimas e regularmente patrocinadas.
Não há questões prévias, nulidades ou outras excepções que obstam ao conhecimento do mérito da causa.

III – Factos
Com base nos elementos existentes nos autos e no respectivo P.A., é assente a seguinte factualidade com interesse à boa decisão da causa:
1. O Recorrente foi condenado no Tribunal Judicial de Base, em cúmulo jurídico, a 7 meses de prisão - suspensa por um ano -, pelo facto de ter constituído relação de trabalho com indivíduos que não eram titulares de documentos exigidos por lei para serem admitidos como trabalhadores, ou seja, por emprego ilegal.
2. Em 11/10/2016, foi elaborada a proposta nº 1303/CISMPRO/2016P, cujo teor é o seguinte:
“....
於2015年08月11日,本廳外國人事務警司處將下列人士之個案(Pº 880163)轉介本處跟進,由本處於2016年05月03日提起禁止入境程序:
1. 利害關係人A(XX籍,男性,出生日期: 19XX年XX月XX日),持阿根廷護照編號:AAXXXXX88。於2014年間以“家庭團聚”為由申請來澳定居。及後,因其於2015年04月08日被本局查獲在本地區實施[僱用罪],故保安司司長於2015年07月30日作出批示不批准該申請。另就有關決定,利害關係人目前已向中級法院提起司法上訴(參閱本廳補充報告書編號:300207/CESMFR/2015P、保安司司長辦公室公函編號:20151016003/GSS)。
2. 於2015年04月08日,本局總務警司處/監察暨記錄科警員在本地區查獲利害關係人。根據本局調查資料,顯示其在本澳涉嫌觸犯第6/2004號法律第16條第1款“僱用”的犯罪行為,以嫌犯身份被送交檢察院偵訊。(參閱情報廳通知編號2326/2015-Pº.222.03/4G、總務警司處/監察暨記錄科實況筆錄編號064/A/2015-Pº.225.48)
3. 2016年01月07日,本廳致函檢察院以便跟進上述案件之司法進度。於2016年02月03日,本廳收到檢察院寄附控訴書之覆函,控訴書內容顯示已於2016年01月26日對利害關係人所觸犯之兩項非法僱用罪提起控訴。(參閱檢察院公函編號 144/2016/LIC/ISI及第4402/2015號偵查卷宗之控訴書。)
4. 鑒於其行為危害公共治安,故依法禁止入境。
5. 於2016年05月03日,在翻查出入境資料後獲悉利害關係人仍身處本澳,故本處便按照澳門《行政程序法典》第93條及第94條的規定,根據其在本廳填報的本澳住址,以公函編號107576/CISM/2016P於2016年05月03日以雙掛號郵寄方式,將“書面聽證”通知書寄予利害關係人,其可在收到通知書後的20天期限,對書面聽證內容表達意見。
6. 於2016年06月16日本廳收到利害關係人之代理人(莫永誠大律師)提交之書面意見,其提出的書面陳述論點及請求內容撮要如下:(詳見附件 - 1)
- 當事人涉嫌觸犯“僱用”罪,且屬初犯,不認為會對公共安全構成危險。
- 當事人之案卷已於檢察機關審理,目前尚未有最終司法判決結果。
- 當事人在檢察院對其涉嫌觸犯之犯罪行為沒有承認或否認。
- 當事人之案件最終有可能會獲判無罪。
- 當事人涉嫌觸犯之犯罪行為並非會影響公共安全秩序。
- 根據第6/2004號法律制條第1款1項及第4/2003號法律第4條第2款3項之規定,被認定強烈跡象的情況,需要以現行犯情況下被查獲或準備犯罪時被查獲。
- 因此,行政當局不應對當事人採取以為期3年的禁入境措施,因為:(a)沒有跡象顯示當事人犯罪;(b)會抹殺當事人無辜的狀況及會違反無罪推定原則,應待有司法判決才進行,現階段不應禁止其入境。
7. 於2016年06月21日,利害關係人以妻子分娩在即,分娩前後需陪伴妻子及即將出生的小孩為由,要求當局批准例外在澳延長逗留90日。及後,保安司司長於2016年07月14日作出批示,批准其在本澳例外延長逗留至2016年09月28日。基於此,本廳便先行暫停有關之禁止入境程序,直至利害關係人獲批之延長逗留許可完結後才重啟程序。(參閱本廳報告書編號:200049/CESMPRO/2016P、通知編號:11491/2016/CI)
8. 於2016年07月19日,本廳另收到初級法院就有關案卷所作之判決結果,內容顯示利害關係人因觸犯第6/2004號法律第16條第1款所規範之兩項僱用罪被判處7個月徒刑,暫緩執行徒刑1年6個月。(參閱檢察院公函編號144/2016/LIC/ISI及第4402/2015號偵查卷宗之控訴書、初級法院公函編號8732/2016/CR3/AC及初級法院第CR3-16-0151-PCS號卷宗的判決書)。
9. 考慮到利害關係人獲批之例外延長逗留許可經已完結,故本處接續執行相關禁止入境程序,並因應上述判決結果及其書面陳述內容一併考慮後,作出如下分析:
- 執行稽查警員在涉事店鋪除查獲兩名非法工作的外籍人士外,即場更查獲案中的僱主,即利害關係人。
- 涉案店舖職員雖未有指出誰是兩名非法僱員的僱主,但都能說出兩人於店舖內擔任的具體工作崗位。
- 利害關係人既為店舖東主,兩名非法僱員均指其為聘用僱主,種種跡象顯示利害關係人確曾有作出非法僱用之行為。
- 初級法院已就有關案卷作出判決,根據判決結果顯示利害關係人因觸犯第6/2004號法律第16條第1款所規範之兩項僱用罪被判處7個月徒刑,暫緩執行徒刑1年6個月。
- 綜合上述,特別是考慮到利害關係人已被判處剝奪自由的刑罰,故建議根據第 4/2003號法律第4條第2款3項結合第6/2004號法律第12條第2款1項、第3款及第4款的規定,建議禁止利害關係人再進入本澳,為期3年。
呈上有關文件予上級決定…”。
3. Em 07/12/2016, o Secretário para a Segurança proferiu o seguinte despacho na referida proposta: “Considerando o informado, com especial destaque para a certidão da sentença condenatória proferida em 2016.07.07, contra o visado, pelo Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, e porque considero existir o perigo efectivo para a segurança e ordem públicas da RAEM, decido aplicar ao cidadão A a medida de interdição de entrada, pelo período de 3 (três) anos, ao abrigo do artigo 12.°, n.º 2, alínea 2), e n.ºs 3 e 4, por remissão para o artigo 4.º, n.º 2, alínea 2), da lei n.º 4/2003…”.
4. A filha do Recorrente nasceu em Macau em 22/07/2016.
5. A esposa e a filha são residentes permanentes da RAEM.
6. O Recorrente é empresário, sendo proprietário de um restaurante na RAEM.
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IV – Fundamentação
Na óptica do Recorrente, a sua entrada e permanência na RAEM não causam qualquer perigo efectivo para a segurança e ordem pública, daí que o acto recorrido enferma dos vícios de violação de lei, erro no pressuposto de facto.
Além disso, entende também que o prazo de 3 anos de interdição é excessivo, o que viola o princípio da proporcionalidade.
Nos termos da al. 2) do nº 2 do artº 4º da Lei nº 4/2003, pode recusar-se a entrada dos não-residentes na RAEM em virtude de que terem sido condenados em pena privativa de liberdade, na RAEM ou no exterior.
Por sua vez, o artº 12º, nºs 3 a 4, da Lei nº 6/2004, dispõe que a interdição de entrada pelo motivo supra indicado deve fundar-se na existência de perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas da RAEM e o período de interdição deve ser proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade dos actos que a determinam.
Trata-se aqui de um poder discricionário da Administração, que tem um campo de actuação bastante largo e só fica sujeito ao controlo judicial em casos de erro manifesto ou total desrazoabilidade (cfr. artº 21º, nº 1, al. d) do CPAC).
No caso em apreço, a Entidade Recorrida concluiu simplesmente a existência do perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas da RAEM com base na condenação penal do Recorrente, pela prática de dois crimes de emprego ilegal.
Ora, a jurisprudência local tem entendido que “a interdição de entrada não constitui consequência directa da prática dos crimes pelos quais vem condenado, mas sim medida policial de prevenção tomada em consequência da análise de personalidade e situação pessoal de um não-residente da RAEM” (Ac. do TUI, de 30/7/2008, proferido no Proc. nº 34/2007).
Assim, a Entidade Recorrida não pode, com base simplesmente na condenação penal do Recorrente, concluir a existência do perigo efectivo.
Para o efeito, a Entidade Recorrida tem de pegar factos concretos e objectivos para o preenchimento do conceito indeterminado do perigo efectivo.
Não o tendo feito, não implica a verificação do vício substancial no sentido da inexistência do pressuposto legal de perigo efectivo tal como é pretendida pelo Recorrente, mas sim a verificação do vício formal de falta de fundamentação.
Como este vício não foi invocado, não podemos conhecê-lo oficiosamente.
Passamos então analisar o vício da violação do princípio da proporcionalidade invocado pelo Recorrente.
Nos termos do nº 2 do artº 5º do CPC, “as decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar”.
É este o chamado princípio da proporcionalidade.
A ideia central deste princípio projecta-se em três dimensões injuntivas: adequação, necessidade e equilíbrio. A adequação impõe que o meio utilizado seja idóneo à prossecução do objectivo da decisão. Entre todos os meios alternativos, deve ser escolhido aquele que implique uma lesão menos grave dos interesses sacrificados. O equilíbrio revela a justa medida entre os interesses presentes na ponderação e determina que, na relação desses interesses entre si, deve a composição ser proporcional à luz do interesse público em causa.1
Além disso, a própria Lei nº 6/2004 também manda que o período de interdição deve ser proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade dos actos que a determinam.
No caso em apreço, a Recorrente é primário e tem família na RAEM, sendo a esposa e a filha menor ambos residentes permanentes de Macau.
A censurabilidade do facto ilícito praticado por ele (ter empregado dois trabalhadores não residentes no seu estabelecimento de comida) não é tão elevada como outros crimes mais graves, tais como a ofensa dolosa à integridade física da pessoa, o furto, o roubo, o tráfico de droga, etc.
No âmbito do Recurso nº 6/2000, o TUI,por Acórdão de 27/04/2000, decidiu que a medida de interdição de entrada por um período de 3 anos é excessivo e desproporcional para um indivíduo residente de Hong Kong que tinha sido condenado por posse de drogas perigosas em Hong Kong em 1984 e 1997, respectivamente, nas multas de HKD$1.000,00, HK$2.000,00, por entender que “proibir a entrada em Macau a um cidadão de Hong Kong pelo período de três anos, que tinha cometido apenas pequenos delitos criminais, com fundamento na ameaça para a ordem pública e segurança de Macau, está a contrariar manifestamente o equilíbrio entre os interesses prejudicados e o fim a prosseguir e a adequação entre o meio e o fim, exigidos pelo princípio da proporcionalidade. A interdição da entrada em Macau de um não residente implica a limitação da sua liberdade de entrada. De acordo com os factos provados, as situações do recorrido não são de tal medida que constitui ameaça para a ordem pública e segurança de Macau. No âmbito do presente caso concreto, é evidente que os direitos do recorrido foram limitados inadequadamente em comparação com o fim de proteger a segurança pública de Macau quando foi interditada a entrada em Macau com esses fundamentos”.
Assim e tendo em conta a jurisprudência do TUI, concluímos que o prazo de 3 anos de interdição da entrada do Recorrente é manifestamente excessivo, o que viola o princípio da proporcionalidade, gerando assim a anulabilidade do acto.
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Tudo visto, resta decidir.
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V – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar procedente o presente recurso contencioso, anulando o acto recorrido.
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Sem custas, por a Entidade Recorrida gozar da isenção subjectiva.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 08 de Fevereiro de 2018.
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Ho Wai Neng Mai Man Ieng
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José Cândido de Pinho
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Tong Hio Fong

1 Cfr. David Duarte, Procedimentalização, Participação e Fundamentação: Para Uma Concretização do Princípio da Imparcialidade Administrativa Como Parâmetro Decisório, Almedina, Coimbra, 1996, 319 a 325.
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183/2017