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Processo nº 217/2014
Data do Acórdão: 08MAR2018


Assuntos:

Imposto do selo especial
Liquidação do imposto
Matriz predial
Presunção legal


SUMÁRIO


A presunção legal fundada na matriz predial é ilidível mediante prova em contrário.


O relator


Lai Kin Hong


Processo nº 217/2014

I

Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

A, Limitada, devidamente identificada nos autos, vem recorrer do despacho do Secretário para a Economia e Finanças que, em sede de recurso hierárquico, manteve a decisão da Directora dos Serviços de Finanças que lhe indeferiu a substituição da guia de pagamento do imposto de selo, concluindo e pedindo que:
1. Através do presente recurso pretende a Recorrente impugnar o despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças, datado de 13 de Fevereiro de 2014, que indeferiu o Recurso Hierárquico apresentado pela Recorrente em 5 de Novembro de 2013 mantendo a decisão que considerou ser devida a taxa adicional de 10% a que se refere o artigo 42° da Tabela Geral do Imposto do Selo, em virtude do disposto no artigo 53.° - A do Regulamento do Imposto do Selo, na redacção conferida pela Lei n.º 15/2012.
2. A ora Recorrente adquiriu em 18 de Julho de 2013 por escritura pública de compra e venda o terreno situado no XXX, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número XXX do livro B-31, pelo preço de HKD$85,000,000.00 (oitenta e cinco milhões de dólares de Hong Kong), equivalente, para efeitos fiscais a MOP$87,550,000.00 (oitenta e sete milhões e quinhentas e cinquenta mil dólares Patacas), requerendo de imediato a liquidação do imposto de selo devido pela transmissão mencionada supra.
3. Na guia de pagamento apresentada pela Repartição de Finanças com o nº 2013-08-917185-9-0, foram contabilizados o imposto de selo devido nos termos do disposto no art. 51°, alínea a) do Regulamento de Imposto de Selo (RIS) e, adicionalmente, a taxa de 10% prevista no artigo 2° da Lei nº 15/2012, por supostamente tal imóvel se destinar à habitação, o que não corresponde à verdade.
4. O imóvel adquirido através da referida escritura de compra e venda trata-se de um simples terreno para construção, onde no passado fora edificado um edifício, o qual foi demolido nos idos anos de 2002.
5. A ora Recorrente veio a adquirir o referido terreno para construção, não existindo sobre o mesmo nenhum edifício para fins habitacionais,
6. Os dados constantes do registo matricial e predial com base nos quais foi elaborada a escritura pública em causa encontravam-se desactualizados por força da demolição do edifício, sendo evidente que o imóvel em causa não se destinava à habitação, e consequentemente, não será devido o imposto de selo adicional de 10%,
7. Resulta claro que a referida taxa adicional incide sobre a transmissão de bens imóveis destinados à habitação, no entanto, reiteramos que no imóvel adquirido e que aqui se encontra em questão não existe qualquer edifício, nem tão pouco existe qualquer imóvel destinado à habitação.
8. Facto demonstrativo de que o edifício situado no prédio em questão havia já sido demolido é também o facto de o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais ("IACM") ter efectuado em 04/09/2002, 10-11/11/2003 e 15/06/2004 diversos serviços de limpeza do terreno.
9. A aplicação da taxa adicional de 10% ao caso em concreto não se coaduna com o escopo da lei, nomeadamente, com o artigo em referência.
10. Quando a ora Recorrente adquiriu legitimidade para tal, procedeu à rectificação dos dados matriciais, dando de imediato conhecimento às Finanças através da apresentação do Modelo M/10 em 12 de Agosto de 2013, que o imóvel em questão se trata de um simples terreno para construção, onde o edifício que ali se encontrava já havia sido demolido, desde os idos anos de 2002,
11. Ficando assim estes serviços a conhecer, de facto, o estado do imóvel e a falta do pressuposto fundamental para a aplicação da taxa adicional de 10%.
12. São conhecidas as inúmeras e frequentes situações em que a administração tributária revê e altera as suas liquidações de imposto quando toma conhecimento de que a realidade do facto tributário e as circunstâncias da sua tributação não correspondem às declarações prestadas pelos contribuintes.
13. O mesmo deverá ser permitido nos casos em que a revisão e reconhecimento de circunstâncias conduzem à redução dessa mesma situação fiscal, como é o caso.
14. Por essa razão, e atendendo às circunstâncias factuais que foram do conhecimento dos Serviços de Finanças no caso concreto, tal correcção também deveria ter sido feita, tanto mais que a ora Recorrente, após ter sido notificada para o pagamento da referida taxa adicional, expôs de imediato ao serviço de finanças o estado do imóvel e juntou a documentação a sustentar tal circunstância.
15. A Administração agiu em desconformidade com a Lei, pois incorreu num erro manifesto sobre os pressupostos de facto, no momento em que atribuiu a um terreno para construção a qualidade de edifício habitacional, gerando uma responsabilidade tributária, que, naturalmente, não se verifica, estando o acto do qual se recorre inquinado do vício de violação de lei, o que gera a anulabilidade do mesmo acto.
16. A Recorrente não podia, em data anterior à da aquisição do imóvel, formalizada na escritura pública de 18.07.2013, iniciar qualquer procedimento tendente à regularização da correspondente matriz, na exacta medida em que carecia de legitimidade para o fazer.
17. De acordo com a Lei, não poderia em situação alguma ter a ora Recorrente promovido a entrega do impresso modelo M/10 por se verificar a sua ilegitimidade para o efeito, pois só a então proprietária poderia ter requerido alterações à matriz, como expressamente reconhecem os Serviços de Finanças na Proposta nº 001/NAJ/DB/14, de 17 de Janeiro.
18. Por essa razão a apresentação do impresso modelo M/10 junto da Direcção dos Serviços de Finanças foi feita no dia 12.08.2013, ou seja, quando a Recorrente já possuía legitimidade para proceder a tal apresentação.
19. Donde, também nesta matéria, resulta inquinado o acto recorrido pelo vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, devido à ilegitimidade da Recorrente para a correcção matricial, o que gera a anulabilidade do acto.
20. Resulta da leitura da escritura de compra e venda do imóvel que é transmitente do mesmo a "B" ou "B1", entidade beneficiária do estatuto jurídico de utilidade pública administrativa.
21. Neste sentido, encontrava-se a transmitente excluída de tal tributação na exacta medida da isenção subjectiva que prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 8.° do RCPU.
22. Ou seja, a conformidade da matriz predial em termos que pudessem conduzir a uma tributação efectiva da transmitente é absolutamente irrelevante, porque também o é a existência de um valor matricial.
23. Para a transmitente, enquanto entidade isenta de CPU, é unicamente essencial que o prédio se encontre identificado e que conste da matriz a propriedade que sobre ele detinha e que só terminou com a transmissão que veio a originar a prolação do acto administrativo de liquidação ora impugnado.
24. Caso a transmitente tivesse entregue o impresso modelo M/10 nos termos do artigo 66.º do RCPU, a inscrição matricial em causa teria de ser oficiosamente cancelada, dando origem a um prédio omisso na matriz.
25. A falta de cumprimento de uma obrigação declarativa de terceiros não pode ter outros efeitos que não sejam aqueles que a própria lei lhes aponta,
26. De acordo com o que se extrai do capítulo de penalidades do RCPU, o não cumprimento de uma obrigação declarativa nele prevista conduz exclusivamente à aplicação de uma pena de multa, a aplicar em procedimento por infracção administrativa, que obedecerá a uma das molduras penais constantes do artigo 101.º do mesmo Regulamento, e nunca à transformação de uma circunstância de facto real numa circunstancia aparente, com as nefastas consequências que tal poderá acarretar na situação fiscal do contribuinte (in casu, não faltoso).
27. Assim, tem a Recorrente como certo que o facto de as inscrições matriciais nada mais poderem fazer presumir que a propriedade de um imóvel e, mesmo assim, exclusivamente para efeitos tributários como dita o artigo 55.º da RCPU e que, a falta da entrega do impresso modelo M/10 de prédio demolido não contém qualquer outra consequência para além da penal,
28. Para o legislador, a falta do referido impresso, quando se trata de prédio devoluto, implica não só o pagamento da penalidade mas também a improcedência de qualquer dedução ou anulação tributária com referência aos duodécimos que ocorram entre o momento em que deveria ter sido satisfeita a obrigação declarativa e o momento em que efectivamente esta é cumprida, tudo se passando como se de uma penalidade acessória se tratasse.
29. Neste caso a lei fiscal determina que se presuma o prédio como efectivamente arrendado ainda que o não esteja, não sendo assim, quando o impresso modelo M/10 serve para a inscrição de prédios demolidos: aí a única consequência legal coloca-se ao nível das infracções administrativas.
30. Assim, a falta de apresentação do impresso modelo M/10 pela transmitente, não pode legitimar que a aquisição de um imóvel cuja matriz se encontra desactualizada conduza à presunção a que aderiu o acto recorrido, o que, tratando-se de mero terreno para construção, ainda que adquirido por pessoa colectiva, não pode a transacção ser sujeita ao artigo 53.° - A do RIS nem à taxa agravada do artigo 42 da TGIS.
31. Donde, também nesta matéria, resulta o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, devido à Irrelevância dos dados matriciais, havendo clara violação do Principio da Legalidade, ao aplicar erradamente o artigo 53°-A do Regulamento do Imposto de Selo, o que gera a anulabilidade do acto.
32. Embora a detenção de imóveis continue a ser tributada em CPU, a transmissão desses imóveis deixou de se efectuar nos termos do Código do Imposto da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações,
33. Contudo, desde que a tributação dinâmica do património passou a realizar-se a coberto do RIS, a única ligação que permanece e que é legítima em termos de execução das leis tributárias fica-se pelo n.º 2 do artigo 55.°.
34. Ou seja, quando se trate da tributação de imóveis inscritos na matriz constitui regra que a matéria colectável é o valor declarado pelo contribuinte mas, caso o valor matricial seja superior, a liquidação terá por base o último dos valores referidos.
35. Donde, a utilização da matriz, organizada nos termos do RCPU, para liquidação do IS só pode ter por referência o valor matricial e nunca qualquer outro dado que dela conste, designadamente o tratar-se, ou não, de prédio urbano, demolido, devoluto, arrendado ou não arrendado.
36. Dita a Lei que a única conexão entre o IS e a CPU seja o valor matricial e, por isso, também por esta via falece a interpretação da administração fiscal, resultando igualmente no vício de violação de lei, não tendo sido respeitado o limite à conexão entre o Imposto do Selo e a Contribuição Predial Urbana, por manifesta violação do Principio da Justiça, o que gera a anulabilidade do acto.
37. A administração careou para a falta de entrega do impresso modelo M/10 em virtude de demolição as mesmas consequências que a lei prevê, exclusivamente, para a falta de entrega desse mesmo impresso quanto à declaração de prédio devoluto.
38. A DSF, ao admitir a existência de uma lacuna, introduziu um elemento na análise do RCPU que conduz a que a mesma tenha sido preenchida com recurso à analogia.
39. Sendo a integração de lacunas da lei genericamente admitida pelo artigo 9.° do Código Civil, enquanto forma de interpretação e aplicação da mesma, em Direito Fiscal tal prática é absolutamente ilegal.
40. O Princípio da Justiça Material, como regra substantiva para a aplicação das normas tributárias ao caso concreto, sujeita a administração tributária a fazer prevalecer a verdade dos factos sobre quaisquer formalismos.
41. A aplicação da taxa agravada a que se reporta o artigo 42 da TGIS, por força do artigo 53.° - A do RIS, à transmissão em causa, pela administração tributária, a partir do momento em que sabe que a transmissão tem por objecto um terreno para construção e não um imóvel destinado a habitação, constitui violação do Princípio da Justiça Material.
42. Donde, resulta o vício de violação de lei, por violação do Principio da Legalidade e do Princípio da Justiça Material, o que gera a anulabilidade do acto.
Nestes termos e nos melhores de Direito, requer-se seja proferido Douto Acórdão por esse Venerando Tribunal que, nos termos do disposto no artigo 21°, nº 1 do CPAC, anule o acto recorrido de aplicação de taxa adicional de 10% e consequentemente se proceda à anulação da guia de pagamento nº 2013-08-917185-9-0, por tal acto se mostrar inquinado de:
a) Vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto;
b) Vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, por violação do artigo 53.º - A do Regulamento do Imposto do Selo (doravante "RIS"), na redacção conferida pela Lei n.º 15/2012;
c) Vício de violação de lei por violação dos princípios da justiça e da legalidade, na vertente do princípio da proibição da analogia em Direito Fiscal, bem como do princípio da justiça material.
Para tanto, requer a V.Ex.a se digne ordenar a citação da Entidade Recorrida, para responder querendo, no prazo legal, e juntar aos autos o original do processo administrativo respectivo.

Citado, veio o Secretário para a Economia e Finanças, contestando pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do acto recorrido.

Por despacho do Relator, foi indeferido o pedido de inquirição das testemunhas.

Foram a recorrente e a entidade recorrida notificadas para apresentar alegações facultativas.

Tanto a recorrente como a entidade recorrida apresentaram alegações facultativas, reiterando grosso modo as razões já deduzidas na petição do recurso e na contestação.

Em sede de vista final, o Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pela procedência do presente recurso.

Colhidos os vistos, cumpre conhecer.

O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.

O processo é o próprio e inexistem nulidades e questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.

Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.

Vejamos.

De acordo com os elementos existentes nos autos, é tida por assente a seguinte matéria de facto com relevância à decisão do presente recurso:

* Por escritura pública de 18JUL2013, foi celebrado um contrato de compra e venda, de que é compradora a ora recorrente e que tem por objecto o prédio urbano sito em Macau, na XXX;

* De acordo com a matriz predial da DSF existente em à data da transmissão, o mesmo prédio tem a finalidade de habitação;

* Para o efeito da liquidação do imposto do selo devido, foi apresentado à DSF pela compradora, ora recorrente, o impresso M/1 aprovado pelo despacho do Chefe do Executivo nº 150/2001;

* Foi-lhe emitida a guia de pagamento do imposto do selo, no impresso M/2, em que se aplicou, para o cálculo do valor do imposto a pagar, a taxa adicional de 10%, fixada nos artigos 42 ou 43 da Tabela Geral do Imposto do Selo, alterada pela Lei n.º 15/2012 – vide as fls. 49 do processo do procedimento administrativo;

* Mediante õ requerimento datado de 12AGO2013 dirigido à Directora dos Serviços das Finanças, a adquirente do prédio, ora recorrente, pediu, a emissão, em substituição daquela guia de pagamento acima referida, da nova guia de pagamento em que não se aplicaria a taxa adicional de 10%, tendo para o efeito alegado que o imóvel que adquiriu é um simples terreno destinado à construção, inexistindo nele nenhum edifício para fins habitacionais e juntado, entre outros documentos, fotografias do imóvel – vide as fls. 26 a 58 do processo do procedimento administrativo;

* Por despacho datado de 26SET2013 da Directora dos Serviços das Finanças, foi indeferido o pedido – vide as fls. 75 do processo do procedimento administrativo;

* Notificada e inconformada do indeferimento, a adquirente do prédio, ora recorrente, interpôs recurso hierárquico para o Chefe do Executivo, mediante o requerimento ora constante das fls. 115 e s.s. do processo do procedimento administrativo, reiterando grosso modo os mesmos fundamentos já invocados, em sede do pedido dirigido à Directora dos Serviços das Finanças, e pedindo a não aplicação da taxa adicional de 10%;

* Em sede de recurso hierárquico, o ora recorrente juntou vários documentos para demonstrar a situação actual do imóvel, nomeadamente uma certidão passada pela DSSOPT, ora constante das fls.103, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

* Por despacho datado de 13FEV2014 do Secretário para a Economia e Finanças, foi indeferido o recurso hierárquico; e

* Notificada do indeferimento do recurso hierárquico, e de novo inconformada, veio a adquirente, ora recorrente, recorrer contenciosamente para este TSI.

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do artº 1º do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

A recorrente imputou ao acto recorrido o vício da violação da lei, na forma de erros nos pressupostos de facto e de direito, assim como a violação dos princípios da justiça material e da proibição da analogia no Direito Fiscal.

No fundo, em face das conclusões na petição do recurso e reiteradas nas alegações facultativas, a única questão suscitada no presente recurso consiste em saber se é a situação de facto do prédio com o nº XXX, ou a sua situação descrita na matriz, que deve ser atendida para o efeito da liquidação do imposto do selo pelo facto da sua transmissão, gerador da obrigação do pagamento do imposto nos termos do Regulamento do Imposto do Selo, doravante simplesmente designado por RIS.

A Lei n.º 6/2011 cria o imposto do selo especial com vista ao combate à especulação imobiliária para habitação.

Esta lei foi posteriormente alterada pela Lei nº 15/2012, que visa alargar o âmbito da incidência deste imposto do selo especial por forma a combater não só a especulação dos bens imóveis destinados a habitação, como também a dos bens imóveis destinados a fins comerciais, de escritórios ou de estacionamento de veículos motorizados.

Para o efeito, foi dada a nova redacção ao artº 1º da Lei nº 6/2011, que determinam quais são os bens imóveis cuja transmissão é geradora da obrigação do pagamento do imposto do selo, foi aditado o artº 53º-A ao RIS e foi aditados artºs 42 e 43 à Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa RIS.

Com essas alterações operadas pela aprovação da nova Lei nº 15/2012, artº 1º da Lei nº 6/2011, o artº 53º-A do RIS e os artºs 42 e 43 da Tabela Geral do Imposto do Selo anexa RIS, passou a ter seguinte redacção:

Artº 1º da Lei nº 6/2011 – A presente lei cria o imposto do selo especial que é devido na transmissão de bens imóveis destinados a habitação, com fins comerciais, de escritórios ou de estacionamento de veículos motorizados, localizados na Região Administrativa Especial de Macau, adiante designada por RAEM, construídos, em construção ou em projecto de construção, adiante designados por bens imóveis, ou direitos sobre esses bens imóveis, com vista ao combate à sua especulação.

Artº 53º-A do RIS –

1. Aos documentos, papéis ou actos que titulam a transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis destinados a habitação, quando o adquirente, a título oneroso ou gratuito, desses bens ou direitos é pessoa colectiva, empresário comercial, pessoa singular, ou não residente que não está abrangido pelas isenções do imposto do selo previstas no presente regulamento ou em legislação especial, além do imposto do selo nos termos do disposto no presente regulamento, aplica-se a taxa adicional fixada nos artigos 42 ou 43 da Tabela Geral do Imposto do Selo.

2. O disposto no número anterior aplica-se aos documentos, papéis ou actos que titulam a transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis destinados a habitação, quando coexistem dois ou mais adquirentes, desde que qualquer deles seja pessoa colectiva, empresário comercial, pessoa singular, ou não residente.

3. O disposto no n.º 1 não se aplica aos documentos, papéis ou actos que titulam a transmissão de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis destinados a habitação, quando coexistem dois ou mais adquirentes, sendo pessoas singulares residentes e não residentes, e sendo estes últimos cônjuges ou parentes ou afins na linha recta de todos ou de alguns daqueles.

4. O disposto n.º 1 não se aplica quando os bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis destinados a habitação são adquiridos do cônjuge, em consequência de divórcio, anulação do casamento ou separação judicial de bens.»

E os artºs 42 e 43 à Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa RIS –


N.os dos artigos
Incidência do Imposto
Taxa
Forma de pagamento
42
[…]
[…]
[…]

[…]
[…]
[…]

[…]
[…]
[…]

Taxa adicional pela aquisição a título oneroso, por parte de pessoas colectivas, empresários comerciais, pessoas singulares, ou não residentes, de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis destinados a habitação, nos termos do artigo 53.º-A.
10%
Selo de verba

[…]
 
43
[…]
[…]
[…]

Taxa adicional pela aquisição a título gratuito, por parte de pessoas colectivas, empresários comerciais, pessoas singulares, ou não residentes, de bens imóveis ou direitos sobre bens imóveis destinados a habitação, nos termos do artigo 53.º-A.
10%
Selo de verba

[…]
 

Ora, diz o artº 1º da artº 1º da Lei nº 6/2011, alterada pela Lei nº 15/2012, que a presente lei cria o imposto do selo especial que é devido na transmissão de bens imóveis destinados a habitação, com fins comerciais, de escritórios ou de estacionamento de veículos motorizados, localizados na RAEM, construídos, em construção ou em projecto de construção, adiante designados por bens imóveis, ou direitos sobre esses bens imóveis, com vista ao combate à sua especulação.

Do espírito apreensível dessa norma decorrem claramente o escopo subjacente à criação do imposto do selo especial e a preocupação por parte do legislador de combater as actividades especulativas no sector imobiliário, nomeadamente especulações que têm por objecto bens imóveis destinados a habitação, com fins comerciais, de escritórios ou de estacionamento de veículos motorizados, construídos, em construção ou em projecto de construção.

In casu, está em causa a transmissão de um imóvel, sito na XXX.

Para a Administração Fiscal, a transmissão integra-se no âmbito da incidência do imposto do selo especial, criado pela Lei nº 6/2011, e alterado pela Lei nº 15/2012, uma vez que, segundo os dados existentes na matriz predial, a transmissão tem por objecto um imóvel para habitação.

Pelo contrário, a recorrente defende que estando desactualizados os dados constantes do registo matricial e predial, com base nos quais foi elaborada a escritura pública da transmissão, por força da demolição do edifício, não será devido o imposto do selo especial, com o adicionamento de 10%, pois o imóvel transmitido é apenas um terreno destinado a construção.

Para o efeito, a ora recorrente juntou em sede de recurso hierárquico para o Secretário para a Economia e Finanças, vários documentos comprovativos de que a edificação existente na XXX, já tinha sido demolida.

Na verdade, não tendo, ainda no procedimento do 1º grau, conhecimento de que foi demolida a edificação para habitação antes existente no local declarado pela contribuinte, ora recorrente, a Administração Fiscal não podia senão proceder à liquidação do imposto do selo especial com base na matriz predial existente no seio da DSF.

Portanto, ao tomar o objecto transmitido como bem imóvel para habitação para a liquidação do imposto do selo especial, a Administração Fiscal não andou mal.

Todavia, o que sucedeu no procedimento do 2º grau já não pode ficar imune da censura.

Tal como vimos na matéria assente e resultou dos elementos existentes nos autos, a contribuinte, ora recorrente, apresentou, pelo menos no dito procedimento do 2º grau, à Administração Fiscal vários documentos, a fim de a convencer de que o objecto transmitido é apenas um terreno.

Dentre os documentos apresentados, temos uma certidão passada pela DSSOPT comprovando que a edificação localizada no XXX já foi demolida em 2002 (位於澳門XXX之樓宇……已於2002年被拆除。)

O que significa que a Administração Fiscal, no procedimento do 2º grau, ciente de que efectivamente não está em causa a transmissão de um imóvel para habitação, mas sim um terreno destinado à construção, continua a insistir na tributação da transmissão como se fosse a transmissão de um imóvel destinado à habitação, com base nos elementos desactualizados existentes na respectiva matriz predial.

Então, urge averiguar qual deverá ser a natureza jurídica e a força probatória dos elementos existentes numa matriz predial.

A matriz predial encontra-se prevista e regulada no Regulamento da Contribuição Predial Urbana, aprovada pela Lei nº 19/78/M, doravante simplesmente designado por RCPU.

Nos termos do disposto nos artºs 53º, 55º e 56º do RCPU, a matriz predial é o tombo de todos os prédios da RAEM; as inscrições matriciais só constituem presunção de propriedade para efeitos tributários; e a matriz deverá conter os elementos necessários à identificação dos prédios inscritos e dos respectivos contribuintes, bem como os dados relevantes para o cálculo e liquidação da contribuição.

Por sua vez o artº 66º do RCPU dispõe que a eliminação das inscrições matriciais dos prédios demolidos será feita oficiosamente, mediante a apresentação do modelo M/10 e após informação dos serviços de fiscalização.

In casu, por um lado, temos a presunção de propriedade para efeitos tributários fundada na matriz predial, segundo a qual o prédio existente à data da transmissão é um imóvel para habitação.

E por outro lado, temos as provas, nomeadamente uma certidão passada pela DSSOPT, um documento autêntico, onde se certifica que a edificação ali existente já foi demolida em 2002, muito antes da data da transmissão para a adquirente, ora recorrente.

Nestas circunstâncias, cremos que a natureza jurídica da presunção fundada na matriz predial é determinante da solução.

Diz o artº 343º/2 do CC que as presunções legais podem ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei o proibir.

Ora, o artº 55º do RCPU, diz simplesmente que as inscrições matriciais só constituem presunção de propriedade para efeitos tributários, é de concluir que se trata de uma presunção juris tantum, ou seja, sujeita à prova em contrário.

No caso vertente, foi levado ao conhecimento à Administração, em sede de recurso hierárquico para o Secretário para a Economia e Finanças, de que a edificação implantada no XXX já foi demolida em 2002.

Factualidade que nem a Administração questionou.

A recorrente imputou ao acto recorrido o vício do erro nos pressupostos de facto.

Há erro nos pressupostos de facto quando os factos que sirvam de fundamento a um acto administrativo não são verdadeiros, ou apenas putativos ou erradamente reputados como verdadeiros pela Administração na prática do acto.

É efectivamente o que sucedeu no caso em apreço.

Pois, não obstante apoiada na presunção fundada na matriz predial, a Administração Fiscal incorreu no erro na apreciação das provas, por ter considerado erradamente ela própria vinculada pela força probatória plena da matriz predial e ignorado de todo em todo as provas trazidas pelo particular interessado, e acabou por reputar como verdadeiro o facto de a transmissão ter por objecto um imóvel para habitação.

Ao tomar como assente um facto que não correspondente à realidade, a Administração, ciente de que a realidade era outra, actuou com erros nos pressupostos de facto.

É de anular portanto o acto recorrido e ficar prejudicado o conhecimento das outras questões.

Em conclusão:

A presunção legal fundada na matriz predial é ilidível mediante prova em contrário.

Resta decidir.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência julgar procedente o recurso, anulando o acto recorrido.

Sem custas.

Registe e notifique.

RAEM, 08MAR2018

Lai Kin Hong
Fong Man Chong
Ho Wai Neng

Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa
217/2014-20