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Processo n.º 38/2017. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: Tak Heng Sing – Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada.
Recorrido: Chefe do Executivo.
Assunto: Aplicação das leis de terras no tempo. Contrato de concessão por arrendamento. Falta de aproveitamento dos terrenos concedidos. Violação de documento interno de serviço. Alteração anormal das circunstâncias. N.º 5 do artigo 104.º e artigo 166.º da Lei de Terras de 2013. Acto vinculado. Culpa do concessionário. Alínea 3) do artigo 215.º da Lei de Terras de 2013. Conceito indeterminado.
Data da Sessão: 11 de Abril de 2018.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
I – Os artigos 212.º e seguintes da nova Lei de Terras (Lei n.º 10/2013), entrada em vigor em 1 de Março de 2014, prevalecem sobre as disposições gerais relativas a aplicação de leis no tempo constantes do Código Civil.
II – No que respeita aos direitos e deveres dos concessionários a alínea 2) do artigo 215.º da nova Lei de Terras faz prevalecer o convencionado nos respectivos contratos sobre o disposto na lei. Na sua falta, aplica-se a nova lei e não a antiga lei (Lei n.º 6/80/M), sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do Código Civil nos termos do qual “a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular”.
III – Tendo em conta que o proémio do artigo 215.º da nova Lei de Terras já determina a aplicação da lei às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, a intenção da alínea 3) do mencionado artigo 215.º, é a de aplicar imediatamente dois preceitos da lei nova (n.º 3 do artigo 104.º e artigo 166.º), mesmo contra o que esteja convencionado nos respectivos contratos (alínea anterior) e na lei antiga, quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário.
IV – Por força do disposto na alínea 3) do artigo 215.º da nova Lei de Terras, a previsão do n.º 3 do artigo 104.º da nova Lei de Terras, sobre o montante da multa, por inobservância dos prazos do procedimento de aproveitamento dos terrenos concedidos, prevalece sobre o n.º 3 do artigo 105.º da lei antiga e sobre a cláusula 8.ª do contrato de concessão por arrendamento do terreno, com a área de 2196 m2, sito na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4ª, dos aterros do Pac On, a que se refere o Despacho nº 70/SATOP/98, do então Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas de 8 de Julho de 1998, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 29, II Série, de 22 de Julho de 1998.
V - Por força do disposto na alínea 3) do artigo 215.º da nova Lei de Terras, no que respeita às concessões provisórias, as alíneas 1) e 2) do n.º 1 do artigo 166.º da lei nova prevalecem sobre as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 166.º da lei antiga e sobre o disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula 15.ª do contrato referido na Conclusão IV.
VI - As instruções de serviço são ordens dados pelos superiores para serem seguidas pelos subalternos de modo a habilitá-los a proceder em circunstâncias futuras que não se sabe precisamente como se apresentarão.
VII - A violação de instrução de serviço pode constituir infracção de dever funcional por parte do subalterno, mas não constitui fonte de direito, pelo que o interessado não pode invocar a violação de instrução, como fundamento de anulação de acto administrativo.
VIII - Cabe ao concessionário de terreno a prova de que as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar sofreram uma alteração anormal e que a exigência das obrigações por ele assumidas afecta gravemente os princípios da boa-fé, não estando coberta pelos riscos próprios do contrato, de modo a impedi-lo de concluir o aproveitamento do terreno no prazo contratual.
IX – O n.º 5 do artigo 104, da actual Lei de Terras não aplica quando o prazo de aproveitamento do terreno expirou na vigência da lei de 1980, dado que não podia ser pedida a suspensão ou a prorrogação do prazo de aproveitamento, que já se esgotara à data da entrada em vigor da Lei de 2013.
X - Do n.º 5 do artigo 105.º da Lei de Terras de 1980 pode retirar-se que o concessionário podia apresentar justificação para o não cumprimento dos prazos.
XI - O acto do Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão por falta de aproveitamento, nos termos do artigo 166.º da Lei de Terras de 2013, é um acto vinculado.
XII - A culpa do concessionário, prevista na norma transitória da alínea 3) do artigo 215.º da Lei de Terras de 2013, constitui um conceito indeterminado, que integra actividade vinculada, de mera interpretação da lei, sindicável pelos tribunais.
O Relator,

Viriato Manuel Pinheiro de Lima


ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
Tak Heng Sing – Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho de 30 de Março de 2015, do Chefe do Executivo, que declarou a caducidade do contrato de concessão por arrendamento de um terreno, com a área de 2196 m2, sito na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, dos aterros do Pac On, nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula decima quinta do contrato de concessão e da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º, da Lei de Terras (doravante designada por nova Lei de Terras1), aprovada pela Lei n.º 10/2013, publicada a 2 de Setembro de 2013 e entrada em vigor a 1 de Março de 2014. Isto é, o acto recorrido declarou a caducidade do contrato de concessão com fundamento em incumprimento da obrigação de realizar o aproveitamento do terreno no prazo contratual.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 2 de Março de 2017, negou provimento ao recurso.
Recorre Tak Heng Sing – Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada, para o Tribunal de Última Instância (TUI), suscitando as seguintes questões:
- O acórdão recorrido não conheceu dos seguintes vícios imputados ao acto recorrido: erro sobre os pressupostos, violação de lei por ofensa às cláusulas 8.ª e 15.ª do contrato, bem como dos artigos 105.º e 166.º da Lei de Terras, aprovada pela Lei n.º 6/80/M, sendo, por isso, nulo, nos termos das alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 571.º do Código de Processo Civil;
- O acórdão recorrido julgou mal não enfermar o acto recorrido de erro sobre os pressupostos de facto, já que os pareceres e informações que classificaram a actuação da recorrente qualificaram a conduta como muito grave quando, face aos critérios definidos na Informação 095/DSODEP/2010, deveria ter sido qualificada como situação menos grave;
- O acórdão recorrido errou ao não considerar o atraso no aproveitamento do terreno como situação de força maior, por virtude da recessão global económica, da eclosão da SARS, da crise financeira asiática, das alterações no ambiente económico e social de Macau, do êxodo da indústria local para o interior da China e outros países vizinhos e da falta de mão-de-obra resultante da abertura da indústria do jogo;
- Ao contrato era aplicável a Lei de Terras, aprovada pela Lei n.º 6/80/M, e não a Lei de Terras nova, como entendeu o acórdão recorrido, pelo que se a Administração não quisesse aceitar as explicações da recorrente para o atraso no aproveitamento do terreno, primeiro teria de aplicar multa e nunca, desde logo, a declaração de caducidade da concessão, nos termos dos artigos 105.º e 166.º daquela Lei e nos termos da cláusula oitava do contrato de concessão;
- O acórdão recorrido violou a lei ao entender que o acto recorrido não violou os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé, da colaboração entre a Administração e os particulares, da decisão, da desburocratização e da eficiência.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência do recurso apenas por violação do princípio da boa-fé, por parte do acto recorrido.


II – Os factos
i) O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
1 - A recorrente é uma sociedade comercial constituída e matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis, sob o nº 9707 (SO), tendo, como objecto social, principalmente, actividades de construção civil e fomento predial.
2 - Por Despacho nº 70/SATOP/98, do então Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas de 8 de Julho de 1998, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 29, II Série, de 22 de Julho de 1998, foi à sociedade recorrente concedido, por arrendamento e com dispensa de concurso público, o terreno com a área de 2196m2, sito na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, dos aterros do Pac On, para construção de um edifício para instalação de unidades industriais e armazéns, afectos a uso próprio.
3 - A referida concessão de terreno por arrendamento, com dispensa de concurso público, embora requerida a pedido dos então interessados, Cheong Siu Kei, Chao Kun e U Cheok Un, então sócios e administradores da sociedade recorrente que vieram posteriormente a constituir-se para o efeito da referida concessão, teve por origem e fundamento a cedência e desocupação, a pedido da Administração de Macau, de três terrenos cujas áreas totalizam 2 775m2, situados juntos à Estrada de Seac Pai Van, no Altinho de Ká-Ho, em Coloane, que os referidos interessados legalmente ocupavam desde longa data.
4 - Pela celebração do contrato de concessão em causa, a Administração de Macau concedeu à sociedade recorrente, por arrendamento, o terreno acima identificado, enquanto a sociedade recorrente, em contrapartida, cedeu e desocupou os três terrenos acima identificados, e cumpriu ainda as demais obrigações contratualmente nele fixadas, nomeadamente:
- Desocupação dos três identificados terrenos no contrato de concessão, com a área de 2 775 m2, então legalmente ocupados, embora a título precário;
- Remoção das construções existentes nos terrenos sitos junto à Estrada de Seac Pai Van no Altinho de Ká-Hó, em Coloane;
- Pagamento de sisa na Recebedoria de Fazenda de Macau (vide o respectivo conhecimento nº 16 491/50 357 foi arquivado no processo da Comissão da Terra);
- Pagamento da caução a que se refere o nº 3 da Cláusula décima primeira do contrato, no valor de 500000,00 (quinhentas mil) patacas, prestada mediante da garantia bancária nº CM98/LG/8207, de 15 de Abril de 1998;
- Pagamento da renda fixada na alínea a) da Cláusula quarta, no montante de 37.332,00 (trinta e sete mil, trezentas e trinta e duas) patacas, fixada de acordo com a Portaria n.º 50/81/M, de 21 de Março;
- Desocupação do terreno e remoção do mesmo de todas as construções e materiais, porventura, existentes no terreno concedido por arrendamento, nos termos fixados na Cláusula sexta do contrato da concessão como encargos especiais;
- Pagamento integral do prémio do contrato no montante determinado na cláusula décima do contrato de concessão ora em causa.
5 - No que se refere ao prazo do arrendamento, a cláusula segunda do aludido contrato de concessão estipula que o prazo do arrendamento é válido pelo prazo de 25 (vinte e cinco) anos, contados da data da publicação, no Boletim Oficial, do despacho que titula o contrato de arrendamento em questão, isto é, desde 22.07.1998 até 21.07.2023, podendo ser, no entanto, nos termos da legislação aplicável, ser sucessivamente renovado até 19 de Dezembro de 2049.
6 - Conforme a cláusula terceira do contrato de concessão em causa - «Aproveitamento e finalidade do terreno», “O terreno é aproveitado com a construção de um edifício com 3 (três) pisos, com uma área bruta de construção de 6 588 (seis mil quinhentos e oitenta e oito) metros quadros, destinados à instalação de unidades industriais e armazéns para uso exclusivo da segunda outorgante.”
7 - Nos termos do nº 1 da cláusula quinta do contrato de concessão, “O aproveitamento do terreno deve operar-se num prazo global de 48 (quarenta e oito) meses, contados da data da publicação, no Boletim Oficial, do despacho que titula o presente contrato.”, isto é, até 21 de Julho de 2002, e de acordo com o nº 2 da mesma cláusula, “Sem prejuízo do cumprimento do prazo estipulado no número anterior, a segunda outorgante deve concluir a construção do primeiro piso, correspondente à primeira fase, 18 (dezoito) meses após a publicação do referido despacho.”
8 - Em 23.09.1998, a sociedade recorrente submeteu, nos termos da Cláusula terceira e da alínea a) do nº 3 da Cláusula quinta do contrato de concessão, o anteprojecto de obra (projecto de arquitectura) e estudo prévio para apreciação e aprovação da DSSOPT, a fim de construir um edifício para instalação de unidades industriais e armazéns.
9 - A DSSOPT aprovou o aludido anteprojecto de obra (projecto de arquitectura) e estudo prévio condicionalmente com vista ao cumprimento de determinados requisitos técnicos (fls. 348 e ss. do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras).
10 - A sociedade recorrente não deu seguimento à devida alteração ao projecto de arquitectura de acordo com o solicitado da DSSOPT.
11 - Entre 1998 e 2005 verificou-se em Macau uma crise no sector imobiliário, devido nomeadamente a recessão global económica, a eclosão da SARS, à crise financeira asiática, alterações no ambiente económico e social de Macau, o êxodo da indústria local para a China continental e outros países vizinhos, a falta de mão-de-obra resultante da abertura da indústria dos jogos de Macau, a qual necessita maior número de trabalhadores oferecendo-lhes melhores condições de trabalho.
12 - Em 21.09.2005, a sociedade recorrente requereu à DSSOPT que lhe emitisse a planta de alinhamento para dar seguimento ao projecto das obras de construção nos termos do contrato de concessão em causa, (cfr. requerimento com a entrada nº T-5861 e T-6347, e fls. 44 do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras).
13 - Em 28.11.2006, a sociedade recorrente submeteu um novo requerimento solicitando a alteração de finalidade do terreno concedido por arrendamento, apresentando um estudo prévio, fundamentado na alteração do ambiente no sector industrial de Macau, e por ter referido que a Administração de Macau alegadamente havia aprovado alguns pedidos de alteração de finalidade de diversos terrenos vizinhos da mesma zona. (cfr. requerimento com a entrada nº T-7878 e fls. 309 do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras)
14 - Do aludido pedido de alteração, a sociedade recorrente nunca obteve nenhuma resposta da parte da DSSOPT.
15 - Em 23.03.2009, a sociedade recorrente apresentou um pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento (cfr. requerimento com a entrada nº T-2452 e fls. 276 do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras)
16 - A sociedade recorrente não obteve resposta aos aludidos pedidos, e sobretudo, nem do de alteração de finalidade do terreno, sendo este facto expressamente confessado pela DSSOPT. (Conforme consta da Informação nº 75/DJUDEP/2011, de 27.12.2011, fls. 342 a 355 do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras).
17 - A recorrente solicitou em 19.04.2011, informações sobre os anteriores pedidos de alteração de finalidades e de prorrogação do prazo de aproveitamento. (Conforme requerimento com a entrada nº 47033, da Informação nº 75/DJUDEP/2011, de fls. 9, e do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras)
18 - Em 01.07.2011, a sociedade recorrente, em resposta às solicitações da DSSOPT no ofício nº 388/6264.02/DSODEP/2011, datado de 31.05.2011, veio apresentar, no determinado prazo de 30 dias, as justificações pelo atraso no aproveitamento do terreno que lhe era imposto nos termos do contrato de concessão em causa.
19 - Na mesma data de 01.07.2011, a sociedade recorrente recebeu um ofício da DSSOPT, com a referência de 00760/DPU/2011, segundo o qual não seria emitida a nova planta de alinhamento oficial (PAO) até à conclusão e publicação do plano/processo da revisão global de toda a zona industrial do Pac-On, a fim de evitar obstáculos para a execução do novo planeamento que a Administração pretendia introduzir/alterar na dita zona do Pac-On, e que quando o referido plano/processo da revisão global da dita zona fosse concluído e publicado, poderia a sociedade recorrente requerer a emissão de nova planta de alinhamento oficial (PAO) relativamente ao terreno em causa, podendo ainda proceder as obras de construção bem como ao aproveitamento desse mesmo terreno (Doc. fls. 164 e de fls. 297 do Processo nº 66/2013 da Comissão de Terras; tradução a fls. 67-73 do apenso “traduções”).
20 - A sociedade recorrente foi notificada por Ofício da DSSOPT com a referência nº 825/6264.02/DSODEP/2012, datado de 21 de Novembro, que havia iniciado o procedimento de declaração de caducidade da concessão do terreno em causa, bem como o sentido da decisão, podendo a concessionária apresentar a audiência escrita no prazo de 10 dias, contado a partir da recepção da mesma notificação, nos termos do artigo 93.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo.
21 - Em 04.12.2012, a sociedade recorrente apresentou a audiência escrita para a qual foi notificada nos termos do número anterior, tendo apresentado todas razões e motivos pelo atraso no aproveitamento do terreno em questão, tendo exposto ainda as situações de não obter nunca nenhuma resposta da parte da DSSOPT em relação aos seus pedidos ao longo dos anos.
22 - Em 5/06/2014, a Comissão de Terras emitiu o seguinte parecer:
PARECER N.º 44/2014
6. Em 28 de Novembro de 2006, a concessionária apresentou à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) um requerimento, referindo que de acordo com o contrato, o prazo de aproveitamento do terreno já tinha terminado, e uma vez que tinha havido alterações significativas na indústria e económica, o terreno em causa já não servia por isso para a finalidade industrial, solicitava desse modo autorização para alteração da finalidade do terreno, anexando para o efeito o respectivo estudo prévio de arquitectura.
7. Posteriormente, apesar de a concessionária nunca ter recebido qualquer resposta sobre o pedido supramencionado e ter tomado conhecimento da publicação do plano de reordenamento da zona de Pac On em 2009, apresentou por isso novamente à mesma entidade, em 23 de Março de 2009, um requerimento para que o seu empreendimento pudesse ser brevemente concluído, tendo solicitado autorização para a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno por um período de 3 anos, contados a partir da obtenção dessa aprovação.
8. Relativamente ao pedido acima referido, o Departamento de Gestão de Solos (DSODEP) da DSSOPT através da comunicação de serviço interno (CSI) n.º 92/6264.01/2009, de 31 de Março, consultou o Departamento de Urbanização (DURDEP) sobre a situação de apreciação e aprovação do respectivo processo.
9. O DURDEP através da CSI n.º 437/DURDEP/2009, de 18 de Maio, respondeu que de acordo com o despacho do director da DSSOPT de 15 de Fevereiro de 2008 exarado sobre a informação n.º 024/DPU/2007, de 16 de Janeiro, sobre o respectivo processo só se poderia dar seguimento aos trabalhos de apreciação e aprovação após a conclusão e a autorização superior da revisão global do planeamento de toda a zona industrial de Pac On.
II
10. Com o intuito de reforçar a fiscalização às situações de aproveitamento dos terrenos concedidos e optimizar a gestão dos solos, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas (SOPT) determinou através do Despacho n.º 07/SOPT/2010, de 8 de Março, que a DSSOPT notificasse todos os concessionários de terrenos cujos aproveitamentos não tivessem ficado concluídos de acordo com os prazos fixados nos respectivos contratos para justificarem tal facto por escrito, no prazo de 1 mês a contar da data da recepção da notificação, e que a DSSOPT procedesse, após a entrega das respectivas justificações, à sua análise e definição de um plano de tratamento das situações e da respectiva ordem de prioridade.
11. Após várias discussões e análises com o Gabinete do SOPT sobre o tratamento a dar aos terrenos concedidos mas não aproveitados, o DSODEP da DSSOPT, através da informação n.º 095/DSODEP/2010 de 12 de Maio submeteu à consideração superior o mapa da situação dos terrenos concedidos mas não aproveitados, a classificação do grau de gravidade do não cumprimento das cláusulas contratuais, bem como os critérios de tratamento, tudo no sentido de permitir estabelecer orientações claras e precisas para o tratamento dessas situações. A classificação e critérios propostos na referida informação mereceram a concordância do SOPT, tendo os mesmos sido aprovados por despacho do Chefe do Executivo, de 31 de Maio do mesmo ano.
12. De acordo com os “Critérios para a Classificação do Grau de Gravidade” para o tratamento dos terrenos não aproveitados definido na informação supramencionada, o presente processo insere-se situação qualificada de “menos grave” (decorrido o período de validade do projecto aprovado mas não foi efectuada a sua revalidação). Deste modo, o DSODEP De DSSOPT através de ofício de 31 de Maio de 2011 solicitou à concessionária a apresentação de declarações e motivos razoáveis que justificassem o atraso no aproveitamento do terreno, assim como a apresentação de todas as informações aplicáveis às suas justificações.
13. Em 1 de Julho de 2011, A, representando a concessionária, apresentou à DSSOPT uma certidão de registo predial, uma certidão do registo comercial, um calendário de execução de obras, três certidões de capacidade financeira emitidas por bancos, entre outros documentos, e deu as seguintes justificações sobre o não aproveitamento do terreno conforme previsto, resumindo os os seguintes:
13.1 A concessionária referiu que já tinha cumprido as obrigações estipuladas no contrato após a sua publicação em despacho, incluindo a prestação da caução e o pagamento de prémio e foro, etc., o cumprimento dos encargos especiais sobre a desocupação do terreno e apresentação do projecto de arquitectura conforme o prazo fixado no contrato;
13.2 Em pressuposto de diversos factores objectivos de força maior que sucederam no período entre 1998 e 2005, especificamente a crise económica em geral e a alteração do ambiente social (nomeadamente a ocorrência da gripe aviaria, do SARS e da crise financeira asiática), houve uma alteração no ambiente empresarial da economia de Macau em que as indústrias locais se mudaram para a China continental, resultando numa grande desocupação de fábricas industriais locais, sendo assim, o respectivo projecto de arquitectura não pôde ser iniciado conforme previsto;
13.3 Uma vez que tinha tornado conhecimento que a Administração já tinha aprovado alguns pedidos de alteração de finalidade de diversos terrenos, de industrial para outras finalidades, consideraram-se deste modo os factores do ambiente sócio-económico e procedeu-se novamente a uma avaliação e análise do terreno, tendo apresentado em 28 de Novembro de 2006 um projecto de concepção para efeitos de alteração da finalidade do terreno em causa;
13.4 Tendo realizado uma reunião em Março de 2009 com o Departamento de Planeamento Urbanístico (DPUDEP) da DSSOPT, tomou conhecimento que a Administração estava a proceder a um plano de reordenamento da zona de Pac On e pretendia a alteração da finalidade industrial para outras finalidades;
13.5 A concessionária também através de carta inquiriu sobre a situação de apreciação e aprovação do projecto de alteração da finalidade do terreno em apreço, pois era possível que a Administração ainda não tivesse tomado uma decisão final para o planeamento de desenvolvimento da zona de Pac On, no sentido de articular com a situação actual de desenvolvimento da mesma (aeroporto, conclusão do Terminal Marítimo de Pac On e projecto de construção dos edifícios habitacionais localizados na zona envolvente);
13.6 Finalmente, a concessionária solicitou à Administração que aceitasse os factores objectivos acima referidos, pois foram esses motivos que fizeram com que a concessionária não tivesse concretizado até à presente data o projecto de desenvolvimento do terreno em causa, solicitando ainda a sua compreensão para a situação da concessionária, por um lado deveria aproveitar o terreno para fins industriais conforme o compromisso assumido no contrato de concessão, e por outro lado, estava perante a situação de um eventual plano de reordenamento de toda a zona de Pac On a ser realizado pela Administração. Além disso, solicitou ainda orientações da Administração em áreas que pudessem ser viáveis, no sentido de permitir à concessionária empenhar-se imediatamente na coordenação do desenvolvimento do terreno conforme a finalidade industrial que lhe foi atribuída inicialmente ou a nova finalidade do novo planeamento;
13.7 A concessionária deu garantias que caso a Administração tomasse a decisão final para o plano de desenvolvimento de toda a zona de Pac On, a mesma estaria disposta a aproveitar o terreno de acordo com o novo planeamento e cumpriria todas as disposições relativas às obrigações resultantes da alteração da finalidade do terreno.
14. Seguidamente, em 26 de Julho de 2011, a concessionária apresentou à DSSOPT uma justificação complementar. Relativamente à consulta sobre a situação de apreciação e aprovação do projecto de alteração da finalidade do terreno em causa efectuada por parte da concessionária, esta recebeu em 2011 um ofício do DPUDEP, referindo que esse departamento tinha iniciado os trabalhos de estudo sobre o plano de reordenamento do Parque Industrial de Pac On da Taipa, sendo inconveniente o desenvolvimento do terreno de acordo com as condições do plano inicial antes da conclusão e publicação dos respectivos trabalhos de estudo, no sentido de evitar impactos na execução do plano de reordenamento bem como evitar a criação de obstáculos ao novo planeamento depois da reordenação da mesma. Por isso, não iria emitir nesta fase a Planta de Alinhamento Oficial (PAO) do terreno em causa, podendo no entanto a concessionária solicitar a emissão da nova PAO e proceder à respectiva construção após a conclusão e publicação do respectivo plano de reordenamento.
15. Para analisar todo o processo de concessão do terreno em causa, o DSODEP através de CSI solicitou ao DPUDEP e ao DURDEP o fornecimento dos procedimentos detalhados de apreciação e aprovação bem como de informações pormenorizadas sobre as análises feitas respeitantes ao processo.
16. Através da CSI n.º 1028/DPU/2011, de 21 de Julho, o DPUDEP respondeu o seguinte:
16.1 A PAO do lote «O4» foi emitida em 19de Fevereiro de 1993;
16.2 Seguidamente lote «O4» foi dividido nos lotes «O4a» e «O4b» e foi emitida a PAO do lote «O4a» em 22 de Setembro de 1993;
16.3 Através da informação n.º 273/DPU/98, de 4 de Novembro, foi analisado o projecto de arquitectura apresentado em 23 de Setembro do mesmo ano pela concessionária, tendo sido referido que uma vez que a PAO n.º 92A110A aprovado em 22 de Setembro de 1993 já tinha caducado, a concessionária deveria desse modo solicitar a emissão de uma nova PAO para o respectivo projecto, assunto esse de que se informou também o DURDEP;
16.4 Após a solicitação da emissão da nova PAO em 21 de Setembro de 2005 e a apresentação complementar em 17 de Outubro do mesmo ano dos respectivos documentos comprovativos por parte da concessionária, esse departamento através da informação n.º 335/DPU/2005, de 27 de Outubro, propôs à consideração superior a elaboração de urna nova PAO de acordo, com as exigências de planeamento do lote, e na sequência disto, a PAO n.º 92A110 foi emitida em 8 de Novembro do mesmo ano depois da aprovação do director em 7 de Novembro de 2005;
16.5 Através da informação n.º 24/DPU/2007, de 16 de Janeiro, foi analisado o estudo prévio de arquitectura apresentado em 28 de Novembro de 2006 pela concessionária, na qual se considerou que uma vez que o estudo do planeamento de Pac On ainda estava em curso, o director desses Serviços tinha emitido deste modo um despacho em 15 de Fevereiro de 2008, tomando a decisão de que só se poderia dar continuidade aos trabalhos do respectivo processo após a conclusão e a autorização superior da revisão global do plano de intervenção urbanística de toda a zona do Parque Industrial de Pac On. O conteúdo do referido despacho foi comunicado ao DURDEP através de CSI;
16.6 Quanto à inquirição da concessionária sobre o andamento do projecto de alteração da finalidade do terreno, do pedido de prorrogação do prazo ele aproveitamento do terreno e do futuro planeamento daquela zona, esse departamento através de ofício informou-a que em virtude de já se terem iniciado os trabalhos de estudo do plano de reordenamento do Parque Industrial de Pac On da Taipa, era inconveniente o desenvolvimento do terreno de acordo com as condições do plano inicial antes da conclusão e publicação dos respectivos trabalhos de estudo, no sentido de evitar impactos na execução do plano de reordenamento, bem como evitar a criação de obstáculos ao novo planeamento depois da reordenação da mesma. Por isso, não se iria emitir nessa fase a PAO do terreno em causa, no entanto, a concessionária poderia solicitar a emissão da nova PAO e proceder à respectiva construção após a conclusão e publicação do respectivo plano de reordenamento.
17. Através da CSI n.º 810/DURDEP/2011, de 5 de Agosto, o DURDEP respondeu que a concessionária tinha apresentado o projecto de arquitectura em 23 de Setembro de 1998, o qual foi aprovado condicionalmente, e só em 28 de Novembro de 2006 é que a concessionária apresentou o estudo prévio de arquitectura para efeitos de alteração da finalidade do terreno, no entanto, uma vez que ainda se estava a proceder à revisão do plano do Parque Industrial de Pac On, não se deu deste modo seguimento ao respectivo projecto.
18. Segundo o download feito em 24 de Novembro de 2011 das informações relativas ao registo predial, através da “Plataforma de Serviços Registais e Notariais via Internet” da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ), o terreno em causa está descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º 22 957 do livro B e inscrito a favor da concessionária sob o n.º 9937F, não possuindo qualquer registo de inscrição de hipoteca.
19. O DSODEP da DSSOPT elaborou a informação n.º 328/DSODEP/2011, de 28 de Novembro, tendo informado superiormente da situação do processo e considerando que o não aproveitamento do terreno devia ser inteiramente imputado à concessionária, sendo motivos principais os seguintes:
19.1 O projecto de arquitectura apresentado pela concessionária em Setembro de 1998 foi aprovado condicionalmente, no entanto, a mesma não apresentou o projecto de alteração, o que violado obviamente os n.º 1, 2 e 3 da cláusula quinta do contrato de concessão;
19.2 A concessionária referiu que uma vez que tinham sucedido diversos factores objectivos de força maior no período entre 1998 e 2005, os mesmos serviam como justificações para o não cumprimento do aproveitamento do terreno, no entanto, esses factores não se poderiam considerar como justificações suficientes e razoáveis, nem casos de força maior resultantes de eventos imprevisíveis e irresistíveis estipulados no n.º 3 da cláusula oitava do contrato de concessão, uma vez que a concessionária não conseguiu disponibilizar dados suficientes e provas concretas sobre o impacto que tiveram na sua indústria os factores supracitados;
19.3 Pelo contrário, essas justificações demonstram que a concessionária teve falta de interesse no desenvolvimento do empreendimento, fazendo com que o respectivo projecto de arquitectura não pudesse ter sido iniciado conforme previsto. No entanto, como investidor deveria ter procedido a uma avaliação preliminar dos riscos a que incorre qualquer projecto de investimento, preparando-se para quaisquer situações ou crises socioeconómicas e não podendo fugir às suas obrigações contratuais;
19.4 Além disso, a concessionária alegou que a Administração não tinha respondido ao seu projecto de alteração de finalidade do terreno apresentado em 2006. De facto, o prazo de aproveitamento do terreno já tinha terminado em 2002, deste modo, a não obtenção de aprovação desse pedido não podia ser uma justificação para que o aproveitamento do terreno não pudesse ter ficado concluído de acordo com as disposições do contrato;
19.5 Finalmente, o não aproveitamento do terreno em tempo adequado deve ser obviamente imputado à concessionária por motivo de falta de interesse no desenvolvimento do empreendimento, não podendo a concessionária pretender absolutamente se afastar da responsabilidade do não aproveitamento do terreno de acordo com as disposições do contrato, invocando alterações das condições objectivas aos níveis socioeconómico e empresarial, ou porque aguardava a publicação do respectivo plano de reordenamento.
20. No entanto, segundo os critérios e a classificação dos terrenos não aproveitados definidos na informação n.º 095/DSODEP/2010, o presente processo foi apenas considerado como situação qualificada de “menos grave”, podendo assim dar-se um prazo razoável a fim de permitir à concessionária concluir o aproveitamento do terreno de acordo com as disposições do contrato.
21. Por outro lado, uma vez que os trabalhos relativos ao plano de reordenamento do Parque Industrial de Pac On destinado às finalidades habitacional e comercial ainda estavam em curso, era difícil naquele momento determinar o calendário da sua publicação, pelo que se propôs deste modo na informação que se considerasse conceder à concessionária um último prazo de aproveitamento do terreno por um período de 48 meses, contados a partir da data da publicação do novo planeamento de Pac On e caso a concessionária não concluísse o aproveitamento do terreno no prazo fixado, a Administração desencadearia imediatamente o procedimento de devolução do terreno. Em virtude do atraso no aproveitamento do terreno poder ser imputado inteiramente à concessionária e também nunca terem sido iniciadas as obras de aproveitamento do terreno, propôs-se deste modo na informação a aplicação à concessionária de uma multa máxima de $900 000,00 patacas ao abrigo da cláusula oitava do contrato de concessão do terreno.
22. A chefe do DSODEP propôs o envio do processo ao Departamento Jurídico (DJUDEP) para auscultar o parecer jurídico, tendo o director da DSSOPT manifestado a sua concordância.
23. Para o efeito, o DJUDEP através da informação n.º 75/DJUDEP/2011, de 27 de Dezembro, procedeu a uma análise do processo, tendo emitido os seguintes pareceres:
23.1 De acordo com os critérios e classificação dos terrenos não aproveitados definidos na informação n.º 095/DSODEP/2010, esse departamento considerou que o processo se inseria em duas situações consideradas de “grave”, ou seja, a concessionária apenas tinha solicitado a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno em 2009, depois de já ter decorrido o prazo de aproveitamento do terreno, o qual tinha terminado em 21 de Julho de 2002,e tinha ainda deixado expirar o período de validade do projecto aprovado sem efectuar a sua revalidação, fortes indícios pois de que a concessionária não estava interessada em desenvolver o aproveitamento do terreno contratualmente previsto;
23.2 E a partir daquela data, a concessionária abandonou completamente o processo, não tendo formulado o pedido de início de obras nem efectuado qualquer pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento. Apenas em 28 de Novembro de 2006, ou seja, mais de 4 anos depois de ter terminado o prazo de aproveitamento, é que a concessionária voltou a demonstrar algum interesse no aproveitamento do terreno, apresentando um novo estudo prévio para alteração da finalidade da concessão. E apenas em 23 de Março de 2009 é que solicitou a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno e comunicou que não obtinha resposta ao pedido de alteração da finalidade submetido em 2006, justificando a perda de interesse no aproveitamento do terreno para fins industriais devido às alterações do tecido económico de Macau;
23.3 Alegou a concessionária como justificação para o incumprimento contratual que se tinha ficado a dever a motivos de força maior, nomeadamente à recessão económica global, bem como às alterações do ambiente económico e social de Macau, não lhe sendo possível concretizar o aproveitamento do terreno entre 1998 e 2005. No entanto, a mesma não demonstrou nem consubstanciou com factos concretos em que medida é que esses factores a tinham impedido de concretizar o empreendimento;
23.4 Embora tenha ocorrido uma crise em 1997 e 1998, a verdade é que logo após o regresso de Macau à Pátria e com a liberalização da indústria do jogo, Macau tem atravessado um longo período de crescimento económico excepcional, e sem precedentes, mas nem por isso a concessionária mostrou interesse em realizar o aproveitamento do terreno;
23.5 Além disso, a concessionária quando requereu a concessão por ajuste directo para construir uma unidade fabril, deveria saber bem que teria de garantir os meios de financiamento necessários e antecipar eventuais dificuldades, tanto mais que decorre das regras de experiência comum que a actividade económica envolve sempre riscos e está sujeita a factores imponderáveis. Além do mais, se efectivamente a concessionária, como afirma, teve dificuldades financeiras no período entre 1998 e 2005, porque é que não o veio demonstrar no decurso do prazo de aproveitamento, mormente na fase de apresentação dos projectos, solicitando por esse motivo a prorrogação do prazo de aproveitamento?
23.6 Por outro lado, embora a concessionária tivesse conhecimento que o terreno manteria a finalidade industrial ao abrigo da PAO n.º 92A110a, emitida em 8 de Novembro de 2005, no entanto, a mesma ainda veio submeter em Novembro de 2006 um novo estudo prévio para alteração da finalidade que se traduziria na construção de um edifício destinado a escritórios e estacionamento. A apresentação do respectivo pedido, 8 anos após a publicação do despacho que titulou a concessão do terreno, é suficientemente reveladora do desinteresse da concessionária no desenvolvimento do aproveitamento ao qual se obrigou através do contrato de concessão e indicia intuitos especulativos em relação ao terreno;
23.7 A concessionária alegou que não tinha obtido uma resposta relativamente ao novo projecto e que teve de aguardar pela conclusão do novo planeamento urbanístico a estabelecer para a zona de Pac On, no entanto, caso a concessionária tivesse cumprido o prazo de aproveitamento estipulado no contrato de concessão, a obra já teria ficado concluída quando se iniciou o estudo de reordenamento urbanístico, isto é, se tivesse cumprido o contrato e se tivesse realizado as obras nos prazos contratualmente estipulados, o aproveitamento estaria concluído em Julho de 2002, muito antes de a Administração decidir proceder à reabilitação daquela área. E tendo sido realizado o aproveitamento do terreno, a concessão teria sido convertida em carácter definitivo, pelo que a concessionária poderia agora, uma vez aprovado o novo plano, solicitar a revisão do contrato de concessão e a alteração da finalidade do mesmo de acordo com o novo planeamento;
23.8 O que não é admissível é o facto de a concessionária, que desde 1998 mantém o terreno na sua posse sem realizar o aproveitamento contratualmente estipulado, venha a beneficiar de mais-valias resultantes da alteração das regras urbanísticas porquanto tal poderá ser entendido como um mero aproveitamento comercial por uma sociedade que logrou a concessão do terreno para a instalação de unidades industriais e armazéns que se revestiam de interesse para o desenvolvimento económico do então território de Macau e, nestas circunstâncias com dispensa de concurso público, possivelmente em detrimento de outros pedidos existentes àquela data e julgados de menos relevância. Da mesma forma, pelas razões supra apontadas também não é relevante o pedido apresentado pela concessionária em 2009, 7 anos após o fim do prazo de aproveitamento, para a prorrogação do prazo de aproveitamento;
23.9 Face ao exposto, nenhum dos argumentos aduzidos pela concessionária podia ser considerado caso de força maior ou facto relevante que estivesse, comprovadamente, fora do seu controlo, pelo que os factos alegados não podiam ser aceites como justificação para a não realização do aproveitamento do terreno;
23.10 A sanção prevista para o incumprimento do aproveitamento é a caducidade da concessão, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima quinta do contrato e da alínea a) do n.º 1 ex vi do n.º 2 do artigo 166.º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho. E considerando-se que incorreria numa situação de declaração de caducidade da concessão do terreno, a concessionária perderia a favor da RAEM a totalidade do prémio liquidado, isto de acordo com o disposto no artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004.
24. Por outro lado, o Grupo de Trabalhos Jurídicos (GTJ) criado por despacho do Chefe do Executivo com a análise e o parecer emitidos pelo DJUDEP através da informação n.º 32/GTJ/2012, de 21 de Agosto. Propôs que para além do desencadeamento do procedimento de declaração da caducidade da concessão do terreno em causa, fosse ainda realizada a audiência da concessionária e posteriormente se enviasse o processo à Comissão de Terras para análise e parecer e prosseguimento das tramitações ulteriores.
25. Seguidamente, o DSODEP elaborou a informação n.º 291/DSODEP/2012, de 18 de Outubro, referindo que uma vez que o prazo de aproveitamento fixado no contrato de concessão do terreno já tinha terminado, a responsabilidade pelo incumprimento do aproveitamento do terreno seria inteiramente imputada à concessionária, podendo por isso o Chefe do Executivo nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima quinta (Caducidade) do contrato de concessão do terreno titulado pelo Despacho n.º 70/SATOP/98 e da alínea a) do n.º 1 ex vi do n.º 2 do artigo 166.º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho, declarar a caducidade da concessão do terreno. E segundo o artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004, uma vez que era uma situação de declaração de caducidade da concessão do terreno, a concessionária perderia, a favor da RAEM, o valor do prémio liquidado (no valor global de $2 031 636,00 patacas). Além disso, de acordo com o n.º 3 da cláusula décima quinta do mesmo contrato, a caducidade da concessão determinaria a reversão do terreno para a posse da RAEM, com todas as benfeitorias aí introduzidas e sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária. Nessa informação, propôs-se deste modo à aprovação superior o desencadeamento do procedimento de declaração da caducidade da concessão do terreno e o envio do processo à Comissão de Terras para análise e parecer e prosseguimento das tramitações ulteriores após a realização do processo de audiência.
O director da DSSOPT e o SOPT emitiram parecer concordante, tendo também o Chefe do Executivo emitido o seu despacho concordante em 13 de Novembro de 2012.
26. Nestas circunstâncias, O DSODEP através do ofício n.º 825/6264.02/DSODEP/2012, de 21 de Novembro, notificou a concessionária do sentido da decisão e que a mesma podia apresentar a respectiva audiência escrita no prazo de 10 dias, contados a partir da recepção da notificação, de acordo com o estipulado no artigo 93.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
27. Relativamente à audiência escrita acima referida, a concessionária apresentou ao Gabinete do Chefe do Executivo (GCE) em 4 de Dezembro de 2012 uma carta resposta, reiterando os motivos do incumprimento contratual:
27.1 A concessão do terreno em causa não foi iniciada do zero, mas sim de uma troca de terreno que ocorreu por duas vezes por solicitação da então Administração Portuguesa, tendo a primeira vez sido na década de 80 / início da década de 90 em que a então Administração Portuguesa efectuou a troca de um terreno pertencente naquela altura a Cheong Siu Kei, Chao Kun e U Cheok Un situado na zona da Estrada de Seac Pai Van, no Altinho de Ká-Hó, em Coloane, e que se destinava a armazém, por um terreno concedido provisoriamente, com a área total de 2 775m2, situado junto da mesma estrada. E a segunda vez ocorreu em 1993, quando a então Administração Portuguesa solicitou novamente a desocupação do terreno situado junto à Estrada de Seac Pai Van, tendo a concessionária então solicitado a concessão, por arrendamento e com dispensa de concurso público, de um terreno com a área compreendida entre 2000 e 2500m2 no aterro do Pac On, para efeitos de troca de terreno;
27.2 E após a publicação do Despacho n.º 70/SATOP/98, as obrigações fixadas no contrato foram cumpridas pela concessionária, nomeadamente o cumprimento da obrigação dos encargos especiais relativos à desocupação do terreno, a prestação da caução, o pagamento do prémio, etc.;
27.3 A concessionária apresentou o projecto de arquitectura em 23 de Setembro de 1998 conforme as disposições do contrato, no entanto, na sequência da crise financeira asiática no período entre 1997 e 1998, os sócios da companhia não conseguiram deliberar sobre a continuação ou não do desenvolvimento conforme o projecto inicial. Em 1999, a estrutura industrial era encabeçada pelo sector do jogo, como consequência, muita mão-de-obra mudou-se para esse sector, provocando uma insuficiência de mão-de-obra no sector industrial. Nestas circunstâncias, as fábricas de Macau mudaram as suas operações ou ainda deslocalizaram as suas fábricas industriais para a China continental. No período entre 1997 e 2005, ocorreu a gripe aviária, SARS, entre outras coisas, acelerando assim a degradação das indústrias de Macau. Por isso, as perspectivas cinzentas no âmbito do ambiente económico e desenvolvimento industrial de Macau foram efectivamente para a concessionária os casos de força maior. No entanto, uma vez que a Administração ainda tinha mantido a finalidade do terreno de toda a zona de Pac On como industrial, a concessionária não conseguiu apresentar o respectivo projecto de alteração conforme previsto;
27.4 A concessionária não descreveu na sua carta os factos concretos relativos aos casos de força maior nem deu justificações de como é que tinha ficado impedida de concretizar o seu projecto, isto porque os factos referidos são do conhecimento de toda a gente, dispensando-se o ónus da prova pela concessionária. É que a concessionária tinha confiança também que caso o aterro do Pac On destinado a finalidade industrial pudesse fazer a diferença e fosse viável, a Administração não teria necessidade de dar início ao Plano de Reordenamento do Parque Industrial de Pac On em 2006;
27.5 A Administração sempre tem salientado que a concessionária não cumpriu o contrato antes do termo do prazo de aproveitamento do terreno, no entanto, nunca aplicou à concessionária qualquer multa e/ou multa agravada de acordo com a cláusula oitava do contrato de concessão, fazendo isto com que a concessionária julgasse que a Administração considerava que haviam casos de força maior ou factos relevantes que estavam comprovadamente fora do seu controlo, tal como estipulado nos n.º 2 e 3 da mesma cláusula, ficando assim a concessionária isenta de responsabilidade;
27.6 Em 2005, devido à Administração ter começado a autorizar que os terrenos concedidos no aterro do Pac On da Taipa para fins industriais pudessem ser alterados para outras finalidades (por exemplo, o lote J), a concessionária depois ter avaliado e analisado novamente o lote «O4a» submeteu por isso à DSSOPT um pedido de alteração de finalidade em 28 de Novembro de 2006, no sentido de construir um edifício destinado à finalidade comercial;
27.7 Conforme a informação n.º 24/DPU/2007, de 16 de Janeiro, o projecto de alteração de finalidade apresentado pela concessionária em 28 de Novembro de 2006 respeitava basicamente a Revisão do Plano de Intervenção Urbanística do Parque Industrial de Pac On, no entanto, de acordo com os despachos emitidos pelo Director desses Serviços em 15 de Fevereiro de 2008 e 21 de Maio de 2009, foi referido que esse projecto de alteração de finalidade devia ser provisoriamente suspenso até que ficasse concluído integralmente o planeamento do Parque Industrial de Pac On, tendo apenas em 1 de Julho de 2011 informado por escrito a concessionária, resultando isto numa espera de quatro anos, deste modo, não pode ser imputada qualquer culpa à concessionária. Por outro lado, através do Despacho do SOPT n.º 55/2007, de 30 de Maio, a Administração concedeu inesperadamente o lote J que se situava junto do seu terreno, com a alteração da finalidade industrial para comercial, para construção de um edifício destinado a «Casa Memorial dos Antepassados» e estacionamento. Isto não só demonstrou uma auto-contradição por parte da Administração como a mesma escondeu da concessionária factos relativos ao plano de reordenamento da zona de Pac On, violando assim os princípios da imparcialidade, da igualdade, da justiça, da isenção e da proporcionalidade;
27.8 Durante esses quatro anos de espera, a concessionária não conseguiu aproveitar completamente o lote «O4a» no tempo adequado de acordo com o projecto e também devido à situação sócio-económica, não deixando outra alternativa à mesma senão a de esperar por uma decisão da Administração, fazendo com que esta acabasse por considerar a existência de uma situação de “terrenos não aproveitados”. Isto não só prejudicou por isso os legítimos direitos e interesses e as legítimas expectativas da concessionária, mas também violou totalmente os princípios da boa-fé e da colaboração entre a Administração e particulares, bem como violou o prazo das notificações estipulado no artigo 71.º do CPA e privou o direito à informação por parte da concessionária que a mesma goza de acordo com a lei. Além disso, a Administração nunca informou a concessionária durante esses quatro anos sobre a necessidade de aplicação de uma multa relativa ao não aproveitamento do terreno no tempo devido, nem tão bem avisou a mesma da gravidade da situação, deste modo, a concessionária apenas pôde aguardar, de boa vontade, uma resposta da Administração, tendo a legítima expectativa de receber uma resposta sobre a autorização ou não do seu pedido de alteração de finalidade após a conclusão do plano de reordenamento da zona de Pac On;
27.9 Em 2009, a concessionária, por sua iniciativa, contactou o DPUDEP para tomar conhecimento sobre a situação e só nessa altura é que soube que qualquer pedido relativo ao lote «O4a» apenas iria ser novamente apreciado após a conclusão do planeamento da zona de Pac On. Por isso, foi assim que a concessionária considerou que já não podia aguardar uma resposta da Administração eternamente, deste modo, foi só nessa altura que solicitou então à DSSOPT a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno;
27.10 Além disso, da leitura dos dados do processo, a situação do atraso no aproveitamento do terreno pela concessionária poderia ser imputada à Administração, por isso, o presente processo foi marcado como terreno não aproveitado a ser tratado numa “segunda ronda”, ainda mais que tinha sido emitido pelo director da DSSOPT um despacho na informação n.º 328/DSODEP/2011, de 28 de Novembro, relativo a uma consulta prévia do DJUDEP sobre a proposta de concessão de um último prazo de aproveitamento do terreno e de aplicação de uma multa. No entanto, decorrido um ano, ou seja, em Novembro de 2012, o Chefe do Executivo emitiu uma decisão administrativa mais rigorosa na informação n.º 291/DSODEP/2012, isto é, uma vez que a responsabilidade pelo incumprimento do aproveitamento do terreno era inteiramente imputada à concessionária, poder-se-ia deste modo declarar a caducidade da concessão do terreno pelo Chefe do Executivo;
27.11 Só num período de um ano, a Administração, em pressuposto de não ter havido qualquer alteração dos factos, apresentou diversas decisões administrativas para o mesmo problema, uma vez que havia diferenças significativas nos conteúdos, mudanças de posição de responsabilidade de uns para outros e uma sanção extremamente grave, isto é, a mudança da posição de “seria imputável à Administração” para “seria imputável à concessionária” e de “menos grave” para “grave”, levantando-se assim questões à Administração de quais os critérios e regras adoptados para o tratamento dos casos de “terrenos não aproveitados”. Isto demonstra que as decisões administrativas relativas ao “desencadeamento do procedimento de declaração de caducidade da concessão do terreno em causa” e à pretensão de aplicação de uma multa à concessionária por parte da Administração não tinham assento numa análise e juízo objectivos dos factos, não tendo havido uma completa apreciação e aprovação baseada em critérios objectivos e uniformizados;
27.12 Finalmente, uma vez que o acto administrativo eventualmente a ser desencadeado violaria os princípios da legítima expectativa, da imparcialidade, da justiça, da isenção, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé e da colaboração entre a Administração e os particulares, violando também o prazo das notificações estipulado no artigo 71.º do CPA e privando a concessionária do direito à informação que a mesma goza de acordo com a lei, assim sendo, a concessionária considerou que a responsabilidade do atraso no aproveitamento do terreno não poderia ser imputada à mesma, não se devendo deste modo desencadear o procedimento da declaração de caducidade da concessão do terreno. No entanto, tendo em consideração todos os factores de força maior e justificações razoáveis acima referidos (designadamente os factos pertinentes relativos à degradação do desenvolvimento industrial local, as justificações que poderiam ser imputadas parcialmente à Administração, o plano de reordenamento da zona de Pac On, etc.), caso o Chefe do Executivo ainda considerasse que a responsabilidade do atraso no aproveitamento do terreno deveria ser imputada à concessionária, mas que esse atraso não era uma negligência grave e total, assim, ao abrigo do princípio da proporcionalidade, deveria conceder à concessionária um prazo de aproveitamento e uma multa adequados e apenas desencadear o procedimento da devolução do terreno caso o terreno não fosse aproveitado no prazo fixado, prazo esse que seria contado a partir da data da publicação do novo planeamento de Pac On.
28. Quanto à audiência escrita da concessionária, o DSODEP através da informação n.º 030/DSODEP/2013, de 5 de Fevereiro, fez a seguinte análise:
28.1 Conforme o referido pela concessionária a concessão do lote «O4a» do Pac On não tinha sido uma concessão pura, mas sim uma concessão que tinha sido atribuída, por duas vezes, através de troca de terrenos. De acordo com a informação n.º 54/SOLDEP/96 constante do processo do referido departamento, Cheong Siu Kei, Chao Kun e U Cheok Un, titulares de licença de ocupação temporária do terreno situado junto à Estrada de Seac Pai Van, no Altinho de Ká-Hó, em Coloane, apresentaram em 8 de Julho de 1993 na DSSOPT um requerimento para a concessão do lote «O4a» do Pac On por terem que desocupar o referido terreno a fim de se proceder ao alargamento da Estrada do Altinho de Ká-Hó, em Coloane, solicitando assim a concessão, por arrendamento, de um lote no aterro do Pac On, na Taipa, com uma área aproximada de 2 000m2. Em seguida, as três pessoas referidas constituíram a sociedade denominada por “Tak Heng Sing - Companhia de Construção e Fomento Predial, Lda”;
28.2 A concessionária indicou ainda que a Administração tinha autorizado a alteração da finalidade industrial dos terrenos concedidos, situados no Pac On, na Taipa, para uma outra finalidade, nomeadamente a do lote J. É de referir que o lote J do Pac On é um terreno que se encontra aproveitado com a construção de um edifício industrial de dois pisos destinado à fabricação de esgotos e componentes de betão nos termos do disposto no Despacho n.º 94/SAOPH/88, por isso, o contrato titulado por Despacho do SOPT n.º 55/2007 trata-se de um contrato de revisão de concessão do terreno cuja concessão se converteu em definitiva. Pelo contrário, o aproveitamento do lote «O4a» do presente processo em causa nunca ficou concluído nos termos do disposto no Despacho n.º 70/SATOP/98, e a sua concessão ainda se mantém provisória;
28.3 Por força do Despacho n.º 07/SOPT/2010, o referido departamento, entre os processos respeitantes a terrenos não aproveitados cujas culpas eram susceptíveis de serem imputadas às respectivas concessionárias, seleccionou 48 para uma análise pormenorizada e tratamento. Entre eles, 31 processos foram classificados como de o tratamento prioritário e outros 17 processos, incluindo o presente processo, foram classificados como de tratamento secundário. Não era por isso como foi referido na audiência da concessionária de que a culpa pelo atraso no aproveitamento do terreno que lhe era atribuída, era sim imputável à Administração, pelo que o presente caso foi classificado como de tratamento secundário;
28.4 De facto, o Chefe do Executivo no seu despacho em 31 de Maio de 2010 autoriza que os critérios para a classificação dos graus de gravidade definidos na informação n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio, sejam adoptados para fixar uma ordem de tratamento dos processos respeitantes aos terrenos não aproveitados e para servirem no futuro como critérios de referência para a análise de cada caso concreto por parte da entidade competente, com vista a melhor tratar os assuntos respeitantes a terrenos não aproveitados. Quanto ao presente caso, o referido departamento também procedeu a uma análise com base nos critérios atrás referidos;
28.5 Embora o estudo prévio apresentado em 23 de Setembro de 1998 tivesse merecido a aprovação condicional, mesmo assim, a concessionária nunca apresentou quaisquer projectos de alteração, nunca requereu à licença de obra nem iniciou a execução da mesma, tendo apenas apresentado em 28 de Novembro de 2006 um estudo prévio de arquitectura para alteração da finalidade do terreno. Assim sendo, o referido departamento considerou que o presente caso era classificado como uma situação qualificada de “menos grave”, ou seja, poderia ser concedido um prazo razoável para a conclusão do aproveitamento do terreno, no entanto, a culpa pelo não aproveitamento do mesmo deveria ainda ser imputada inteiramente à concessionária por falta de interesse no desenvolvimento do projecto. A concessionária não podia escudar-se nas transformações objectivas em termos de sociedade, economia, circunstâncias da exploração das actividades comerciais ou no aguardar da divulgação do novo planeamento como pretextos para não assumir as responsabilidades de aproveitamento do terreno nos termos contratuais;
28.6 Em virtude do presente processo respeitante a um terreno não aproveitado ter sido classificado como uma situação “menos grave”, o referido departamento solicitou autorização superior para que se solicitasse o parecer do DJU, sobre a proposta de concessão de um último prazo de aproveitamento do terreno e a aplicação de multa à concessionária.
29. Por outro lado, de acordo com a informação n.º 75/DJUDEP/2011 de 27 de Dezembro, o DJUDEP considerou que face ao incumprimento contratual por parte da concessionária a Administração deveria manter o sentido da decisão de declarar a caducidade da concessão (vide o ponto 23) nos termos da alínea a) do n.º I da cláusula décima quinta do respectivo contrato da concessão e da alínea a) do n.º 1 ex vi do n.º 2 do artigo 166.o da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho, tendo o GTJ concordado com o respectivo parecer jurídico.
30. Em consequência disto, o DSODEP propôs na referida informação o envio ao DJUDEP da informação e da audiência escrita da concessionária no sentido de proceder a uma análise das justificações no âmbito dos princípios legais e de jurisprudência.
31. Assim, o DJUDEP através da informação n.º 53/DJUDEP/2013, de 22 de Agosto, procedeu à análise jurídica sobre a audiência escrita apresentada pela concessionária:
31.1 A concessionária começa por alegar que a concessão do terreno em apreço se processou por troca de um outro terreno de que a requerente era ao tempo a titular da licença de ocupação temporária, mas o argumento aduzido é perfeitamente irrisório, porquanto o que se revela é que a concessionária apresentou em 8 de Julho de 1993 na DSSOPT um requerimento a solicitar a concessão com dispensa de concurso público do lote «O4a», o qual veio a ser concedido através do Despacho n.º 70/SATOP/98. Em seguimento do referido despacho, a concessionária apresentou em 23 de Setembro de 1998 um projecto de arquitectura que foi aprovado condicionalmente, no entanto, é de salientar que a concessionária não apresentou o projecto de alteração conforme o solicitado pela DSSOPT, nem requereu a respectiva licença de obras;
31.2 A concessionária alegou ainda que o não aproveitamento do terreno se ficou a dever à crise financeira asiática no período compreendido entre 1997 e 1998 e ainda ao facto de ter havido um desentendimento entre os sócios da sociedade relativamente ao aproveitamento de mesmo. A justificação apresentada pela concessionária não pode ser aceite, porquanto o despacho de concessão do terreno foi publicado precisamente em 1998, ou seja, no decorrer da aludida crise asiática, pelo que se a mesma considerava que não detinha capacidade financeira para avançar com o aproveitamento do terreno deveria desde logo ter desistido da concessão. Se não o fez, isto é, se não interrompeu as negociações relativas à concessão do terreno e aceitou as cláusulas contratuais é porque pressupunha que estaria em condições de proceder à construção da obra. Então não pode agora “venire contra factum proprium” e vir justificar-se com a conjuntura económica que o território de Macau atravessava ao tempo para fugir às suas responsabilidades;
31.3 Por outro modo, podemos mesmo considerar que houve retenção especulativa do terreno pela concessionária eventualmente por má-fé, ficando a RAEM privada de obter qualquer proveito económico. Com a outorga da concessão à concessionária faltosa, a RAEM deixou de poder dispor do terreno, nomeadamente de o poder conceder a outrem que oferecia vantagens porventura equivalentes ou aproximadas e deixou de ver efectivado em tempo oportuno o aproveitamento do terreno, preocupação dominante no regime jurídico das concessões de terrenos, com os prejuízos inerentes ainda não patrimoniais. Além disso, quem formula um pedido de concessão de terreno para a realização de determinado aproveitamento, deve estar ciente dos riscos que podem advir duma crise económica, tendo assim, que possuir capacidade financeira para concretizar o empreendimento pretendido. E a concessionária bem sabia, quando requereu a concessão por ajuste directo para construir uma unidade fabril, que teria de garantir os meios de financiamento necessários e antecipar eventuais dificuldades, tanto mais que decorre das regras de experiência comum que a actividade económica envolve sempre risco e está sujeita a factores imponderáveis;
31.4 Por outro lado, a concessionária vem reconhecer que a partir de 1999, logo após a transferência de administração, com a liberalização da indústria do jogo surgiu em Macau um período de crescimento económico, mas alega que tal levou a que uma grande percentagem de mão-de-obra fosse canalizada para o sector do jogo, causando escassez de recursos humanos no sector industrial. Também não é de aceitar este argumento, na medida em que o sector da construção civil estava em franca expansão, não faltando possibilidade de se proceder ao aproveitamento do terreno, sendo que, por outro lado, se a construção da unidade fabril já estivesse concluída e em fase laboral é que a concessionária poderia vir alegar a falta de mão-de-obra no sector industrial. De qualquer forma, ainda que houvesse carência de mão-de-obra para a construção de outros empreendimentos que não os ligados à indústria do jogo, caberia à concessionária alegar o facto oportunamente e solicitar a prorrogação do prazo de aproveitamento ou a fixação de um novo prazo;
31.5 Mais tarde a concessionária vem de novo invocar que devido à eclosão da SARS durante o período de 1999 a 2005, Macau entrou em recessão económica, o que levou a que a maior parte das indústrias locais se tivesse deslocado para o interior da China. Todavia, este argumento não justifica o incumprimento das obrigações contratuais da concessionária, limitando-se a alegar genericamente a crise económica e as alterações sociais, não demonstrando nem consubstanciando com factos concretos em que medida as mesmas impediram a concretização do empreendimento;
31.6 Alega ainda que em 28 de Novembro de 2006 apresentou um pedido de alteração de finalidade o qual não obteve resposta por parte da DSSOPT e que quando a DSSOPT a notificou foi para informar que estava a decorrer a revisão do planeamento urbanístico daquela zona, pelo que até à aprovação do novo plano não seriam emitidas plantas de alinhamento oficial. Antes de mais convém referir que a apresentação deste pedido, apenas em 2006, ou seja, 8 anos após a publicação do despacho que titulou a concessão e depois de ter terminado o prazo de aproveitamento, é suficientemente revelador do desinteresse demonstrado pela concessionária no desenvolvimento do aproveitamento previsto no contrato de concessão. Pois mesmo sabendo que só era permitida a finalidade industrial e que logrou a concessão do terreno por se propor executar um empreendimento adequado a essa finalidade e que foi considerado relevante para o desenvolvimento do então território de Macau, a concessionária submete um estudo prévio para alteração da finalidade, traduzida na construção de um edifício com a altura total de 74,5 metros, destinado a escritórios e estacionamento;
31.7 Por outro lado, é ainda de referir que se a concessionária tivesse cumprido o prazo de aproveitamento estipulado no contrato de concessão, a obra já estaria concluída quando se iniciou o estudo de reordenamento urbanístico, isto é, se tivesse cumprido em tempo o contrato, como era seu dever, e se tivesse realizado as obras nos prazos contratualmente estipulados, o aproveitamento estaria concluído em Julho de 2002, muito antes da Administração ter decidido de proceder à reabilitação daquela área. E uma vez realizado o aproveitamento do terreno, a concessão teria adquirido carácter definitivo, pelo que poderia agora a concessionária, uma vez aprovado o novo plano, solicitar a revisão do contrato de concessão e a alteração da finalidade do mesmo de acordo com o novo planeamento;
31.8 O DJUDEP reiterou que não admite o facto que a concessionária, que desde 1998 mantém o terreno na sua posse sem realizar o aproveitamento contratualmente estipulado, venha a beneficiar das mais-valias resultantes da alteração das condicionantes urbanísticas porquanto tal poderá ser entendido como um mero aproveitamento comercial por uma sociedade que logrou a concessão do terreno para a instalação de unidades industriais e armazéns que se revestiam de interesse para o desenvolvimento económico do então território de Macau e, nestas circunstâncias, com dispensa de concurso público, possivelmente em detrimento de outros pedidos existentes àquela data e julgados de menos relevância. Importa ainda salientar que nos termos da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras), de 5 de Julho, a apresentação de um pedido de modificação do aproveitamento do terreno ou de alteração de finalidade da concessão não a responsabilidade do concessionário pelo não cumprimento das obrigações contratuais a que está adstrito;
31.9 Refere a concessionária que se o seu pedido de alteração de finalidade apresentado em 2006 tivesse sido desde logo rejeitado teria tempo suficiente para concluir as obras de aproveitamento previstas no projecto, sendo que “Nestas circunstâncias é evidente que o atraso do aproveitamento do lote «O4a» não pode ser integralmente imputado a esta sociedade”. No entanto, esquece-se porém a concessionária que quando foi apresentado o referido pedido já a mesma se encontrava em incumprimento contratual há largos anos, pelo que não é de aceitar esta justificação. Além disso, o despacho que recaiu sobre o projecto submetido em 23 de Setembro de 1998 já havia caducado (cfr. artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto);
31.10 Por último, a concessionária alega que não compreende os critérios da Administração relativamente ao seu caso, porquanto numa fase inicial a Administração considerou que apenas era de aplicar uma multa pelo incumprimento dos prazos contratuais, devendo-lhe ser concedido um novo prazo para concretizar o aproveitamento, e posteriormente tenha tomado a decisão de desencadear o procedimento de declaração de caducidade, considerando assim que a Administração violou os princípios da imparcialidade, justiça, isenção, igualdade e proporcionalidade, etc.;
Ora, relativamente à violação de todos aqueles princípios desde logo se dirá que não basta vir alegar a violação de princípios por parte da Administração, há que consubstanciar em que medida é que estes princípios foram violados, apresentando factos concretos, pelo que não merece a menor relevância o argumento aduzido. Quanto à alegação de diferentes critérios de apreciação no presente caso e de divergência de decisões, a última mais gravosa para a concessionária, dir-se-á que a requerente é que fez uma interpretação errónea do procedimento, pois não há qualquer decisão contraditória. O que acontece é que procedimento administrativo é instruído com diversos pareceres técnicos e um deles considerou que o incumprimento da concessionária era menos grave e por isso propôs a mera aplicação de uma multa, enquanto que um outro parecer técnico, analisando o caso segundo uma outra vertente, considerou e fundamentou que o incumprimento contratual da concessionária era mais gravoso e consequentemente susceptível de se poder desencadear o processo de declaração de caducidade e nesta medida formulou uma proposta de decisão que veio a ser acolhida favoravelmente por despacho superior;
31.11 Por último, o DJUDEP concluiu na referida informação que tendo em consideração que os contributos trazidos ao processo pela concessionária em sede de audiência prévia não tinham contribuído para uma alteração do projecto de decisão, o incumprimento contratual, consubstanciado na inexecução da obra de aproveitamento do terreno, é por isso imputável à concessionária, devendo a Administração manter o sentido da sua decisão de declarar a caducidade da concessão.
32. Nestes termos, o DSODEP, através da proposta n.º 317/DSODEP/2013, de 15 de Novembro, propôs autorização superior para o envio do processo à Comissão de Terras para análise, parecer e prosseguimento dos trâmites ulteriores, tendo o director da DSSOPT proferido em 18 de Novembro de 2013 despacho concordante.
33. Face a todo o exposto, a presente Comissão analisou o processo e, uma vez que o prazo de aproveitamento previsto no contrato da concessão já tinha terminado, o incumprimento do aproveitamento do terreno seria integralmente imputado à concessionária em virtude da mesma ter apresentado apenas em 2006 um estudo prévio de arquitectura para alteração da finalidade do terreno, ou seja, mais de 4 anos após o termo do prazo de aproveitamento (em 2002), e posteriormente, apenas em 2009, ter apresentado o pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento, revelando isso o desinteresse da concessionária no desenvolvimento do aproveitamento previsto no contrato de concessão.
Por outro lado, não é de aceitar o argumento invocado pela concessionária relativo às alterações da situação económica de Macau, em virtude da mesma não ter demonstrado com factos concretos em que medida as mesmas impediram a concretização do empreendimento, não podendo ainda considerar-se que tenham havido casos de força maior ou outros factos relevantes, cuja produção tivessem estado, comprovadamente, fora do seu controlo. E quanto às alegações invocadas pela concessionária de que não tinha dado uma resposta ao estudo prévio de arquitectura apresentado em consequência do seu pedido de alteração de finalidade do terreno, assim como tinha ficado a aguardar a conclusão do planeamento urbanístico da zona de Pac On, é de referir que caso a concessionária tivesse cumprido o prazo de aproveitamento estipulado no contrato de concessão, o aproveitamento do terreno estaria concluído em 2002, muito antes da Administração ter decidido proceder ao estudo de reordenamento urbanístico da referida zona.
Para além disso, a atribuição da concessão foi feita com dispensa de concurso público, no entanto, a concessionária, que desde 1998 mantém o terreno na sua posse sem realizar o aproveitamento contratualmente estipulado, venha a beneficiar das mais-valias resultantes da alteração das condicionantes urbanísticas porquanto tal poderá ser entendido como um mero aproveitamento comercial que logrou a concessão para a instalação de unidades industriais e armazéns que se revestiam de interesse para o desenvolvimento económico do então território de Macau.
Atento o facto de a Lei n.º 6/80/M, Lei de Terras, se encontrar no termo da sua vigência, dado que no dia 1 de Março de 2014 entrou em vigor a nova Lei de terras, Lei n.º 10/2013, e não estar ainda concluído o procedimento de caducidade, cabe-nos agora analisar se esta lei se aplicará ao presente caso.
O artigo 215.º da nova Lei de terras, Lei n.º 10/2013, determina a aplicabilidade do novo diploma às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, com as seguintes ressalvas: 1.) Quando esteja a correr um prazo fixado por legislação anterior e a presente lei o tiver modificado, é aplicado o prazo mais longo; 2.) Os direitos e deveres dos concessionários são imediatamente regulados pela presente lei, sem prejuízo do convencionado nos respectivos contratos; 3.) Quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 104.º e no artigo 166.º.
Ora, tendo já expirado o prazo fixado para o aproveitamento do terreno e considerando que este não foi. realizado por culpa da concessionária, a concessão caduca, independentemente de ter sido aplicada multa, nos termos dó disposto na alínea i) do n.º 1 do artigo l66.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras).
A não execução do aproveitamento nos termos e prazos contratuais por razões imputáveis ao concessionário constitui violação grave do dever de aproveitamento (cfr artigos 103. º a 106.º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras) e artigos 103.º, 104.º e 106.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras)), obrigação principal do contrato de concessão e, por isso, facto gerador de caducidade em ambas as leis.
Nessa medida e porque no caso vertente os interessados já se pronunciaram sobre todas as questões objecto do procedimento e relevantes para a decisão, quer de facto quer de direito, afigura-se que se encontra devidamente garantido o exercício dos seus direitos de participação procedimental e de oposição pelo que não há necessidade de efectuar nova audiência por força da aplicação da lei nova.
Por esta razão, esta Comissão concordou com a proposta da DSSOPT, não se opondo à declaração da caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de concurso público, a favor da “Tak Heng Sing - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, do terreno com a área 2 196m2, situado na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, nos aterros de Pac On, cujo contrato da concessão foi titulado pelo Despacho n.º 70/SATOP/98, nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima quinta do respectivo contrato de concessão do terreno e alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras). Concordou-se ainda que a totalidade do prémio (no valor global de $2031636,00 patacas) já liquidado pela concessionária reverterá para a posse da RAEM ao abrigo do disposto no artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004. Em simultâneo, de acordo com o estipulado no n.º 3 da cláusula décima quinta do referido contrato da concessão, e do n.º 1 do artigo 168.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras), a caducidade da concessão determina a reversão do terreno para a posse da RAEM com todas a benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
Para além disso, ao abrigo do disposto no n.º 2 da cláusula décima quarta do mesmo contrato e no artigo 167.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras), a caducidade da concessão será declarada por despacho do Chefe do Executivo a publicar no Boletim Oficial da RAEM.
III
Reunida em sessão de 5 de Junho de 2014, esta Comissão, analisado o processo e tendo em consideração os pareceres constantes nas informações n.º 328/DSODEP/2011, de 28 de Novembro de 2011, 75/DJUDEP/2011, de 27 de Dezembro de 2011, 32/GTJ/2012, de 21 de Agosto de 2012, 291/DSODEP/2012, de 18 de Outubro de 2012, 30/DSODEP/2013, de 5 de Fevereiro de 2013, 53/DJUDEP/2013, de 22 de Agosto de 2013 e 317/DSODEP/2013, de 15 de Novembro de 2013 e tendo em conta os despachos emitidos na informação n.º 291/DSODEP/2012 pelo SOPT em 9 de Novembro de 2012 e pelo Chefe do Executivo em 13 de Novembro de 2012, considera que se deve declarar a caducidade da concessão, por arrendamento, a favor da “Tak Heng Sing - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, do terreno com a área 2 196m2, situado na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, nos aterros de Pac On, cujo contrato da concessão foi titulado pelo Despacho n.º 70/SATOP/98, nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima quinta do respectivo contrato de concessão e da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras). A Comissão concorda ainda que a totalidade do prémio (no valor global de $2 031 636,00 patacas) já liquidado pela concessionária reverterá para a posse da RAEM ao abrigo do disposto no artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004. Em simultâneo, de acordo com o estipulado no n.º 3 da cláusula décima quinta do referido contrato da concessão e do n.º 1 do artigo 168.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras), a caducidade da concessão determina a reversão do terreno para a posse da RAEM com todas a benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
Para além disso, ao abrigo do disposto no n.º 2 da cláusula décima quarta do mesmo contrato e no artigo 167.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras), a caducidade da concessão será declarada por despacho do Chefe do Executivo a publicar no Boletim Oficial da RAEM.
Comissão de Terras, aos 5 de Junho de 2014.
23 - Em 17/03/2015, o Secretário para as Obras Públicas e Transportes, por seu turno, emitiu o seguinte parecer:
Proc. n.º 66/2013 - Respeitante à proposta de declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento e com dispensa de concurso público, do terreno com a área de 2 196m2, situado na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, dos aterros do Pac On, a favor da “Tak Heng Sing - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, pelo não cumprimento de disposições do contrato, nomeadamente a de aproveitamento do terreno nos prazos fixados, cujo contrato de concessão foi titulado pelo Despacho n.º 70/SATOP/98.
1. Pelo Despacho n.º 70/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 29, II Série, de 22 de Julho, foi autorizada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 2 196m2, sito na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, dos aterros do Pac On, a favor da “Tak Heng Sing - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, destinado à construção de um edifício para instalação de unidades industriais e armazéns, afectos a uso próprio.
2. Conforme o estipulado na cláusula segunda do contrato de concessão, o prazo de arrendamento é de 25 anos, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau, ou seja, o prazo de arrendamento terminará no dia 21 de Julho de 2023.
3. Nos termos das disposições do n.º 1 da cláusula quinta do contrato de concessão supramencionado, o prazo global de aproveitamento do terreno é de 48 meses, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau do referido despacho, ou seja, terminará no dia 21 de Julho de 2002 e resulta dos n.º 2 e n.º 3 da mesma cláusula, que sem prejuízo do cumprimento do prazo global de aproveitamento do terreno, a concessionária deveria concluir a construção do primeiro piso, correspondente à primeira fase, 18 meses após a publicação do respectivo despacho, devendo ainda apresentar os projectos e início da obra de acordo com os prazos estipulados.
4. Além disso, a concessionária deveria elaborar e apresentar o anteprojecto de obra (projecto de arquitectura) no prazo de 60 dias, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau do despacho referido. A elaboração e apresentação do projecto de obra (projecto de fundações, estruturas, águas, esgotos, electricidade e instalações especiais) no prazo de 90 dias, contados a partir da data da notificação da aprovação do anteprojecto de obra. E o início da obra no prazo de 45 dias, contados a partir da data da notificação da aprovação do projecto de obra.
5. Da leitura das informações da Folha de Acompanhamento Financeiro, resulta que a concessionária já pagou integralmente o montante do prémio no valor de $1 906 455,00 patacas conforme previsto no contrato.
6. Em 28 de Novembro de 2006, a concessionária apresentou à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) um requerimento, referindo que de acordo com o contrato, o prazo de aproveitamento do terreno já tinha terminado, e uma vez que tinha havido alterações significativas na indústria e económica, o terreno em causa já não servia por isso para a finalidade industrial, solicitava desse modo autorização para alteração da finalidade do terreno, anexando para o efeito o respectivo estudo prévio de arquitectura.
7. O DSODEP da DSSOPT através de ofício de 31 de Maio de 2011 solicitou à concessionária a apresentação dos motivos razoáveis que justificassem o atraso no aproveitamento do terreno, assim como a apresentação de todas as informações aplicáveis às suas justificações.
8. Em 1 de Julho de 2011, A, representando a concessionária, apresentou à DSSOPT uma certidão de registo predial, uma certidão do registo comercial, um calendário de execução de obras, três certidões de capacidade financeira emitidas por bancos, entre outros documentos, e deu as justificações sobre o não aproveitamento do terreno conforme previsto.
9. Para analisar todo o processo de concessão do terreno em causa, o DSODEP através de CSI solicitou ao DPUDEP e ao DURDEP o fornecimento dos procedimentos detalhados de apreciação e aprovação bem como de informações pormenorizadas sobre as análises feitas respeitantes ao processo.
10. A chefe do DSODEP propôs ainda o envio do processo ao Departamento Jurídico (DJUDEP) para auscultar o parecer jurídico, tendo o director da DSSOPT manifestado a sua concordância.
11. Por outro lado, o Grupo de Trabalhos Jurídicos (GTJ) criado por despacho do Chefe do Executivo concordou com a análise e o parecer emitidos pelo DJUDEP através da informação n.º 32/GTJ/2012, de 21 de Agosto e propôs que para além do desencadeamento do procedimento de declaração da caducidade da concessão do terreno em causa, fosse ainda realizada a audiência da concessionária e posteriormente se enviasse o processo à Comissão de Terras para análise e parecer e prosseguimento das tramitações ulteriores.
12. Nestas circunstâncias, o DSODEP através do ofício n.º 825/6264.02/DSODEP/2012, de 21 de Novembro, notificou a concessionária do sentido da decisão e que a mesma podia apresentar a respectiva audiência escrita no prazo de 10 dias, contados a partir da recepção da notificação, de acordo com o estipulado no artigo 93.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
13. Relativamente à audiência escrita acima referida, a concessionária apresentou ao Gabinete do Chefe do Executivo (GCE) em 4 de Dezembro de 2012 uma resposta, a qual não alterou o sentido da decisão.
14. Reunida em sessão de 5 de Junho de 2014, a Comissão de Terras, analisado o processo e tendo em consideração os pareceres constantes nas informações n.ºs 328/DSODEP/2011, de 28 de Novembro de 2011, 75/DJUDEP/2011, de 27 de Dezembro de 2011, 32/GTJ/2012, de 21 de Agosto de 2012, 291/DSODEP/2012, de 18 de Outubro de 2012, 30/DSODEP/2013, de 5 de Fevereiro de 2013, 53/DJUDEP/2013, de 22 de Agosto de 2013 e 317/DSODEP/2013, de 15 de Novembro de 2013 e tendo em conta os despachos emitidos na informação n.º 291/DSODEP/2012 pelo SOPT em 9 de Novembro de 2012 e pelo Chefe do Executivo em 13 de Novembro de 2012, considera que se deve declarar a caducidade da concessão, por arrendamento, a favor da “Tak Heng Sing - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, do terreno com a área 2 196m2, situado na ilha da Taipa, na Rua Heng Lon, lote 4a, nos aterros de Pac On, cujo contrato da concessão foi titulado pelo Despacho n.º 70/SATOP/98, nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima quinta do respectivo contrato de concessão e da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras). A Comissão concorda ainda que a totalidade do prémio (no valor global de $2 031 636,00 patacas) já liquidado pela concessionária reverterá para a posse da RAEM ao abrigo do disposto no artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004. Em simultâneo, de acordo com o estipulado no n.º 3 da cláusula décima quinta do referido contrato da concessão e do n.º 1 do artigo 168.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras), a caducidade da concessão determina a reversão do terreno para a posse da RAEM com todas a benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto pelas razões indicadas naquele, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno”
24 - Em 23/03/2015, o Chefe do Executivo, proferiu o seguinte despacho:
“ Concordo” (fls. 49 dos autos).
25 - À recorrente nunca foi aplicada qualquer multa.
ii) As cláusulas 8.ª e 15.ª do contrato de concessão são do seguinte teor:
“CLÁUSULA OITAVA - MULTAS
1. Salvo motivos especiais devidamente justificados, aceites pelo primeiro outorgante, pelo incumprimento dos prazos fixados na cláusula quinta, relativamente à apresentação dos projectos, início e conclusão das obras, a segunda outorgante fica sujeita a multa até $5.000,00 (cinco mil) patacas, por cada dia de arraso até sessenta dias; para além desse período e até ao máximo global de cento e vinte dias, fica sujeita a multa até ao dobro daquela importância.
2. A segunda outorgante fica exonerada da responsabilidade referida no número anterior em casos de força maior ou de outros factos relevantes, cuja produção esteja, comprovadamente, fora do seu controlo.
3. Consideram-se casos de força maior os que resultem exclusivamente de eventos imprevisíveis e irresistíveis.
4. Para efeitos do disposto no nº 2 desta cláusula, a segunda outorgante obriga-se a comunicar, por escrito, ao primeiro outorgante, o mais rapidamente possível, a ocorrência dos referidos factos”.
“CLÁUSULA DÉCIMA QUINTA - CADUCIDADE
O presente contrato caduca nos seguintes casos:
O presente contrato caduca nos seguintes casos:
a) Findo o prazo da multa agravada, previsto na cláusula oitava;
b) Alteração, não consentida, da finalidade da concessão, enquanto o aproveitamento do terreno não estiver concluído;
c) Interrupção do aproveitamento do terreno por um prazo superior a 90 (noventa) dias, salvo motivos especiais devidamente justificados e aceites pelo primeiro outorgante.
2. A caducidade do contrato é declarada por despacho de S, Ex.ª o Governador, a publicar no Boletim Oficial.
3. A caducidade do contrato determina a reversão do terreno à posse do primeiro outorgante com todas as benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da segunda outorgante”.



III – O Direito
1. Questões a apreciar
Há que apreciar as questões suscitadas pela recorrente.
Nas alegações diz-se que o acórdão recorrido omitiu um facto atinente a uma reunião em Março de 2009 (v. n.º 38 da petição de recurso contencioso) entre um seu Administrador e uma Arquitecta da DSSOPT, mas não se explica qual a pertinência do facto, pelo que a impugnação não é procedente.

2. Questões atinentes à nulidade do acórdão recorrido
A recorrente imputa várias nulidades ao acórdão recorrido, por ter entendido que este julgou mal certas questões suscitadas pela recorrente. Ora, como é sabido, a nulidade das decisões judiciais não se referem a erros de julgamento, por má interpretação e aplicação da lei ou por erro na determinação da norma aplicável. As nulidades a que se refere o artigo 571.º do Código de Processo Civil são vícios formais e as questões invocadas não se subsumem a esta categoria.
Ou seja, a recorrente qualificou mal os vícios imputados ao acórdão recorrido, que serão conhecidos, seguidamente, apesar desta má qualificação.
Improcedem as alegadas nulidades do acórdão recorrido.

3. Aplicação das leis de terras no tempo
A primeira questão a conhecer, por preceder logicamente todas as outras, é a de saber qual a lei aplicável à declaração de caducidade, se a nova Lei de Terras (Lei n.º 10/2013), se a antiga Lei (Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho), visto que o contrato de concessão foi celebrado e vigorou largos anos na vigência da lei velha, mas quando foi praticado o acto administrativo, que declarou a caducidade do contrato, já vigorava a lei nova.
Põe-se, por isso, um problema de aplicação da lei no tempo.
Seguiremos, nesta matéria, as considerações que fizemos nos nossos acórdãos de 20 de Fevereiro de 2017 e 11 de Outubro de 2017, respectivamente, nos Processos n. os 81/2016 e 28/2017.
A nova Lei de Terras entrou em vigor em 1 de Março de 2014 (artigo 223.º).
Embora o Código Civil contenha disposições gerais sobre a aplicação de leis no tempo (artigo 11.º), sobre elas prevalecem as normas especiais que o legislador tenha emitido sobre o assunto. Estas constam do Capítulo XV da nova Lei de Terras, epigrafado Disposições finais e transitórias, constituído pelos artigos 212.º a 223.º.
O artigo 212.º, atinente a “Aplicação da presente lei a situações já iniciadas”, dispõe que “A aplicação da presente lei a situações iniciadas antes da sua entrada em vigor subordina-se ao disposto nos artigos seguintes”.
O artigo 213.º rege sobre os procedimentos de ocupação e concessão ainda não concluídos, o artigo 214.º sobre ocupações por licença autorizadas antes da entrada em vigor da lei, o artigo 216.º sobre concessões definitivas por arrendamento do pretérito e o artigo 217.º aplica-se às concessões gratuitas do pretérito.
Relativamente às concessões provisórias anteriores à entrada em vigor da lei nova, prescreve o artigo 215.º da nova Lei de Terras:
“Artigo 215.º
Nas concessões provisórias
A presente lei aplica-se às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, com as seguintes ressalvas:
1) Quando esteja a correr um prazo fixado por legislação anterior e a presente lei o tiver modificado, é aplicado o prazo mais longo;
2) Os direitos e deveres dos concessionários são imediatamente regulados pela presente lei, sem prejuízo do convencionado nos respectivos contratos;
3) Quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 104.º e no artigo 166.º”.

A alínea 1) não é relevante para a questão em apreço por se referir à duração de prazos legais.
No que respeita aos direitos e deveres dos concessionários a alínea 2) faz prevalecer o convencionado nos respectivos contratos sobre o disposto na lei. Na sua falta, aplica-se a nova Lei e não a antiga Lei.
Ou seja, em tudo quanto respeite a direitos e deveres dos concessionários aplica-se, em primeiro lugar, o que tiver sido contratado pelas partes. No que não esteja regulado no contrato de concessão aplica-se, supletivamente, a nova Lei. E, eventualmente, se for caso disso, até as normas do artigo 11.º do Código Civil. Pelo menos, o disposto no seu n.º 1, nos termos do qual “a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular”.
Na matéria de facto provada, (ii), transcrevemos a cláusula 15.ª onde se estipula sobre as condições de caducidade do contrato de concessão por falta de aproveitamento do terreno no prazo contratual, pelo que a mesma se aplica nos termos da alínea 2) do artigo 215.º da Lei nova.
Não obstante, isso não quer dizer que as condições de declaração da mencionada caducidade se rejam apenas pela mesma cláusula. Nas situações omissas pode ter lugar a aplicação da Lei nova, como dissemos já.
Interpretemos a alínea 3) do artigo 215.º da Lei nova, segundo a qual, quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 104.º e no artigo 166.º.
Tendo em conta que o proémio do artigo 215.º já determina a aplicação da lei às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, a intenção desta alínea 3) é a de aplicar imediatamente dois preceitos da lei nova, mesmo contra o que esteja convencionado nos respectivos contratos (alínea anterior) e na lei antiga. A não ser esta a interpretação da alínea 3) (prevalência destas duas normas da lei nova sobre o estabelecido nos contratos), ela seria inútil visto que do proémio do artigo 215.º e da sua alínea 2) já resultaria que a lei nova se aplicaria às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor e que o contratado prevalece sobre a lei no que toca a direitos e deveres dos concessionários. Não haveria necessidade de mandar aplicar expressamente dois preceitos da lei nova. Ou seja, o único efeito útil da alínea 3) é dizer que, ao contrário do que resulta da alínea 2) - onde o convencionado pelas partes prevalece sobre as disposições da lei nova - estes dois preceitos da lei nova prevalecem sobre o contratado.
Analisemos tais preceitos da lei nova que se aplicam, quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário:
- O disposto no n.º 3 do artigo 104.º;
- O disposto no artigo 166.º.
Quanto ao primeiro, estatui o artigo 104.º:

“Artigo 104.º
Procedimento de aproveitamento
1. O prazo e procedimento de aproveitamento dos terrenos concedidos são definidos no respectivo contrato de concessão.
2. Se o contrato de concessão for omisso e quando o aproveitamento incluir, entre outros, a edificação de construções, devem ser observados os seguintes prazos máximos:
1) 90 dias a contar da data de publicação em Boletim Oficial do despacho que titula a concessão, para a apresentação do projecto de arquitectura;
2) 180 dias a contar da data de notificação da aprovação do projecto de arquitectura, para a apresentação de outros projectos de especialidades;
3) 60 dias a contar da data de notificação de aprovação dos projectos de especialidades, para a apresentação do pedido de emissão da licença de obras;
4) 15 dias a contar da data de emissão da licença de obras, para o início da obra;
5) O prazo estabelecido na licença de obras para a conclusão das mesmas.
3. A inobservância de qualquer um dos prazos referidos no número anterior sujeita o concessionário às penalidades estabelecidas no respectivo contrato ou, sendo este omisso, à multa no montante correspondente a 0,1%, consoante as situações, do prémio ou do preço de adjudicação por cada dia de atraso, até 150 dias.
4. …
5. …”
A previsão do n.º 3, sobre o montante da multa, por inobservância dos prazos do procedimento de aproveitamento dos terrenos concedidos, prevalece sobre o n.º 3 do artigo 105.º da lei antiga, nos termos da qual “A inobservância dos prazos sujeita o concessionário às penalidades estabelecidas no respectivo contrato ou, sendo este omisso, à multa de cem patacas por cada dia de atraso, até cento e vinte dias, e, para além deste período mas até ao máximo de sessenta dias, ao dobro daquela importância”.
E prevalece sobre a cláusula 8.ª do contrato.
No tocante ao artigo 166.º dispõe-se neste:
“Artigo 166.º
Caducidade das concessões
1. Para além das situações previstas nos Capítulos VII e XI, as concessões provisórias ou as concessões definitivas em fase de reaproveitamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano caducam, quando se verifique qualquer uma das seguintes situações:
1) Não conclusão do aproveitamento ou reaproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa;
2) Suspensão, consecutiva ou intercalada, do aproveitamento ou reaproveitamento pelo período fixado no contrato ou, no silêncio deste, por prazo superior a metade do previsto para a sua conclusão.
2. Para além das situações previstas nos Capítulos VII e XI, as concessões provisórias de terrenos rústicos caducam quando:
1) O aproveitamento não seja iniciado dentro de seis meses após a concessão ou no prazo contratual fixado;
2) O aproveitamento seja suspenso, consecutiva ou intercaladamente, por um período superior a 12 meses”.
Examinemos as disposições correspondentes da Lei n.º 6/80/M:
“Artigo 166.º
(Caducidade das concessões provisórias)
1. As concessões provisórias por aforamento caducam, quando ao terreno concedido seja dada finalidade diferente da autorizada, sem o consentimento da autoridade concedente, ou quando ocorra qualquer das seguintes circunstâncias, imputáveis ao concessionário:
a) Falta do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo do pagamento da multa agravada previsto no n.º 3 do artigo 105.º;
b) Interrupção do aproveitamento pelo período que o contrato fixar ou, no silêncio deste, por prazo superior a metade do marcado para a sua efectivação.
2. Os arrendamentos provisórios de terrenos urbanos ou de interesse urbano caducam em qualquer dos casos referidos no número anterior e no de subarrendamento proibido ou efectuado sem precedência de autorização.
3. Os arrendamentos provisórios de terrenos rústicos caducam, quando:
a) O aproveitamento não tenha sido iniciado dentro de seis meses após a concessão ou no prazo contratual fixado;
b) O aproveitamento tenha sido interrompido por período consecutivo superior a doze meses;
c) A finalidade da concessão haja sido alterada ou não tenham sido cumpridas as cláusulas contratuais respeitantes ao plano de exploração;
d) O subarrendamento haja sido efectuado sem precedência de autorização ou nos casos em que é proibido”.
Ora, no que respeita às concessões provisórias, as alíneas 1) e 2) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei nova prevalecem sobre as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei antiga.
E a alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei nova prevalece sobre o disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula 15.ª, que estipula:
1. O presente contrato caduca nos seguintes casos:
a) Findo o prazo da multa agravada, previsto na cláusula oitava;
….

Isto é, as concessões provisórias caducam quando se verifique não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa.
Ou seja, na nova Lei de Terras pode ser declarada a caducidade por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa.
Em conclusão, à declaração de caducidade por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais aplica-se a lei nova e não a lei antiga, como pretende a recorrente.

4. Violação de documento interno ou circular
Na tese da recorrente, o acórdão recorrido julgou mal não enfermar o acto recorrido de erro sobre os pressupostos de facto, já que os pareceres e informações que classificaram a actuação da recorrente qualificaram a conduta como muito grave quando, face aos critérios definidos na Informação 095/DSODEP/2010, deveria ter sido qualificada como situação menos grave.
A Informação 095/DSODEP/2010 é um mero documento interno dos Serviços de Obras Públicas, pelo que a recorrente não pode fundar na hipotética violação deste documento pelo acto administrativo recorrido qualquer vício deste acto. O acto administrativo não pode violar as leis e os regulamentos vigentes, mas um documento interno dos Serviços não tem o mesmo valor hierárquico.
Em relação à violação de instruções de serviço, recordámos no já mencionado acórdão de 20 de Fevereiro de 2017, no Processo n.º 81/2016, que “As instruções são ordens dados pelos superiores para serem seguidas pelos subalternos de modo a habilitá-los a proceder em circunstâncias futuras que não se sabe precisamente como se apresentarão2.
A violação de instrução pode constituir infracção de dever funcional por parte do subalterno, mas não constitui fonte de direito, pelo que o interessado não pode invocar a violação de instrução, como fundamento de anulação de acto administrativo.
A violação de lei é fundamento de pedido de anulação de acto administrativo, constituindo o vício de que enferma o acto administrativo cujo objecto e pressupostos contrarie normas jurídicas com os quais se devia conformar.3
As instruções não constituem normas jurídicas de acto normativo, pelo que a sua violação não constitui fundamento para anulação de acto administrativo”.
Não merece censura, nesta parte, o acórdão recorrido.

5. Situação de força maior
Considera a recorrente que o acórdão recorrido errou ao não considerar o atraso no aproveitamento do terreno como situação de força maior, por virtude da recessão global económica, da eclosão da SARS, da crise financeira asiática, das alterações no ambiente económico e social de Macau, do êxodo da indústria local para o interior da China e outros países vizinhos e da falta de mão-de-obra resultante da abertura da indústria do jogo.
Afigura-se-nos que o acórdão recorrido julgou bem ao não reconhecer ter havido uma situação de força maior impeditiva do aproveitamento do terreno no prazo contratual.
O contrato de concessão é de 1998 e o terreno deveria ter sido aproveitado em 48 meses. Ou seja até 21 de Julho de 2002.
Em 1998 já se verificava a crise financeira asiática, que começou em 1997, na Tailândia, o que não impediu a recorrente de ter aceitado a concessão em 1998.
Por outro lado, é do conhecimento geral que a crise financeira de 1997 teve efeitos mais intensos em alguns países e regiões que noutros. Designadamente, em Macau, teve efeitos na área do imobiliário, mas a concessão dos autos visava a construção de edifícios industriais e armazéns, afectos a uso próprio, pelo que não se vislumbra nenhuma relação de causa e efeito entre a crise e a impossibilidade de a recorrente aproveitar o terreno.
A SARS eclodiu em Hong Kong em Novembro de 2002 – quando o terreno já deveria estar aproveitado - e os seus efeitos só se fizeram sentir a partir de 2003.
De resto, é princípio geral que os contratos devem ser pontualmente cumpridos. Quase todos os contratos envolvem um risco, que corre por conta dos contraentes. Só em circunstâncias excepcionais se deve admitir que a parte afectada possa resolver ou ter direito à modificação do contrato.
Como se dispõe no n.º 1 do artigo 431.º do Código Civil (idêntico ao n.º 1 do artigo 437.º do Código Civil de 1966), “Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato”.
Ora, a recorrente não demonstrou que as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar sofreram uma alteração anormal que a impossibilitasse de cumprir o contrato ou que tal cumprimento fosse excessivamente oneroso. Designadamente que o preço da mão-de-obra tenha aumentado de tal maneira que a impossibilitasse de construir.
Acresce que, em 2006, já a recorrente tinha deixado para trás o interesse na construção de edifícios industriais e armazéns, afectos a uso próprio, e pretendia alteração de finalidade do terreno concedido.

6. Declaração de caducidade sem aplicação de multa prévia
Sustenta a recorrente que ao contrato era aplicável a Lei de Terras, aprovada pela Lei n.º 6/80/M, e não a Lei de Terras nova, como entendeu o acórdão recorrido, pelo que se a Administração não quisesse aceitar as explicações da recorrente para o atraso no aproveitamento do terreno, primeiro teria de aplicar multa e nunca, desde logo, a declaração de caducidade da concessão, nos termos dos artigos 105.º e 166.º daquela Lei e nos termos da cláusula oitava do contrato de concessão.
Mas no n.º 3 deste acórdão concluímos que:
No que respeita às concessões provisórias, as alíneas 1) e 2) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei nova prevalecem sobre as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei antiga.
E a alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei nova prevalece sobre o disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula 15.ª, que estipula:
1. O presente contrato caduca nos seguintes casos:
a) Findo o prazo da multa agravada, previsto na cláusula oitava;
….

Isto é, as concessões provisórias caducam quando se verifique não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa.
Ou seja, na nova Lei de Terras pode ser declarada a caducidade por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa.
Em conclusão, à declaração de caducidade por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais aplica-se a lei nova e não a lei antiga, como pretende a recorrente.

7. Violação dos princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé, da colaboração entre a Administração e os particulares, da decisão, da desburocratização e da eficiência
Alega a recorrente que o acórdão recorrido violou a lei ao entender que o acto recorrido não violou os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé, da colaboração entre a Administração e os particulares, da decisão, da desburocratização e da eficiência.
O acórdão recorrido afastou a violação de tais princípios com o argumento de que o acto administrativo do Chefe do Executivo, que declara a caducidade por falta de aproveitamento do terreno é um acto vinculado. Acrescentou o acórdão recorrido que a recorrente não realizou o aproveitamento no prazo fixado de 48 meses, nem durante esse prazo pediu a sua prorrogação. E que qualquer pedido de prorrogação findo tal prazo parece só ter efeito de pedido de renovação de concessão.
Vejamos.
Nos termos da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei de Terras de 2013, as concessões provisórias ou as concessões definitivas em fase de reaproveitamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano caducam, quando se verifique não conclusão do aproveitamento ou reaproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa.
No caso dos autos o prazo de aproveitamento era de 48 meses, que findou em 21 de Julho de 2002.
A lei exige expressamente um acto administrativo que declare a caducidade das concessões. Na verdade, dispõe o artigo 167.º:
“Artigo 167.º
Declaração de caducidade
A caducidade das concessões, provisórias e definitivas, é declarada por despacho do Chefe do Executivo, publicado no Boletim Oficial”.

O mesmo dispunha a alínea a) do n.º 1 do artigo 166.º, por força do seu n.º 2, da Lei de Terras de 1980.
Tem de entender-se que se trata de um poder-dever do Chefe do Executivo, quando o terreno não tenha sido aproveitado no prazo legal e não tenha sido pedido a prorrogação do prazo, nos termos do n.º 5 do artigo 104, da actual Lei de Terras, onde se dispõe:
“A requerimento do concessionário, o prazo de aproveitamento do terreno pode ser suspenso ou prorrogado por autorização do Chefe do Executivo, por motivo não imputável ao concessionário e que o Chefe do Executivo considere justificativo”.
Esta norma não se pode aplicar ao caso dos autos, dado que o prazo de aproveitamento do terreno expirou na vigência da lei de 1980, pelo que não podia ser pedida a suspensão ou a prorrogação do prazo, que já se esgotara à data da entrada em vigor da Lei de 2013.
De qualquer forma, do n.º 5 do artigo 105.º da Lei de Terras de 1980 pode retirar-se que o concessionário podia apresentar justificação para o não cumprimento dos prazos, o que a recorrente não fez no prazo do aproveitamento.
Ou seja, o acto do Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão por falta de aproveitamento, nos termos do artigo 166.º da Lei de Terras de 2013, é um acto vinculado.
É fora de dúvida que a concessionária não aproveitou o terreno no prazo contratual de 48 meses, que findou em 21 de Julho de 2002, por sua culpa, já que, tendo submetido em 23 de Setembro de 1998, o anteprojecto da obra e estudo prévio para construção de edifício, a Administração aprovou-os, mas a concessionária não deu seguimento ao processo (factos 8 a 10).
Só em 2005 pretendeu a recorrente retomar o processo.
E em 2006, já a recorrente tinha desistido de cumprir as cláusulas de aproveitamento, vindo a solicitar alteração da finalidade da concessão.
Ora, como vimos, a norma transitória da alínea 3) do artigo 215.º da Lei de Terras de 2013 estatui que quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário, aplica-se o disposto no artigo 166.º, que determina a caducidade das concessões provisórias por não conclusão do aproveitamento nos prazos contratuais.
Na apreciação da culpa do concessionário, imposta por esta norma transitória, pode ver-se aqui um conceito indeterminado.
A propósito dos conceitos indeterminados, reflectimos o seguinte no acórdão de 3 de Maio de 2000, no Processo n.º 9/2000:
    Aqui, nos conceitos indeterminados, não há liberdade. Logo que se apure qual a interpretação correcta da norma - e em direito só há uma interpretação correcta em cada caso – o aplicador da lei tem de a seguir necessariamente.
   Por isso, ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA4referiu que «a discricionariedade começa onde acaba a interpretação».
   Deste modo, quando se conclua que a tarefa a efectuar é apenas a de interpretar a lei, o tribunal pode fiscalizar a aplicação do direito feita pela Administração.
   No entanto, a doutrina cedo detectou que ao lado dos conceitos indeterminados que se traduzem na mera interpretação da lei, há um outro grupo de situações em que se mostra que a intenção da lei é a de pretender «deixar ao órgão administrativo a escolha dos pressupostos quando os define através de noções vagas ou indeterminadas5».
   Este segundo grupo é que J. M. SÉRVULO CORREIA6 considera que são os verdadeiros conceitos indeterminados, ou conceitos indeterminados puros.
A doutrina alemã, a partir dos anos cinquenta avançou com a construção de doutrinas com vista a delimitar os casos em que a aplicação de conceitos indeterminados envolve o exercício de capacidade de apreciação própria da Administração, não sindicável pelos tribunais.
Foi assim que BACHOF lançou a célebre teoria da margem de livre apreciação, definindo-a como o âmbito dentro do qual se reserva à Administração uma margem para a livre apreciação dos pressupostos da sua actuação. Para o Professor alemão nem todo o conceito indeterminado confere uma margem de livre apreciação à Administração, sendo ao legislador que incumbe escolher os casos em que assim sucederá.7
Posteriormente, WALTER SCHMIDT, veio defender que «a avaliação de pressupostos que integram a situação concreta, para efeito da sua subsunção em conceitos indeterminados que figuram na hipótese da norma, reduz-se sempre a um problema de prognose, quer se trate de avaliação de qualidades de pessoas ou coisas, quer, directamente, da estimativa sobre a evolução futura de processos sociais…
À luz desta construção, a «margem de livre decisão» reduz-se aos casos de discricionariedade e de aplicação isolada de conceitos de prognose: a aplicação de todos os outros elementos do «Tatbestand» de uma norma jurídica é inteiramente sindicável pelos tribunais»8.
Seguindo a doutrina de WALTER SCHMIDT, J. M. SÉRVULO CORREIA9 explicitou que «a aplicação do conceito indeterminado tipo ao caso concreto (Anwendung) envolve a emissão de juízos de valor que inevitavelmente contêm elementos subjectivos, muitos deles integrados numa prognose. A prognose é um raciocínio através do qual se avalia a capacidade para uma actividade futura, se imagina a evolução futura de um processo social ou se sopesa a perigosidade de uma situação futura…
O juízo de prognose respeita à subsunção da situação concreta no conceito encerrado na previsão da norma (Tatbestand) e não à interpretação em abstracto de tal conceito. Assim, por exemplo, vigora na República Federal (Alemã) uma norma jurídica que determina que deverá ser recusada a licença de instalação de um estabelecimento hoteleiro quando os factos (Tatsachen) justificarem a suposição de que o requerente não merece confiança (Zuverlässigkeit) necessária para o desempenho de tal actividade industrial. O conceito indeterminado «confiança» carece de ser interpretado e o modo do seu entendimento em abstracto é revisível pelo tribunal. Mas o juízo, perante os pressupostos de facto, sobre se o requerente merece ou não a necessária confiança é um juízo de prognose, visto que envolve uma apreciação da hipotética conduta futura do requerente no desempenho da actividade pretendida».
Acresce que, para o mesmo autor, os conceitos indeterminados do 1.º tipo, que não envolvam juízos de prognose são determinados, porque o seu conteúdo é apurável através de métodos teorético-discursivos.10
Por outro lado, aos conceitos indeterminados do 2.º tipo, aqueles em que se revela a intenção de conferir uma margem de livre apreciação à Administração, devem aplicar-se as regras já estudadas a propósito dos limites e da fiscalização judicial do exercício de poderes discricionários11, afirmando-se que, embora estruturalmente diferenciáveis, discricionariedade e conceitos jurídicos indeterminados são unificáveis em termos de regime jurídico. 12>
Manifestamente, no caso dos autos, em que está em causa a interpretação da culpa passada da concessionária no não desenvolvimento do terreno, o conceito indeterminado é do 1.º tipo, pois não envolve qualquer juízo de prognose, mas apenas envolve a avaliação da conduta passada, porque o seu conteúdo é apurável através de métodos teorético-discursivos.
Assim, não podem estar em causa a violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da boa-fé.
Ora, a recorrente não alega nenhum facto que possa levar à conclusão de que o acto administrativo errou ao não considerar que a recorrente não teve culpa no não aproveitamento do terreno. Ou que errou ao considerar que a concessionária teve culpa em tal falta de aproveitamento.
Por outro lado, não se vislumbra qualquer violação dos princípios da legalidade, da colaboração entre a Administração e os particulares, da decisão, da desburocratização e da eficiência.
Assim, quaisquer indecisões ou menos eficiência dos Serviços da Administração, mormente de Obras Públicas, longos anos findo o prazo de aproveitamento do terreno, poderão relevar noutra sede, que não na de anulação do acto recorrido.
Improcedem, assim, as questões suscitadas.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 8 UC.
Macau, 11 de Abril de 2018.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa



     1 Quando mencionarmos no texto apenas a Lei de Terras, estar-nos-emos a referir à nova Lei de Terras.
     2 MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, Coimbra, Livraria Almedina, 10.ª edição, reimpressão, 1980, Tomo I, p. 438.
     3 MARCELLO CAETANO, Manual…, Tomo I, p. 501.
     4 ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA, ob. cit., p. 217 (referíamo-nos a Erro e Ilegalidade no Acto Administrativo, Lisboa, Ática, 1962).

     5 M. ESTEVES DE OLIVEIRA, ob. cit., p. 246 (referíamo-nos a Direito Administrativo, vol. I, 1980, Livraria Almedina, Lisboa).
     6 J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 332 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
     7 J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 122 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
     8 J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 131 e 136 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
     9 J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 119 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
     10 J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 136 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
     11 Neste sentido, DAVID DUARTE, ob. cit., p. 368 (referíamo-nos a Procedimentalização, Participação e Fundamentação: Para uma Concretização do Princípio da Imparcialidade Administrativa como Parâmetro Decisório, Livraria Almedina, Coimbra, 1996), e J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 499 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
     12 WALTER SCHMIDT, citado por J. M. SÉRVULO CORREIA, ob. cit., 136 (referíamo-nos a Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, Livraria Almedina, 1987).
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Processo n.º 38/2017

65
Processo n.º 38/2017