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Processo nº 299/2013
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 15 de Março de 2018

ASSUNTO:
- Usurpação de poder
- Nulidade do contrato administrativo
- Nulidade do acto administrativo
- Direito de propriedade
- Actividade vinculada

SUMÁRIO
- A nulidade de um contrato administrativo pode resultar das suas próprias cláusulas contratuais ou dos actos administrativos nulos de que haja dependido a sua celebração.
- Para a declaração da nulidade do contrato administrativo resultante das suas próprias cláusulas contratuais, o legislador exige que tal nulidade só pode ser declarada pelos tribunais competentes em sede própria – cfr. nº 1 do artº 173º do CPA e artº 113º do CPAC.
- O que já não acontece para a nulidade do contrato administrativo resultante dos actos administrativos nulos de que haja dependido a sua celebração.
- Neste último, a nulidade do contrato administrativo é, nos termos do nº 1 do artº 172º do CPA, consequência directa da nulidade dos actos administrativos de que haja dependido a sua celebração.
- O regime da declaração da nulidade dos actos administrativos está previsto no nº 2 do artº 123º do CPA, nos termos do qual qualquer órgão administrativo ou qualquer tribunal pode assim proceder.
- Assim, não enferma o vício de usurpação do poder o acto pelo qual se declarou a nulidade do acto administrativo relativo à formação do contrato administrativo.
- Uma vez declarada a nulidade dos actos administrativos de que haja dependido a celebração do contrato administrativo em causa, a nulidade deste último opera automaticamente do nº 1 do artº 172º do CPA, não carecendo uma outra declaração expressa para o efeito.
- A concessão do terreno por arrendamento apenas confere o direito de aproveitamento do terreno nos termos consagrados no contrato de concessão, nunca o direito de propriedade sobre ele.
- Se a revogação dos actos ilegais anuláveis é uma actividade vinculada da Administração, então, por maioria razão, também o é a declaração da nulidade dos actos nulos.
O Relator,

Ho Wai Neng







Processo nº 299/2013
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 15 de Março de 2018
Recorrente: A Ltd.
Entidade Recorrida: O Chefe do Executivo da RAEM

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
As Recorrentes A Ltd., B, C e D, melhores identificadas nos autos, vêm interpor o presente Recurso Contencioso contra o despacho do Chefe do Executivo de 09 de Abril de 2013, que declarou a nulidade do seu acto anterior, de 09 de Março de 2011, concluíndo que:
A. As Recorrentes têm legitimidade para interpor o presente recurso, a 1.ª por ser, enquanto titular de posição jurídica substantiva, a destinatária do acto recorrido e, as 2.ª e 3as, por terem um interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso, uma vez que o acto recorrido produziu efeitos externos lesivos na esfera jurídica dos seus direitos e interesses legalmente protegidos;
B. As Recorrentes impugnam, entre outros, os factos constantes dos pontos n.ºs 3 e 4 da Informação n.º 109/DSODEP/2013, de 2 de Abril, sob a qual foi exarado o acto recorrido;
C. Nos pontos 1 a 8 da referida Informação n.º 109/DSODEP/2013 refere-se, expressamente como pressuposto da decisão que ali se propõe, a nulidade dos Despachos do CE de 17/03/06, tal como declarada pelo Despacho do CE de 8/08/12, o que tornaria imperativa, a título de reposição da ordem jurídica alegadamente violada por aqueles actos autorizativos, a declaração de nulidade do Despacho do Chefe do Executivo, de 9/03/11, que entretanto autorizou a revisão da concessão em causa;
D. Acontece que os Despachos do CE de 17/03/06 não são nulos, tal como invocaram as Recorrentes no Recurso Contencioso de Anulação interposto do Despacho do CE de 8/08/12 acima identificado, isto porque não há coincidência entre os actos declarados nulos e o acto objecto de crime, como não há coincidência entre o autor dos actos declarados nulos e o autor do alegado crime, como exige a alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA;
E. Mais, o Despacho do CE de 8/08/12, que declara a nulidade dos Despachos do CE de 17/03/06, é que é nulo (ou subsidiariamente, anulável), por entre outros, padecer do vício de usurpação de poderes, tal como invocado nos autos de Recurso Contencioso de Anulação que, sob o n.º 755/12, correm termos por esse Tribunal;
F. Ora, se o único pressuposto de decisão em que o acto recorrido se baseou for declarado nulo ou anulado judicialmente, deixa aquele de ter fundamento e, como tal, padecerá em erro sobre os pressupostos de direito;
G. Por conseguinte, a verificação ou não do aqui invocado erro no pressuposto de direito quanto à nulidade dos Despacho do CE de 17/03/06 depende do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida, a final, no âmbito do Recurso Contencioso n.º 755/2012, o que representa uma causa prejudicial à apreciação do presente recurso - motivo pelo qual deve a presente instância ser suspensa, nos termos conjugados do n.º 1 do artigo 223.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do artigo 1.º do CPAC, e da alínea d) do n.º 1 do artigo 15.º também do CPAC, até que haja decisão final no âmbito do Recurso Contencioso n.º 755/12;
H. Entende expressamente o acto recorrido que, tendo sido declarados nulos os Despachos do CE de 17/03/06 de homologação dos Pareceres da Comissão de Terras favoráveis à transmissão dos direitos resultantes da concessão dos Lotes à 1.ª Recorrente, também o subsequente contrato de transmissão da concessão, por arrendamento, é nulo e de nenhum efeito;
I. O artigo 173.° do CPA atribua aos tribunais a reserva exclusiva para a apreciação de quaisquer questões de validade ou invalidade dos contratos administrativos, independentemente da fonte dessa invalidade;
J. Ora, as considerações que a Entidade Recorrida faz ao longo do acto recorrido sobre os efeitos do Despacho de 8/08/2012 e deste sobre o contrato de concessão e sua revisão, respectivamente, concluindo pela sua nulidade automática, correspondem, efectivamente, a actos opinativos sobre a (in)validade desse mesmo contrato, nos termos do artigo 173.º do CPA;
K. Ao contrário do que defende a Entidade Recorrida, é inegável que a mesma se pronuncia, efectiva e claramente, pela nulidade do contrato de revisão da concessão em causa pois que, na Informação n.º 223/DSODEP/2012, constam já os alegados efeitos dessa declaração de nulidade do contrato, ao ali falar-se em desocupação do terreno e restituição à 1.ª Recorrente do prémio pago, nos termos e para os efeitos do artigo 282.° do Código Civil e ao promover o registo dessa declaração unilateral de nulidade na Conservatória do Registo Predial, conforme Apresentação n.º 1 de 17/04/2013 às descrições 2XXXX, 2XXXX, 2XXXX, 2XXXX e 2XXXX, onde se lê: "Inutilizado o averbamento n.° (...), por ter [sido] declarada a nulidade da revisão e dos actos relacionados da concessão por arrendamento constante do despacho n.º 15/2011";
L. O princípio da equiparação dos contratos administrativos, tal como invocado pela Entidade Recorrida, por via do artigo 172.° do CPA, não é uma forma de atribuição de poderes à Administração para se pronunciar sobre a validade ou invalidade (incluindo a nulidade) de contratos administrativos;
M. Confunde a Entidade Recorrida, uma proposição de direito substantivo de invalidades quanto ao regime legal a aplicar por via do artigo 172.º do CPA, com uma proposição de direito processual de determinação, constante do n.º 1 do artigo 173.º, bem como dos artigos 113.º e ss. do mesmo Código, do órgão com competência (exclusiva) para uma pronúncia de autoridade sobre a matéria, sendo, nos termos desses artigos, a declaração de nulidade dos contratos apenas alcançada através da propositura, com ganho de causa, de uma acção judicial com tal pedido;
N. De resto, pela lógica jurídico-administrativa, é indispensável que a declaração de nulidade se consolide na ordem jurídica (quer através da não impugnação do acto recorrido ou da sua improcedência) previamente à decisão judicial a proferir em sede de acção sobre contratos administrativos;
O. O acto recorrido ignorou a condicionante de direito processual colocada pelos já citados artigo 173.º, n.º 1, do CPA, artigo 30.º, n.º 3, III, da Lei Básica, artigo 113.º do CPAC e ainda o parágrafo (3) do n.º 2 do artigo 30.° da Lei n.º 9/1999, de 20 de Dezembro, pois que, no tocante à definição imperativa das situações de invalidade dos contratos, a condicionante processual cifra-se desde logo na respectiva reserva aos tribunais em face dos órgãos da Administração – fica assim demonstrado que o acto recorrido:
(iv) enferma de usurpação de poder, por tomar como pressuposto a nulidade dos contratos de transmissão de direitos de concessão sobre os Lotes sem que tal nulidade alguma vez haja sido judicialmente declarada;
(v) enferma novamente de usurpação de poder ao pretender decidir sobre a pretensa nulidade do contrato de revisão da concessão em 2011;
(vi) viola o artigo 113.° do CPAC ao ignorá-lo como único meio processual admissível de a Administração procurar obter uma declaração imperativa da nulidade do contrato de concessão;
P. Padece, assim, o acto recorrido, de duplo vício de usurpação de poder, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA, sendo, por isso nulo;
Q. O direito do concessionário por arrendamento de terrenos do domínio privado da RAEM tem natureza de direito real e não de direito meramente obrigacional, conferindo o contrato de concessão poderes de construção e transformação de obras ou edifícios sobre os terrenos concessionados, correspondendo tais poderes a um verdadeiro direito de propriedade, como determina o artigo 1.º do DecretoLei n.º 51/83/M, de 26 de Dezembro, e tendo o concessionário o direito de transmitir a propriedade das construções, nos termos da Lei de Terras;
R. O acto recorrido viola frontalmente o direito de propriedade da 1.ª Recorrente resultante do contrato de concessão, por arrendamento, dos Lotes, o qual é um direito fundamental consagrado e protegido pelos artigos 6.º e 103.º da Lei Básica de Macau e, como tal, é nulo, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA;
S. O acto impugnado visa despojar a destinatária, a ora 1.ª Recorrente, dos seus direitos de conteúdo patrimonial, relativos ao Terreno, benfeitorias e construções já aí efectuadas, sem qualquer compensação pelo preço pago pelos Lotes, pelo seu valor real, o que não deixa de corresponder, assim, a um verdadeiro confisco - o que é incompatível com o artigo 103.° da Lei Básica, invocando-se, à cautela, o vício de violação de lei por confisco e a consequente nulidade do acto impugnado;
T. A declaração imperativa de não produção de efeitos pelo Despacho do CE de 8/08/12 não significa que os contratos de transmissão não tenham tido lugar, nem os removeu do ordenamento jurídico: os contratos foram outorgados e publicados no Boletim Oficial n.º 14, II Série, de 6 de Abril de 2006, pelos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas nºs. 48/2006 a 52/2006 e encontram-se válidos e eficazes a esta data, assim se mantendo enquanto não houver uma decisão judicial transitada em julgado que os julgue inválidos;
U. A relação contratual entre a RAEM e a 1.º Recorrente mantém-se válida e eficaz, logo o acto do Chefe do Executivo de 9 de Março de 2011 continua a ter objecto válido, logo, ao contrário do que se propugna na Informação n.º 223/DSODEP/2012, não existe qualquer impossibilidade do objecto do acto do Chefe do Executivo de 9 de Março de 2011;
V. Assim, o fundamento do acto recorrido incorre em erro sobre os pressupôstos de direito, uma vez que os referidos contratos de concessão (e posterior revisão) se mantêm válidos e eficazes, até serem, eventualmente, declarados inválidos pelo tribunal competente, padecendo de vício de violação de lei por erro na aplicação da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do CPA;
W. Do mesmo modo que, ao contrário do que se sugere nas alíneas 18. e 22. do ponto A. da Informação n.º 223/DSODEP/2012 não falta ao acto em causa nenhum dos seus elementos essenciais (i.e. sujeito, objecto, forma e finalidade) que, nessa eventualidade, pudesse acarretar a sua nulidade nos termos do n.º 1 do artigo 122.° do CPA. Pelo que também, nesta parte, o acto recorrido incorre em erro sobre os pressupostos de direito;
X. Além disso, trata-se, de uma concessão profundamente renovada, com um objecto diferente do inicial, conformado ao longo de um procedimento autónomo relativamente àquele que fora tomado em consideração pelos Despachos do CE de 17/03/2006, todo ele desenvolvido sob o mandato de um diferente Secretário dos Transportes e das Obras Públicas, com a intervenção de diversos órgãos colegiais representativos e serviços da Administração Pública;
Y. Considerar que, apesar de tudo isto, o Despacho do CE de 9/03/11, careceu de objecto como consequência da declaração de nulidade de um Despacho de 2006, do mesmo órgão, que autorizara uma muito distinta concessão, envolve não só uma errónea compreensão daquilo que seja o objecto desse acto administrativo de 2011 para efeito de aplicação do artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do CPA, mas um formalismo conceptual vazio e totalmente desligado das realidades e dos interesses públicos e privados merecedores de tutela à luz da Lei e do Direito;
Z. A transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do Terreno à 1.ª Recorrente não se encontram regulados pela escritura de 14 de Dezembro de 1990, como defende a Entidade Recorrida no ponto 1. da Informação 223/DSODEP/2013, porquanto com a aprovação das novas minutas de contrato de concessão e a celebração dos contratos publicados em 2006 e 2011, uma nova relação jurídica se criou, com novos termos contratuais, entre novas partes, com novas e diversas finalidades e com objectos totalmente diferentes do inicialmente acordado. Pelo que, nesta sede, incorre, assim, o acto recorrido em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito;
AA. O acto declarado nulo é um elemento da própria declaração negocial da Administração, enquanto contraente de um contrato administrativo, de apreciação, aceitação e decisão sobre a revisão da concessão proposta pela 1.ª Recorrente, e a prova disso é que o acto praticado pela Entidade Recorrida (agora declarado nulo) foi dirigido à própria 1.ª Recorrente, para aceitação expressa, com o propósito de que a situação jurídica em causa se definisse e concretizasse;
BB. Não se está, assim, perante uma invalidade derivada do contrato administrativo, mas tão só e apenas, a verificar-se, uma invalidade originária ou intrínseca do contrato, relacionada com a declaração negocial da Administração, contida no acto ora declarado nulo, cuja validade poderá apenas, como se disse, ser discutida em sede judicial, no âmbito de acção sobre contratos administrativos. Por isso, incorre em violação do artigo 172.º do CPA e em erro nos pressupostos de direito o acto impugnado ao remeter o caso concreto para o n.º 1 daquele preceito;
CC. Ainda que se entendesse que o acto recorrido não padecia de vício de 7usurpação de poder, o acto recorrido sempre estaria em claro erro de direito sobre os efeitos que o acto recorrido (e o anterior acto de declaração de nulidade dos actos do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006) têm sobre a validade dos contratos de concessão publicados pelos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48 a 52/2006 e do contrato de revisão dessa concessão, publicado pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 15/2011, dado que tal questão terá que ser discutida em acção própria a intentar no Tribunal competente;
DD. O acto recorrido padece, assim, de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito e errada interpretação dos efeitos do n.º 1 do artigo 172.° do CPA;
EE. Ao não suspender o procedimento administrativo onde foi proferido o acto recorrido, tal como requerido na pronúncia em sede de audiência escrita, por haver causa prejudicial, a Entidade Recorrida está a violar o artigo 33.° do CPA, o que corresponde ao vício de violação de lei;
FF. Ao dar como certos os factos constantes do Acórdão do TUI num processo-crime em que a 1.ª Recorrente não foi parte e ao aplicá-los automaticamente ao procedimento administrativo, o acto recorrido viola os limites objectivos do caso julgado, o que consubstancia um vício de violação de lei, que aqui se invoca para os devidos efeitos legais;
GG. Ao dizer, no ponto 4 da Informação n.º 109/DSODEP/2013, na qual foi exarado o acto recorrido, que o procedimento administrativo de transmissão dos direitos resultantes da concessão à 1.ª Recorrente foi viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transporte e Obras Públicas, o acto recorrido incorre em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito;
HH. O acto recorrido equivoca-se ao partir do princípio de que, no caso vertente, não restava à Administração qualquer margem de apreciação da oportunidade de declarar a nulidade do acto permissivo do contrato de revisão da concessão de 2011 e, como ela abusivamente pretende, a nulidade da própria revisão, violando-se assim por erro de aplicação o n.º 3 do artigo 123.º do CPA que permite a atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de actos nulos, por força do simples decurso do tempo, de harmonia com os princípios gerais de direito;
II. Incorre-se num vício de não exercício de discricionariedade por desconsideração da existência de margem de livre decisão causada pela convicção errónea de carácter totalmente vinculado do poder. Assumindo-se - apenas por necessidade de raciocínio - que devessem ser desde já tomados como nulos os contratos de 2006 pelos quais a 1.ª Recorrente adquiriu direitos de concessão sobre os Lotes, a verdade é que, à sombra desses efeitos transmissórios, se constituíram inúmeras situações de facto e de direito afectando as esferas jurídicas de muitos terceiros de boa-fé;
JJ. O acto recorrido levou inflexivelmente a uma solução de total desfazimento das situações jurídicas, económicas e sociais constituídas na base do acto de revisão da concessão em causa, sendo totalmente falacioso o argumento produzido na rubrica 4. de fls. 11 da Informação n.º 16/DJUDEP/2013 (que integra o acto recorrido), de que se não verificaria um decurso de tempo razoável, visto o acto agora declarado nulo haver sido praticado já em 9 de Março de 2011, quando, na verdade, aquilo que, segundo a fundamentação, o acto ora impugnado se propõe é extrair efeitos da alegada nulidade de um outro acto pré-contratual proferido em Março de 2006, ou seja, há mais de 7 anos atrás;
KK. No caso em apreço, uma cuidada ponderação deveria ter sido feita, na medida em que tudo provém de uma alegada infecção dos procedimentos e das decisões por acção de um governante corrupto, quando nenhuma responsabilidade da 1.ª Recorrente se encontra comprovada nos procedimentos administrativos, nem nenhum dos seus directores se encontra condenado por crime de corrupção, e quando o governante em causa já o não era ao longo de todo o procedimento preparatório do contrato de revisão da concessão de 2011 e não teve qualquer intervenção no primeiro procedimento que se possa considerar causalmente determinante da emissão e do conteúdo do primeiro Despacho do Chefe do Executivo declarado nulo;
LL. A declaração de destruição da revisão da concessão do Terreno, com mera devolução do prémio à Recorrente, ignora pura e simplesmente os princípios que, ao lado do da legalidade, também devem reger a actuação da Administração, designadamente o da protecção dos interesses legítimos que merecem tutela à luz do direito, nomeadamente as situações de facto constituídas à luz do n.º 3 do já citado artigo 123.º do CPA;
MM. Por esta razão, a Administração, antes de ter declarado a nulidade do acto do Despacho do CE de 9/03/11, deveria ter feito o exercício de ponderação previsto no n.º 3 do artigo 123.° do CPA, relativizando e balizando tal declaração por limites de proporcionalidade, adequação e justiça, com protecção dos direitos de terceiros de boa-fé - os quais se mostram, salvo o devido respeito, largamente ultrapassados pelo Despacho sob impugnação;
NN. Em suma, ainda que os Despachos de 2006 e de 2011 do Chefe do Executivo houvessem sido nulos, os princípios da protecção da confiança, da justiça e da proporcionalidade ordenariam que se ponderasse o exercício do poder de afastamento de efeitos anulatórios ao abrigo do poder conferido pelo antigo 123.º, n.º 3, do CPA. Este preceito e aqueles princípios foram ofendidos pela omissão de ponderação de interesses relevantes para um tal exercício;
OO. Por outro lado, sendo inescapável o exercício de uma margem de livre apreciação sobre a tomada oficiosa da iniciativa de declarar nulo um anterior acto administrativo, foram os mesmos princípios ofendidos pelo manifesto défice de ponderação dos valores e dos interesses legítimos favoráveis e contrários à adopção de uma tal iniciativa;
PP. Conclui-se pelo vício de violação de lei do acto recorrido, por erro no pressuposto do carácter absolutamente vinculado do acto recorrido, bem como violação dos princípios de protecção de confiança, boa fé, da proporcionalidade e da adequação por défice de ponderação no quadro do disposto pelo n.º 3 do artigo 123.° do CPA;
QQ. A revisão da concessão operada 2011, e considerada nula pelo acto recorrido, tratou-se de um procedimento administrativo independente, novo, sem qualquer irregularidade, mácula ou vício, cujo objecto estava em plena conformidade com a lei e regulamentos aplicáveis, e sobre o qual foi tomada decisão final por novos titulares de órgãos da Administração, sem qualquer tipo de condicionamento, reserva ou influência, com absoluta observação do princípio da legalidade;
RR. Assim, toda a actuação da Administração, incluindo a revisão da concessão nos termos supra descritos, a percepção do imposto de selo devido pelas promessas de compra das futuras fracções autónomas a construir no Terreno, a aprovação dos projectos de arquitectura e engenharia e a emissão de licenças de obra, até à declaração de nulidade em 8 de Agosto de 2012 dos actos do Chefe do Executivo de 17 de Março de 2006, reforçou a confiança da 1.ª Recorrente (e da Chinese Estates, sua sócia única, bem como de particulares, e outros investidores) nos direitos concedidos por via do contrato de concessão;
SS. Tendo em conta o exposto, o acto recorrido contraria frontalmente o comportamento da Administração, pondo, deste modo, em causa o princípio da boa-fé e da confiança e, bem assim, os princípios da justiça, proporcionalidade e adequação, tal como estabelecidos nos artigos 3.º a 5.º, 7.º e 8.º do CPA - o que, nessa eventualidade, consubstanciará violação de lei, sendo o acto anulável;
TT. A 2.ª e 3.as Recorrentes dão por reproduzida na íntegra, para os devidos efeitos legais, toda a fundamentação aduzida nos artigos precedentes e invocam, mutatis mutandis, os mesmos vícios do acto recorrido conforme alegados pela 1.ª Recorrente na presente petição de recurso, em particular os constantes dos pontos 3.8 e 3.9 supra.
*
Como contra-interessados, indicaram as seguintes pessoas colectivas:
a) E - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, com sede em Macau, na Avenida ......, s/n, Edifício ......, ....º andar “...”;
e, ainda, por entretanto terem sido dissolvidas, a citação, nos termos do artigo 325.° do Código Comercial, dos antigos sócios de cada umas demais Transmitentes, supra identificadas: F - Sociedade de Fomento Predial, Limitada; G Sociedade de Fomento Predial, Limitada; H Sociedade de Fomento Predial, Limitada e I Sociedade de Fomento Predial, Limitada, todas anteriormente com sede em Macau, na Avenida ......, s/n, Edifício ......, ....º andar “...”;
b) a Região Administrativa Especial de Macau, titular de uma quota correspondente a 88% do capital social de cada uma das referidas sociedades à data da dissolução, representada pelo Ministério Público nos termos do n.º 1 do artigo 56.° da Lei n.º 9/1999, de 20 de Dezembro e do artigo 52.º do CPC;
c) a Sociedade J, S.A., com sede em Macau, na Avenida de ......, n.º ... a ..., Hotel ......, ...º andar, titular de uma quota correspondente a 5% do capital social de cada uma das referidas sociedades à data da dissolução;
d) a K - Sociedade do ...... de Macau, S.A.R.L., com sede em Macau, na Avenida ......, Edifício do ......, ....° e ....º andares, Ilha da Taipa; e
e) Companhia de Investimento L, Limitada, com sede em Macau, na Avenida da ......, n.º ..., Edifício ......, ....º andar “...”.
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Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 403 a 430 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, suscitando a ilegitimidade activa das 2ª e 3as Recorrentes e pugnando ao mesmo tempo pelo não provimento do recurso.
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Por acórdão de 12/06/2014, foi determinada a suspensão da instância dos presentes autos, aguardando-se pela prolação da decisão final, com trânsito em julgado, no Proc. nº 755/2012 deste TSI.
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Por despacho do Relator de 30/01/2015, foi declarada a extinção da instância dos presentes autos em relação às Recorrentes C e D em consequência da desistência das mesmas.
*
Por despacho do Relator de 12/03/2015, foi declarada a extinção da instância dos presentes autos em relação à Recorrente B em consequência da desistência da mesma.
*
Por acórdão de 20/10/2016, foi julgada procedente a excepção da ilegitimidade passiva das contra-interessadas RAEM, Sociedade J, SA, K - Sociedade do ...... de Macau, SARL e Companhia de Investimento L, Limitada.
*
O Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
   “Na douta petição inicial, as recorrentes solicitaram a suspensão da instância até que haja decisão final no âmbito do recurso contencioso sob o n.º755/12 e, ainda, a declaração da nulidade ou, a título subsidiário, a anulação do despacho em escrutínio que se encontra exarado pelo Chefe do Executivo na Informação n.º109/DSODEP/2013 (doc. de fls.111 a 116 dos autos).
   O pedido de suspensão da instância viu atendido pelo Venerando TSI (cfr. o Acórdão de fls.594 a 595 verso), e tal suspensão cessou com o trânsito em julgado em 07/07/2016 do brilhante Acórdão do Venerando TUI que negou provimento ao recurso jurisdicional e confirmou a douta decisão do TSI traduzida em julgar improcedente o recurso contencioso (docs. de fls.632 a 782 dos autos), pelo que se resta apreciar os vícios assacados pelas recorrentes ao despacho in questio.
*
1. Do pedido da declaração da nulidade
Fundamentando o seu pedido da declaração de nulidade do despacho recorrido, as recorrentes rogaram a (dupla) usurpação de poder e a ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental na sua dupla vertente de ofensa do direito de propriedade da 1ª recorrente.
1.1- Antes de mais, impõe-se frisar que o acto atacado nestes autos declarou a nulidade do despacho proferido em 09/03/2011 pelo Chefe do Executivo, e este despacho de 09/03/2011, por sua vez, se consubstancia em autorizar a revisão de contrato de concessão referido nos arts.2º a 4º da petição, revisão que veio a ser concretizada pelo Despacho n.º15/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (doc. de fls.632 a 782 dos autos).
Sendo assim, é pertinente e, com efeito, necessário que se apura se o referido despacho de autorização de 09/03/2011 do Chefe do Executivo eivar do vício aludido na Informação n.º109/DSODEP/2013 ou de outros que possam germinar a nulidade? Sendo esta do conhecimento oficioso.
1.2- Repare-se que o despacho objecto do Processo n.º755/2012 do Venerando TSI declarou a nulidade dos despachos do Chefe do Executivo de 17/03/2006 que consistem na homologação dos Pareceres da Comissão de Terra n.º23/2006, n.º24/2006, n.º25/2012, n.º26/2006 e n.º27/2006.
Ora bem, desses despachos de homologação do Chefe do Executivo de 17/03/2006 dependem estrita e imprescindivelmente as transmissões e a revisão da concessão de terreno (art.2º da petição), cuja nova revisão foi autorizada pelo Chefe do Executivo no despacho datado de 09/03/2011.
Para além de confirmar o Acórdão no Processo n.º755/2012, pelo qual o douto TSI julgou improcedente o recurso contencioso e, nesta medida, fortalece a nulidade dos actos praticados pelo Chefe do Executivo em 17/3/2006, o Venerando TUI ilumina ainda a situação jurídica do contrato de concessão dependente destes actos (vide. Acórdão no Processo n.º76/2015):
4. Quanto à invalidade do contrato administrativo, convém distinguir as seguintes situações: o contrato é nulo em consequência da nulidade das suas cláusulas contratuais; o contrato padece de nulidade derivada, porque é nulo o acto administrativo de que tenha dependido a sua celebração, nos termos do n.º1 do art.º172.º do CPA.
5. Na segunda situação, a nulidade do contrato não tem nada a ver com a interpretação ou a validade das cláusulas contratuais, não estando em causa o sentido ou conteúdo do contrato. A nulidade do contrato determina-se com o mesmo vício do próprio acto administrativo que permite a celebração do contrato.
Em conformidade com esta sensata jurisprudência, podemos inferir que a locução «nos termos do presente Código» utilizada pelo legislador no n.º1 do art.172º do CPA deve ser interpretada no sentido de os motivos conducentes à nulidade ou anulabilidade de um certo acto administrativo provocarem as correspondentes formas de invalidade do respectivo contrato sequencial. Nisto reside a regra do paralelismo das causas.
De acordo com o disposto na alínea a) do n.º3 deste art.172º, aos contratos que dependem dum acto administrativo pré-contratual e com objecto passível de acto administrativo aplica-se o regime de invalidade de acto administrativo estabelecido no CPA. – Eis a regra do paralelismo do regime. Daí decorre que a nulidade do acto administrativo determina directa e inevitavelmente a nulidade do contrato dependente daquele. O que significa que a nulidade do contrato constitui a decorrência ipso jure e ope legis da nulidade do acto administrativo que é o pressuposto.
Tudo isto leva-nos a extrair que judicialmente confirmada, a declaração pelo Chefe do Executivo da nulidade dos seus actos de 17/3/2006 operam, só por si e necessariamente, a nulidade do respectivo contrato de concessão sequencial (art.2º da petição), sem esta nulidade derivada carecer da acção para obter a declaração judicial, e o caso julgado formado pelo douto aresto tirado pelo Venerando TUI no seu Processo n.º76/2015 torna indiscutível e firme a nulidade desse mesmo contrato de concessão.
De outra banda, devido à apontada regra do paralelismo do regime jurídico quanto à invalidade prescrita na alínea a) do n.º3 do art.172º do CPA – regra que se aplica ao contrato de concessão referido no art.2º da petição por o seu objecto ser passível de acto administrativo, a nulidade do mesmo contrato de concessão cai, sem dúvida, na impossibilidade de revogação, sanação e, por maioria da razão, de revisão.
Ora, na medida em que tem por objectivo e ratio autorizar a nova revisão do sobredito contrato de concessão cuja nulidade fica coberta pelo caso julgado (Acórdão do TUI no Processo n.º76/2015), o despacho (preferido pelo Chefe do Executivo em 09/03/2011) enferma efectivamente do objecto impossível e, deste modo, é irremediavelmente nulo nos termos da determinação na alínea c) do n.º2 do art.122º do CPA.
Chegando aqui, podemos extrair quatro conclusões:
- Os despachos de homologação proferidos pelo Chefe do Executivo em 17/03/2006 são nulos, e tal nulidade adquire já firmeza em virtude da improcedência do recurso contencioso e do decaimento do subsequente recurso jurisdicional (vide. arestos de fls.632 a 727 e de fls.728 a 782 dos autos);
- O sobredito contrato de concessão que depende directa e imprescindivelmente dos referidos despachos de homologação eiva da nulidade derivada consagrada no n.º1 do art.172º do CPA;
- Nos termos do disposto na alínea a) do n.º3 do art.172º do CPA, a nulidade derivada supra mencionada determina que o mesmo contrato de concessão fique na impossibilidade da revogação, sanação e, por maioria da razão, da revisão;
- Tendo por objectivo e ratio autorizar a nova revisão deste contrato de concessão cuja nulidade encontra coberta pelo caso julgado (Acórdão do TUI no Processo n.º76/2015), o acto praticado em 09/03/2011 pelo Chefe do Executivo fica ferido do objecto impossível e, deste modo, é irremediavelmente nulo nos termos da determinação na alínea c) do n.º2 do art.122º do CPA.
1.3- Com base nestas conclusões, inclinamos a entender que consistindo em declarar a nulidade do acto praticado pelo Chefe do Executivo em 09/03/2011 ao abrigo da c) do n.º2 do art.122º do CPA, o despacho impugnado no presente recurso contencioso está em plena conformidade com as disposições nesta alínea c) e no n.º2 do art.123º do CPA, pelo que não padece, de todo em todo lado, da assacada usurpação de poder que tem sido definida sendo vício consubstanciado na prática por um órgão da administração dum acto incluído nas atribuições do poder legislativo ou do poder judicial (Freitas do Amaral: Direito Administrativo, vol. III, Lisboa 1989, p.295).
Repare-se que tal como acontece na ordem jurídica de Portugal e nas outras civilizadas, o ordenamento jurídico da RAEM não protege, em regra, a propriedade e outros direitos patrimoniais, desde que a respectiva aquisição padeça da nulidade ou constitua ilicitude criminal (arts.279º e 282º do Código Civil, bem como arts.101º e 282º do Código Penal).
Neste quadro legal, e dado que os direito resultantes do contrato de concessão à 1ª recorrente não têm a natureza da propriedade, colhemos tranquilamente que não faz sentido a arguição (da recorrente) da ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental – direito de propriedade.
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2. Do pedido da anulação
A fim de abonar o pedido de anulação as recorrentes invocaram os seguintes vícios:
1º- o erro nos pressupostos de direito quanto à alegada impossibilidade do objecto;
2º- o erro nos pressupostos de facto e de direito ao considerar que a concessão de terreno é regulada pela escritura pública outorgada em 14 de Dezembro de 1990;
3º- a violação do artigo 172º do CPA e erro nos pressupostos de direito ao considerar o Despacho de 9/03/11 como destacável e causador de nulidade derivada do contrato de concessão;
4º- o erro nos pressupostos de direito ao concluir pela nulidade automática dos contratos de concessão por arrendamento;
5º- a violação do artigo 33º do CPA;
6º- o erro nos pressupostos de direito por desrespeito dos limites do caso julgado;
7º- o erro nos pressupostos de facto e de direito ao considerar que o procedimento administrativo de transmissão de direitos resultantes da concessão à 1ª recorrente foi viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas;
8º- o erro nos pressupostos de facto do carácter absolutamente vinculado do acto recorrido, bem como a violação dos princípios de protecção de confiança, boa fé, da proporcionalidade a da adequação por défice de ponderação nos quadro do disposto pelo n.º3 do art.123º do CPA;
9º- a violação dos princípios da justiça, boa fé, confiança, proporcionalidade a adequação
Sem prejuízo do elevado respeito pela melhor opinião em sentido contrário, entendemos que às recorrentes não assiste qualquer razão.
2.1- Recorde-se que o contrato de concessão que depende directa e imprescindivelmente daqueles despachos de homologação proferidos pelo Chefe do Executivo em 17/03/2006 eiva da nulidade derivada prevista no n.º1 do art.172º do CPA, de outro lado, por força do preceito na alínea a) do n.º3 deste artigo, a nulidade derivada germina a impossibilidade da revogação, sanação e, por maioria da razão, da revisão deste mesmo contrato. O que torna infundado o primeiro argumento acima aludido.
2.2- O teor da Informação n.º109/DSODEP/2013 (doc. de fls.111 a 116 dos autos), sobretudo o seu ponto n.º13 demonstra, sem margem para dúvida, que a Administração tinha perfeita consciência de que a situação jurídica da 1ª recorrente, como concessionária, não estava regulada pela escritura pública outorgada em 14/12/1990, mas sim pelo contrato de concessão referido no art.4º da petição. Daí resulta que não existe este erro.
2.3- Ora, os factos alegados nos arts.3º e 4º da petição evidenciam que o despacho do Chefe do Executivo de 09/03/2011 se consubstancia em deferir o pedido da nova revisão apresentado em 13/02/2009 pela 1ª recorrente e, deste modo, autorizou a nova revisão que veio a ser concretizada pelo despacho n.º15/2011 do STOP.
Note-se que nas alturas respectivamente do pedido e do despacho acima referidos, estava em vigor a Lei n.º6/80/M. Nos termos da alínea d) do art.41º desta Lei, competia ao Chefe do Executivo autorizar alteração de finalidade de concessões e modificação do aproveitamento de terrenos concedidos. Procedendo à interpretação sistemática e teleológica das disposições nesta alínea d), no art.124º e no art.143º da mesma Lei, temos por certo que a revisão de qualquer concessão carecia sempre de prévia autorização – regime que, no actual ordenamento jurídico, se encontra expressamente consagrada no n.º1 do art.139º da Lei n.º10/2013.
À luz da definição consignada no art.110º do CPA, não há margem para dúvida de que as autorizações prévias dadas a qualquer revisão de concessão assumem a natureza jurídica de acto administrativo, e constituem pressuposto imperativo, vinculativo e impostergável de revisão da concessão, sob pena de germinar a nulidade da revisão não-autorizada. E a aceitação prevista no art.125º da Lei n.º6/80/M funciona apenas como o requisito de eficácia das autorizações prévias que são encaixadas, pela doutrina autorizada, na categoria de actos receptícios (Lino Ribeiro, José Cândido de Pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau – Anotado e Comentado, pp.676 a 677).
Nestes termos, o despacho do Chefe do Executivo de 09/03/2011 é passível de declaração da nulidade pela Administração (art.123º, n.º2 do CPA), e o argumento (da recorrente) de tal despacho ser apenas um elemento da declaração negocial da Administração é sofisticado. Daí flui necessariamente que este despacho do Chefe do Executivo não infringe o preceito no art.172º do CPA.
2.4- Repita-se acentuadamente que as transmissões e a revisão da concessão incorporadas no contrato da concessão titulado pelo despacho do STOP n.º15/2011 foram autorizadas pelos despachos proferido pelo Chefe do Executivo em 17/03/2006 e, de outra banda, a nulidade destes despacho se torna indiscutível e firme por força dos prudentes Acórdãos dos Venerandos TSI e TUI nos Processos respectivamente n.º755/2012 e n.º76/20152.
Sendo assim, e nos termos da determinação no n.º1 do art.172º do CPA, o referido contrato da concessão titulado pelo despacho do STOP n.º15/2011 enferma da nulidade automática, portanto, o despacho atacado nestes autos não fere do erro nos pressupostos de direito em apreciação.
2.5- A nulidade do contrato da concessão titulado pelo despacho do STOP n.º15/2011 determina adequada e necessariamente que este mesmo contrato caísse na impossibilidade de revisão. Daqui flui que tendo por única finalidade autorizar a revisão deste contrato, o despacho proferido em 09/03/2011 pelo Chefe do Executivo incide, de forma inevitável, no objecto impossível e, deste modo, é irremediavelmente nulo nos termos da determinação na alínea c) do n.º2 do art.122º do CPA.
Na medida em que o Chefe do Executivo se dispõe da competência para declarar a nulidade do seu despacho de 09/03/2011, as questões no que respeitem ao contrato titulado pelo despacho do STOP n.º15/2011 não constituem, em boa verdade, questão prejudicial para o despacho recorrido, por isso, este não contende com o art.33º do CPA.
Na mera hipótese de haver questão prejudicial, a suspensão do procedimento exigida pelo n.º1 do art.33º do CPA degrada-se na formalidade não essencial, pois bem, os doutos Acórdãos dos Venerandos TSI e TUI nos Processos respectivamente n.º755/2012 e n.º76/20152 neutralizam e curam a preterição da suspensão, pelo que a inobservância do disposto no n.º1 do art.33º do CPA não pode invalidar o despacho em causa.
2.6- Ora bem, o ponto 3 da Informação n.º109/DSODEP/2013 e o considerando 3 da Informação n.º223/DSODEP /2012 mencionam, clara e propositadamente, que a intervenção criminosa do então STOP só foi o fundamento da declaração da nulidade dos despachos de homologação do Chefe do Executivo em 17/03/2006, já não foi o motivo da nulidade do seu despacho de 09/03/2011 destinado a autorizar a revisão do contrato dependente dos apontados despachos de homologação, motivo este que consiste no objecto impossível por tal contrato padecer da nulidade derivada e, nesta medida, cair na impossibilidade de revisão.
O que impõe concluir que o acto ora recorrido que se consubstancia em declarar a nulidade do despacho decretado em 09/03/2011 pelo Chefe do Executivo não desrespeite o caso julgado configurado pelo Acórdão de condenação tirado pelo Venerando TUI no Processo n.º37/2011.
2.7- Bem, o Acórdão condenatório do Venerando TUI no Processo n.º37/2011 forma já caso julgado, no sentido de que aquele procedimento administrativo de transmissão de direitos resultantes da concessão à 1ª recorrente foi viciado pela intervenção criminosa do então STOP.
Este caso julgado torna irrefutável a intervenção criminosa do então STOP no referido procedimento administrativo de transmissão, e acarreta o irremediável falecimento à arguição do erro nos pressupostos de facto e direito nos arts.181º a 192º da petição inicial. De outro lado, importa ter presente que a nulidade dos despachos de homologação proferidos pelo Chefe do Executivo em 17/03/2006 adquire firmeza e verdade jurídicas.
2.8- Assevera peremptoriamente o Venerando TUI (Acórdão no Processo n.º54/2011): A Administração está vinculada a revogar os actos ilegais anuláveis, sejam desfavoráveis ou favoráveis aos particulares, com ou sem substituição por outros, a menos que decida proceder à sua sanação (reforma, conversão ou ratificação).
Em esteira desta sensata jurisprudência, podemos extrair, com toda a tranquilidade, que por maioria da razão, a Administração está vinculada a declarar a nulidade dos actos nulos, portanto, o despacho recorrido que se traduz apenas em declarar a nulidade do despacho do Chefe do Executivo de 09/03/2011 assume a molde de acto administrativo vinculado.
O que nos legitima a seguir à jurisprudência mais autorizada que ensina: Não dispondo a Administração, face ao tipo legal do acto, de margem de discricionariedade ou liberdade decisória, é inoperante a alegação de violação dos princípios da boa-fé, da igualdade, proporcionalidade ou justiça. (aresto acima citado, no seio do TSI, vide. a título exemplificativo Acórdãos nos Processos n.º433/2015 e n.º179/2016)
Nestes termos, todos os argumentos aduzidos nos arts.193º a 247º da petição inicial não podem deixar de ser infundados e inoperantes.
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   Por todo o expendido acima, propendemos pelo não provimento do presente recurso contencioso.”
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é o competente.
As partes possuem personalidade e capacidade judiciárias.
Mostram-se regularmente patrocinadas.
Não existem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – Factos
É assente a seguinte factualidade com base nas provas testemunhal e documental existente nos autos:
1. Desde 15 de Novembro de 1999 que as sociedades E - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, F - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, G - Sociedade de Fomento Predial, Limitada, H - Sociedade de Fomento Predial, Limitada e I - Sociedade de Fomento Predial, Limitada (as "Transmitentes") eram titulares dos direitos resultantes das concessões, por arrendamento, respectivamente, do Lote 1c, Lote 2, Lote 3, Lote 4 e Lote 5, situados na ilha da Taipa, junto à Avenida Wai Long e Estrada da Ponta da Cabrita, descritos na Conservatória do Registo Predial sob os n.ºs 2XXXX, 2XXXX, 2XXXX, 2XXXX e 2XXXX (os "Lotes").
2. Em 16 de Fevereiro de 2006, as Transmitentes requereram junto da Direcção dos Serviços de Solos e Obras Públicas a transmissão dos direitos resultantes dos contratos de concessão, por arrendamento, dos Lotes a favor da Recorrente A Ltd., tendo o procedimento administrativo iniciado com tal requerimento seguido os seus trâmites normais e a Comissão de Terras, reunida em sessão de 16 de Março de 2006, emitido os Pareceres n.ºs 23 a 27/2006, favoráveis à transmissão requerida, bem como à revisão da concessão e às minutas de contratos a eles anexas, que vieram a ser homologados por Despachos do Exmº Senhor Chefe do Executivo, de 17 de Março de 2006 (os "Despachos do CE de 17/03/06") - tudo conforme os Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 48 a 52/2006, publicados no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 14, II Série, de 06 de Abril de 2006.
3. Pouco depois da transmissão dos direitos referida no ponto anterior, a referida Recorrente iniciou um procedimento de revisão da concessão em causa, o qual acabou por ser formalizado em 13 de Fevereiro de 2009, com um pedido de nova revisão do contrato de concessão dos Lotes e solicitação de prorrogação do prazo de aproveitamento dos Lotes até 13 de Dezembro de 2015.
4. O procedimento para revisão seguiu a sua tramitação normal, tendo sido enviado o processo à Comissão de Terras, que emitiu o parecer n.º 41/2011, favorável ao deferimento do pedido no sentido de se proceder à alteração do objecto de concessão dos cinco Lotes, mediante a sua anexação, à reversão para o domínio público da RAEM de nove parcelas a desanexar dos mesmos e a concessão por arrendamento de oito parcelas contíguas, em ordem a formar um único lote com a área de 82711m2, o qual foi homologado por Despacho do Exmº. Senhor Chefe do Executivo, de 09 de Março de 2011 (o "Despacho do CE de 9/03/11").
5. A mesma Recorrente foi notificada do Despacho do Exmº. Senhor Chefe do Executivo de 08 de Agosto de 2012, exarado sob a Informação n.º 192/DSODEP/2012, de 07 de Agosto de 2012 (o "Despacho do CE de 8/08/12", que declarou a nulidade dos supra mencionados Despachos do CE de 17/03/06, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), com fundamento em que tinha ficado provado, por Acórdão n.º 37/2011 do Tribunal de Última Instância, de 31 de Maio de 2012, que o processo de selecção da transmissão dos direitos resultantes da concessão provisória, por arrendamento, dos Lotes teria sido viciado pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transportes e Obras Públicas, enquanto titular de um órgão da Administração.
6. Tal acto foi impugnado contenciosamente e deu origem ao Recurso Contencioso sob o n.º 755/2012, que correu termos no TSI.
7. Por acórdão de 18/06/2015, o TSI julgou o referido recurso contencioso improcedente, confirmando o acto recorrido.
8. Inconformada, a Recorrente A Ltd interpôs recurso jurisdicional para o TUI, que correu termos sob o nº 76/2015.
9. Por acórdão de 22/06/2016, o TUI negou provimento ao recurso jurisdicional interposto.
10. Em 04 de Setembro de 2012, foi a Recorrente A Ltd. notificada, através do ofício 0624/6452.04 a 6456.04/DSODEP/2012, da Informação n.º 223/DSODEP/2012, de 04 de Setembro, para se pronunciar, em sede de audiência escrita, sobre a intenção do Chefe do Executivo de declarar a nulidade do seu acto 09 de Março de 2011, de homologação do parecer da Comissão de Terras n.º 41/2011, no qual aquela tinha emitido parecer favorável ao pedido de revisão da concessão por si apresentado, bem como à minuta de contrato a ele anexa - o que a Recorrente fez em 19 de Setembro de 2012.
11. A Recorrente A Ltd. foi notificada do Despacho do Exmº. Senhor Chefe do Executivo de 09 de Abril de 2013, exarado sob a Informação n.º 109/DSODEP/2013, de 02 de Abril de 2013, que declarou a nulidade do acto do Chefe do Executivo, de 09 de Março de 2011, através do qual foi homologado o Parecer da Comissão de Terras n.º 41/2011, de 03 de Março de 2011, ora o acto recorrido.
12. A Informação n.º 109/DSODEP/2013, de 02 de Abril, tem o seguinte teor:
“….
1. 透過公佈於2006年4月6日第14期《澳門特別行政區公報》第二組的第48至52/2006號運輸工務司司長批示,批准將五幅以租賃制度批出,位於氹仔島,鄰近偉龍馬路及雞頸馬路,稱為“1c”地段、“2”地段、“3”地段、“4”地段及“5”地段,面積4,012平方米、13,425平方米、18,707平方米、8,750平方米及33,895平方米,標示於物業登記局第 2XXXX、2XXXX、2XXXX、2XXXX及2XXXX號的土地的臨時租賃批給所衍生權利有償轉讓予A, Ltd.公司。上述批給由1990年12月14日訂立的公證書規範,並經第5/SATOP/94號批示、第82/SATOP/95號批示、第52/SATOP/96號批示及第 34/SATOP/97號批示作出修改,以及經第53/SATOP/97號批示作出更正。(附件A)
2. 隨後,透過公佈於2011年3月30日第13期《澳門特別行政區公報》第二組的第15/2011號運輸工務司司長批示,批准修改上述五幅土地的批給,並歸還九幅地塊,以及批出八幅地塊以便將其合併及共同利用,基於上述修改,該土地的總面積改為82,711平方米。(附件B)
3. 根據終審法院的第37/2011號合議庭裁判,證實名為“1c”地段、“2”地段、“3”地段、“4”地段及“5”地段,面積4,012平方米、13,425平方米、18,707平方米、8,750平方米及33,895平方米,位於氹仔島,鄰近偉龍馬路及雞頸馬路,標示於物業登記局第2XXXX、2XXXX、2XXXX、2XXXX及2XXXX號的土地的臨時租賃批給所衍生權利的承讓公司甄選程序因前運輸工務司司長,以行政當局的機關據位人的身份作出犯罪干預而沾上瑕疵。
4. 由於上述權利轉讓的行政程序是以該甄選程序衍生的協商作為基礎,因此亦受前運輸工務司司長作出的犯罪而沾上瑕疵。
5. 基於此,行政長官於2012年6月12日在同日第149/DSODEP/2012號報告書上作出批示,按照《行政程序法典》第122條第2款c)項和第123條第2款的規定,展開宣告其於2006年3月17日分別確認土地委員會的2006年3月16日第23/2006號、第24/2006號、第 25/2006號、第26/2006號及第27/2006號意見書的行為無效的程序。在該等意見書中委員會對“1c”地段、“2”地段、“3”地段、“4”地段及“5”地段的批給合同所衍生的權利轉讓予A, Ltd.公司和修改批給合同,以及附於該等意見書的合同擬本發出贊同意見。(附件C)
6. 其後,經完成相關的聽證程序後,行政長官於2012年8月8日在2012年8月7日第192/DSODEP/2012號報告書上作出批示,按照《行政程序法典》第122條第2款c)項和第123條第2款的規定,宣告其於2006年3月17日分別確認土地委員會的2006年3月16日第23/2006號、第24/2006號、第25/2006號、第26/2006號及第27/2006號意見書的行為無效。(附件D)
7. 為此,透過公佈於2012年8月15日第33期《澳門特別行政區公報》第二組的第38/2012號運輸工務司司長批示,將上述宣告無效的決定向外公佈。(附件E)
8. 為跟進上述宣告無效行為對第15/2011號運輸工務司司長批示規範的相關土地批給修改所產生的影響,本局於2012年9月4日撰寫了第223/DSODEP/2012號報告書(附件F),建議:
8.1. 根據《行政程序法典》第122條第1款和第2款c)項,以及第123條第2款的規定,展開宣告行政長官於2011年3月9日確認土地委員會在2011年3月3日作出的第41/2011號意見書的行為無效的程序。在該意見書中土地委員會對A, Ltd.公司提出修改五幅以租賃制度批出,位於氹仔島,鄰近偉龍馬路及雞頸馬路,稱為“1c”地段、“2”地段、“3”地段、“4”地段及“5”地段,面積4,012平方米、13,425平方米、18,707平方米、8,750平方米及33,895平方米的土地批給,以及歸還九幅地塊和批出八幅地塊,以便將其合併和共同利用的申請和附於該意見書的合同擬本,發出贊同意見。該確認行為透過第15/2011號運輸工務司司長批示公佈於2011年3月30日第13期《澳門特別行政區公報》第二組;
8.2. 並於作出決定前,根據《行政程序法典》第93條及續後數條的規定,對承批人A, Ltd.公司進行預先聽證,以預先聽取利害關係人的意見。
9. 就上述建議,行政長官於2012年9月4日在上述報告書作出同意批示。
10. 因此,根據《行政程序法典》第93條及續後數條的規定,本廳透過2012年9月4日第 624/6452.04 a 6456.04/DSODEP/2012號公函通知承批人A, Ltd.公司進行利害關係人的聽證,允許其於收到通知書日起計15日期限內發表意見。(附件G)
11. A, Ltd.公司於2012年9月19日透過收件編號107635/2012申請書表明其立場。
12. 為對A, Ltd.公司的回覆進行分析,本廳將上述申請書送交法律廳。該廳根據《行政程序法典》第98條的規定,撰寫載有利害關係人聽證報告的2013年3月15日第16/DJUDEP/2013號報告書(附件I),其內容如下:
「就宣告行政長官於2011年3月9日確認土地委員會在2011年3月3日作出的第41/2011號意見書的行為無效的最終決定意向進行的利害關係人聽證,根據《行政程序法典》第98條的規定編製報告書。在該意見書中土地委員會對A, Ltd.公司提出修改位於氹仔島雞頸馬路稱為““1c”地段、“2”地段、“3”地段、“4”地段及“5”地段的批給,以及歸還九幅地塊和批出八幅地塊,以便將其合併和共同利用的申請和附於該意見書的合同擬本,發出贊同意見。
     A.背景資料
1. 於2012年9月4日,土地工務運輸局根據《行政程序法典》第122條第1款和第2款(c)項及第123條第2款的規定,就展開宣告行政長官於2011年3月9日確認土地委員會2011年3月3日第41/2011號意見書的行為無效的程序的決定草案,向利害關係人A, Ltd.公司進行預先聽證。上述意見書對批准有關土地的承批公司A, Ltd.提出的申請,發出贊同意見。
2. 關於該預先聽證,於2012年9月19日收到批給的持有人A, Ltd.公司的意見。
3. 因此,上述回覆已送交法律廳,以便根據《行政程序法典》第98條的規定,編製報告書並對決定作出建議。
B.所收回覆的摘要
A, Ltd.公司提出的辯解撮要如下:
     I. 關於援引標的不可能方面,出現事實和法律前提的錯誤。
1. 利害關係人認為,行政當局提出行政長官於2011年3月9日確認土地委員會第41/2011號意見書和附於該意見書的合同擬本的行為欠缺主要要素和(間接)標的的不可能,缺乏理據,因為不論是從事實的角度,還是從法律的角度,在行政長官於2012年9月4日作出批示的報告書所依據的前提是不存在的。該前提是指行政當局認為因宣告行政長官2006年3月17日的行為無效,而使修改批給的申請公司從來不是五幅有關地設的權利持有人。
2. 因該公司認為,根據《行政程序法典》第173條第1款的規定,在未經共同訂立合同人的同意,行政當局不能解釋合同條款或就合同條款是否有效發表意見,而當缺乏該同意時,必須向有權限法院提起訴訟。
3. 然而,利害關係人是沒有理由的,因為我們現在不是對合同條款作出解釋,亦不涉及其有效性的問題。
4. 第223/DSODEP/2012號報告書只是分析行政長官於2012年8月8日宣告其於2006年3月17日批准轉讓上述土地批給合同所衍生的權利的行為無效的批示,對第15/2011號運輸工務司司長批示規範的批給修改所產生的效力。
5. 該報告書沒有對將有關土地批給所衍生的權利轉予A, Ltd.公司和修改批給的合同內任一條款作出解釋,亦沒有就該等合同條款是否有效,發表意見。
6. 因此,恰恰與利害關係人所說的相反,我們並非面對《行政程序法典》第173條第1款規定的情況(表示意見的行為),而是行政當局行使絕對羈束權的情況。
7. 由於行政長官作出宣告批准轉讓五幅土地的批給合同所衍生權利的行為無效的批示,故此行政當局(土地工務運輸局)有責任分析該批示對第15/2011號運輸工務司司長批示規範的的批給修改所產生的效力。
8. 這正是第223/DSODEP/2012號報告書所進行的工作。行政當局僅限於分析該行政長官的行為,對之後的批給修改所產生的效力。這是行政當局的責任。
9. 按照第223/DSODEP/2012號報告書所述,最終得出結論是:由於批准轉讓批給所衍生權利的行為和其隨後的轉讓合同均無效,故其後於2011年批准修改批給的行為,亦由於欠缺一個主要要素和因標的的不可能而無效。
10. 由此顯示利害關係人認為行政當局必須向有管轄權的法院提起訴訟,是完全沒有依據,因為自始至終均沒對任何合同條款作出解釋或就其是否有效發表意見。
II.在司法上訴的審理前之先決問題 -《行政程序法典》第33條
1. 按照利害關係人的看法,於2012年9月14日在中級法院就行政長官2012年8月8日的宣告其之前的行為無效的行為提起司法上訴,根據《行政程序法典》第33條規定,構成一個審理前的先決問題,因此在法院就上訴作出裁定前,應中止宣告該批准修改批給的行為無效的程序。
2. 但是,利害關係人在這點亦沒有理由,因為看不到利害關係人A, Ltd.公司提出的司法上訴如何可以構成本程序的一個審理前的先決問題。
3. 按照司法見解,「根據《行政程序法典》第33條第1款的規定,對中止行政程序產生效力的理前的先決問題,必須被理解為一切和任何在程序中提出的問題,而解決該問題的權限屬於另一行政機關或屬於法院的權限,且在未有決定前,便會損害或阻礙可能在程序中作出的最終決定。而由行政機關審議的問題的最終決定,必須取決於審理前的先決問題的解決方案」,但在本個案明顯沒有這種情況。
4. 首先,因為我們面對的是一個新的行政程序,其最終決定不取決於法院對利害關係人所提上訴作出的判決,而根據《行政程序法典》第33條的規定,行政當局並無責任中止宣告有關行為無效的程序。
5. 再者,因為行政行為合法性的推定原則佔優,且根據《行政程序法典》第123條第2款規定:「任何行政機關得隨時主張」無效,而非僅「法院」得主張無效,故此2012年8月8日行政長官的行為,是由其權限和責任審議並決定宣告該等批准轉讓5幅地段的批給所衍生權利的行為的無效性的實體作出。
6. 換言之,具權限對本程序作最終決定的行政機關,亦具有審議和決定之前該等行為無效的權限,而事實上已對宣告該等行為無效作出決定。
7. 反之,如果仍沒有宣告之前的行為無效的行為,又或對該問題作決定的權限是屬於另一行政機關或法院時,則這項新程序繼續與否便取決於對該問題所作的決定。
8. 因此,在本個案(in casu)一開始便欠缺《行政程序法典》第33條所要求構成審理前的先決問題其中一個前提,亦即欠缺存在一個問題,而對該問題作出決定的權限屬另一機關或法院。正如《行政程序法典》第123條第2款的規定,具權限在此程序中作最終決定的行政機關-行政長官-本身亦具權限對批准轉讓批給所衍生權利的行為的無效性進行審議和決定。
9. 因此,不存在阻礙於本程序中作出有關宣告批准修改批給的行為無效的最終決定的先決問題。
10. 另一方面,司法上訴僅具有移審的效力,這意味行政當局毋須中止執行該上訴所針對的行為。
III在越權方面
1. 利害關係人指,若作出在本程序中建議的宣告無效的最終決定,該決定將會沾有越權的瑕疵。
2. 為此,利害關係人援引行政當局無權就行政合同是否有效發表意見作為理由,因為《行政程序法典》第173條第1款規定僅法院有權審議行政合同有效性的問題。
3. 現所指宣告無效的行為並不屬於《行政程序法典》第173條規定(表示意見的行為)的情況,亦非以該規定為依據。恰恰與利害關係人擬令人相信的情況相反,該規定從未被用作為建議作出決定的依據,可以肯定,行政當局並沒有對任何與合同有效性相關的問題進行審議或發表意見,因為我們現在面對的不是源自合同本身瑕疵而生的原始非有效,而是由之前的行政行為(合同前行為)瑕疵衍生的非有效。
4. 由於批准將5幅地段的批給所衍生的權利轉讓予A, Ltd.公司的行政行為(請參看2012年8月8日的行政長官批示)無效和不產生任何效果,因此隨後的轉讓上述5幅地段權利的轉讓合同亦同樣無效。
5. 利害關係人堅持行政當局無權就行政合同是否有效發表意見,因此,其意見認為,以《行政程序法典》第172條第1款規定的等同原則,視轉讓批給所衍生權利的合同同樣無效為前提而對行政長官於2011年3月9日作出的行為宣告無效的決定意向,沾有越權瑕疵,因為有關事宜屬法院專屬權限。
6. 但我們認為這是毫無理由的。
7. 首先,因為是基於行政長官於2012年8月8日宣告其之前的數項行為無效的行為,而該等行為的無效必然導致相關的轉讓合同自動無效,亦即合同的無效是源自於對確認土地委員會意見書的行為的無效性宣告。
8. 因此,我們面對的是衍生自一個行政合同 - 轉讓批給所衍生權利的合同 - 的非有效,其以《行政程序法典》第172條第1款為法律依據,該款規定:「訂立行政合同所取決之行政行為無效或可撤銷時,該行政合同亦為無效或可撤銷,且適用本法典之規定。」,確立了衍生或繼後無效的原則,即當訂立合同前的程序的決定是可撤銷或無效,且該決定明顯對簽訂合同的決定有影響時,則行政合同亦為可撤銷或無效的原則。
IV.在侵犯基本權利的根本內容方面:利害關係人的所有權
1. 利害關係人在其回覆中第57點指出,宣告無效的行為將會公然侵犯其從修改以租賃方式批給有關地段的合同所衍生的所有權,這是《基本法》確立及保護的基本權利,因此根據《行政程序法典》第122條第2款(d)項的規定,該行為將會無效。
2. 利害關係人認為該行為旨在剝奪其對有關地段及該處已興建的建築物和改善物所擁有的權利,而不予理會如何將利害關係人已支付的溢價金返還及誰應對有關改善物的價值承擔責任。
3. 我們看不到宣告無效的行為如何旨在剝奪利害關係人的所有權,因為很明顯該行為是在行使絕對羈束權的範圍內作出。對行政當局而言,除宣告批准修改批給的行為無效之外,便沒有其他選擇,因為已宣告轉讓非有效後,A, Ltd.公司不再是該等批給所衍生權利的持有人,致使批准修改批給的行為因欠缺一個主要要素和因標的的不可能而無效。
4. 另一方面,按照第223/DSODEP/2012號報告書B點第(5)項所載,“在A, Ltd.公司騰空有關土地後,澳門特別行政區須返還因修改批給而應支付的款項”。
V. 因欠充分考量《行政程序法典》第123條第3款規定的範圍而違反保護信賴原則、適度原則及適當原則
1. A, Ltd.公司還斷言,雖然不論有否宣告,無效行為均不產生任何法律效果,但若該行為沒有即時被法院爭議或被行政當局宣告無效,隨著時間的過去,該行為會因時間經過而產生事實效果。
2. 事實上,根據《行政程序法典》第123條第3款的規定,“法律上,行為自始不能產生法律效果”,這並“....不妨礙因時間經過及按法律一般原則,而可能對從無效行為中衍生之事實情況賦予某些法律效果。”
3. 眾所周知,無效行為不產生任何效果,亦不能因時間經過而獲補救,然而,基於穩定社會關係這一公共利益,可容許因事實情況長期持續而產生某些效果。
4. 事實上,在本個案(in casu)擬宣告無效的行為是於2011年3月9日作出,我們看不到如何可以將利害關係人援引的情況納入上述規定所述的情況。
VI. 違反公正原則、善意原則、信賴原則、適度原則及適當原則
1. A, Ltd.公司在第81點和續後數點中認為,現擬作出的行為沒考慮到行政當局應遵的各種原則,尤其是適度原則、公正原則、適當原則及善意原則,而僅考慮透過第15/2011號運輸工務司司長批示對該批給作出修改的事實。
2. 在第100點中還指出,此合同乃一份由新一屆政府全面修改、適當組成卷宗、分析及詳細審視的新批給合同,並無違背任何公共利益,亦沒有任何不規則的情況。
3. 然而,我們認為提及這些原則並無任何意義,因為該等原則乃是對行政當局的自由裁量活動的一種限制,而現擬作出的行為是在此活動範圍以外,是一個受絕對羈束的行為。
4. 事實上,重要的是,繼宣告批准轉讓五幅有關地段的批給所衍生權利的2006年3月17日的行為無效後,A, Ltd.公司已不再是該等權利的持有人,因而使批准修改該批給的行政長官2011年3月9日的行為的間接標的變成不可能。
5. 因此,根據《行政程序法典》第122條第1款及第2款(c)項第一部分的規定,行政當局除宣告該行為無效之外,便無其他選擇。
C. 結論
綜上所述,由於利害關係人在對其進行聽證的回覆中,並沒就有關案卷作出澄清,亦無提出理據,能改變宣告行政長官於2011年3月9日確認土地委員會第41/2011號意見書的行為無效的決定意向,因此行政當局應維持其決定意向。土地委員會在該意見書中對A, Ltd.公司所提出的修改批給申請及附於該意見書的合同擬本,發出贊同意見。
13. 綜上所述,基於2013年3月15日第16/DJUDEP/2013號報告書所述的事實和依據,建議如下:
13.1. 根據《行政程序法典》第122條第1款及第2款c)項和第123條第2款的規定,宣告行政長官於2011年3月9日確認土地委員會在2011年3月3日作出的第41/2011號意見書的行為無效。在該意見書中土地委員會對A, Ltd.公司提出修改五幅以租賃制度批出,位於氹仔島,鄰近偉龍馬路及雞頸馬路,稱為“1c”地段、“2”地段、“3”地段、“4”地段及“5”地段,面積4,012平方米、13,425平方米、18,707平方米、8,750平方米及33,895平方米的土地批給,以及歸還九幅地塊和批出八幅地塊,以便將其合併及共同利用的申請和附於該意見書的合同擬本,發出贊同意見。該確認行為透過第15/2011號運輸工務司司長批示公佈於2011年3月30日第13期《澳門特別行政區公報》第二組。
13.2. 倘第13.1點所述的建議獲同意,有關決定須在《澳門特別行政區公報》公佈,並根據《行政程序法典》第68條的規定,將其通知利害關係人A, Ltd公司。…”
*
IV – Fundamentação
Entende a Recorrente que o acto recorrido padece dos seguintes vícios:
- usurpação de poder e violação do artº 172º do CPA;
- ofensa do conteúdo essencial do direito de propriedade;
- erro nos pressupostos de direito quando à alegada impossibilidade do objecto;
- erro nos pressupostos de direito e de facto ao considerar que a concessão do terreno é regulada pela escritura pública outorgada em 14/12/1990;
- erro nos pressupostos de direito ao considerar o Despacho de 09/03/2011 como destacável e causador de nulidade derivada do Contrato de Concessão;
- erro nos pressupostos de direito ao concluir pela nulidade automática do(s) Contrato(s) de Concessão por Arrendamento;
- violação do artº 33º do CPA;
- desrespeito dos limites do caso julgado;
- erro nos pressupostos de facto e de direito ao considerar que o procedimento administrativo de transmissão dos direitos resultantes da Concessão foi viciado pela intervenção criminosa dos então Secretário para os Transporte e Obras Públicas;
- erro no pressuposto do carácter vinculativo do acto recorrido;
- violação dos princípios de protecção de confiança, Boa-fé, da proporcionalidade e da adequação.
Vamos analisar se assiste razão à Recorrente.
1. Da usurpação de poder e da violação dos artºs 33º e 173º do CPA:
Na óptica da Recorrente, tendo em conta o disposto do nº 1 do artº 173º do CPA, só o Tribunal pode declarar a nulidade do contrato de concessão/revisão, pelo que o acto recorrido padece do vício da usurpação de poder.
Por outro lado, a questão da nulidade do contrato administrativo em referência também constitui uma questão prejudicial nos termos do artº 33º do CPA.
Não lhe assiste razão.
Antes de mais, cumpre-nos realçar que a Entidade Recorrida não declarou a nulidade do contrato de concessão, mais sim a nulidade do seu acto 09/03/2011, que homologou o parecer da Comissão de Terras n.º 41/2011, no qual esta tinha emitido parecer favorável ao pedido de revisão da concessão.
Como é sabido, a nulidade de um contrato administrativo pode resultar das suas próprias cláusulas contratuais ou dos actos administrativos nulos de que haja dependido a sua celebração.
Para a declaração da nulidade do contrato administrativo resultante das suas próprias cláusulas contratuais, o legislador exige que tal nulidade só pode ser declarada pelos tribunais competentes em sede própria – cfr. nº 1 do artº 173º do CPA e artº 113º do CPAC.
O que já não acontece para a nulidade do contrato administrativo resultante dos actos administrativos nulos de que haja dependido a sua celebração.
Neste último, a nulidade do contrato administrativo é, nos termos do nº 1 do artº 172º do CPA, consequência directa da nulidade dos actos administrativos de que haja dependido a sua celebração.
No mesmo sentido, veja-se o Ac. do TUI, de 22/06/2016, proferido no Proc. nº 76/2015.
Ora, o regime da declaração da nulidade dos actos administrativos está previsto no nº 2 do artº 123º do CPA, nos termos do qual qualquer órgão administrativo ou qualquer tribunal pode assim proceder.
Face ao exposto, é de julgar improcedentes estes argumentos do recurso.
2. Da ofensa o conteúdo essencial do direito de propriedade:
Entende a Recorrente que o acto recorrido, ao declarar a nulidade do contrato da concessão, ofendeu o conteúdo essencial do seu direito de propriedade.
Não tem mínima razão.
Alguém adquire uma coisa mediante um contrato nulo, pode dizer que a declaração da nulidade do contrato ofendeu o seu direito de propriedade?
Trata-se duma resposta simples que qualquer jurista consegue responder.
Pois, o legislador prevê de forma expressa os efeitos da nulidade, que são justamente a não produção ex tunc de qualquer efeitos jurídicos e a sua reposição da situação inicial (cfr. nº 1 do artº 123º do CPA e nº 1 do artº 282º do CC.).
Por outro lado, a concessão do terreno por arrendamento apenas confere o direito de aproveitamento do terreno nos termos consagrados no contrato de concessão, nunca o direito de propriedade sobre ele.
Assim e sem necessidade de mais delongas, se conclui pela inexistência do alegado vício.
3. Do erro nos pressupostos de direito quando à alegada impossibilidade do objecto:
A Entidade Recorrida considerou que o objecto indirecto do acto de autorização da revisão da concessão, de 09/03/2011, era impossível, já que com a não produção de quaisquer efeitos jurídicos dos seus actos de autorização de transmissão da concessão de 17/03/2006 em consequência da declaração da nulidade dos mesmos, a Recorrrente nunca era titular dos direitos resultantes da concessão dos terrenos, pelo que não podia haver lugar a revisão da concessão.
Para a Recorrente, uma vez que a declaração da nulidade do contrato de concessão tem ser procedida pelo Tribunal nos termos do nº 1 do artº 173º do CPA, a supra consideração da Entidade Recorrida não é correcta.
Quid iuris?
Já referimos no ponto nº 1 que o disposto do nº 1 do artº 173º do CPA só se aplica para a declaração da nulidade do contrato administrativo resultante das próprias cláusulas contratuais, não sendo portanto aplicável para os casos da nulidade do contrato administrativo resultante da nulidade dos actos administrativos de que haja dependido a sua celebração.
Assim, uma vez declarada a nulidade dos actos administrativos de que haja dependido a celebração do contrato administrativo em causa, a nulidade deste último opera automaticamente do nº 1 do artº 172º do CPA, não carecendo uma outra declaração expressa para o efeito.
4. Do erro nos pressupostos de direito e de facto ao considerar que a concessão do terreno é regulada pela escritura pública outorgada em 14/12/1990:
Não interessa saber, para o caso sub justice, se a concessão dos terrenos é regulada pela escritura pública outorgada em 14/12/1990 ou outra escritura pública celebrada em momento posterior, visto que o que o objecto do presente recurso contencioso consiste na declaração da nulidade do acto do Senhor Chefe do Executivo de 09/03/2011, que homologou o parecer da Comissão de Terras n.º 41/2011, no qual esta tinha emitido parecer favorável ao pedido de revisão da concessão.
Esta declaração da nulidade foi procedida em consequência da declaração da nulidade dos actos de autorização de transmissão da concessão do CE, de 17/03/2006.
Assim, a eventual menção errada do contrato da concessão vigente, nada pode afectar a validade ou invalidade do acto recorrido.
Face ao exposto, não é de apreciar o alegado vício, por ser irrelevante para o caso.
5. Do erro nos pressupostos de direito ao considerar o Despacho de 09/03/2011 como destacável e causador de nulidade derivada do Contrato de Concessão e da violação do artº 172º do CPA:
No entendimento da Recorrente, o acto recorrido é simplesmente uma declaração negocial da Administração, enquanto contraente de um contrato administrativo, e não um acto pré-contratual destacável, para os efeitos do artº 172º do CPA.
Não lhe assiste razão, visto que sem o despacho do CE de 09/03/2011, que homologou o parecer da Comissão de Terras n.º 41/2011, no qual esta tinha emitido parecer favorável ao pedido de revisão da concessão, nunca pode ter lugar o contrato administrativo da revisão da concessão.
Ou seja, a celebração deste último depende do referido acto de homologação, o qual foi declarado nulo por via do acto ora recorrido.
Improcede, assim, este argumento do recurso.
6. Do erro nos pressupostos de direito ao concluir pela nulidade automática do(s) Contrato(s) de Concessão por Arrendamento:
Para a Recorrente, a Entidade Recorrida está em erro quando diz que a declaração da nulidade de 09/03/2011 que homologou o parecer da Comissão de Terras n.º 41/2011, no qual esta tinha emitido parecer favorável ao pedido de revisão da concessão, leva à nulidade automática desse mesmo contrato.
Com fundamentos já expostos nos pontos nºs 1 e 3, é de julgar improcedente este argumento do recurso.
7. Do desrespeito dos limites do caso julgado:
Na óptica da Recorrente, o acto recorrido ao dar como certos e provados os factos constantes do acórdão do TUIde 31/05/2012, proferido no Processo-crime nº 37/2011, em que ela não foi parte, e ao aplicá-los automaticamente ao procedimento administrativo da declaração da nulidade, viola os limites do caso julgado, o que consubstancia um vício da violação de lei.
A mesma questão já foi colocada no âmbito do Recurso Contenciso do acto do CE de 08/08/2012, pelo qual se declarou nulidade dos seus actos de autorização de transmissão da concessão de 17/03/2006, também interposto pela ora Recorrente, que correu termos no TSI sob o nº 755/2012 e no TUI sob o nº 76/2015.
Em ambas instâncias este argumento foi julgado improcedente por razões seguintes, a saber:
   “…
   O artigo 578º do CPC dá uma boa resposta à preocupação da recorrente e dele se retira que os pressupostos de facto que são subjacentes a uma decisão condenatória podem presuntivamente valer contra terceiros, desde que a estes seja dada oportunidade de o contraditarem, o que foi feito.
   Sobre os efeitos positivos externos do caso julgado em processo penal, diz Germano Marques da Silva: "A problemática dos efeitos positivos do caso julgado pode, porém, ser colocada em termos mais amplos (...). Trata-se de determinar em que medida a declaração na sentença da verificação ou não de certos factos constitutivos dos crimes tem eficácia noutros domínios do direito (civil, administrativo, laboral, fiscal, etc.). Uma vez que a lei penal nada nos diz sobre os efeitos do caso julgado e porque entendemos ser aplicável subsidiariamente a lei processual civil, temos que considerar que os efeitos do caso julgado são apenas os efeitos da decisão. Sendo assim, como nos parece ser, os factos considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além das contidas na decisão final, salvo expressa previsão da lei em contrário"
   A reforma do processo civil operada em 1995/96 e que em boa parte o CPC de Macau acolheu, neste particular, retomou o regime constante do CPP 29, mas, por exigências decorrentes do princípio do contraditório, retirou à decisão penal condenatória a eficácia erga omnes que o artº. 153º CPP 29 lhe atribuía.
   A definição da eficácia probatória extraprocessual legal da sentença penal condenatória ou absolutória transitada em julgado é feita pelo estabelecimento duma presunção ilidível da existência dos factos em que a condenação se tiver baseado, ou, simetricamente, em caso de absolvição, da inexistência dos factos imputados ao arguido.
   Essa presunção é invocável em relação a terceiros, isto é, em relação aos sujeitos de acção de natureza civil ou administrativa em que se discutam relações jurídicas dependentes da ou relacionadas com a prática da infracção que não tenham intervindo no processo penal.
   Não se verifica, pois, qualquer violação dos limites do caso julgado, até porque, para além das razões já invocadas, em direito processual penal não se pode falar de partes, de causa de pedir ou pedido, como acontece no processo civil…” (Proc. nº 755/2012 do TSI).
“…
   Nos termos do art.º 578.º do Código de Processo Civil, “a condenação definitiva proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros, presunção ilidível no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal, bem como dos que respeitam às formas do crime, em quaisquer acções civis em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infracção”.
   Desde logo, pese embora não se encontre nenhuma norma a prever expressamente a aplicabilidade do art.º 578.º do CPC a procedimento administrativo, não se nos afigura haver obstáculo legal à sua aplicação, até porque, por força do art.º 1.º do CPAC, as regras da lei de processo civil são subsidiariamente aplicáveis ao processo de contencioso administrativo.
   Por outro lado, mesmo admitindo a hipótese de não aplicabilidade de tal norma, certo é que os elementos carreados aos autos de procedimento administrativo e referentes à prática do crime não podem, naturalmente, deixar de ser ponderados e avaliados pela Administração para tomar a decisão que achar correcta, desde que ofereça à interessada a oportunidade de defender-se.
   Faz-se sentido transcrever aqui as doutas considerações do Prof. Germano Marques da Silva, já citadas no Acórdão ora recorrido, sobre o efeito positivo do caso julgado:
   “É costume atribuir-se ao caso julgado um efeito positivo, consistente na relevância da decisão em qualquer outro processo, seja qual for a sua natureza. Assim, em qualquer outro processo (civil, laboral, administrativo, etc.) em que seja necessário considerar a questão já julgada no processo penal, ela deve considerar-se como resolvida nos precisos termos da decisão penal.
   Este efeito do caso julgado penal, para além do próprio âmbito penal, é frequentemente apresentado como uma consequência da unidade e identidade da jurisdição, ou simplesmente pela conveniência de evitar interferências e possíveis contradições na actividade dos tribunais com diversa jurisdição. A decisão penal transitada em julgado deveria ter-se por certa e indiscutível dentro e fora do processo em que foi proferida.
   O CPP/29 dispunha expressamente sobre os efeitos do caso julgado penal em processos não penais (arts. 153.º e 154.º), mas o Código vigente é omisso sobre a matéria. Parece-nos que a questão não há-de ter solução em tudo idêntica à do Código anterior, mas apenas que o efeito do caso julgado penal em processos não penais há-de relevar apenas nos precisos termos da decisão penal, seja condenatória ou absolutória, ou seja, que os factos constituem ou não crime e que o agente é ou não por eles responsável penalmente.
   Com efeito, havendo uma decisão proferida validamente pela jurisdição própria para decidir a questão, seria incompreensível que a mesma pudesse ser posteriormente posta em causa por tribunal da mesma ou diversa jurisdição.
   A problemática dos efeitos positivos do caso julgado pode, porém, ser colocada em termos mais amplos, como o era no CPP/29 (…). Trata-se de determinar em que medida a declaração na sentença da verificação ou não de certos factos constitutivos dos crimes tem eficácia noutros domínios do direito (civil, administrativo, laboral, fiscal, etc.).
   Uma vez que a lei penal nada nos diz sobre os efeitos do caso julgado e porque entendemos ser aplicável subsidiariamente a lei processual civil, teremos de considerar que os efeitos do caso julgado são apenas os efeitos da decisão.
   Sendo assim, como nos parece ser, os factos considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além das contidas na decisão final, salvo expressa previsão da lei em contrário…” (Proc. nº 76/2015 do TUI).
Por ora, não se vê qualquer razão plausível para alterar a jurisprudência já fixada.
Assim, com a devida vénia, fazemos como nossos os fundamentos acima transcritos para julgar improcedente o recurso contencioso nesta parte.
8. Do erro nos pressupostos de facto e de direito ao considerar que o procedimento administrativo de transmissão dos direitos resultantes da Concessão foi viciado pela intervenção criminosa dos então Secretário para os Transporte e Obras Públicas:
Este argumento do recurso é manifestamente improcedente face ao trânsito em julgado do Ac. do TUI de 22/06/2015, proferido no Proc. nº 76/2015, onde afirmou, sem qualquer margem de dúvida, de que o procedimento administrativo de transmissão dos direitos resultantes da Concessão foi viciado pela intervenção criminosa dos então Secretário para os Transporte e Obras Públicas.
9. Do erro no pressuposto do carácter vinculativo do acto recorrido:
O princípio da legalidade é um princípio basilar do Direito Administrativo previsto no artº 1º do CPA, nos termos do qual “Os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos”.
Por outro lado, o próprio regime legal da nulidade prevê que “O acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade” (artº 123º, nº 1 do CPA).
Perante este quadro legal, não se compreende como é que a Recorrente pode dizer que o acto recorrido não consiste numa actividade vinculada da Administração?
Tendo conhecimento da existência de um acto administrativo nulo, se não declarar a sua nulidade, a Administração viola, sem qualquer margem de dúvida, o princípio da legalidade de que está sujeita.
O TUI, no acórdão de 14/12/2011, proferido no Proc. nº 54/2011, tem fixado a jurisprudência no sentido que a Administração está vinculada a revogar os actos ilegais anuláveis, sejam favoráveis ou desfavoráveis aos particulares, com ou sem substituição por outros, a menos que decida proceder à sua sanação.
Ora, se a revogação dos actos ilegais anuláveis é uma actividade vinculada da Administração, então, por maioria razão, também o é a declaração da nulidade dos actos nulos.
Fustrado assim este argumento do recurso.
10. Da violação dos princípios de protecção de confiança, Boa-fé, da proporcionalidade e da adequação:
Os alegados princípios só são operantes no âmbito da actividade discricionária da Administração.
Ora, sendo a declaração da nulidade do acto administrativo uma actividade vinculada, não resta outra alternativa senão julgar improcedentes estes fundamentos do recurso.
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Tudo visto, resta decidir.
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V – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar improcedente o presente recurso contencioso, confirmando o acto recorrido.
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Custas pela Recorrente com 20UC de taxa de justiça
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 15 de Março de 2018.

(Relator) Fui presente
Ho Wai Neng Joaquim Teixeira de Sousa

(Primeiro Juiz-Adjunto)
José Cândido de Pinho

(Segundo Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong

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299/2013