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Processo nº 113/2018(I)
(Autos de recurso penal)
(Incidente)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. No âmbito dos presentes Autos de Recurso Penal proferiu o ora relator a seguinte “decisão sumária”:

“Relatório

1. A, arguido com os restantes sinais dos autos, respondeu no T.J.B. vindo a ser condenado como autor da prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 4 meses de prisão, assim como na pena acessória de inibição de condução por 1 ano e 9 meses, suspendendo-se, parcialmente, a execução desta pena acessória por 2 anos; (cfr., fls. 115 a 118-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o arguido recorreu, dizendo (tão só) que a decisão recorrida viola o disposto no art. 48° do C.P.M. e que se lhe devia decretar a “suspensão da execução da pena”; (cfr., fls. 123 a 128-v).

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Respondeu o Ministério Público pugnando pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 131 a 136).

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Neste T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação de fls.123 a 128v dos autos, o recorrente assacou, à douta sentença em escrutínio (vide. fls.115 a 118 v.), a ofensa dos princípios da adequação e da proporcionalidade, bem como da disposição no art.48° do Código Penal, alegando o remorso, o pagamento de indemnizações devidas, a confissão espontânea, os encargos familiares e a diferente natureza entre o crime condução em estado de embriaguez e os antecedentes.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações da ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.131 a 136 dos autos), no sentido do não provimento do recurso em apreço.
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O n.°1 do art.48° do CPM revela inequivocamente que a suspensão da pena de prisão depende imprescindivelmente do preenchimento cumulativo de dois requisitos: o formal e objectivo traduz em a pena aplicada não ser superior a 3 anos; e o material consubstancia-se na razoável conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, adequada e suficientemente, as finalidades da punição que, de acordo com a determinação no art.40° do CPM, consistem na prevenção especial e na geral.
Nos termos deste segmento legal, tal conclusão tem de angular-se em apreciação e valorização prévias, de índole prudente e prognóstico, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Interessa ter na mente que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°242/2002, n.°190/2004 e n.°192/2004)
No caso sub judice, os 3 antecedentes firmam, de modo inquestionável, que a suspensão da execução será fatalmente vã e infrutífera, não logrando os efeitos reeducativos, por ser inadequada e insuficiente para a realização das finalidades da punição.
Daí decorre que a douta sentença da MMa Juiz a quo não infringe o disposto no art.48° do CPM ou os princípios da adequação e da proporcionalidade, nem merece censura alguma, portanto, fica desprovido de qualquer razão o pedido da suspensão de execução do recorrente.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 146 a 146-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” os factos como tal elencados na sentença recorrida a fls. 115-v a 116-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).

Do direito

3. Vem o arguido recorrer da sentença proferida pela Mma Juiz do T.J.B. que o condenou como autor da prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 4 meses de prisão, e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 1 ano e 9 meses, suspendendo-se, parcialmente, a execução desta pena acessória por 2 anos.

Pede, tão só, a “suspensão da execução” da dita pena de 4 meses de prisão.

Porém, e sem embargo do muito respeito por outro entendimento, não se vislumbra que tenha o recorrente qualquer razão, apresentando-se-nos de julgar o presente recurso “manifestamente improcedente”, como já se deixou adiantado e infra se passa a (tentar) explicitar.

Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Sobre a matéria já teve este T.S.I. oportunidade de dizer que:

“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 20.04.2017, Proc. n.° 303/2017, de 26.10.2017, Proc. n.° 762/2017 e de 11.01.2018, Proc. n.° 1157/2017).

E, como temos também entendido, o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo, posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 22.06.2017, Proc. n.° 399/2017, de 09.11.2017, Proc. n.° 853/2017 e de 18.01.2018, Proc. n.° 1/2018).

No caso dos autos, e como da matéria de facto dada como provada se retira, o arguido ora recorrente foi surpreendido a conduzir em “estado de embriaguez”, acusando uma taxa de álcool no sangue de 1,68g/l, (tendo-se envolvido num acidente de viação por não assegurar a distância de segurança em relação ao veículo da frente, vindo a discutir e a entrar em confronto físico com o outro condutor), cabendo igualmente referir que não é “primário”, tendo já sofrido 3 outras condenações: em 2009, 2012 e 2017, por 1 crime de “fuga à responsabilidade”, 1 de “desobediência” e 1 outro de “ofensa simples à integridade física”; (cfr., o seu C.R.C., a fls. 85 a 93).

Sendo esta a 4 condenação, revela, assim, uma total ausência de vontade de aproveitar as várias oportunidades que lhe foram dadas e de se corrigir, levando uma vida em conformidade com as normas de convivência social, demonstrando uma personalidade avessa ao direito e com tendência para delinquir, tornando, desta forma, evidentes as fortes razões de prevenção criminal especial, notando-se que, in casu, foi o crime em questão cometido no período de suspensão da execução de uma outra pena (em que tinha sido condenado menos de 1 mês antes), evidenciando, que a anteriormente decretada suspensão da execução da pena, com a censura do facto e ameaça de prisão, não realizou de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.

Como igualmente temos vindo a considerar, devem-se “evitar penas de prisão de curta duração”.

Porém, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta; (cfr., v.g., os Acs. deste T.S.I. de 26.01.2017, Proc. n.° 840/2016, de 15.06.2017, Proc. n.° 462/2017 e de 01.11.2017, Proc. n.° 948/2017).

Como também considerava Jescheck: “o tribunal deve dispor-se a correr um risco aceitável, porém se houver sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para aproveitar a oportunidade ressocializadora que se lhe oferece, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico”; (in, “Tratado de Derecho Penal”– Parte General – Granada 1993, pág. 760, e, no mesmo sentido, o Ac. da Rel. de Lisboa de 05.05.2015, Proc. n.° 242/13, e, mais recentemente, da Rel. de Coimbra de 27.09.2017, Proc. n.° 147/15, onde se consignou que “Na formulação deste juízo [de prognose] o tribunal deve correr um risco prudente pois a prognose é uma previsão, uma conjectura, e não uma certeza. Quando existam dúvidas sérias e fundadas sobre a capacidade do agente para entender a oportunidade de ressocialização que a suspensão significa, a prognose deve ser negativa e a suspensão negada”, in “www.dgsi.pt”).

Com efeito, perante a (repetida) insistência na prática de ilícitos criminais por parte de um arguido, (como é o caso), revelando, claramente, não ser merecedor de um “juízo de prognose favorável”, outra solução não existe que não seja uma “medida detentiva”, sob pena de manifestação de falência do sistema penal para a protecção de bens jurídicos e autêntico “convite” à reincidência; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. de Guimarães de 13.04.2015, Proc. n.° 1/12).

Dest’arte, e outra questão não havendo a apreciar, resta decidir como segue.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o arguido a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
(…)”; (cfr., fls. 148 a 153-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Oportunamente, veio o arguido reclamar do decidido, alegando que o seu recurso não devia ser considerado manifestamente improcedente, (e rejeitado), insistindo também no entendimento que em sede do seu recurso tinham deixado exposto; (cfr., fls. 157 a 158).

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Sobre este expediente, assim opinou o Ilustre Procurador Adjunto:

“O magistrado do M.° P.° junto desse Venerando Tribunal vem, relativamente à Reclamação, aduzida pelo recorrente A, da douta decisão sumária (cfr. fls.148 a 153v. dos autos), apresentar a sua RESPOSTA nos termos e com os fundamentos seguintes:
Na Reclamação de fls.157 a 158 dos autos, o reclamante pediu que lhe seria concedida a suspensão da execução da pena de quatro meses de prisão, reiterando os fundamentos arrogados na Motivação do recurso (cfr. fls.256 a 259 dos autos), a confissão sem reserva, o pagamento da indemnização ao ofendido, o decurso de longo tempo dos dois antecedentes criminais ocorridos em 2006 e 2012, os encargos familiares.
Ressalvado o respeito pela opinião diferente, temos por indiscutível que não pode deixar de ser improcedente a Reclamação em apreço, visto que todas as circunstâncias arrogadas pelo reclamante em seu favor não possuem a virtude de determinar a pretendida suspensão da execução.
Antes de mais, importa realçar o facto provado de que no local do acidente de viação provocado culposamente pelo recorrente, «雙方商討維修費用期間,嫌犯因不滿的士駕駛者B要求的賠償金額過高,故對B進行拳打腳踢,之後,B報警求助».
Sendo assim, sufragamos inteiramente o prudente ponto de vista de que «Sendo esta a 4 condenação, revela, assim, uma total ausência de vontade de aproveitar as várias oportunidades que lhe foram dadas e de se corrigir, levando uma vida em conformidade com as normas de convivência social, demonstrando uma personalidade avessa ao direito e com tendência para delinquir, tornando, desta forma, evidentes as fortes razões de prevenção criminal especial, ……»
De outra banda, temos por proficiente e sensata a conclusão a que chegou o MM° Relator, inculcando: «Com efeito, perante a (repetida) insistência na prática de ilícitos criminais por parte de um arguido (como é o caso), revelando, claramente, não ser merecedor de um “juízo de prognose favorável”, outra solução não existe que não seja uma “medida detentiva”, sob pena de manifestação de falência do sistema penal para a protecção de bens jurídicos e autêntico “convite” à reincidência; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. da Rel. de Guimarães de 13.04.2015, Proc. n.°1/12).»
Ponderando globalmente os antecedentes criminais e a agressão pelo recorrente ao ofendido, colhemos que ele é agressivo e totalmente indiferente tanto à vida social como aos interesses de outrem, e portento, o deferimento do pedido de suspensão da execução frustrarão indubitavelmente a prevenção geral e a especial.
(…)”; (cfr., fls. 160 a 161)

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Por despacho do ora relator, foram os presentes autos conclusos para visto dos Mmos Juízes-Adjuntos e, seguidamente, inscritos em tabela para decisão em conferência; (cfr., fls. 162).

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Nada parecendo obstar, passa-se a decidir.

Fundamentação

2. No uso da faculdade que lhe é legalmente reconhecida pelo art. 407°, n°. 8 do C.P.P.M., vem o arguido reclamar da decisão sumária nos presente autos proferida.

Porém, mostra-se de concluir que evidente é que não se pode reconhecer mérito à sua pretensão, muito não se mostrando necessário aqui consignar para o demonstrar.

Com efeito, a decisão sumária agora reclamada apresenta-se clara e lógica na sua fundamentação – nela se tendo efectuado correcta identificação e tratamento das questões colocadas – e acertada na solução.

Na verdade, e pelos motivos que na referida decisão sumária se deixaram expostos, patente se mostra que justo e adequado foi o decidido na sentença do Mmo Juiz do T.J.B. objecto do recurso pelo ora reclamante trazido a este T.S.I., o que, por sua vez, implica, a necessária e natural conclusão de que devia ser (totalmente) confirmada.

Dest’arte, e mais não se mostrando de consignar, já que se limitam o ora reclamante a repisar o já alegado e adequadamente apreciado da decisão sumária agora em questão, inevitável é a improcedência da reclamação apresentada.

Decisão

3. Nos termos que se deixam expostos, em conferência, acordam julgar improcedente a reclamação apresentada.

Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 3 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$800,00.

Registe e notifique.

Macau, aos 19 de Abril de 2018
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José Maria Dias Azedo
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Chan Kuong Seng
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Tam Hio Wa

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