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Processo n.º 29/2018. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrentes: A e B (aliás, B1).
Recorrido: Chefe do Executivo.
Assunto: Acto administrativo. Crime. Alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo. Autorização de residência.
Data da Sessão: 30 de Maio de 2018.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
Não viola o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo, o despacho do Chefe do Executivo que declara nulos os actos administrativos que concederam a residência a cônjuge de requerente de residência com fundamento em investimento imobiliário, e que renovaram a autorização de residência, se este cônjuge usou uma identidade falsa em tais requerimentos, com base em documentos intelectualmente falsos.
  O Relator,
  Viriato Manuel Pinheiro de Lima
  
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A e B (aliás, B1) interpuseram recurso contencioso de anulação do despacho de 22 de Agosto de 2016, do Chefe do Executivo, que declarou a nulidade dos despachos de autorização de residência temporária e de renovação residência temporária da 2.ª recorrente, B (aliás, B1).
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 7 de Dezembro de 2017, negou provimento ao recurso, tendo entendido que se a 2.ª recorrente não tivesse utilizado uma identidade falsa para obter o passaporte de Nauru não teria visto o seu pedido de residência em Macau por investimento do seu marido deferido, já que, de acordo com a alínea h) do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º14/95/M, de 27 de Março, vigente ao tempo, sendo cidadã chinesa, residente no Interior da China, teria de entregar documento comprovativo da autorização para requerer a fixação de residência em Macau, emitido pelas autoridades competentes da República Popular da China, o que não seria possível.
Mais considerou o acórdão recorrido que o acórdão do TUI de 5 de Julho de 2012, no Processo n.º 48/2012, interpretou extensivamente a alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código de Procedimento Administrativo, de modo a que as nulidades previstas abrangem todos os actos administrativos que envolvam, na sua preparação ou execução, a prática de um crime, mesmo não sendo crime pelo objecto próprio, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a sua prática.
Inconformados, interpõem A e B (aliás, B1) recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), suscitando as seguintes questões:
- Não há qualquer prova da falsificação do passaporte de Nauru detido pela 2.ª recorrente;
- Se a 2.ª recorrente tivesse pedido o passaporte de Nauru em nome de B1 e utilizado para pedir autorização de residência em Macau o pedido seria igualmente deferido;
- A 2.ª recorrente só alterou o nome depois de ter obtido bilhete de identidade de residente de Macau;
- Assim, os actos administrativos que deferiram a concessão de residência temporária e suas renovações não constituem crime, para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código de Procedimento Administrativo;
- O acórdão recorrido violou os princípios da boa-fé e da legalidade e o artigo 24.º da Lei Básica.
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II – Os factos
i) O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:
1. Em 2000, a 2ª recorrente pediu ao IPIM a autorização de fixação de residência temporária na qualidade do membro de agregado familiar (cônjuge) do 1º recorrente A com as informações de identidade de “B”.
2. Em seguida:
- Em 26 de Dezembro de 2000, o Chefe do Executivo da RAEM proferiu o despacho de autorização de residência temporária da 2ª recorrente com prazo de validade de 3 anos;
- Em 6 de Abril de 2004, o Secretário para a Economia e Finanças proferiu o despacho de autorização de residência temporária da 2ª recorrente com prazo de validade de 3 anos;
- Em 16 de Fevereiro de 2007, o Secretário para a Economia e Finanças proferiu o despacho de renovação da autorização de residência temporária da 2ª recorrente até 31 de Maio de 2008.
3. A 2ª recorrente obteve o bilhete de identidade de residente não permanente de Macau em 29 de Janeiro de 2001 e o bilhete de identidade de residente permanente de Macau em 27 de Dezembro de 2007.
ii) Resulta, ainda, dos documentos juntos aos autos:
a) Por acórdão de 3 de Fevereiro de 2016, do Tribunal Judicial de Base, transitado em julgado, B1 foi condenada pela prática em autoria material, na forma consumada, de um crime de falsificação de documento de especial valor, previsto e punível pelo artigo 245.º, em conjugação com o artigo 244.º, n.º 1, alíneas b) e c), ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução durante um ano, por ter requerido a emissão de bilhete de identidade de residente de Macau, o que conseguiu, declarando que o seu nome era B, em romanização do cantonense, B, filha de C e de D, nascida em 25 de Setembro de 19XX, alegando ser nacional de Nauru.
Consta do mesmo acórdão que a identidade real da 2.ª recorrente é B1, nascida em 7 de Outubro de 19XX, filha de C1 e de D (proc. n.º CR4-15-0157-PCC).
b) Em 31 de Maio de 2016, um técnico superior do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) elaborou a seguinte informação:

1. O requerente, A, casado, de nacionalidade nauruana, portador do passaporte n.º XXXXXX, emitido pela República de Nauru em 7 de Julho de 2000, nos termos do disposto no D.L. n.º 14/95/M, requereu a autorização de residência temporária com base no investimento em bens imóveis do valor não inferior a um milhão de patacas, bem como pediu que essa foi estendida ao seu cônjuge, “B”. Naquela altura, B, de nacionalidade nauruana, era titular do passaporte n.º XXXXXX, emitido pela República de Nauru em 7 de Julho de 2000 (vide anexo 1).
2. De acordo com o despacho n.º 120-I/GM/97 do Governador de Macau, o Corpo de Polícia de Segurança Pública procedeu a uma verificação do passaporte dos interessados. Conforme a resposta das autoridades de Nauru, verificou-se que os documentos apresentados pelos interessados se encontraram satisfeitos a disposição da fixação da residência no território (vide anexo 1).
3. Assim, o Chefe do Executivo proferiu em 26 de Dezembro de 2000 despacho que deferiu o pedido da autorização de residência temporária acima indicado, ou seja, deferiu o pedido da autorização de residência temporária do requerente “A” e do seu cônjuge “B” no Processo n.º XXX/XXXX (vide anexo 1).
4. Em seguida, os pedidos da renovação da autorização de residência temporária do requerente “A” e do seu cônjuge “B”, ambos ainda titulares do passaporte da República de Nauru como seus documentos de identificação, foram deferidos em 6 de Abril de 2004 e 16 de Fevereiro de 2007, nos Processos n.ºs XXX/XXXX/1R e XXXX/XXXX/2R, respectivamente (vide anexo 2).
5. No entanto, através dos ofícios da Direcção dos Serviços de Identificação e do Corpo de Polícia de Segurança Pública, verificou-se que B (ou seja, “B” acima indicada), com a data de nascimento declarada de 25 de Setembro de 19XX, filha de “C” e de “D”, requereu junto da DSI em 1 de Dezembro de 2011 as alterações do nome para “B1”, da data de nascimento para 7 de Outubro de 19XX e do nome do seu pai para “C1”, bem como apresentou uma escritura pública de nascimento como comprovação. Além disso, no auto de declaração, revelou que “B” era uma identidade falsa e aproveitou-se deste nome para efectuar o registo de residência e o registo de casamento no Interior da China. Posteriormente, tinha conseguido a fixação de residência em Nauru com esta identidade falsa, aproveitou-se do passaporte da República de Nauru para obter a autorização de residência temporária em Macau e, consequentemente, adquiriu o Bilhete de Identidade de Residente de Macau (vide anexo 3).
6. Por isso, considera-se que, no presente processo, o nome do cônjuge do requerente “B” é verdadeiramente de “B1”. A mesma agiu, de forma livre, consciente e dolosa, os actos acima indicados. Os seus actos não só afectaram a autenticidade, a legalidade e a fé pública do Bilhete de Identidade de Residente de Macau, mas também prejudicaram os interesses da RAEM e de terceiros e, em consequência, adquiriu os interesses ilegítimos para si própria. Através da sentença proferida pelo Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, verificou-se que a pessoa acima mencionada foi condenada, pela prática do crime de falsificação de documento de especial valor, na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano (vide anexo 3).
7. Através da sentença acima mencionada, verifica-se que a chamada “B” é uma identidade falsa de “B1”. Relativamente ao acto que concedeu-lhe a autorização de residência temporária, é juridicamente inexistente a administrada “B”, pois, considera-se que o acto administrativo que concedeu à “B” a autorização de residência temporária é um acto administrativo a que falta os elementos essenciais, sendo o acto administrativo nulo e podendo ser declarado nulo tal acto.
8. Para tal, face ao caso acima referido, procedeu-se a uma audiência escrita à interessada (vide anexo 4) e a mesma apresentou a sua resposta escrita (vide anexo 5), cujo conteúdo se transcreve principalmente:
1) A interessada declarou quando era criança, a sua família era dono dos terrenos, no intuito de evitar a perseguição, a avó criou-lhe o nome de “B”, então, utilizou este nome de “B” para contrair casamento em 1992. Ela não aproveitou-se dolosamente deste nome falso “B”.
2) Face ao pedido da autorização de residência temporária apresentado pela interessada, quer fosse apresentado em nome de “B” ou “B1”, foi-lhe concedida a autorização de residência temporária apenas por motivo da sua qualidade de cônjuge do requerente da autorização de residência temporária “A”, portanto, considerou que, o objecto do acto administrativo que concedeu à interessada a autorização de residência temporária, foi a sua qualidade de cônjuge do requerente da autorização de residência temporária “A”.
3) A respectiva sentença penal não afecta a qualidade de interessada como cônjuge do requerente da autorização de residência temporária “A”, o nome da interessada não é elemento essencial do acto administrativo da concessão de autorização de residência temporária acima referido, ao contrário, a sua qualidade de cônjuge do requerente é elemento essencial do acto administrativo em causa, o nome da interessada só serviu-se da identificação e do registo. Por outro lado, requer-se a alteração do nome de “B” para “B1”.
9. Quanto à resposta escrita acima indicada, analisa-se o seguinte:
1) Através da comunicação por ofício da DSI, pode-se saber que “B1” não só declarou falsamente o seu nome como “B”, mas também declarou falsamente a sua data de nascimento e o nome do seu pai, podendo esta série dos actos mostrar-se que a interessada praticou dolosamente os actos ilícitos.
2) O acto administrativo é geralmente constituído por sujeito, objecto e conteúdo. O administrado é objecto do acto administrativo. No presente processo, a administrada, B, é uma identidade falsa de “B1”, sendo juridicamente inexistente esta administrada “B”, pois, considera-se que o acto administrativo que concedeu à “B” a autorização de residência temporária é um acto administrativo a que falta os elementos essenciais.
3) Por outro lado, de acordo com a sentença acima referida, “B1” praticou ilegalmente a identidade “B” e foi condenada pela prática do crime de falsificação de documento de especial valor. Uma vez que “B1” foi concedida a autorização de residência temporária na qualidade de “B” através deste Instituto, por isso, os actos administrativos que deferiram os pedidos da autorização de residência temporária e das subsequentes renovações encontram-se preenchidos acto que constitua um crime, previsto no art.º 122.º, n.º 2, alínea c) do Código do Procedimento Administrativo, portanto, os actos administrativos acima indicados são nulos. Sendo assim, também é inexistente o pressuposto da alteração do nome.
10. Pelo exposto, propõe-se que o Chefe do Executivo declare a nulidade dos seguintes três actos administrativos que concederam à “B” a autorização de residência temporária:
1) Despacho de 26 de Dezembro de 2000 proferido pelo Chefe do Executivo que concedeu à “B” a autorização de residência temporária pelo período de 3 anos;
2) Despacho de 6 de Abril de 2004 proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças que concedeu à “B” a renovação da autorização de residência temporária pelo período de 3 anos;
3) Despacho de 16 de Fevereiro de 2007 proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças que concedeu à “B” a renovação da autorização de residência temporária até ao dia 31 de Maio de 2008.
  Por tudo o exposto, submete-se à apreciação e ao despacho superior.

c) No mesmo dia, a Directora-adjunta do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência do IPIM, emitiu o seguinte parecer:
Concordo com a análise da presente proposta, propõe-se que o Exm.º Chefe do Executivo declare a nulidade dos seguintes três actos administrativos que concederam à “B” a autorização de residência temporária:
1) Despacho de 26 de Dezembro de 2000 proferido pelo Chefe do Executivo que concedeu à “B” a autorização de residência temporária pelo período de 3 anos;
2) Despacho de 6 de Abril de 2004 proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças que concedeu à “B” a renovação da autorização de residência temporária pelo período de 3 anos;
3) Despacho de 16 de Fevereiro de 2007 proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças que concedeu à “B” a renovação da autorização de residência temporária até ao dia 31 de Maio de 2008.
 Submete-se à apreciação do Presidente da Comissão Executiva.
d) Em 3 de Junho de 2016 o Presidente da Comissão Executiva do IPIM, emitiu o seguinte parecer:
 Concordo com a presente proposta, submeto à apreciação do Secretário para a Economia e Finanças.
e) Em 20 de Junho de 2016, o Secretário para a Economia e Finanças, emitiu o seguinte parecer:
Concordo com a proposta e submeto à apreciação e aprovação do Chefe do Executivo.
f) Em 22 de Agosto de 2016, o Chefe do Executivo lavrou o seguinte despacho:
Concordo com a proposta e declaro nulos os despachos indicados nesta proposta que autorizaram a residência temporária e as suas renovações.
Este é o acto recorrido.

III – O Direito
1. Questões a apreciar
Há que apreciar as questões suscitadas pelos recorrentes, atrás mencionadas.

2. Acto administrativo. Crime. Alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo. Autorização de residência.
O despacho do Chefe do Executivo, de 26 de Dezembro de 2000, que autorizou a residência temporária da 2.ª recorrente por 3 anos, concedeu a residência temporária a uma pessoa que não existe, B, cuja identidade foi forjada mediante a prática de um crime, com a exibição de passaporte de Nauru, que continha uma identidade falsa.
Por outro lado, os despachos do Secretário para a Economia e Finanças, de 6 de Abril de 2004, que renovou a autorização de residência temporária da 2.ª recorrente, por 3 anos e de 16 de Fevereiro de 2007, que renovou a autorização de residência temporária da 2.ª recorrente até 31 de Maio de 2008, foram emitidos a favor de uma pessoa que não existe, tendo sido exibido para tal um bilhete de identidade de residente não permanente de Macau, que foi declarado falso por um Tribunal da RAEM e por cuja falsificação intelectual foi a 2.ª recorrente condenada em pena de prisão, suspensa na sua execução.
Ora, dispõe o artigo 122.º, n.º 2, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo:
“Artigo 122.º
(Actos nulos)
1. São nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.
2. São, designadamente, actos nulos:
a) ...
b)...
c) Os actos cujo objecto seja impossível, ininteligível ou constitua um crime;
d) ...
e) ...
f)...
g) ...
h)...
i) ...”

Relativamente à interpretação desta alínea, dissemos o seguinte nos acórdãos de 25 de Abril e 25 de Julho de 2012, respectivamente, nos Processos n. os 11/2012 e 48/2012:
«O objecto do acto administrativo é a produção de efeitos jurídicos no caso concreto1, é o efeito jurídico criado ou declarado2.
No caso dos autos, o objecto do despacho de … não constitui qualquer crime, pelo que, em termos literais, poderia parecer não ter aqui aplicação a alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo.
Contudo, a doutrina tem feito uma interpretação extensiva da norma, que é totalmente justificável.
MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS3 sustentam que:
“A expressão «actos administrativos que impliquem a prática de um crime» tem que ser objecto de interpretação extensiva: não estão em causa apenas as situações em que o acto administrativo em si preenche um tipo penal, mas todas aquelas em que o acto administrativo envolva, na sua preparação ou execução, a prática de um crime.
Exemplos de actos administrativos que implicam a prática de crimes: um acto administrativo de conteúdo difamatório para o seu destinatário; um acto praticado sob extorsão; uma ordem dada por um superior a um subalterno para que exerça violência física injustificada sobre pessoas”.
E MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM4 escrevem:
“Consideramos abrangidos na parte final desta alínea c) – mesmo se parece estranho o facto do legislador se referir apenas ao «objecto» do acto administrativo – também aqueles que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática. Diríamos, portanto, serem nulos não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime.
Estão nessas circunstâncias, por exemplo, os actos que se fundem em documentos administrativamente falsificados (actas ou convocatórias forjadas, etc) ou os actos que sejam praticados mediante suborno ou por corrupção”».
Pois bem, tendo o despacho do Chefe do Executivo, de 26 de Dezembro de 2000, que autorizou a residência temporária da 2.ª recorrente e os despachos do Secretário para a Economia e Finanças, de 6 de Abril de 2004, que renovou a autorização de residência temporária da 2.ª recorrente, por 3 anos e de 16 de Fevereiro de 2007, que renovou a autorização de residência temporária da 2.ª recorrente até 31 de Maio de 2008, sido proferidos com base em documentos de identificação de uma interessada que eram falsos, com nome falso, com data de nascimento e identidade do pai que não coincidiam com os verdadeiros elementos de identificação da 2.ª recorrente, podemos dizer que tais actos administrativos apenas foram produzidos porque tinham na sua base a prática de crimes, por parte da 2.ª recorrente.
E pergunta-se, se a 2.ª recorrente tivesse exibido a sua verdadeira identidade, tais actos ter-lhe-iam concedido a residência de Macau? Não sabemos. Provavelmente, não, já que tendo a 2.ª recorrente de nacionalidade chinesa, residente no Interior da China, face ao disposto na alínea h) do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º14/95/M, de 27 de Março, vigente ao tempo, teria de entregar documento comprovativo da autorização para requerer a fixação de residência em Macau, emitido pelas autoridades competentes da República Popular da China, o que não seria possível, porque tal documento nunca foi emitido.
Ou seja, a 2.ª recorrente obteve a residência em Macau usando uma identidade falsa, por razões não inteiramente claras e que em si não são relevantes, mas que provavelmente estão relacionadas com o que se disse atrás. Quando já era residente permanente, veio, então, pretender regressar à sua identidade verdadeira, pedindo a alteração do nome no seu bilhete de identidade de residente. Parece evidente que não pode ser.
Afigura-se-nos que o acto recorrido interpretou devidamente a alínea c) do n.º 2 do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo.
E não se vislumbra o que é que os princípios da boa-fé e da legalidade e o artigo 24.º da Lei Básica têm que ver com a questão em apreço, não tendo, assim, sido violados nem pelo acto recorrido nem pelo acórdão recorrido.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pelos recorrentes, com taxa de justiça fixada em 5 UC.
Macau, 30 de Maio de 2018.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa

1 MARCELLO CAETANO, Manual..., I vol., p. 481.
2 MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Lisboa, Almedina, 1980, p. 441.
3 MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Direito..., Tomo III, p. 162.
4 MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e JOÃO PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo, Coimbra, Almedina, 2.ª edição, 1997, p. 645.
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