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Processo n.º 21/2016 Data do acórdão: 2018-6-7 (Autos em recurso penal)
Assunto:
– erro notório na apreciação da prova



S U M Á R I O
Como após vistos todos os elementos probatórios referidos na fundamentação probatória da decisão recorrida, não se vislumbra que o tribunal recorrido, aquando da formação da sua convicção sobre os factos, tenha violado quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou quaisquer leges artis no julgamento de factos, não pode haver o vício de erro notório na apreciação da prova.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 21/2016
(Recurso em processo penal)
Recorrente (arguido): A





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA
REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por acórdão proferido a fls. 269 a 278 do subjacente Processo Comum Colectivo n.o CR3-15-0107-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, ficou condenado o arguido A como autor material de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art.o 142.o, n.o 1, do Código Penal (CP), conjugado com o art.o 93.o, n.o 1, da Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), na pena de onze meses de prisão (suspensa na sua execução por um ano e seis meses) e na inibição de condução por seis meses, para além de ficar condenada a Companhia de Seguros de X, S.A. (X保險有限公司) no pagamento, a favor do demandante civil C, de MOP226.613,00 de indemnização, com juros legais contados desde a data desse acórdão até integral e efectivo pagamento.
Inconformado, veio recorrer o arguido para este Tribunal de Segunda Instância (TSI) mediante a motivação de fls 291 a 295 dos presentes autos correspondentes, imputando àquela decisão condenatária penal erro notório na apreciação da prova (por dever ter sido provado que ele chegou a parar o veículo para deixar o ofendido passar primeiro) ou, pelo menos, contradição insanável da fundamentação (por ante o teor da fundamentação jurídica da decisão penal recorrida no atinente à não suspensão da pena de inibição de condução não se conseguir perceber se no local do acidente de viação em causa, ele, afinal, continuou a conduzir, ou, antes pelo contrário, chegou a parar o veículo), e, subsidiariamente, erro na escolha da espécie da pena (com violação do disposto no art.o 64.o do CP, por as finalidades da punição poderem ser realizadas com a pena de multa) e erro na decisão de não suspensão da execução da pena de inibição de condução (porquanto sendo ele taxista de profissão, com mulher, um filho e uma filha a seu cargo, a inibição de condução ia acarretar a perda da sua capacidade de ganho para subsistência económica), a fim de rogar o reenvio do processo para novo julgamento, ou, subsidiariamente, a aplicação da pena de multa em vez da de prisão e a suspensão da execução da pena de inibição de condução por um período de seis meses.
Respondeu ao recurso a Digna Delegada do Procurador a fls. 299 a 304, no sentido de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, opinou a Digna Procuradora-Adjunta a fls. 314 a 316v, no sentido também de improcedência do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que o acórdão ora recorrido se encontra proferido a fls. 269 a 278, cujo teor integral se dá por aqui integralmente reproduzido.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
É nesses parâmetros que vai ser decidida a presente lide recursória.
O arguido começou por apontar à decisão recorrida o vício de erro notório na apreciação da prova.
A este propósito, vistos todos os elementos probatórios referidos na fundamentação probatória do acórdão recorrido, não se vislumbra que o Tribunal recorrido, aquando da formação da sua convicção sobre os factos, tenha violado quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou quaisquer leges artis vigentes no julgamento de factos. Para constatar isto, basta atender à justificação dada pelo Tribunal recorrido acerca da sua livre convicção formada sobre os factos, na parte respeitante à concluída comprovação de que o arguido não tinha deixado o ofendido a passar primeiro com segurança e prioridade (cfr. sobretudo o facto provado descrito no último parágrafo da página 4 do texto do acórdão recorrido a fl. 270v, e a justificação da decisão probatória dada no 3.o parágrafo da página 10 do mesmo texto a fl. 273v).
Não pode, pois, ter existido erro notório na apreciação da prova (como vício referido na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do Código de Processo Penal (CPP)) por parte do Tribunal recorrido nessa parte em questão.
O arguido assacou à decisão recorrida o vício de contradição insanável da fundamentação, na parte da fundamentação jurídica do acórdão recorrido no atinente à decisão de não suspensão da pena de inibição de condução (escrita no 2.o parágrafo da página 13 do texto do acórdão recorrido). Entretanto, como frisou a Digna Procuradora-Adjunta no seu parecer emitido, as considerações tecidas pelo Tribunal recorrido em jeito da fundamentação da decisão de não suspensão da pena de inibição de condução mediante a interpretação da matéria de facto julgada não são reconduzíveis à figura de contradição insanável da fundamentação como vício previsto no art.o 400.o, n.o 2, alínea b), do CPP e possibilitador do novo julgamento da matéria de facto. O problema suscitado pelo arguido na fundamentação jurídica da decisão de não suspensão da inibição de condução tem a ver propriamente com o eventual erro de interpretação da matéria de facto já julgada e descrita nomeadamente no último parágrafo da página 4 do texto do acórdão recorrido e no primeiro parágrafo da página seguinte, questão essa de eventual erro de interpretação dos factos provados essa que já não releva, porquanto para o presente Tribunal de recurso, acerca da pretensão de suspensão da execução da inibição de condução, a resposta tem que ficar a descontento do arguido, porque no caso o acidente de viação causou fractura óssea ao ofendido que lhe demandou 90 a 120 dias para convalescença, pelo que ainda que o Tribunal recorrido tenha decidido pela suspensão da pena de prisão do arguido, já não pode ser suspensa, em sede do art.o 109.o, n.o 1, da LTR, a inibição de condução, dadas as exigências da prevenção geral do tipo de conduta de condução praticada pelo arguido, mesmo que este seja um taxista de profissão.
Pediu também o arguido a aplicação da pena de multa, em detrimento da de prisão. Mas, atentas todas as circunstâncias já apuradas em primeira instância, de entre as quais se salienta o facto de o ofendido ter ficado com fractura óssea que lhe demandou 90 a 120 dias para convalescença, não é de optar a pena de multa, já que esta espécie da pena não dá, no caso, para realizar as finalidades da punição, na vertente de prevenção geral do crime (cfr. o critério material exigido no art.o 64.o do CP para efeitos da escolha da espécie da pena).
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso do arguido.
Custas do recurso pelo recorrente, com quatro UC de taxa de justiça.
Macau, 7 de Junho de 2018.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chou Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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