打印全文
Processo nº 241/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 12 de Julho de 2018
Recorrente: A (Autor)
Recorrida: B, S.A. (1ª Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
Por sentença de 22/01/2018, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência:
- condenou as 1ª e 2ª Rés, B, S.A. e C, S.A., a pagar ao Autor A a quantia de MOP$13,132.50 e de MOP$62,572.50, respectivamente, acrescida dos juros de mora à taxa legal a contar da data da presente sentença até o efectivo e integral pagamento;
­ condenou as 1ª e 2ª Rés a pagar respectivamente ao Autor o subsídio de alimentação, o subsídio de efectividade e as compensações pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatório, cujo montante a liquidar em execução da sentença;
­ condenou a 1ª Ré a pagar ao Autor as compensações pelo trabalho extraordinário de 8 horas em cada ciclo de 21 dias de trabalho e as compensações pelos dias de descanso semanal e pelos dias de descanso compensatório não gozados, cujo montante a liquidar em execução da sentença; e
­ absolvem-se as Rés do restante pedido.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, alegando, em sede de conclusões, o seguinte:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao Recorrente a atribuição de uma compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal na medida de um dia de salário em dobro;
2. Não obstante o montante a apurar pela violação deste crédito ter sido relegado para liquidação em sede de execução de Sentença, está desde já o ora Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e, neste sentido, se mostra em violação ao disposto no artigo 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril.
3. Ou melhor, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas o equivalente a um dia de trabalho (em singelo) pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, o Tribunal a quo procedeu a uma não correcta aplicação do disposto na al. a) do n.º 6 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
4. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal, por cada dia de descanso semanal prestado;
5. Do mesmo modo, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas e tão-só um dia de salário em singelo, o Tribunal a quo desviou-se da interpretação que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância sobre a mesma questão de direito, no sentido de entender que a compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser feita em respeito à seguinte fórmula: (salário diário X n.º de dias de descanso não gozados X 2);
6. De onde, deve a douta Decisão ser substituída por outra que atenda ao pedido de condenação da 1.ª Ré (B) nos termos e com base nas bases de cálculo formuladas pelo Autor na sua Petição Inicial.
*
A 1ª Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 224 a 227, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
­ Até 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
­ O contrato de prestação de serviço n.º 5/98 foi objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (B)
­ Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré para a 2.ª Ré, com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. fls. 37 a 39, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (C)
­ Entre 22/07/2003 a 20/07/2016, o Autor passou a estar ao serviço da 2.ª Ré, prestando as mesmas funções de “guarda de segurança”. (D)
­ Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (E)
­ Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HK$7,500.00, a título de salário de base mensal. (F)
­ Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (G)
­ Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (H)
­ A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (I)
­ A data do início do Autor junto da 1ª Ré era de 03 de Dezembro de 1998. (1º)
­ O Autor foi recrutado pela Sociedade D – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/98 celebrado entre a referida Agência de Emprego e a 1.ª Ré. (2º)
­ Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés. (3º)
­ Os locais de trabalho do Autor eram fixados de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (4º)
­ Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés. (5º)
­ Ao longo do período que prestou trabalho, as Rés apresentaram ao Autor contratos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação. (6º)
­ Os contratos individuais de trabalho apresentados ao Autor eram idênticos para os demais trabalhadores não residentes, guardas de segurança do Nepal. (7º)
­ Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços 05/98 celebrado entre a 1.ª Ré e Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (8º)
­ Desde 26/04/2010, o Autor não deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (9º)
­ A 1.ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (10º)
­ Até Março de 2010, a 2.ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (11º)
­ Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços 05/98 celebrado entre a Ré e a Agência de Emprego, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (12º)
­ A 1.ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (13º)
­ A 1.ª Ré não entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (14º)
­ Até 31/03/2010, a 2.ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (15º)
­ Até a 31/12/2006, o Autor não prestou a sua actividade nos Casinos que disponibilizavam comida nas cantinas. (16º)
­ Até 31/12/2002, a 1.ª Ré não fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, nem um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (17º)
­ Até 31/12/2002, o Autor prestou a sua actividade de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré. (18º)
­ Até 31/12/2002, a 1.ª Ré não fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (19º)
­ O Autor prestou a sua actividade de segurança em 01 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 01 de Maio e 01 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré. (20º)
­ A 1.ª Ré não pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (21º)
­ Até 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 01 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 01 de Maio e 01 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré. (22º)
­ A 2.ª Ré não pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (23º)
­ Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h). (24º)
­ Durante todo o período da relação de trabalho com a 1ª Ré, o Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pela 1ª Ré. (25º)
­ Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (26º)
­ Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho junto da 1ª Ré durante dois períodos de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos (C-B) e (B-A). (27º)
­ A 1ª Ré não pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (28º)
­ Desde 2007, foram fornecidas refeições diárias ao Autor e a todos os seus colegas na sala de descanso dos trabalhadores. (33º)
*
III – FUNDAMENTAÇÃO
O recurso não deixará de se julgar provido face à jurisprudência unânime deste TSI nos processos congéneres em que as Rés também são partes.
Assim, a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido.
*
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conceder provimento ao recurso do Autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a 1ª Ré ao acatamento da fórmula acima referida, no tocante aos dias de trabalho prestado em dias de descanso semanal, no que se liquidar em execução de sentença, tal como é decidido pelo Tribunal a quo.
*
Custas pela 1ª Ré.
Notifique e D.N..
*
RAEM, aos 12 de Julho de 2018.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
(Votei vencido por entender que, para efeitos de cálculo do valor da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, o trabalhador tem direito a receber o dobro da retribuição, mas há-de descontar o salário diário já pago em singelo, sob pena de ele estar a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário, ao que acresce ainda o dia de descanso compensatório previsto no n.º 4 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, o trabalhador irá ser pago pelo quádruplo do valor diário se trabalhar em dias de descanso semanal.)





9
241/2018