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Processo n.º 364/2017 Data do acórdão: 2018-7-19 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– inibição de condução
– condenação de novo crime no período da suspensão da pena
– revogação da suspensão da execução da pena de prisão
– art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal
S U M Á R I O
Estando provado na sentença condenatória do arguido num novo processo penal que ele conduziu veículo automóvel no quinto dia do período de vigência da pena de inibição imposta no presente processo, esta circunstância é altamente censurável e suficientemente demonstradora de que o arguido, por esse acto de condução seu (que levou à sua condenação ali), destruiu já a esperança de acatamento da lei então depositada nele, pelo juiz titular do presente processo em primeira instância aquando da tomada de decisão de suspensão da execução da pena de prisão, daí que é de revogar essa suspensão da execução da pena de prisão, sob a égide do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 364/2017
(Autos de recurso penal)
Arguido recorrente: A





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o despacho revogatório da suspensão, por dois anos, da execução da pena de três meses de prisão inclusivamente imposta na sentença de fls. 25v a 27 do subjacente Processo Sumário n.º CR4-16-0185-PSM do 4.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.o 90.o, n.o 1, da Lei do Trânsito Rodoviário (LTR), veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir a revogação dessa decisão revogatória da pena suspensa, tendo alegado, para o efeito, e em síntese, o seguinte (cfr. com mais detalhes, o teor da motivação de recurso, apresentada a fls. 73 a 79 dos presentes autos correspondentes):
– ele não chegou a ser notificado da data de início de vigência do período de interdição de condução;
– por negligência ou falta de atenção, ele entendeu erroneamente que a interdição de condução só produziria efeitos com a entrega da carta de condução ao Corpo de Polícia de Segurança Pública;
– segundo a doutrina jurídica penal, apenas com a condenação em prisão efectiva do crime posterior é que se pode decidir pela revogação da pena de prisão do crime anterior;
– para além da verificação do requisito de condenação do crime posterior, há que ajuizar se o cometimento do crime posterior pelo arguido revela que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas, pelo que não se pode basear no facto de cometimento do crime posterior para se concluir, sem mais, pela verificação desse critério material sobre o fracasso de prosseguimento das finalidades subjacentes à suspensão da pena;
– no caso dele, a revogação da suspensão da execução da pena de prisão não é a única via, pelo que merece ele a manutenção da suspensão da pena, com prorrogação do período da suspensão nos termos do art.o 53.o do Código Penal (CP).
Ao recurso respondeu (a fls. 84 a 87v) o Ministério Público, no sentido de improcedência do recurso.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fl. 95 a 95v), pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame crítico e global dos autos, fluem os seguintes elementos fácticos e processuais, pertinentes à solução do recurso:
– por sentença de fls. 25v a 27 do subjacente Processo Sumário n.o CR4-16-0185-PSM do TJB do qual proveio o presente processo recursório, o ora recorrente ficou condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.o 90.o, n.o 1, da LTR, na pena de três meses de prisão, suspensa na execução por dois anos, sob condição de prestação de oito mil patacas de contribuição a favor da Região Administrativa Especial de Macau no prazo de um mês contado do trânsito em julgado da sentença, para além de ficar condenado na inibição de condução por um ano;
– o arguido assinou, no próprio dia 14 de Novembro de 2016 de realização da audiência de julgamento em que o M.mo Juiz ditou finalmente para a respectiva acta a acima referida sentença condenatória (com o texto da própria sentença disponibilizado a partir de 21 de Novembro de 2016 – cfr. a declaração feita a fl. 27v dos presentes autos), a nota de notificação (de fl. 28 a 28v dos presentes autos) da mesma sentença;
– da alínea a) do ponto 2 das observações escritas no verso dessa nota de notificação, consta que no caso de condenação em inibição de condução nos termos da LTR, a inibição de condução produzirá efeitos, segundo o disposto no n.o 1 do art.o 143.o da LTR, desde o trânsito em julgado da decisão de aplicação da inibição de condução, mesmo que o condutor não entregue a carta de condução ao Corpo de Polícia de Segurança Pública;
– da acta da audiência de julgamento então realizada em primeira instância, consta que o arguido foi assistido por um Defensor (cfr. o teor dessa acta lavrada a fls. 24 e seguintes dos presentes autos);
– foi junta a fls. 51 e seguintes dos presentes autos a certidão da sentença proferida, e já transitada em julgado, no âmbito do Processo Sumário n.o CR1-16-0198-PSM do TJB, que condenou o mesmo arguido como autor material de um crime consumado de desobediência qualificada (por condução durante o período de inibição de condução), p. e p. pelo art.o 92.o, n.o 1, da LTR, conjugado com o art.o 312.o, n.o 2, do CP, na pena de um ano de prisão, suspensa na execução por dois anos e seis meses, com cassação da carta de condução;
– conforme a matéria de facto descrita como provada nessa sentença: o arguido foi descoberto pelo pessoal do Corpo de Polícia de Segurança Pública a conduzir em via pública no dia 17 de Dezembro de 2016, enquanto já começou, em 13 de Dezembro de 2016, a ser executada a sentença aplicadora da inibição de condução ao mesmo indivíduo no Processo n.o CR4-16-0185-PSM;
– em face da condenação penal nesse novo processo sumário, o M.mo Juiz titular do presente processo em primeira instância ouviu a própria pessoa do ora recorrente (cfr. o teor da acta dessa diligência lavrada a fls. 66 e seguintes dos presentes autos), na sequência do que acabou por decidir revogar, à luz do art.º 54.º, n.º 1, alínea b), do CP, a suspensão da execução da pena de prisão inicialmente aplicada ao mesmo arguido (cfr. o teor do despacho revogatório da pena suspensa, constante de fl. 67 a 67v).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, vê-se que o recorrente sindicou do mérito da decisão recorrida, revogatória da suspensão da pena de prisão.
Desde já, observa-se que dos elementos referidos na parte II do presente acórdão de recurso, resulta que o último dia para interposição de recurso ordinário da sentença condenatória então ditada para a acta da audiência de julgamento de 14 de Novembro de 2016 dos presentes autos, com o respectivo texto disponibilizado a partir de 21 de Novembro de 2016, foi o dia 12 de Dezembro de 2016 (cfr. o art.o 401.o, n.o 1, alínea c), do Código de Processo Penal (CPP)), de maneira que segundo o art.o 143.o, n.o 1, da LTR e tal como já ficou descrito como provado na sentença do novo Processo Sumário n.o CR1-16-0198-PSM do arguido, a pena de inibição de condução então imposta nos presentes autos penais já começou a produzir efeitos em 13 de Dezembro de 2016.
Não procede o argumento do arguido de que ele não soube que a sua inibição de condução tenha começado a vigorar logo após o trânsito em julgado da sentença anterior. É que ele assinou a nota de notificação dessa sentença anterior, e dessa nota de notificação já constou a observação de que a inibição de condução iria produzir efeitos nos termos do art.o 143.o, n.o 1, da LTR, por um lado, e, por outro lado, sendo assistido então por um Defensor (art.o 50.o, n.o 1, alínea e), do CPP), ele não poderia vir a defender que não saberia nada acerca da data de começo de vigência da pena de inibição de condução.
Assim sendo, e estando provado na sentença do novo processo sumário acima identificado que o recorrente conduziu no quinto dia do período de vigência da pena de inibição imposta nos presentes autos, esta circunstância é altamente censurável e suficientemente demonstradora de que o arguido, por esse acto de condução seu (que levou à sua condenação, com decisão já transitada em julgado, pela prática de um crime doloso de desobediência qualificada, na plena vigência do período de suspensão da execução da pena de prisão), destruiu já a esperança de acatamento da lei então depositada nele, pelo M.mo Juiz titular do presente processo em primeira instância aquando da tomada de decisão de suspensão da execução da pena de prisão.
Daí que sem mais indagação por ociosa ou prejudicada, é de revogar mesmo a suspensão da execução da pena de prisão do arguido, sob a égide do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do CP.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com duas UC de taxa de justiça.
Comunique a presente decisão ao Processo Sumário n.o CR1-16-0198-PSM do Tribunal Judicial de Base.
Macau, 19 de Julho de 2018.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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