打印全文
Processo n.º 833/2015 Data do acórdão: 2018-7-26 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– busca domiciliária
– consentimento
– art.o 159.o, n.o 4, alínea b), do Código de Processo Penal
– art.o 162.o, n.o 2, do Código de Processo Penal
S U M Á R I O
Do disposto no art.o 159.o, n.o 4, alínea b), ex vi do do n.o 2 do art.o 162.o, ambos do Código de Processo Penal, retira-se que a lei não exige que o consentimento para a realização da busca domiciliária por órgão de polícia criminal tenha que ser dado pelo dono ou pelo inquilino da “casa habitada” visada, pelo que o que importa é ser esse consentimento dado por alguém nela habita.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 833/2015
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por sentença proferida a fls. 171 a 175v do Processo Comum Singular n.o CR4-15-0275-PCS do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, ficou condenada a arguida A, aí já melhor identificada, pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de desobediência, p. e p. pelo art.o 312.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal, em quatro meses de prisão, e de cinco crimes de acolhimento, p. e p. pelo art.o 15.o, n.o 1, da Lei n.o 6/2004, de 2 de Agosto, em seis meses de prisão por cada, e, em cúmulo jurídico dessas penas, finalmente em um ano e seis meses de prisão única, suspensa na execução por dois anos.
Inconformada, veio a arguida recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), tendo alegado (no seu essencial) e rogado o seguinte na sua motivação apresentada a fls. 180 a 181v dos presentes autos correspondentes:
– o consentimento então prestado à Polícia para feitura da busca na fracção autónoma dos autos foi prestado não pela própria arguida mas sim por um senhor chamado Erdenebat Shagdar que não era arguido no presente processo penal, nem era dono ou inquilino dessa fracção autónoma;
– pelo que a busca domiciliária então feita pela Polícia devia ser considerada invalidada, o que devia acarretar a invalidação de actos de inquirição de pessoas “acolhidas” nessa fracção aquando da realização da busca, o que afinal de contas devia implicar a absolvição da própria arguida dos cinco imputados crimes de acolhimento, por falta de prova;
– a decisão condenatória, ora recorrida, desses cinco crimes de acolhimento violou, pois, o disposto nos art.os 162.o, n.o 2, 159.o, n.o 4, alínea b), e 113.o, n.o 3, do Código de Processo Penal (CPP).
Ao recurso, respondeu o Ministério Público a fl. 183 a 183v no sentido de manutenção do julgado.
Subidos os autos, a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista, emitiu parecer a fls. 193 a 194, pugnando também pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
1. A sentença ora recorrida encontrou-se proferida a fls. 171 a 175v, cujo teor (incluindo a sua fundamentação fáctica, probatória e jurídica) se dá por aqui integralmente reproduzido.
2. De acordo com a fundamentação fáctica dessa sentença: no dia 20 de Fevereiro de 2012 em que foi feita a busca pela Polícia na fracção autónoma dos autos, a arguida já tinha habitado ali e deixado uma família de cinco pessoas a habitar também ali, cinco pessoas essas não possuidoras de qualquer documento que lhes permitissem permanecer em Macau.
3. Segundo o teor do auto de participação policial n.o 1974/2012/C3 (a que aludem as fls. 3 a 6v dos autos), o pessoal policial do Corpo de Polícia de Segurança Pública procedeu à busca na dita fracção autónoma no dia 20 de Fevereiro de 2012, mediante o consentimento escrito prestado por um senhor chamado Erdenebat Shagdar, e na sequência dessa busca, foram encontrados a arguida e outras cinco pessoas dentro da mesma fracção.
4. O consentimento escrito em causa tem teor certificado a fl. 21v dos autos, do qual consta que aquele senhor declarou que consente que seja efectuada em 20 de Fevereiro de 2012 a busca na sua residência, sita naquela fracção autónoma.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Veio a arguida suscitar a alegada ilegalidade da busca então feita pela Polícia na fracção autónoma dos autos, invocando, essencialmente, que tal busca não tinha sido por ela consentida, mas por um outro senhor chamado Erdenebat Shagdar, o qual não era dono nem inquilino dessa fracção.
Do disposto no art.o 159.o, n.o 4, alínea b), ex vi do do n.o 2 do art.o 162.o, ambos do CPP, retira-se que a lei não exige que o consentimento para a realização da busca domiciliária por órgão de polícia criminal tenha que ser dado pelo dono ou pelo inquilino da “casa habitada” visada, pelo que o que importa é ser esse consentimento dado por alguém nela habita.
No caso dos autos, do consentimento escrito então prestado por aquele senhor chamado Erdenebat Shagdar, consta que este declarou que consentiu a realização da busca na sua residência sita na fracção autónoma dos autos. Assim sendo, para todos os efeitos legais, foi legalmente consentida a busca domiciliária então realizada pela Polícia.
Improcede, assim, o recurso, sem mais indagação por desnecessária.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso.
Custas do recurso pela arguida recorrente, com duas UC de taxa de justiça. Fixam em mil e oitocentas patacas os honorários da Ex.ma Defensora Oficiosa da recorrente, a cargo desta.
Macau, 26 de Julho de 2018.
_______________________
Chan Kuong Seng
(Relator)
_______________________
Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
_______________________
Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



Processo n.º 833/2015 Pág. 6/6