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Proc. nº 123/2017
Recurso contencioso
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 11 de Outubro de 2018
Descritores:
- Caducidade preclusiva
- Prorrogação do prazo da concessão
- Actividade vinculada
- Lei Básica (arts. 6º, 7º, 103º)

SUMÁRIO:

I - A caducidade-preclusiva pelo decurso do prazo geral máximo da concessão impõe-se, inevitavelmente, à entidade administrativa competente. É, pois, um acto vinculado, por ter a sua raiz mergulhada na circunstância de esse efeito caducitário decorrer directamente ope legis, sem qualquer interferência do papel da vontade do administrador. É da lei que advém fatalmente a caducidade.

II - Os princípios da boa fé e da eficiência constituem limite intrínsecos à actividade administrativa discricionária e não vinculada.

III – Os artigos 6º, 7º e 103º da Lei Básica não apresentam qualquer relevância para os casos em que é declarada administrativamente a caducidade de uma concessão e em que, consequentemente, não está em causa propriedade privada da concessionária.
Proc. nº 123/2017

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
“PLASBOR - FÁBRICA DE PLÁSTICOS E BORRACHAS S.A.R.L.”, com sede em Macau, na Avenida da Amizade, n.º 1023, Edifício Nam Fong, 1.º andar AF, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º 4123(SO), com o capital social de quinhentas mil patacas,----
Interpõe recurso contencioso -----
Do despacho do Chefe do Executivo, de 15 de Dezembro de 2016, tornado público pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (“STOP”) n.º 54/2016, publicado no Boletim Oficial n.º 1, II Série, de 4 de Janeiro de 2017, -----------------------
Que declarou a caducidade da concessão de um terreno com a área de 2.902m2, designado por lote “SA”, situado na Ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, exarado no Parecer do STOP de 26 de Fevereiro de 2016, notificado à Recorrente em 13 de Janeiro de 2017.
Na petição inicial formulou as seguintes conclusões:
“1. Por Despacho do Governador de Macau n.º 168/GM/89, de 29 de Dezembro de 1989, foi concedido por arrendamento a favor da ora Recorrente, um terreno com a área de 2.902m2, designado por lote “SA”, situado na Ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, destinado à construção de uma unidade industrial de transformação de borracha e matérias plásticas, por um prazo 25 anos a contar da celebração do respectivo contrato, tendo o prémio sido integralmente pago;
2. Por Despacho do SATOP, de 30 de Agosto de 1993, foi aprovado o Plano Geral de Exploração e Recuperação da Pedreira de Coloane, para o loteamento da designada zona de Seac Pai Van passar a ter uma finalidade habitacional em vez da finalidade industrial inicialmente prevista no Despacho de Concessão;
3. A alteração da finalidade da concessão é justificada no referido Despacho do SATOP com o elevado custo e dificuldades na execução das infra-estruturas na zona de Seac Pai Van;
4. No Despacho do SATOP determinou-se que fossem oficiados os concessionários de lotes de Seac Pai Van, para se obter o acordo destes na alteração da finalidade e revisão das concessões, com a definição de novos prazos de aproveitamento compatíveis com os previstos para a disponibilização dos respectivos lotes, bem como para a revisão dos prémios pagos;
5. A decisão do SATOP, expressa naquele Despacho, apenas dava à concessionária a possibilidade de manter a concessão do lote “SA” se aceitasse a alteração de finalidade e a revisão da concessão, que a Recorrente aceitou, não obstante ter dado nota da submissão de projectos para a construção de um edifício industrial;
6. Determinou o SATOP, no ponto 2. al. b) do dito Despacho, que caso os concessionários continuassem a ter preferência por uma concessão com finalidade industrial, ser-lhes-ia atribuída uma concessão de um terreno equivalente em local destinado a essa finalidade, nomeadamente no aterro da Concórdia ou noutra zona adequada;
7. Com o Despacho de 30 de Agosto de 1993, ficou relevada a falta de aproveitamento do terreno concedido naquela zona e, em consequência da alteração de finalidade, a concessionária ficou impedida de concretizar o desenvolvimento industrial do lote “SA” da zona de Seac Pai Van;
8. A Recorrente também foi impedida, até à data do Despacho de declaração de caducidade ora recorrido, de utilizar o lote “SA” da zona de Seac Pai Van para o desenvolvimento da finalidade habitacional que foi, entretanto, determinada pelo Governo;
9. Pois, para poder iniciar o projecto de desenvolvimento de um edifício habitacional, precisava que o Governo procedesse à revisão da concessão, o que nunca chegou a acontecer;
10. O Governo não facultou à Recorrente as informações necessárias sobre as novas condicionantes urbanísticas, para que esta pudesse elaborar estudos de aproveitamento adequados à alteração da finalidade do loteamento do Seac Pai Van, decidida em 30 de Agosto de 1993;
11. A Administração, ao não ter procedido à revisão da concessão, na sequência do Despacho do SATOP de 30 de Agosto de 1993, impediu o aproveitamento do terreno para a nova finalidade aprovada e violou os princípios da justiça, da boa-fé, na sua vertente da tutela da confiança, da decisão e da eficiência da Administração, previstos nos artigos 7.º, 8.º, 11.º e 12.º do CPA;
12. O princípio da confiança implica um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhe são juridicamente criadas, censurando-se as afectações arbitrárias, com as quais não poderia a Recorrente razoavelmente contar;
13. Um Governo que concessiona terrenos para desenvolvimento imobiliário, mas que, depois, não é capaz de tomar decisões relativas à revisão de uma concessão cuja finalidade alterou, não age como um contratante de boa-fé e não é minimamente merecedor de confiança no comércio jurídico;
14. Não se entende que a Administração faça apelo ao decurso do prazo de caducidade, quando é manifesto que a caducidade só opera se não existir um comportamento culposo por parte da Administração que constitua causa impeditiva do início ou decurso desse prazo;
15. Admitir que a Administração pode criar obstáculos sucessivos, ou omitir a prática de actos relevantes, de modo a deixar passar o prazo das concessões, é aceitar que a sua actuação pode, afinal, afastar o princípio da boa-fé;
16. Demorar anos sem aprovar a Planta de Condições Urbanísticas, de que dependia a revisão da concessão e a elaboração de novos estudos de aproveitamento, adequados à alteração da finalidade do loteamento do Seac Pai Van, para agora fazer apelo à caducidade do prazo de uma concessão cuja finalidade foi alterada, configura um erro manifesto nos pressupostos de facto a que alude a al. d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC;
17. O prazo da concessão por arrendamento do terreno destinado à construção da unidade industrial foi fixado em 25 anos, contado a partir da data da outorga da escritura de concessão por arrendamento, que nunca chegou a ser celebrada, nomeadamente por causa da mencionada alteração de finalidade da concessão;
18. O prazo de caducidade só começa a correr no momento em ser efectivamente exercido, conforme determina o artigo 321.º do Código Civil
19. A falta de celebração da escritura de concessão e a da sua revisão, aprovada em 30 de Agosto de 1993, bem como a omissão de informações sobre as novas condicionantes urbanísticas decorrentes da alteração de finalidade, impedem o início da contagem do prazo de 25 anos, nos termos previstos nos artigos 265.º, ex vi 270.º; e 321.º todos do Código Civil;
20. O Despacho de alteração da finalidade do loteamento da zona de Seac Pai Van, que determinou a revisão das concessões dos terrenos e a definição de novos prazos de aproveitamento compatíveis com os previstos para a disponibilização dos lotes, constitui o efeito impeditivo da caducidade previsto no artigo 323.º, n.º 1 do Código Civil;
21. A Administração usa o instituto jurídico da caducidade como uma punição sem culpa, desembocando num efeito jurídico próximo do da expropriação sem compensação, em clara violação do espírito do artigo 103.º da Lei Básica;
22. É o direito de propriedade que está em causa, pois o que a Recorrente adquiriu foi o direito do uso da propriedade, também consagrado e protegido naquele preceito fundamental da lei de Macau;
23. O contrato pelo qual alguém fica autorizado a fazer construções ou plantações em terreno alheio, conservando a propriedade delas, embora seja denominado locação, deverá ser classificado como um direito de superfície;
24. A concessão por arrendamento de terrenos do Estado aproxima-se do direito de superfície, previsto no artigo 1417.º e ss. do Código Civil e esse direito, que pode ter por objecto a construção de edifício ou conjunto de edifícios em regime de propriedade horizontal, é, em si mesmo, uma manifestação do direito à propriedade privada;
25. Por seu turno, o art.º 7 da Lei Básica determina que os solos e os recursos naturais na Região são propriedade do Estado, salvo os terrenos que sejam reconhecidos de acordo com a lei, como propriedade privada, antes do estabelecimento da RAEM;
26. Como tal é nula a previsão do artigo 48.º da Lei de Terras, pois viola os princípios e regras da Lei Básica, nomeadamente os inscritos nos artigos 6.º e 7.º da Lei Fundamental da RAEM;
27. O acto recorrido viola o disposto nos artigos 265.º, ex vi 270.º, 321.º e 323.º, n.º 1 e 1417.º e ss. do Código Civil; os princípios da justiça, da boa-fé, na sua vertente da tutela da confiança, da decisão e da eficiência da Administração, previstos nos artigos 7.º, 8.º, 11.º e 12.º do Código do Procedimento Administrativo; e os artigos 6.º, 7.º e 103.º da Lei Básica da RAEM, constituindo erro nos pressupostos de facto e de direito, nos termos previstos no artigo 21.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Administrativo Contencioso, devendo, por isso, ser anulado de acordo com o artigo 124.º do Código de Procedimento Administrativo.
Termos em que, e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por o acto recorrido estar ferido de ilegalidade, devendo por isso ser anulado, com as consequências legais.”

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Contestou a entidade recorrida, pugnando pela improcedência do recurso, em termos que aqui damos por reproduzidos.
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Não houve alegações facultativas.
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O digno Magistrado do MP emitiu o seguinte parecer:
“Objecto do presente recurso contencioso é o acto de 15 de Dezembro de 2016, da autoria do Exm.º Chefe do Executivo, que declarou a caducidade da concessão do terreno designado por lote “SA”, com a área de 2 902 m2, situado em Coloane, na Zona Industrial de Seac Pai Van, que havia sido concedido por arrendamento mediante Despacho n.º 168/GM/89, de 29 de Dezembro de 1989.
A recorrente, “Plasbor - Fábrica de Plásticos e Borrachas, S.A.R.L.”, acha que o acto padece dos vícios de erro nos pressupostos de facto, erro nos pressupostos de direito e violação da Lei Básica, conforme explicita na sua petição de recurso, no que é contraditada pela entidade recorrida, que defende a legalidade do acto e pugna pela sua manutenção na ordem jurídica.
Vejamos quanto ao erro nos pressupostos de facto.
A recorrente sustenta que o acto está viciado de erro nos pressupostos de facto porquanto, tendo o próprio concedente decidido, em 1993, alterar a finalidade do aproveitamento, de industrial para habitacional, sem que procedesse à revisão das concessões de acordo com a nova finalidade para permitir o desenvolvimento dos terrenos à luz dessa nova finalidade, vem agora declarar a caducidade com a alegação de que decorreu o prazo da concessão sem que houvesse sido construída a unidade industrial para a qual o terreno foi concedido.
Este pressuposto “falta de construção” ou “falta de aproveitamento”, adoptado no acto recorrido, apresenta-se exacto. Na verdade, é irrefutável que, em 28 de Dezembro de 2014, expirou o prazo de 25 anos do arrendamento do terreno, sem que este se mostrasse aproveitado, tal como reza o acto.
Saber quais as vicissitudes que estão por detrás do não aproveitamento e quem por isso é responsável já é matéria que, por não ter sido aflorada no acto, não cabe aqui analisar. Daí que nos dispensemos de discorrer sobre a alegada violação dos princípios da justiça, da boa-fé, da decisão e da eficiência, que, embora en passant, a recorrente não deixa de trazer à colação, mas a propósito da falta de revisão da concessão, que, em seu entender, terá dado causa ao não aproveitamento do terreno para a nova finalidade habitacional. Aliás, a jurisprudência relativa à caducidade das concessões pelo decurso do seu prazo vai toda no sentido de dispensar o apuramento da responsabilidade pelo incumprimento, entendendo que basta a constatação do incumprimento - cf., v.g., acórdão do Tribunal de Última Instância, de 11 de Outubro de 2017, in Processo n.º 28/2017.
Não ocorre, pois, o aventado erro nos pressupostos de facto, pelo que claudica este vício.
Passemos ao erro nos pressupostos de direito.
A recorrente acha que o acto labora em equívoco quanto ao decurso do prazo de caducidade, uma vez que tal prazo ainda nem sequer iniciou a sua contagem. Alicerça esta afirmação na circunstância de não haverem sido celebradas escrituras da concessão e da revisão e de não terem sido disponibilizadas informações sobre as condicionantes urbanísticas decorrentes da alteração da finalidade, o que, em seu entender, é impeditivo do início da contagem do prazo. Além disso, aduz ainda que também o Despacho que determinou a alteração da finalidade do loteamento tem um efeito impeditivo da caducidade.
Todavia, não explica a recorrente de que modo estas aventadas circunstâncias têm esse efeito à luz do direito, pois as normas que convoca não caucionam a sua tese. Além disso, conforme a entidade recorrida referiu na sua contestação, esta concessão está titulada pelo Despacho n.º 168/GM/89, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, da Lei 8/91/M, de 29 de Julho, que alterou a Lei 6/80/M, pelo que a formalidade da escritura deixou de revestir qualquer acuidade.
Improcede também o suscitado erro nos pressupostos de direito.
Finalmente, a recorrente sustenta haver violação da protecção do direito à propriedade privada garantido pela Lei Básica.
É certo que a Lei Básica manda proteger o direito à propriedade privada, tal como impõe o reconhecimento e protecção dos contratos de concessão de terras celebrados antes do estabelecimento da RAEM e que se prolonguem para além da data de transferência de soberania. Mas relega, para a lei, a forma e as condições que moldam essa protecção, como melhor se vê das normas pertinentes (artigos 6.º e 120.º). Pois bem, no que respeita aos terrenos pertença do antigo Território de Macau e da actual RAEM - terrenos do Estado -, não há concessões por tempo indeterminado. Há prazos de concessão e há regras para o aproveitamento dos terrenos. Esses prazos e regras estão disciplinados por lei e, na maioria dos casos, até são vertidos para os contratos de concessão.
Portanto, a protecção conferida pela Lei Básica é uma protecção subordinada ao cumprimento das regras legalmente instituídas, que se pode esvair com a inobservância dessas regras. E as regras, em matéria de terras, têm como pano de fundo a finalidade social dos direitos associados ao seu uso, o que demanda o seu efectivo aproveitamento nos prazos que o legislador teve por razoáveis, adentro do seu poder de conformação. Daí que o artigo 48.º ao estabelecer a impossibilidade de renovação das concessões provisórias em nada afronte os princípios vertidos naqueles artigos da Lei Básica.
Improcede, pois, a suscitada violação do direito de propriedade protegido pela Lei Básica.
Ante o exposto, o nosso parecer vai no sentido de ser recusado provimento ao recurso.”
*
Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - Por despacho do então Governador de Macau n.º 168/GM/89, de 29 de Dezembro de 1989, foi concedida, por arrendamento a favor da ora Recorrente, a concessão de um terreno com a área de 2.902m2, designado por lote “SA”, situado na Ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, destinado à construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo oito pisos, ficando parte do r/c e o 2.º piso afectados a uma unidade industrial de transformação de borracha e matérias plásticas, a explorar directamente pela concessionária (Docs. n.ºs 2 e 3, juntos com a p.i.).
2 - O referido terreno está descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22140, a fls. 118v., do Livro B111A e o direito resultante da concessão encontra-se inscrito a favor da concessionária sob o n.º 789, a fls. 23 do Livro FK3 (Docs. n.º 2 e 4 cits.).
3 - O prémio no valor de MOP3.773.911,00 foi totalmente pago pela Recorrente, desde 29 de Janeiro de 1992, conforme consta da Proposta n.º 031/DSODEP/2016 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (“DSSOPT”), de 5 de Fevereiro de 2016, sobre a qual foi exarado o Despacho do STOP (ver Doc. n.º 2), e do Parecer da Comissão de Terras n.º 24/2016, de 19 de Fevereiro de 2016 (ver Doc. n.º 1 cit.).

4 - Por Despacho, de 30 de Agosto de 1993, do então Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas (“SATOP”) foi aprovado o Plano Geral de Exploracão e Recuperacão da Pedreira de Coloane para o loteamento da designada zona de Seac Pai Van passar a ter uma finalidade habitacional em vez da finalidade industrial, inicialmente prevista nos vários Despachos de concessão por arrendamento dos lotes dessa zona de Seac Pai Van (Despacho a fls. 17, incluído no Doc. n.º 2 cit.).
5 - Naquele Despacho de 30 de Agosto de 1993, o SATOP ordenava que fossem oficiados os concessionários de lotes do Seac Pai Van, para se obter o acordo destes para a alteração da finalidade e revisão das concessões, com a definição de novos prazos de aproveitamento compatíveis com os previstos para a disponibilização dos respectivos lotes, bem como para a revisão dos prémios pagos (cfr. 17, doc. n.º 2. cit.)
6 - Por Ofício do Director dos SSOPT n.º 850/8113.1/SOLDEP/93, de 2 de Dezembro de 1993, a ora Recorrente foi informada de que fora decidido, por causa da localização do terreno e do elevado custo e dificuldades na execução das infra-estruturas, afectar o loteamento do Seac Pai Van à finalidade habitacional em vez de industrial e atribuir a regularização e loteamento do terreno a uma empresa com capacidade técnica para a sua execução (cfr. fls. 20 do Doc. n.º 2. cit.)
7 - Mais se informava, naquele Ofício da DSSOPT, que, como a regularização do terreno, o tratamento paisagístico e a comparticipação nos custos das infra-estruturas dos lotes concedidos, que também constituíam encargos dos respectivos concessionários, era necessário obter o consentimento destes para a revisão e alteração da finalidade da concessão, com definição de novos prazos de aproveitamento e ajustamentos dos montantes dos prémios.
8 - Em 20 de Dezembro de 1993, a concessionária, respondeu dizendo que, não obstante já ter apresentado os projectos de construção de acordo com a finalidade da concessão, manifestava o seu interesse no reaproveitamento do terreno para fins habitacionais, com a consequente revisão da concessão, e solicitou o fornecimento de todas as informações necessárias para a elaboração de novos estudos de aproveitamento do lote “SA” (fls. 21 do doc. n.º 2 cit.).
9 - Em 29 de Julho de 1999, um requerimento ao então Governador de Macau, em que solicitava a troca do lote concedido por um outro terreno situado na Ilha da Taipa, junto à Estrada Almirante Marques Esparteiro, destinado às finalidades de comércio e habitação (fls. 22 do doc. n.º 2 cit.).
10 - O requerimento para a troca de terrenos foi indeferido por Despacho do SATOP, de 24 de Setembro de 1999 (cfr. fls. 24 e 26 do doc. n.º 2 cit.).
11 – Em 19/02/2016, a Comissão de Terras emitiu o seguinte parecer:
“PARECER N.º 24/2016
Proc. n.º 9/2016 - Respeitante à proposta da declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 2 902m2, situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, lote “SA”, a favor da Plasbor - Fábrica de Plásticos e Borrachas, S.A.R.L., pelo decurso do seu prazo de vigência, de 25 anos, que expirou em 28 de Dezembro de 2014, cuja concessão foi titulada pelo Despacho n.º 168/GM/89.
I
1. Ao abrigo do disposto no artigo 44.º da Lei n.º 10/2013, Lei de terras, a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório, por prazo a fixar em função das suas características e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente. Nos termos do disposto no artigo 48.º da mesma Lei, a concessão provisória não pode ser renovada. Assim, por despacho do Chefe do Executivo, declara-se a caducidade da concessão, por decurso do prazo de arrendamento, de acordo com o artigo 167.º da mesma lei.
2. Ao abrigo do disposto no artigo 179.º da Lei de terras e no artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto, o despejo do concessionário ou do ocupante é ordenado por despacho do Chefe do Executivo quando se verifica a declaração da caducidade da concessão.
3. Face ao exposto, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), através da proposta n.º 349/DSODEP/2015, de 18 de Novembro de 2015, propôs autorização para dar início ao procedimento de declaração de caducidade das concessões provisórias cujo prazo de arrendamento expirou ou irá expirar, bem como dar início aos respectivos trabalhos por ordem cronológica das datas em que terminou o prazo de arrendamento de cada um daqueles processos, tendo o Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) aprovada esta proposta por despacho de 25 de Novembro de 2015.
II
4. Através do Despacho n.º 168/GM/89, publicado no 4.º suplemento ao Boletim Oficial de Macau, n.º 52, de 29 de Dezembro de 1989, foi titulada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 2 902m2, situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, lote “SA”, a favor da Plasbor - Fábrica de Plásticos e Borrachas, S.A.R.L., destinado à construção de um edifício industrial.
5. Conforme a cláusula segunda do contrato de concessão, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da respectiva escritura, porém, não tendo sido celebrada a escritura, por força do disposto no n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 8/91/M, de 29 de Julho, a concessão passou a ser titulada pelo sobredito despacho, passando o prazo de arrendamento a contar-se da data da sua publicação, ou seja, até 28 de Dezembro de 2014.
6. Conforme o previsto na cláusula terceira do contrato da concessão, o terreno seria aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 8 pisos, destinados às finalidades industrial e de estacionamento, ficando parte do rés-do-chão e o 2.º piso afectados a uma unidade industrial de transformação de borracha e matérias plásticas, a explorar directamente pela concessionária.
7. Conforme o previsto na cláusula quinta do contrato da concessão, o prazo global de aproveitamento do terreno é de 30 meses, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau do despacho que autoriza o contrato, ou seja, de 29 de Dezembro de 1989 até 28 de Junho de 1992.
8. Conforme a cláusula sexta do contrato de concessão, constituem encargos especiais a serem suportados exclusivamente pela concessionária a desocupação do terreno concedido e a remoção do mesmo de todas as construções e materiais aí existentes.
9. Da leitura das informações da folha de acompanhamento financeiro decorre que a concessionária pagou integralmente o montante do prémio no valor de $3 773 911,00 patacas conforme previsto na cláusula décima do contrato.
10. O terreno referido em epígrafe está descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22 140 a fls. 118v do livro B111A e o direito resultante da concessão encontra-se inscrito a favor da concessionária sob o n.º 789 a fls. 23 do livro FK3.
11. Em cumprimento do despacho emitido em 30 de Agosto de 1993 pelo Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas (SATOP), exarado na informação n.º 063/S0TSDB/93, de 6 de Agosto de 1993, a DSSOPT, através do ofício n.º 850/8113.1/SOLDEP/93, de 2 de Dezembro de 1993, comunicou à concessionária o seguinte:
“……devido à sua localização e ao elevado custo e dificuldade na execução das infra-estruturas de uma zona com as características de Seac Pai Van, foi decidido por despacho do Exmo. Senhor Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas, de 30 de Agosto de 1993, o seguinte:
a) Afectar o loteamento do Seac Pai Van à finalidade habitacional em vez de industrial;
b) Atribuir a obra de regularização e loteamento do terreno a uma empresa com capacidade técnica para a sua execução.
Assim, e porque a referida regularização do terreno, o tratamento paisagístico e comparticipação nos custos das infra-estruturas dos lotes concedidos, constituem encargos dos respectivos concessionários torna-se necessário, a fim de se evitarem contratempos, obter um acordo, por escrito, de V. Exa., quanto à aceitação de revisão do contrato de concessão, face à nova finalidade do terreno o qual implicará, nomeadamente:
a) A definição de um novo prazo de aproveitamento compatível com o prazo previsto para a disponibilização do lote;
b) O ajustamento do montante do prémio.
Caso V. Exa. continue a ter preferência pela concessão com finalidade industrial, deverá igualmente informar esta Direcção de Serviços com vista à concessão, por troca, de um terreno equivalente, em local mais adequado a essa finalidade.
Tornando-se necessário programar rapidamente o início dos trabalhos, solicita-se uma resposta de V. Exa. até dia 20 de Dezembro de 1993.”
12. A concessionária, através da carta apresentada em 20 de Dezembro de 1993, veio manifestar interesse no reaproveitamento do terreno para fins habitacionais e solicitar o fornecimento de todas informações necessárias relativas ao lote e, mormente, plantas ou outros elementos com as novas directrizes e condicionamentos urbanísticos de forma a poder ser elaborado novo estudo de aproveitamento.
13. Posteriormente, a concessionária apresentou um requerimento à DSSOPT em 28 de Julho de 1999, a solicitar a troca do lote concedido por um outro terreno situado na ilha da Taipa, junto à Estrada Almirante Marques Esparteiro, destinado às finalidades de comércio e habitação. O pedido foi indeferido por despacho do SATOP, de 24 de Setembro de 1999.
14. De acordo com o disposto na cláusula segunda do contrato da concessão, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da escritura pública do contrato, ou seja, o prazo terminou em 28 de Dezembro de 2014. No entanto, uma vez que o terreno ainda não foi aproveitado e a respectiva concessão ainda é provisória, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 48.º da Lei de terras, a mesma não pode ser renovada. Nestas circunstâncias, a DSSOPT procedeu à análise da situação e, através da proposta n.º 031/DSODEP/2016 de 8 de Janeiro de 2016, propôs que seja autorizado o seguimento do procedimento relativo à declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento e o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, proposta esta que mereceu a concordância do STOP por despacho de 3 de Fevereiro de 2016.
15. Face ao exposto, esta Comissão, após ter analisado o processo, considera que a concessão provisória em apreço se encontra já caducada pelo facto de ter expirado em 28 de Dezembro de 2014 o prazo de arrendamento, de 25 anos, fixado na cláusula segunda do respectivo contrato (caducidade preclusiva).
Com efeito, de acordo com o artigo 44.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), aplicável ao caso vertente por força do disposto nos seus artigos 212.º e 215.º, a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente (vide ainda artigos 130.º e 13l.º).
Findo o seu prazo de vigência, as concessões provisórias não podem ser renovadas, a não ser no caso previsto no n.º 2 do artigo 48.º da Lei de terras, conforme estabelece o n.º 1 do mesmo preceito legal, operando-se a caducidade por força da verificação daquele facto (decurso do prazo de arrendamento).
De igual modo, resultava da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de terras anterior), que no caso da concessão revestir natureza provisória em virtude do terreno não se encontrar aproveitado (cf. artigos 49.º, 132.º e 133.º), não era possível operar a sua renovação por períodos sucessivos de dez anos porquanto a figura da renovação prevista no n.º 1 do artigo 55.º era aplicável apenas às concessões definitivas.
Apesar da caducidade operar de forma automática e directa, para tornar a situação jurídica certa e incontestada e, portanto, eliminar a insegurança jurídica sobre a extinção ou não do direito resultante da concessão, deve a mesma (caducidade) ser declarada, conforme decorre do disposto no corpo do artigo 167.º da Lei n.º 10/2013.
Nestas circunstâncias, esta Comissão nada tem a opôr à declaração de caducidade da concessão do terreno em epígrafe pelo decurso do prazo de arrendamento, perdendo a concessionária a favor da Região Administrativa Especial de Macau todas as prestações do prémio e os respectivos juros já pagos, nos termos do disposto no artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004.
III
Reunida em sessão de 19 de Fevereiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo e ter tido em consideração o parecer e proposta constantes na proposta n.º 031/DSODEP/2016, de 8 de Janeiro de 2016, bem corno o despacho nela exarado pelo STOP, de 3 de Fevereiro de 2016, considera que verificada a caducidade da concessão pelo termo do prazo de arrendamento em 28 de Dezembro de 2014, deve esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Comissão de Terras, aos 19 de Fevereiro de 2016.”
12 – O Secretário para os Transportes e Obras Públicas, em 26/02/2016, emitiu o seguinte parecer:
“Parecer
Proc. n.º 9/2016 - Respeitante à proposta da declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 2 902m2, situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, lote “SA”, a favor da Plasbor - Fábrica de Plásticos e Borrachas, S.A.R.L., pelo decurso do seu prazo de vigência, de 25 anos, que expirou em 28 de Dezembro de 2014, cuja concessão foi titulada pelo Despacho n.º 168/GM/89.
1. Através do Despacho n.º 168/GM/89, publicado no 4.º suplemento ao Boletim Oficial de Macau, n.º 52, de 29 de Dezembro de 1989, foi titulada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 2 902m2, situado na ilha de Coloane, na zona industrial de Seac Pai Van, lote “SA”, a favor da Plasbor - Fábrica de Plásticos e Borrachas, S.A.R.L., destinado à construção de um edifício industrial.
2. Conforme a cláusula segunda do contrato de concessão, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da respectiva escritura, porém, não tendo sido celebrada a escritura, por força do disposto no n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 8/91/M, de 29 de Julho, a concessão passou a ser titulada pelo sobredito despacho, passando o prazo de arrendamento a contar-se da data da sua publicação, ou seja, até 28 de Dezembro de 2014.
3. Conforme o previsto na cláusula terceira do contrato da concessão, o terreno seria aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, compreendendo 8 pisos, destinados às finalidades industrial e de estacionamento, ficando parte do rés-do-chão e o 2.º piso afectados a uma unidade industrial de transformação de borracha e matérias plásticas, a explorar directamente pela concessionária.
4. O prazo de arrendamento do lote “SA” terminou em 28 de Dezembro de 2014 e este não se mostrava aproveitado naquela data. Nestas circunstâncias, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes propôs que fosse autorizado o seguimento do procedimento relativo à declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento e o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, o que mereceu a minha concordância, por despacho de 3 de Fevereiro de 2016.

5. Reunida em sessão de 19 de Fevereiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo, considerou que o prazo de arrendamento de 25 anos fixado na cláusula segunda do contrato terminou em 28 de Dezembro de 2014, e que, a concessão provisória, não pode ser renovada, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 48.º da Lei n.º 10/2013, Lei de terras, aplicável por força dos seus artigos 212.º e 215.º. Deste modo, a concessão do lote “SA” encontra-se caducada pelo termo do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido.
Aos 26 de Fevereiro de 2016.
O Secretário para os Transportes e Obras Públicas,
Raimundo Arrais do Rosário”
13 – O Chefe do Executivo, em 15/12/2016 produziu o seguinte despacho (a.a.):

“Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, a que se refere o Processo n.º 9/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 26 de Fevereiro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho.
Aos 15 de Dezembro de 2016
O Chefe do Executivo,
Chui Sai On”
***
IV – O Direito
1 – A recorrente imputou ao acto sindicado os vícios seguintes:
- Erro sobre os pressupostos de facto;
- Violação dos princípios da justiça, da boa-fé, da decisão e eficiência;
- Violação dos arts. 265º , 270º, 321º e 323º e 1417º, do CC;
- Violação dos arts. 6º, 7º e 103º da Lei Básica.
*
2 – Do erro sobre os pressupostos de facto
Entende o recorrente que só não realizou o aproveitamento do terreno em virtude de a Administração ter alterado a finalidade do loteamento da zona, sem que tivesse, na sequência disso, procedido à revisão da concessão.
Com este argumento, porém, a recorrente está a desviar-se do essencial fundamento que consta do acto: o não aproveitamento do terreno ao cabo dos 25 anos fixado na cláusula 2ª do contrato. Ora, esse facto é verdadeiro! Portanto, não se pode dizer errado o pressuposto fáctico em que o acto se louvou.
O que a recorrente nos traz é algo diferente: é imputar à Administração a culpa no não aproveitamento. Só que isso não está aqui em causa, nem aqui cumpre dilucidar no âmbito da análise deste vício. Com efeito, o acto em crise assenta no mero decurso do prazo de caducidade. É, portanto, a caducidade preclusiva que nele está invocada. E, como é jurisprudência da RAEM, a culpa, nesse caso, é indiferente à solução do recurso, já que a declaração administrativa da caducidade não tem que ver com razoes impeditivas ou não do aproveitamento. O que releva é somente o facto objectivo do decurso do prazo, é o que a jurisprudência da RAEM tem por adquirido (v.g., Acs. do TUI, de 6/06/2018, Proc. nº 43/2018 e de 11/10/2017, Proc. nº 28/2017; Ac. do TSI, de 19/10/2017, Proc. nº 179/2016; de 1/02/2018, Proc. nº 26/2017 e de 26/04/2018, Proc. nº 767/2016).
Assim, sem mais formalidades, improcede o vício.
*
3 – Da violação dos princípios da justiça, da boa-fé, da decisão e eficiência
Em termos que aqui damos por reproduzidos, advoga a recorrente que a atitude da entidade recorrida, em declarar a caducidade da concessão, sem que lhe fosse permitido alterar a execução da nova finalidade do contrato, por decisão unilateral da Administração, mas sem que fosse efectuada a revisão da concessão, atenta contra aqueles princípios.
Ora, este vício não pode proceder, pela simples razão que os princípios de direito administrativo da boa fé e da eficiência (arts. 8º, 12º, do CPA) constituem limites internos da actividade administrativa discricionária (cfr., entre tantos, o citado Ac. do TSI lavrado no Proc. nº 767/2016).
Ora, a actividade em apreço é vinculada ope legis, portanto, sem qualquer interferência do papel da vontade do administrador. É da lei que advém fatalmente a caducidade.
Isto é, têm entendido os tribunais de Macau, e com razão, que, decorrido o prazo da concessão sem que o aproveitamento tenha sido efectuado tal como contratualmente convencionado, à contraente pública outra solução não resta senão declarar a caducidade (ver arestos citados).
Desta maneira, sem mais considerandos, somos a dar por improcedente o vício.
*
4 – Da violação dos arts. 265º, 270º, 321º e 323º e 1417º, do CC
Neste ponto, a recorrente dá entrada num capítulo a que chamou “erro nos pressupostos de direito.
E é com base nos preceitos invocados que refere que o prazo de caducidade não podia ter começado a correr. O seu raciocínio é este: O prazo de 25 anos deveria começar a sua contagem apenas com a outorga da escritura da concessão por arrendamento, bem a da sua revisão, coisa que nunca chegou a ser acontecer!
Estranho é este argumentário, pois parece revelar que, afinal de contas, no seu próprio juízo, a recorrente não se acha com direito a coisa nenhuma, uma vez que a escritura não chegou a ser formalizada. Mas, se assim fosse, então não se entenderia por que se acha com o direito de pedir a invalidação de algo que não chegou a ter existência com valor jurídico. A recorrente, na sua própria tese, parece que nem seria sequer concessionária.
Vamos, no entanto, dar relevância ao Despacho nº 168/GM/89, publicado no BO de 29/121989, sem esquecer que a concessão foi objecto de publicidade e, consequentemente, de eficácia através do de registo predial. Assim terá que ser, de resto, tendo em consideração o que dispõe o Despacho referido (fls. 57vº) e o disposto no art. 4º, nº1 da Lei nº 8/91/M, de 29/07, diploma que altera a Lei de Terras nº 6/80/M, de 5/07.
Sendo assim, não faz qualquer sentido a alusão à violação dos arts. 265º e 270º do Código Civil, pois que se referem a uma condição que no caso não se verifica.
E, dito isto, do mesmo modo se julga irrelevante a invocação dos arts. 321º e 323º do mesmo Código. Não é verdade que o prazo de 25 anos não tenha começado a contar (conta-se, sim, a partir da publicação do Despacho) e, por outro lado, não cremos que, ao caso, se aplique qualquer causa que obste à verificação da caducidade, porque não existe nenhum acto a que a lei ou convenção atribua esse efeito impeditivo.
Quanto ao art. 1417º do Código, não se crê que ele preste algum socorro à recorrente, porque a situação não se enquadra na sua previsão legal.
*
5 – Da violação dos arts. 6º, 7º e 103º da Lei Básica.
Neste passo, entende a recorrente terem sido violados os preceitos citados.
Não tem razão, salvo o devido respeito.
Quanto ao primeiro – “O direito à propriedade privada é protegido por lei ma Região Administrativa Especial de Macau” – não se vê, sinceramente, de que modo o direito da recorrente à propriedade privada se mostra ferido, se não é disso que se trata na concessão.
Quanto ao segundo, parece-nos evidente a sua irrelevância à tese da recorrente, pois que ele se limita a conferir a propriedade dos solos e recursos naturais à RAEM, exceptuando, porém, a situação dos terrenos que tenham sido reconhecidos, antes do estabelecimento da RAEM, como propriedade privada. Ora, isso não está em discussão nos autos.
Quanto ao último - “A Região Administrativa Especial de Macau reconhece e protege, em conformidade com a lei, os contratos de concessão de terras legalmente celebrados ou aprovados antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau que se prolonguem para além de 19 de Dezembro de 1999 e os direitos deles decorrentes.
As concessões de terras feitas ou renovadas após o estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau são tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da Região Administrativa Especial de Macau” – também ele não acode à recorrente.
Efectivamente, tal como este TSI teve ensejo de dizer no Ac. de 19/10/2017, Proc. nº 179/2016: «É correcto afirmar que a Lei Básica, no corpo do artigo, reconhece e protege os contratos de concessão de terras celebrados, e os direitos deles decorrentes, antes do estabelecimento da RAEM que se prolonguem para depois de 19/12/1999. Mas tal segmento normativo apenas pode ser utilizado para consagrar o respeito que a RAEM deve reconhecer aos direitos emergentes dos contratos que se encontrem em vigor após 19/12/1999. Ora, quanto a este aspecto, e como já tivemos ocasião de observar, o contrato celebrado em nada impedia a prática do acto administrativo que aqui está em apreciação, por em nada ter afrontado o clausulado inicial do contrato e das suas revisões.

E mesmo quanto ao seu parágrafo único1, igualmente não encontramos no acto nenhuma ofensa à força imperativa deste inciso legal, se pensarmos que ele se limita a mandar aplicar às novas concessões e às renovações (quando possíveis, obviamente) o regime legal e as “políticas” que vierem a ser produzidos já no âmbito da RAEM. A imposição que brota deste parágrafo está, de resto, em sintonia com o art. 11º do Código Civil e com o princípio tempus regit actum.» (no mesmo sentido, Ac. do TSI, 26/04/2018, Proc. nº 767/2016 acima citado).
Improcede, pois, o vício.
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V – Decidindo
Face a todo o exposto, acordam em negar provimento ao recurso contencioso, mantendo o acto administrativo impugnado.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 20 Ucs.
T.S.I., 11 de Outubro de 2018
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José Cândido de Pinho Joaquim Teixeira de Sousa
_________________________ (Fui presente)
Tong Hio Fong
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Lai Kin Hong
1 “As concessões de terras feitas ou renovadas após o estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau são tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da Região Administrativa Especial de Macau”.
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Rec. Cont. 123/2017 26