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Processo nº 448/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 18 de Outubro de 2018
Recorrente: A (Ré)
Recorrido: B (Autor)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I - RELATÓRIO
  Por sentença de 01/03/2018, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré A a pagar ao Autor B a quantia de MOP$112,861.25, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vem recorrer a Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a 1ª Ré A, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização no valor global MOP$112.861,25, acrescida de juros moratórias à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório, entendendo a Recorrente que no que respeita ao subsidio de alimentação. (ii) trabalho prestado em dia de descanso semanal (iii) trabalho prestado em feriado obrigatório (iv) compensação pelo descanso compensatório (v) trabalho extraordinário por turnos e prestado 30 minutos para além do período normal diário de trabalho efectivo, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu, em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece dos vícios de erro na aplicação do direito e nulidade da Sentença.
2. Foi a seguinte a factualidade tida por assente e provada após audiência e discussão de julgamento: Entre 1 de Agosto de 1998 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré, prestando funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente (cfr. doc. 1). (A) Conforme informação prestada pelo Gabinete para os Recursos Humanos da RAEM (GRH), o Autor exerceu a sua prestação de trabalho para a La Ré ao abrigo de um Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre a 1ª Ré e a Sociedade ECONFORCE - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. (B) Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor prestou trabalho nos locais (postos de trabalho) indicados pela 1ª Ré. (C) Durante o período que prestou trabalho, a 1ª Ré pagou ao Autor a quantia de Mop$7,800.00, a título de salário de base mensal (cfr. doc. de fls. 28). (D) Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela 1.ª Ré. (1.°) Durante O tempo que prestou trabalho para a 1.ª Ré, o Autor nunca deu qualquer falta injustificada. (2.º) Para um período de trabalho de 8 horas de trabalho por dia e de 6 dias por semana. (3.º) Aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor que teria direito a alimentação e alojamento gratuitos em Macau. (4.°).
3. Mais se provou que "Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de $20,00 patacos diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação", (5.º) Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ ou géneros. (6.º) Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, que "(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1° outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território". (7.º) Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais incluindo-se as gorjetas que pagou a todos os demais trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança. (8.º) Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) "(…) um subsidio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que 110 mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço", (9.º) Durante todo o período da relação laboral, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte da 1.ª Ré. (10.º) Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, a 1ª Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia a título de subsídio mensal de efectividade. (11.º) Entre 01/08/1998 e 31/12/2002, a 1ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (12.º).
4. E ainda que: "A 1.ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (13.º) A 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (14.º) A 1.ª Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal. (15.º) Durante o referido período de tempo, a 1.ª Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.º) Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho para a 1.ª Ré, a la Ré procedeu ao desconto da quantia de HKD$750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de "comparticipação nos custos de alojamento". (18.º) O desconto no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela 1ª Ré. (18º-B) Mesmo que o trabalhador (leia-se, do Autor) optasse por residir fora da residência que lhe era destinada pela la Ré, sempre lhe seria descontado a quantia de HK$750,00 por cada mês. (18.º-C) Em cada residência residiam cerca de 8 trabalhadores (guardas de segurança de origem nepalesa), cada um dos quais "pagava" à la Ré a quantia de HK$750,00. (18.º-D) Era expressamente proibido ao Autor (e aos demais trabalhadores de origem nepalesa que com ele residia) receber quaisquer visitas e/ou familiares no referido apartamento. (18.º-F) Sendo, igualmente, expressamente vedado a entrada de quaisquer pessoas de sexo feminino em qualquer dos alojamentos "providenciados" pela 1.ª Ré. (18.º-G)
5. Provou-se ainda que: "Durante todo o período da relação de trabalho com a 1.ª Ré, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (19.º) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (A) num regime de 3 turnos rotativas de 8 horas por dia: Turno A: (das 08h às 16h),Turno B: (das 16h às 00h) e Turno C: (das 00h às 08h) (20.º) A 1.ª Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (21.º) Por ordem da 1.ª Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (22.°) O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (23.º) Período durante o qual o Autor estava sujeito às ordens e instruções da 1.ª Ré. (24.º) A 1.ª Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia salarial pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno e relativamente ao qual o Autor permaneceu sob as ordens e as instruções da 1ª Ré. (25.º) Entre 1/8/1998 e 21/7/2003, o Autor prestou 1656 dias de trabalho efectivo junta da Ré (26.°). O Autor gozou de 24 dias de férias por cada ano civil e tendo-se deslocado ao Nepal, com a excepção do ano 2000 que não chegou a deslocar ao Nepal (28.º). Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante os 6 dias de feriados obrigatórios (1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias); 1 de Maio e 1 de Outubro), por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré (A) (16.° e 29.º).
6. No que diz respeito ao Subsídio de alimentação o douto Tribunal a quo condenou a ora Recorrente a pagar ao Autor, ora Recorrido, a quantia de MOP$16.080,00 a título de subsídio de alimentação tendo o Tribunal fundamentado a aludida condenação, em tradução livre da nossa responsabilidade - "Considerando que foi provado que além dos 73 dias das férias anuais que o Autor gozou, (incluindo: de 4/6/2001 a 28/6/2001, num total é de 25 dias. de 26/2/2002 a 21/3/2002, num total é de 24 dias e de 6/5/2003 a 29/5/2003, num total é de 24 dias), não há qualquer outro dado que demonstre que o Autor tenha falta justificada ou injustificada, a forma de cálculo é (o período de prestar trabalho (25/02/2001 a 21/07/2003 = a 877 dias - os dias das férias anuais73) x MOP20.00 (subsídio de alimentação por dia) = Valor total de subsídio de alimentação + MOP16,080.00. Por isso, a Primeira Ré tem de pagar ao Autor o subsídio de alimentação em (...) total por MOP16,080.00.»
7. Mas com o devido respeito está a Recorrente em crer que o Tribunal não estava em condições de proceder à condenação nos termos em que o fez, uma vez que já havia ficado provado na 1ª sentença e confirmado pelo Acordão proferido por este Venerando Tribunal nos presentes autos relativo ao primeiro julgamento realizado que durante o período em que o Recorrido trabalhou para a Recorrente, aquele nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés, ou seja, o que se provou foi que durante o período em que o Recorrido prestou trabalho nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés, resultando assim assumido pelo Recorrido. E nesta senda pergunta-se então quantos dias o Recorrido esteve ausente? Ou, a contrario, quantos dias trabalhou? Ora, o direito invocado pelo Recorrido não se pode presumir como certo, e o Tribunal terá que apreciar com base nos factos alegados pelo Recorrido e conforme o Direito. E não o faz! E a parca matéria fáctica dada como a provada em audiência, não pode conduzir, sem mais, à procedência do pedido. Assim, resultou apurado que o Recorrido deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização da Recorrente, mas não se comprova quais são esses dias.
8. É que, conforme tem vindo a ser entendido por esse Venerando Tribunal não se trata apenas de determinar o número de dias de trabalho efectivo e o número de ausência, mas antes de determinar quais os dias em que o trabalho foi prestado. Mais do que o quanto importa apurar o quando! Assim, não se tendo apurado os dias em que o Recorrido trabalhou e sendo o subsídio de alimentação atribuído em função da efectiva prestação de trabalho, o Tribunal a quo não poderia ter determinado o número de dias em que o Recorrido tem direito a receber o subsídio de alimentação, parecendo que não estaria o Tribunal a quo em condições de determinar quais os dias relativos aos quais o Recorrido tem direito ao subsídio de alimentação e este subsidio conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário, tendo vindo a ser, aliás, doutamente defendido por esse Venerando Tribunal de Segunda Instância em diversos arestos dos quais se destaca o proferido em 13.04.2014 no processo 414/2012 e lançando mão à douta decisão, para que houvesse condenação da ora Recorrente no pagamento desta compensação, deveria o Autor ter alegado e provado quantos foram os dias de trabalho efectivamente por si prestados, o que não sucedeu, estando, aliás, a decisão em contradição com a factualidade provada (cfr. resposta ao quesito 10°).
9. Caso assim não seja entendido, pode ler-se na douta sentença recorrida que "Considerando que foi provado que além dos 73 dias das férias anuais que o Autor gozou, (incluindo: de 4/6/2001 a 28/6/2001, num total é de 25 dias, de 26/2/2002 a 21/3/2002, num total é de 24 dias e de 6/5/2003 a 29/5/2003, num total é de 24 dias), não há qualquer outro dado que demonstre que o Autor tenha falta justificada ou injustificada, (…)." parece-nos com esta afirmação que pretende o Digno Tribunal de Primeira Instância inverter o ónus da prova, ónus esse que compete ao Autor, ou seja, pretende o Digno Tribunal recorrido que seja a Ré a apresentar prova quanto á indicação dos dias de faltas e de ausências que o Autor teve durante a sua relação laboral com a Recorrente, quando tal a esta lhe não compete, pois o ónus da prova não respeita à ora Recorrente mas sim ao Recorrido e nem o legislador assim esperava essa obrigação por parte da Recorrente já que antes da Lei 7/2008 podíamos supor a obrigação de manutenção de documentos até 5 anos após o terminus da relação laboral aplicando-se analogicamente o Código Comercial, mas que para uma Companhia com a enorme dimensão como a da Recorrente e dada a enorme mobilidade de recurso humanos existente em Macau e na própria Recorrente, se tornava mesmo assim completamente impossível manter documentos de trabalhadores que saíram da Companhia há 15 anos, como o Recorrido, aliás, quanto à obrigação do recorrido e ao ónus que sobre si impende se pronunciou já este Venerando Tribunal em casos em tudo semelhantes, dando como exemplo o processo 858/2017 (pagina 30) quando diz: "Ainda que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento da matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contrato, visto até o tempo entretanto decorrido - não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em divida. Quanto se diz não retira deforma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça."
10. Pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, não tendo sido provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em o fez, padecendo assim a douta Sentença, nesta parte, do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento de compensação a título de subsídio de alimentação.
11. Quanto à compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal e compensatório e feriados obrigatórios deu o Tribunal a quo por provado que: "Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização (10.°) O Autor gozou 24 dias de férias anuais por cada ano civil tendo-se deslocado ao Nepal, com excepção do ano 2000 que não chegou a deslocar-se ao Nepal (28°)." Em face da sobredita matéria o Tribunal a quo condenou a Recorrente a pagar ao Autor a quantia de MOP$44,500.00 entendendo que eram 89 o número de dias de descanso semanal devidos e não gozados, podendo ler-se na decisão- em tradução livre da nossa responsabilidade que - os factos assentes demonstram que além das férias anuais que o Autor gozou todo os anos durante o período que trabalhou para a 1.ª Ré, o Autor não tem qualquer registo de ausência ao trabalho.
12. Ora, parece-nos que, aqui novamente pretendeu o Digno Tribunal de Primeira Instância inverter o ónus da prova, ónus esse que compete ao Autor, ou seja, pretende o Digno Tribunal recorrido que seja a Ré, ora Recorrente, a apresentar prova quanto à indicação dos dias de faltas e de ausências que o Autor teve durante a sua relação laboral com a Recorrente, quando tal a esta lhe não compete, mas sim ao Autor, ora, salvo devido respeito, o ónus da prova não respeita à ora Recorrente mas sim ao Recorrido, como já acima explanado, dando-se também aqui como reproduzido e por outro lado, da factualidade provada nada resulta quanto ao quantum e ao quando o Autor trabalhou para que se pudesse chegar à conclusão que tem direito a ser compensado por 89 dias de descansos semanais, não se tendo provado que o Autor não tem registo de ausências.
13. Não se provou, o número de dias concretos que o Autor trabalhou para se poder concluir pelo número de dias de descanso semanal que deixou de gozar, aplicando-se o mesmo raciocínio à condenação do tribunal relativamente aos créditos reclamados pelos dias de descanso compensatório e novamente se mostra insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permitisse ao Tribunal condenar a Recorrente pelo alegado trabalho prestado em dias de descanso semanal, já que a quantificação de qualquer montante estará dependente do concreto apuramento de dias de trabalho efectuado pelo recorrido, factualidade não apurada, verificando-se, por isso, uma ena da aplicação do Direito por parte do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, em violação do princípio do dispositivo consagrado no artigo 5.º do CPC e, bem assim, o disposto nos artigos 17.º do DL 24/89/M, devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado.
14. O mesmo raciocínio se aplica à condenação da recorrente ao pagamento de uma compensação pelo alegado trabalho prestado em feriados. Sendo quanto a isto dito na douta sentença recorrida que: "Os factos assentes mostram que durante o período entre 25 de Fevereiro de 2001 a 21 de Julho de 2003, o Autor ainda não gozava o ferido anual no período do feriado obrigatório, por isso, a compensação do feriado obrigatório deve ser calculado como: (dias de feriado oficial (13) - feriado gozado (0) x salário mensal/30) x 3 = valor da compensação = MOP9.750,00." Ora, estando provadas as dispensas ao trabalho ainda que autorizadas e justificadas e apesar dos registos emitidos pelos Serviços de Migração indicarem as entradas e saídas do Recorrido no território, não pode o Tribunal a quo, a partir destes registos, considerar que os mesmos possam substituir o registo de assiduidade do Recorrido. E estando provado que o Recorrido dava faltas ao serviço sem que estejam definidos em que dias foram tais faltas dadas, como pode o Digno Tribunal a quo saber que tais faltas ou ausências não tenham ocorrido em algum dos feriados obrigatórios?
15. Mais uma vez se verifica, salvo melhor e douta opinião, uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por parte do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em quantia indefinida quanto aos feriados obrigatórios, já que o mesmo raciocínio se aplica a este pedido de crédito, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art.º 5° do CPC e, bem assim, o disposto nos artigos 17° e 19° do DL 24/89/M. Devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado quanto à compensação sobre a prestação de trabalho do recorrido em dias de feriado obrigatório.
16. Quanto ao trabalho por turnos e trabalho extraordinário, à semelhança do ocorrido com os demais pedidos, o Recorrido limitou-se a invocar factos genéricos não alegando especificadamente quais os factos que permitam concluir que tenha direito a pedir qualquer tipo de compensação a esse título. Isto porque o Recorrido não especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias, e consequentemente quando ocorriam as entradas ao serviço 30 minutos antes do horário de trabalho. Não sendo por isso possível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de prova em julgamento. E mais, se se comprovou que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) não se vislumbra como pôde o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que estava de turno e quantas horas extraordinárias foram feitas por dia já que não se provou em concreto quantos dias o Autor prestou a sua actividade pelo que não se pode com certeza afirmar quantos ciclos de 21 dias de trabalho continuo e consecutivo prestou durante a relação de trabalho até 21/07/2003 e quando entrou ao serviço 30 minutos antes do horário de trabalho, motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar a Recorrente, em violação do artigo 5.° do CPC e do artigo 10.º do DL 24/89/M, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou que tão-somente condene Recorrente a pagar ao Recorrido compensação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no n° 2 do artigo 564º do CPC.
17. Com o devido respeito, a decisão em crise padece ainda do vício de falta de fundamentação por manter na íntegra as conclusões incoerentes aduzidas pelo Autor em sede de petição inicial, ficando por apurar algumas questões vícios que a seguir se enumeram: ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da Ré e quantos foram esses dias de faltas justificadas que vêm referidas pelo Digno Tribunal a quo na decisão sobre a matéria de facto? Ou seja, esta decisão, por essa razão, padece também de vício de falta de fundamentação decorrente do ónus de alegação por parte do Recorrido, sendo, por isso, nula. não subsistindo dúvidas que se impõe a anulação do julgamento, por imposição do estatuído no ali. 571º, b) do CPC, por forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestados pelo Recorrido.
18. Caso assim não seja entendido, e face ao acima exposto a decisão em crise padece do vicio de oposição entre os fundamentos e a decisão, conforme estipulado no artigo 571º, n° 1, alínea c) do Código de Processo Civil, pois existe total contradição entre o que foi dado como provado pelo Digno Tribunal a quo e o que foi decidido, já que tendo ficado provado em relação à 1ª Ré a matéria constante no quesito 10°, que para além dos períodos de férias anuais o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem e autorização, ou seja, tendo ficado provado que o Autor deu faltas justificadas ao serviço (...) como pode tribunal a quo apurar os dias de efectivo trabalho do Autor e assim condenar a Ré A no pagamento da compensação relativa ao subsídio de alimentação, ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, ao descanso compensatório, ao trabalho prestado em dia de feriado e trabalho extraordinário por turnos, á compensação da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo, tal como se alude na douta sentença recorrida?
19. Ressalvando sempre o devido respeito por opinião diversa, parecem não subsistir dúvidas que se encontra a douta sentença ferida de nulidade nos termos e para os efeitos do artigo 571º, nº 1, alínea c) do Código de Processo Civil, pelo que deverá a mesma ser revogada nesta palie e substituída por outra que absolva a 1ª Ré A do peticionado a título de subsídio de alimentação, ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, ao descanso compensatório, prestado em dia de feriado e trabalho extraordinário por turnos e á compensação da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo.
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O Autor respondeu à motivação do recurso da Ré, nos termos constantes a fls. 641 a 649, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
1. Entre 01 de Agosto de 1998 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (cfr. doc.1). (A)
2. Conforme informação prestada pelo Gabinete para os Recursos Humanos da RAEM (GRH), o Autor exerceu a sua prestação de trabalho para a Ré ao abrigo de um Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre a Ré e a Sociedade ECONFORCE – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. (B)
3. Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor prestou trabalho nos locais (postos de trabalho) indicados pela Ré. (C)
4. Durante o período que prestou trabalho, a Ré pagou ao Autor a quantia de MOP$7,800.00, a título de salário de base mensal (cfr. doc. de fls. 28). (D)
5. Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (1.º)
6. Durante o tempo que prestou trabalho para a Ré, o Autor nunca deu qualquer falta injustificada. (2.º)
7. Para um período de trabalho de 8 horas de trabalho por dia e de 6 dias por semana. (3.º)
8. Aquando do recrutamento do Autor no Nepal foi garantido ao Autor que teria direito a alimentação e alojamento gratuitos em Macau. (4.º)
9. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (5.º)
10. Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (6.º)
11. Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, que “(…) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território”. (7.º)
12. Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, a Ré nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais incluindo-se as gorjetas que pagou a todos os demais trabalhadores residentes, incluindo guardas de segurança. (8.º)
13. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (9.º)
14. Durante todo o período da relação laboral, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte da 1ª Ré. (10.º)
15. Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, a Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia a título de subsídio mensal de efectividade. (11.º)
16. Entre 01/08/1998 e 31/12/2002, a Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (12.º)
17. A Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (13.º)
18. A Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (14.º)
19. A Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal. (15.º)
20. Durante o referido período de tempo, a Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.º)
21. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho para a Ré, a Ré procedeu ao desconto da quantia de HKD$750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (18.º)
22. O desconto no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela Ré. (18.º-B)
23. Mesmo que o trabalhador (leia-se, do Autor) optasse por residir fora da residência que lhe era destinada pela Ré, sempre lhe seria descontado a quantia de HK$750,00 por cada mês. (18.º-C)
24. Em cada residência residiam cerca de 8 trabalhadores (guardas de segurança de origem nepalesa), cada um dos quais “pagava” à Ré a quantia de HK$750,00. (18.º-D)
25. Era expressamente proibido ao Autor (e aos demais trabalhadores de origem nepalesa que com ele residia) receber quaisquer visitas e/ou familiares no referido apartamento. (18.º-F)
26. Sendo, igualmente, expressamente vedado a entrada de quaisquer pessoas de sexo feminino em qualquer dos alojamentos “providenciados” pela Ré. (18.º-G)
27. Durante todo o período da relação de trabalho com a Ré, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (19.º)
28. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a Ré (A) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
- Turno A: (das 08h às 16h)
- Turno B: (das 16h às 00h)
- Turno C: (das 00h às 08h) (20.º)
29. A Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (21.º)
30. Por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (22.º)
31. O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (23.º)
32. Período durante o qual o Autor estava sujeito às ordens e instruções da Ré. (24.º)
33. A Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia salarial pelo período de 30 minutos que antecediam o início de cada turno e relativamente ao qual o Autor permaneceu sob as ordens e as instruções da Ré. (25.º)
34. Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, o Autor prestou 1656 dias de trabalho efectivo junta da Ré (26.º).
35. O Autor gozou de 24 dias de férias por cada ano civil e tendo-se deslocado ao Nepal, com a excepção do ano 2000 que não chegou a deslocar ao Nepal (28.º).
36. Entre 01/08/1998 e 21/07/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante os 6 dias de feriados obrigatórios (01 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias); 01 de Maio e 01 de Outubro), por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela Ré (A) (16.º e 29.º).
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III – FUNDAMENTAÇÃO
1. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:
Entende a Ré que a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação.
Adiantamos desde já que não lhe assiste razão.
Como é sabido, a fundamentação da sentença visa dar conhecimento às partes quais são as razões de facto e de direito que serviram de base de decisão judicial, ou seja, permitir às partes conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo tribunal, para que possa optar em aceitar a decisão em causa ou impugná-la através dos meios legais.
No caso em apreço, face ao teor da sentença recorrida, na nossa opinião, a mesma não só é suficientemente clara no seu texto para dar conhecimento às partes o discurso justificativo da decisão tomada como tem capacidade para esclarecer as razões determinantes da decisão.
Dela resulta de forma clara que o nº dos dias de trabalho efectivamente prestado pelo trabalhador (Autor) é calculado em função do nº total dos dias anuais, subtraíndo o nº de dias de férias anuais gozadas, uma vez que não resultam provados, nem foram alegados, outros dias de faltas ao serviço do trabalhador.
É de improceder este fundamento do recurso.
2. Da nulidade da sentença por oposição entre factos e a decisão:
Como é sabido, só existe oposição entre fundamentos e decisão quando os fundamentos invocados pelo tribunal conduziriam logicamente ao resultado oposto àquele que foi decidido.
No caso em apreço, o Tribunal a quo através dos cálculos feitos apurou o nº de dias de trabalho efectivo do Autor e com base nesse elemento determinou os montantes compensatórios.
Como se vê, os fundamentos invocados e decisão tomada na sentença recorrida são coerentes e lógicas.
A questão de saber se os fundamentos invocados estão correctos ou não, já não cabe no âmbito da nulidade da sentença por oposição, mas sim prende-se com o mérito da decisão, questão que vamos analisar a seguir.
Face ao expendido, a alegada nulidade não deixará de se julgar improcedente.
3. Do erro de julgamento:
Para a Ré, o Tribunal a quo cometeu erro de julgamento no que respeita ao nº de dias de trabalho efectivo do Autor, já que ficou provado no quesito 10º da Base Instrutória que o Autor deu faltas justificadas além das férias anuais, e assim sendo, sem saber quais são essas faltas, o Tribunal a quo não pode determinar os dias de trabalho efectivo do Autor simplesmente com base nos cálculos efectuados nos termos referidos no ponto nº 1 do presente aresto.
Também não lhe assiste razão.
Em primeiro lugar, não ficou provado que o Autor deu faltas justificadas além das férias anuais.
O que ficou provado é o seguinte:
“Durante todo o período da relação laboral, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte da 1ª Ré”.
Esta factualidade conjugada com o facto provado no quesito 28º de que “O Autor gozou de 24 dias de férias por cada ano civil e tendo-se deslocado ao Nepal, com a excepção do ano 2000 que não chegou a deslocar ao Nepal”, é lógica para o Tribunal retirar a conclusão de que o Autor não deu mais faltas além dos 24 dias de férias anuais autorizados pela Ré, uma vez que não foram alegadas outras faltas justificadas do mesmo, matéria fáctica essa que, a nosso ver, constitui excepção peremptória que obsta ou modifica o pedido do Autor, pelo que incumbe à parte contrária o ónus de alegar e provar.
Pois, como o Autor alegou que só tinha dado aquele nº de dias de faltas, caso a Ré entender que o Autor tinha dado mais faltas do que alegou, tem o ónus de alegar e provar tal matéria fáctica.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso interposto pela Ré, confirmando a sentença recorrida.
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  Custas pela Ré.
  Notifique e D.N..
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RAEM, aos 18 de Outubro de 2018.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong



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448/2018