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Processo n.º 85/2018. Recurso jurisdicional em matéria cível.
Recorrente: A.
Recorrida: B.
Assunto: Marcas. Erro ou confusão do consumidor. Landmark. 置地.
Data do Acórdão: 7 de Novembro de 2018.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
  Existe susceptibilidade de erro ou confusão por parte do consumidor médio em Macau, entre as marcas Landmark e 置地 para a mesma classe de serviços.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
B interpôs recurso judicial do despacho de 13 de Fevereiro de 2017, da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial, da Direcção dos Serviços de Economia, que concedeu o registo da marca N/97774, 置地, para assinalar serviços da classe 36.ª, a A.
Por sentença, de 13 de Julho de 2017, foi julgado improcedente o recurso.
B interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância (TSI) que, por Acórdão de 26 de Abril de 2018, concedeu provimento ao recurso, anulando o despacho recorrido, determinando a sua substituição por outro que negue o registo mencionado.
Inconformada, recorre A para este Tribunal de Última Instância (TUI), formulando as seguintes conclusões:
A. O acórdão recorrido determina a recusa de registo da marca N/97774, destinada a assinalar serviços na classe 36.a, que se caracteriza pelo sinal 置地, porque atenta contra a marca prioritária LANDMARK, da Recorrida, protegida pelos registos N/12113 e N/12114, destinados a assinalar serviços nas classes 36.a e 35.a, respectivamente.
B. Fundamenta o TSI a sua decisão nos motivos que levaram o mesmo TSI, no acórdão proferido no recurso n.o 704/2016, a recusar a marca N/12112, caracterizada pelo sinal 置地, que havia sido pedida pela ora Recorrida para assinalar serviços da classe 42.a.
C. O caso analisado no recurso n.º 704/2016 é totalmente diferente do que ocupa os presentes autos, uma vez que, ali, a marca 置地 foi recusada com fundamento em reprodução ou imitação de direitos prioritários da Recorrente e de sociedades do mesmo grupo sobre o sinal 置地, integrado em sinais complexos: (i) marca N/11861, mista, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para serviços da classe 36.a; (ii) marca N/12024, mista, que contém as expressões 置地廣場酒店澳門, para serviços da classe 42.a ; (iii) nome de estabelecimento E/40 misto, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para administração e gestão de propriedades.
D. Por outro lado, no acórdão proferido no recurso n.º 704/2016 foi expressamente rejeitada a tese da inevitável associação entre LANDMARK e 置地, ao passo que, agora, o TSI julga existir essa indissociabilidade.
E. O acórdão recorrido entra em contradição entre os fundamentos, que impunham a concessão do registo pretendido pela Recorrente, e os fundamentos (?), o que gera nulidade (artigo 571.°, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil) (sic).
F. Nenhuma semelhança se detecta entre LANDMARK e 置地, pelo que não se verifica o requisito básico e indispensável da imitação ou reprodução, muito menos ocorrendo risco de confusão ou de associação, que pudesse ter conduzido à aplicação dos artigos 214.° e 215.° do RJPI.
G. A Recorrente e outras sociedades do grupo que integra são titulares de diversos direitos de propriedade industrial que integram a expressão 置地 (i) marca N/11861, mista, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para serviços da classe 36.a ; (ii) nome de estabelecimento E/40 misto, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para administração e gestão de propriedades; (iii) marca N/12024, mista, que contém as expressões 置地廣場酒店澳門, para serviços da classe 42.a; (iv) marca N/64135, mista, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para serviços da classe 43.a.
H. Tudo justifica a concessão da marca à Recorrente, conforme havia sido já decidido pela DSE e pelo TJB.
I. O acórdão recorrido violou o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 214.° e na alínea c) do n.º 1 do artigo 215.°, ambos do RJPI.


II – Os factos
Os factos considerados provados são os seguintes:
1 – Em 13 de Fevereiro de 2017 a Chefe do Departamento de Propriedade Intelectual (Substituta) dos Serviços de Economia, no âmbito de poderes delegados, concedeu à “A” o registo da marca置地 (que romaniza CHI TEI), que tomou o n.º N/97774, para assinalar serviços da classe 36.ª.
2 – A “B” foi concedido o registo da marca N/12113 que consiste em Landmark, destinada a assinalar serviços da classe 36ª.
3 – A “A” tem registada em Macau a marca N/11861 para serviços da classe 36, nomeadamente os de “Administração de bens imobiliários” que consiste em (doc. fls. 170 e vº).
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- Por acórdão do TSI, de 6/03/2014 foi confirmada a sentença do TJB que tinha julgado improcedente o recurso judicial interposto por “B” contra o registo nº E/40 do Nome do Estabelecimento concedido a “A”.
- “B” é titular da marca registada em Macau N/12113, “LANDMARK” para assinalar produtos da classe 36ª.
- Por acórdão do TSI, de 17/11/2016, Proc. nº 656/2016, foi negado provimento ao recurso jurisdicional e confirmada a sentença que tinha julgado improcedente o recurso judicial interposto pela “A” contra o registo que tinha sido concedido a favor de “B” da marca N/12114, “LANDMARK” destinada a assinalar produtos da classe 35.
- Este registo da marca N/12114 tinha ocorrido por despacho de 12/01/2015, publicado na II Série do Boletim Oficial nº5, de 4 de Fevereiro.
- À empresa “B” havia sido concedido o registo da marca “LANDMARK”, N/12115, mas por acórdão do TSI, de 22/05/2014, no Proc. nº 39/2014, foi confirmada a sentença do TJB, que havia declarado a caducidade dessa marca pelo não uso.
- Por acórdão do TSI, de 24/11/2016, Proc. nº 663/2016, foi concedido parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto pela “A” da sentença do TJB, que tinha julgado improcedente o recurso judicial ali por si interposto contra a recusa de registo da sua marca N/64137, “LANDMARK” para assinalar produtos da classe 43ª por se ter considerado que reproduz a marca registada N/12113, “LANDMARK” para produtos da classe 36ª concedida a “B”.
- Neste aresto (Proc. nº 663/2016) foi decidido revogar a sentença do TJB e determinar à DSE que procedesse ao registo da marca N/64137 “LANDMARK” em favor de “A” para alguns determinados produtos da classe 43, em relação aos quais não havia risco de confusão e afinidade.
- Na mesma data, 24/11/2016, o TSI, no Processo nº 704/2016 negou provimento ao recurso jurisdicional interposto contra a sentença por “B” que tinha julgado improcedente o recurso judicial por si interposto contra a decisão da DSE de recusar-lhe o registo da marca N/12112, consistente em 置地, para produtos da classe 42ª, por considerar haver risco de reprodução e imitação da marca com a marca de “A”.

III – O Direito
1. As questões a resolver
Importa resolver, fundamentalmente, duas questões:
- A primeira, a de saber se o acórdão recorrido enferma de contradição entre os fundamentos;
- A segunda questão é a de saber há risco de confusão entre a marca registada dos autos 置地 e a marca Landmark anteriormente registada para serviços da mesma classe 36.ª.

  2. Nulidade de sentença
  Trata-se de saber se o acórdão recorrido entra em contradição entre os fundamentos.
  Ao contrário do que a ora recorrente defende, afigura-se-nos não haver contradição entre os próprios fundamentos do acórdão recorrido.
  Embora o acórdão recorrido tenha citado em seu abono o seu acórdão de 24 de Novembro de 2016, no Processo n.º 704/2016, fê-lo para invocar a decisão de que os caracteres 置地 não podiam formar uma marca por gerarem confusão com o nome de estabelecimento Landmark. Não o fez para invocar a seu favor o entendimento de tal anterior acórdão, de que os caracteres chineses 置地 como marca são indissociáveis da expressão Landmark, já que o acórdão recorrido acaba por concluir por tal indissociabilidade.
  
3. Marcas. Imitação.
Como se sabe, o registo das marcas é efectuado por produtos ou serviços, competindo à DSE indicar as respectivas classes de acordo com a classificação prevista na lei [artigo 205.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 97/99/M, de 13 de Dezembro (RJPI)].
Como tivemos oportunidade de reflectir no recente acórdão de 20 de Maio de 2015, no Processo n.º 19/2015:
«A marca é um dos direitos de propriedade industrial.
O direito de propriedade industrial confere ao respectivo titular a plena e exclusiva fruição, utilização e disposição das invenções, criações e sinais distintivos, dentro dos limites, condições e restrições fixados na lei [artigo 5.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial (RJPI)].
Como se refere no artigo 197.º do RJPI, “Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”.
A marca destina-se a distinguir produtos ou serviços. Sendo ela “… um sinal distintivo de coisas, há-de ela ser dotada, para o bom desempenho da sua função, de eficácia ou capacidade distintiva, isto é, há-de ser apropriada para diferenciar o produto marcada de outros idênticos ou semelhantes”1.
Como se sabe, vigora em matéria de marcas o princípio da especialidade, segundo o qual a marca há-de ser constituída por forma a que não se confunda com outra anteriormente adoptada para o mesmo produto ou semelhante.
É o que decorre da alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI, que estatui que “O pedido de registo também é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha: b) Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada ”.
  Como explica FERRER CORREIA2 “A marca não pode, portanto, ser igual ou semelhante a outra já anteriormente registada. O grau de semelhança que a marca não deve ter com outra registada anteriormente é definido por este elemento: possibilidade de confusão de uma com outra no mercado. Mas não pode haver confusão entre a marca adoptada para certo produto e a marca adoptada para outro que daquele seja completamente distinto. Por isso a lei restringe o princípio da especialidade da marca aos produtos da mesma espécie ou afins, nessa conformidade tendo substituído ao sistema do registo por classes o sistema de registo por produtos”».
Como mencionámos no Acórdão de 26 de Outubro de 2011, no Processo 38/2011:
«No Acórdão de 21 de Outubro de 2009, no Processo n.º 21/2009 dissemos que se discorda da tese, segundo a qual os caracteres 香港, que significam Hong Kong, juntos aos caracteres 置地 [Chi Tei] (que são a expressão utilizada em chinês para significar Landmark), ou seja, Hong Kong Landmark, permitam ao consumidor médio distinguir claramente a marca da recorrida particular 香港置地 [Hong Kong Chi Tei], ou seja Hong Kong Landmark, do nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza.
Na verdade, não parece que uma designação de proveniência geográfica, como Hong Kong, seja capaz de fornecer eficácia distintiva aos caracteres 置地 [Chi Tei].
Manifestamente, na marca 香港置地 [Hong Kong Chi Tei], que corresponde a Hong Kong Landmark, não é a designação “Hong Kong” que tem eficácia distintiva. É antes 置地 [Chi Tei], ou seja, “Landmark”.
O mesmo acontece no nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza. O que tem capacidade distintiva é 置地 [Chi Tei], ou seja, “Landmark”.
Da mesma maneira, recorrendo a um exemplo, nos nomes Holiday Inn Hong Kong e Holiday Inn Plaza, o que tem carácter distintivo é Holiday Inn e não Hong Kong ou Plaza. Um consumidor médio pensará que há ligação entre os dois nomes. Isto sem esquecer que, provavelmente, Holiday Inn é uma marca mais forte que Landmark.
O mesmo se diga quanto à firma de duas das recorrentes. O elemento característico é a palavra Landmark.
No caso dos autos, um consumidor médio em Macau, que não faça um exame atento ou confronto, pode confundir o nome do estabelecimento e as duas firmas com a marca, pode pensar que a marca está ligada ao estabelecimento de hotel Landmark, que aquela marca provém deste estabelecimento.
Afigura-se-nos, portanto, que a mencionada marca, a que foi concedido o registo em Macau, é susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão com o nome do estabelecimento».
Mantemos o mesmo entendimento deste anterior acórdão: entre a população de Macau, que é maioritariamente chinesa, tal como os turistas que nos visitam, há uma evidente associação entre os caracteres 置地 e a expressão inglesa Landmark, até porque a grande maioria destes consumidores não lê inglês. Para a maioria dos consumidores de Macau ao ler 置地 está a representar Landmark.
Logo, estando registada a marca Landmark para serviços da classe 36.ª não podia ter sido concedida a marca 置地 para a mesma classe de serviços.
Improcede, assim, o recurso.

IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Macau, 7 de Novembro de 2018.

Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai


     1 FERRER CORREIA, Lições de Direito Comercial, Universidade de Coimbra, Volume I, 1973, p. 323.
     2 FERRER CORREIA, Lições …, p. 328 e 329.
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