打印全文
Processo nº 288/2018
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 25 de Outubro de 2018
Descritores:
- Revisão de sentença
- Divórcio
- Regulação do poder paternal

SUMÁRIO:

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos à competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do nº1, do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.

Proc. nº 288/2018

Acordam no Tribunal de Segunda Instancia da RAEM

I – Relatório
A, divorciado, residente em Macau, na XXX, ------
Instaurou acção especial de confirmação de sentença proferida por tribunal do exterior de Macau ------
Contra:
B, divorciada, residente em Macau, na XXX.
*
Citada, a requerida não contestou.
*
O MP não se opôs ao deferimento do pedido.
*
Cumpre decidir.
***
II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da matéria, nacionalidade e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
***
III – Os Factos
1 – Requerente e requerida contraíram casamento civil na República Popular da China no dia 25 de Junho de 1993.
2 – Por sentença proferida em 29/01/2008, pelo Tribunal Popular do Distrito de Xiang Zhou, da cidade de Zhuhai, na Província de Guandong, foi este casamento dissolvido em autos de divórcio por mútuo consentimento.
3 – A referida sentença tem o seguinte teor:
Escritura Pública
Cartório Notarial de Zhu Hai, Cidade de Zhu Hai, Província de Guang Dong, República Popular da China
Tribunal Popular do Distrito de Xiang Zhou, da Cidade de Zhu Hai, da Província de Guangdong
Termo de Conciliação Cível
(2008) 香(Tribunal Popular do Distrito de Xiang Zhou) 民一(1º Juízo Cível) 初字(1ª Instância) 第636號(n.º 636)
Autor: A, do sexo masculino, da etnia Han, nascido de 7 de Julho de 1970, residente na XXX, Cidade de Zhu Hai, titular do Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente da RAEM n.º XXX.
Mandatário constituído: C, do sexo masculino, da etnia Han, nascido de 13 de Setembro de 1983, residente no XXX, Cidade de Zhu Hai, titular do Cartão de Identidade da República Popular da China n.º XXX.
Ré: B, do sexo feminino, da etnia Han, nascido de 31 de Janeiro de 1971, residente na XXX, Cidade de Zhu Hai, titular do Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente da RAEM n.º XXX.
Mandatário constituído: D, do sexo masculino, da etnia Han, nascido de 1 de Agosto de 1978, residente na XXX, Cidade de Zhu Hai, titular do Cartão de Identidade da República Popular da China n.º XXX.
No dia 25 de Janeiro de 2008, o presente tribunal instruiu e admitiu o caso de conflitos de divórcio do Autor A e da Ré B, procedendo-se ao julgamento ao público e com intervenção do tribunal colectivo constituído pelo Juiz Presidente XXX, Julgador de Representação XXX e Julgador de Representação XXX nos termos da lei.
 O Autor alegou que, após ter estabelecido o relacionamento amoroso, no dia 25 de Junho de 1993, o Autor e a Ré contraíram matrimónio no Distrito de Xiang Zhou, na Cidade de Zhu Hai, durante o período de casamento, as partes deram vida à filha E no dia 18 de Janeiro de 1996, e deram vida ao filho F no dia 18 de Outubro de 2000. Devido às diferentes personalidades, as partes não conseguiram a viver em conjunto. Nesta situação, as partes requerem que o tribunal ordene a dissolução da relação conjugal das partes; 2. Ordene que a Ré será responsável pelo cuidado da filha E e do filhoF nascidos dentro do casamento.
Após a conciliação presidida pelo presente tribunal, ambas as partes chegam voluntariamente ao seguinte acordo:
1. O Autor A e a Ré B concordam com o divórcio por mútuo consentimento.
2. A Ré B será responsável pelo cuidado da filha E e do filhoF nascidos dentro do casamento.
3. Após a redução em metade da despesa, a despesa de admissão é de RMB200,00, o AutorA será responsável pela despesa. (Já pago)
O acordo supracitado satisfaz às respectivas disposições legais, o presente tribunal confirmou o acordo.
O termo de conciliação terá a força jurídica após ter sido assinado e recebido pelas partes.
Juiz Presidente XXX
Julgador de Representação XXX
Julgador de Representação XXX
29/01/2008
Está conforme.
Escrivã XXX
4 – Esta decisão transitou em julgado no mesmo dia 29/01/2008.
***
IV – O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida; 342/2009 28/34
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos não se conhece do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos então os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Ora, os documentos constantes dos autos reportam e certificam a situação de divórcio entre requerente e requerido, que foi decretada por decisão proferida pelo tribunal competente da República Popular da China.
Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da decisão que decidiu sobre o exercício do poder paternal dos dois filhos comum de ambos.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, também o direito substantivo de Macau prevê o divórcio e a regulação do exercício do poder paternal.
Assim, cremos estarem reunidos os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b) a e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos. Na verdade, o trânsito da decisão já ocorreu. A decisão foi proferida por entidade competente e não versa sobre matéria exclusiva da competência dos tribunais de Macau, face ao que consta do art. 20º do Cód. Proc. Civil.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
***
V - Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a sentença de divórcio acima referida, nos precisos termos acima transcritos.
Custas pelo requerente.
T.S.I., 25 de Outubro de 2018
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong





288/2018 8