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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 05/11/2018 ---------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Juiz José Maria Dias Azedo -----------------------------------------------------------


Processo nº 687/2018
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)

Relatório

1. A, arguido com os restantes sinais dos autos, vem recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou como autor material da prática 1 crime de “ofensa simples à integridade física”, p. e p. pelo art. 137°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução por 2 anos, na condição de, no prazo de 30 dias, pagar à “B”, a quantia de MOP$10.000,00, assim como no pagamento de MOP$50.000,00 de indemnização à ofendida/assistente C; (cfr., fls. 338 a 345-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o arguido recorreu.

Em sede da sua motivação e conclusões de recurso, assaca ao Acórdão recorrido o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” e “errada aplicação de direito”; (cfr., fls. 358 a 364).

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Responderam o Ministério Público e a assistente, pugnando pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 366 a 368 e 370 a 371).

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Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação de fls.358 a 364 dos autos, o recorrente solicitou a absolvição do crime de ofensa simples à integridade física imputado a si pelo Tribunal a quo, assacando ao Acórdão um erro de direito e um vício de insuficiência para decisão da matéria de facto provada, consagrados nos n.°1 e alínea a) do n.°2 do art.400° do CPP.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.366 a 368 dos autos), no sentido do não provimento do presente recurso.
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Ora, o 17° facto provado assevera que “自遭到嫌犯的上述侵犯後,被害人的情緒變得不穩定,常常感到驚恐不安而哭泣,出現入睡困難及早醒後不能再睡的症狀,有時半夜會驚叫,但經叫喚也沒有回應。上述事件導致被害人的集中和記憶力變差;生活功能下降;在人際方面變得較保有距離;情感上變得不如過往快樂。同時使被害人留下心理的困擾、焦慮及抑鬱狀態,並且對自身安全及自信心不足,想依賴他人,擔心別人的眼光或負面的評價而傾向疏離別人及避免親密關係,令被害人患上急性壓力疾患,使其精神健康受到損害,需要接受心理治療。”
Por sua vez, o 19° facto provado constata: “嫌犯明知不可仍在為被害人診症之時,多時隔着被害人的上衣或直接將手伸進被害人的上衣內搓揉被害人的乳房,令被害人留下心理的困擾、焦慮及抑鬱狀態,使被害人的精神健康受到損害。”
Sem embargo do muito respeito pela opinião diferente, inclinamos a entender que o recorrente praticou ofensa e provocou lesão na saúde da ofendida, para os efeitos consignados no n.°1 do art.137° do CPM, e a matéria de facto provada, na sua globalidade, mostra adequada e suficiente para sustentar a decisão de condená-lo em praticar, em autoria material forma consumada, um crime p.p. pelo n.°1 do art.137° do CPM.
Com efeito, há boa doutrina que preconiza (apud. Comentário Conimbricense do Código Penal, dirigido por Jorge de Figueiredo Dias, 2ª ed., Coimbra, p.308): “A neurose traumática é uma verdadeira doença quando a lesão psíquica se revela através de sintomas fisiológicos e psicológicos imediatos relacionados com uma trauma físico ou psíquico de intensidade apreciável (……)”.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 383 a 383-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 340 a 341-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor material da prática 1 crime de “ofensa simples à integridade física”, p. e p. pelo art. 137°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 1 ano de prisão suspensa na sua execução por 2 anos, na condição de, no prazo de 30 dias, pagar à “B”, a quantia de MOP$10.000,00, assim como no pagamento de MOP$50.000,00 de indemnização à ofendida/assistente dos autos.

Entende que a decisão recorrida padece do vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” e “errada aplicação de direito”.

E, como (igualmente) já se deixou adiantado, patente é a improcedência do recurso, sendo antes de se acompanhar, na íntegra, o teor da Resposta e douto Parecer do Ministério Público que dá uma clara e cabal resposta ao recurso do arguido, e que, por uma questão de economia processual, aqui se dá como reproduzido.

Seja como for, não se deixa de consignar o que segue.

–– Vejamos, começando-se pelo assacado vício da “decisão da matéria de facto”.

Repetidamente temos afirmado que o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 25.01.2018, Proc. n.° 1149/2017, de 14.06.2018, Proc. n.° 451/2018 e de 06.09.2018, Proc. n.° 677/2018, podendo-se também sobre o dito vício em questão e seu alcance, ver o Ac. do Vdo T.U.I. de 24.03.2017, Proc. n.° 6/2017).

Como decidiu o T.R. de Coimbra:

“O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, existe quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem dados e elementos para a decisão de direito, considerando as várias soluções plausíveis, como sejam a condenação (e a medida desta) ou a absolvição (existência de causas de exclusão da ilicitude ou da culpa), admitindo-se, num juízo de prognose, que os factos que ficaram por apurar, se viessem a ser averiguados pelo tribunal a quo através dos meios de prova disponíveis, poderiam ser dados como provados, determinando uma alteração de direito.
A insuficiência para a decisão da matéria de facto existe se houver omissão de pronúncia pelo tribunal sobre factos relevantes e os factos provados não permitem a aplicação do direito ao caso submetido a julgamento, com a segurança necessária a proferir-se uma decisão justa”; (cfr., Ac. de 17.05.2017, Proc. n.° 116/13, in “www.dgsi.pt”).

E, como igualmente também considerou o T.R. de Évora:

“A insuficiência da matéria de facto para a decisão não tem a ver, e não se confunde, com as provas que suportam ou devam suportar a matéria de facto, antes, com o elenco desta, que poderá ser insuficiente, não por assentar em provas nulas ou deficientes, antes, por não encerrar o imprescindível núcleo de factos que o concreto objecto do processo reclama face à equação jurídica a resolver no caso”; (cfr., o Ac. de 26.09.2017, Proc. n.° 447/13).

“Só existe tal insuficiência quando se faz a “formulação incorreta de um juízo” em que “a conclusão extravasa as premissas” ou quando há “omissão de pronúncia, pelo tribunal, sobre factos alegados ou resultantes da discussão da causa que sejam relevantes para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados ou como não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão”; (cfr., o Ac. da Rel. de Évora de 21.12.2017, Proc. n.° 165/16).

“O vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada traduzir-se-á, afinal, na falta de elementos fácticos que permitam a integração na previsão típica criminal, seja por falência de matéria integrante do seu tipo objectivo ou do subjectivo ou, até, de uma qualquer circunstância modificativa agravante ou atenuante, considerada no caso. Em termos sintéticos, este vício ocorre quando, com a matéria de facto dada como assente na sentença, aquela condenação não poderia ter lugar ou, então, não poderia ter lugar naqueles termos”; (cfr., o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 647/14).

No caso dos presentes autos, de uma (mera) leitura ao Acórdão recorrido se constata que o Tribunal a quo emitiu expressa pronúncia sobre “toda a matéria objecto do processo”, elencando a que do julgamento resultou “provada” (e “não provada”), justificando, adequadamente, esta sua decisão; (cfr., fls. 340 a 343).

Dest’arte, patente é que não padece a decisão recorrida do imputado vício de “insuficiência”. Aliás, como no recente Ac. da Rel. de Coimbra de 12.09.2018, Proc. n.° 28/16, se decidiu, inexiste insuficiência da matéria de facto provada para a decisão “quando os factos dados como provados permitem a aplicação segura do direito ao caso submetido a julgamento”, sendo, como se verá, este o caso dos autos).

–– Passemos, agora, para o alegado “erro na aplicação do direito”.

Nos termos do art. 137° do C.P.M.:

“1. Quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
2. O procedimento penal depende de queixa.
3. O tribunal pode dispensar de pena quando:
a) Tiver havido lesões recíprocas e não se tiver provado qual dos contendores agrediu primeiro; ou
b) O agente tiver unicamente exercido retorsão sobre o agressor”.

E, perante a matéria de facto dada como provada, muito não se mostra de dizer, pois que como – bem – nota o Ilustre Procurador Adjunto, a dita factualidade provada contém todos os elementos típicos objectivos e subjectivos do crime pelo qual foi o ora recorrente condenado; (cfr., v.g., os “factos 17° e 19°”).

Diz o recorrente que a sua conduta não causou nenhuma “lesão” à ofendida.

Incorre em patente equívoco.

Importa pois atentar que o n.° 1 do art. 137° do C.P.M. prevê como “elemento objectivo” do dito crime de “ofensa à integridade física” a “ofensa ao corpo ou saúde de outra pessoa”.

E como já tivemos oportunidade de afirmar, pode haver “ofensa à integridade física de uma pessoa”, sem que esta sofra “lesão, dor ou incapacidade para o trabalho”, pois que o crime em questão não implica “lesões no ofendido”; (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 23.05.2013, Proc. n.° 887/2012, o Ac. do S.T.J. de 18.12.1991, Proc. n.° 41618, in D.R., I-A, n.° 33, de 08.02.1992, pág. 775, e o Ac. da Rel. de Guimarães de 04.03.2013, Proc. n.° 159/11, in “www.dgsi.pt”, aqui citados como mera referência).

Assim, em face do exposto, e outra questão não havendo a apreciar, visto está que o presente recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência.

Decisão

4. Nos termos do exposto, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 05 de Novembro de 2018
José Maria Dias Azedo
Proc. 687/2018 Pág. 12

Proc. 687/2018 Pág. 13