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Processo n.º 961/2017
(Recurso Civil)
Data : 08 de Novembro de 2018

Recorrentes : Recurso Final
       - A (Autor)
       Recurso Interlocutório
       - B (1ª Ré)

Recorridos : - Os mesmos
- Sociedade de Construção e Fomento Predial X X, SARL (2ª Ré)
       - C (4º Réu) (C)
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    I - RELATÓRIO
A (Autor), Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando parcialmente da sentença proferida pelo tribunal de primeira instância, dela veio recorrer para este TSI, tendo formulado as seguintes conclusões :
1. O Tribunal a quo julgou provado o pedido, subsidiário, do A. de enriquecimento sem causa.
2. Acabando por condenar a l.ª Ré a pagar ao A. “ ... o montante a ser liquidado em execução de sentença, com a quantia de MOP$6.863.500,00, depois de ser deduzido o valor correspondente à metade dos empréstimos bancários devido ao Banco XX, S.A, concedidos para a aquisição das fracções, contados a partir da ruptura da união de facto ocorrida em 10 de Outubro de 2011, com os juros de mora calculados à taxa legal desde a liquidação.”
3. Ora, se na decisão de condenar a 1.ª Ré no pagamento de metade do valor dos bens, MOP$6.863.500,00, pelo enriquecimento que esta obteve à custa do A. nada há a censurar;
4. Já no que diz respeito à dedução do valor correspondente à metade dos empréstimos bancários devido ao Banco XX, S.A, concedidos para a aquisição das fracções, contados a partir da ruptura da união de facto ocorrida em 10 de Outubro de 2011,
5. E no que diz respeito aos juros de mora calculados à taxa legal desde a liquidação,
6. Não obtém a aquiescência do aqui Recorrente.
7. Salvo o devido respeito, que é muito, entendemos que o Tribunal a quo andou mal.
8. Tivesse o Tribunal a quo atendido aos documentos juntos pelo A. no seu requerimento de 2/3/2015, fls. 682 a 699, e mais recentemente o documento junto pelo A. em 6/9/2016 e teria decidido de outra forma.
9. Teria constatado que o A., ainda hoje, deposita na conta da 1.ª Ré, BXX n.º ..., conta original onde era descontada a prestação, o valor de MOP$6.295,35.
10. Este é, exactamente, o valor da prestação do empréstimo bancário devido ao Banco XX, S.A, concedido para aquisição das fracções.
11. Aliás, ao confrontarmos os extracto bancário da conta n.º ... (junto em 6/9/2016), em nome do Recorrente, A, e da 1.ª Ré, B, com o extracto da conta n.º ... (junta como doc. 24 pela 1.ª Ré em 7/9/2016), apenas em nome da 1.ª Ré, B, constatamos que a coincidência de valores é total.
12. A cada depósito do Recorrente, no valor de MOP$6.295,35, na conta original do empréstimo (...), a 1.ª Ré transfere imediatamente o mesmo valor para a sua conta n.º ....
13. Pelo que dúvidas não restam que é o A., ora Recorrente, quem tem pago a totalidade das prestações do empréstimo bancário devido ao Banco XX, S.A, concedido para aquisição das fracções.
14. Não havendo, por essa razão, nada que deduzir ao valor de MOP$6.863.500,00 que a 1.ª Ré tem que pagar ao A.
15. O Tribunal a quo tem nos autos prova suficiente para fazer, ele próprio a liquidação.
16. Não precisa de remeter as partes para a liquidação em execução de sentença.
17. Devia, por outro lado, liquidar o valor a devolver pela 1.ª Ré no montante exacto de MOP$6.863.500,00, condenando a 1.ª Ré em juros de mora, desde essa liquidação e não de uma futura.
18. Ou seja, numa acção que deu entrada em juízo no ano de 2012, cinco anos depois, o Tribunal a quo, tendo toda a documentação necessária para decidir remete as partes para a liquidação em execução de sentença! ...
19. Estamos, assim, perante uma omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo pois, deixou de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
20. O que o artigo 571.º, n.º 1 al. d) do CPC sanciona com a nulidade, que se invoca.
21. Diz-nos o artigo 744.º do CC que: “O devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas por causa dela ou de danos por ela causados.”
22. In casu, o crédito do Recorrente sobre a 1.ª R. resulta exactamente das despesas que aquele efectuou por causa das coisas que pretende reter, nomeadamente o preço pago pelos imóveis, as despesas de reparação e decoração e anda os impostos que suportou.
23. Pelo que dúvidas não restam sobre o direito que assiste ao A. de reter todos os bens supra referidos até que a 1.ª R. satisfaça o crédito do A.
24. O Tribunal a quo violou o artigos 571.º, n.º 1, al. d) do CPC e 744.º do CC
*
B (1.ª Ré), Recorrida nos autos referenciados, vem apresentar as suas alegações, formulado as seguintes conclusões :
1) Os bens adquiridos durante a união de facto podem ser de um dos unidos de facto ou de ambos, conforme os bens hajam sido adquiridos só por um deles ou por ambos em compropriedade, tendo aquele que não adquiriu o bem direito a ser ressarcido na medida do seu contributo para a aquisição do mesmo bem por aquele que tem o bem no seu património.
2) O montante do contributo para aquisição do bem - o empobrecimento - tem que ser alegado e provado - e o enriquecimento do adquirente do bem é determinado pela proporção desse contributo para a aquisição do bem; a falta de alegação e prova da proporção do contributo para a aquisição do bem, não se resolve a favor do "alegado empobrecido" a quem compete, nos termos do art. 335.º, n.º 1, do. Código Civil, alegar e provar os factos constitutivos do seu direito.
3) A contribuição indistinta para as despesas de economia doméstica dos unidos de facto, não releva para efeitos da determinação deste contributo para a aquisição do bem, pois elas tem outra causa que se não prende com tal aquisição, mas com a vivência em comum em condições análogas às dos cônjuges, e não dão direito a restituição _ entendimento diverso faria indevida interpretação e aplicação dos artigos 1471.° e 1536.° do Código Civil.
4) O depósito de quantias em conta conjunta de A. e 1.ª R, ainda que coincidentes com algumas das prestações mensais de amortização do empréstimo contraído pela 1.ª R junto do "Banco XX, S.A.", após a cessação da união de facto em nada relevam para determinar o enriquecimento da 1.ª R que tenha por causa um empobrecimento do A., que haja sido determinado por uma causa que entretanto deixou de existir e que o A. pretende seja a cessação da união de facto - a cessação da vivência em comum em condições análogas às dos cônjuges - pois as mesmas foram pela primeira vez depositadas em tal conta, em Fevereiro de 2013, ou seja, mais de um ano após a referida cessação que se verificou em 10 de Outubro de 2011, e nem sequer foram depositadas todos os meses após esse mês de Fevereiro de 2013, nada havendo sido alegado e provado pelo A. relativamente à falta de causa justificativa para estes depósitos na conta conjunta de A. e 1.ª R e se os mesmo determinam um empobrecimento no seu património que é causa directa de um enriquecimento da 1.ª R
5) Aliás estando o A. a fruir sem causa legítima, designadamente, a fracção "C21" e o parque de estacionamento "CV1-130", que se, desocupados poderiam ter sido arrendados, em finais de 2011, pelas rendas mensais de MOP$15,00C.00 e MOP$2,000.00, e, ao longo dos anos decorridos, desde então, por quantias muito superiores, é certo e seguro que não existe qualquer empobrecimento do A. que haja determinado qualquer enriquecimento à 1.ª R, pelo contrário, é o A. que está obter um enriquecimento à custa do empobrecimento da 1.ª R. sem causa justificativa, desde a data da cessação da união de facto entendimento contrária faria indevida interpretação e aplicação do artigo 467.° do Código Civil.
6) Se o bem foi adquirido por um dos unidos do facto, o outro não tem direito à sua fruição, senão enquanto a mesma lhe for permitida pelo adquirente, por estarem a viver em condições análogas às dos cônjuges, devendo cessar de imediato essa fruição no momento da cessação da união de facto, designadamente, se pelos seus actos anteriores a tal cessação se verificar que não quer viver em condições análogas às dos cônjuges.
7) O direito de retenção da coisa só pode existir se, em primeiro lugar, o titular detiver licitamente a coisa que está obrigado a entregar a outrém; em segundo lugar, tem que ser credor daquele a quem deve a restituição; em terceiro lugar que entre os dois créditos haja uma relação de conexão, ou seja, o crédito do retentor tem que resultar de despesas feitas por causa da coisa ou de danos por ela causados - entendimento diverso, faria indevida interpretação e aplicação do artigo 744.° do Código Civil.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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    III - FACTOS
Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:
Da Matéria de Facto Assente:
- Em 17 de Outubro de 2000, nasceu D, filha de A e de B. (alínea A) dos factos assentes)
- Em 23 de Março de 2004 a 1ª Ré outorgou a escritura de compra e venda com mútuo e hipoteca, declarando comprar as fracções autónomas designadas por:
* “C21” sita em Macau, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao 21.º Andar C, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição ...;
* “A1-130” sita em Macau, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-130, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição ...;
* “A1-131” sita em Macau, na freguesia da Nossa senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-131, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição .... (alínea B) dos factos assentes)
- No dia 27/03/2006, a R. declarou comprar a fracção autónoma denominada “C/V1-133” sita em Macau, na freguesia da Sé, na ..., correspondente ao parque de estacionamento C/V1-133, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º .... (alínea C) dos factos assentes)
Da Base Instrutória:
- O Autor e a 1ª Ré viveram juntos pelo menos desde 1994 até 10 de Outubro de 2011, em Macau. (resposta ao quesito 1º da base instrutória)
- No período referido no item anterior Autor e 1ª Ré, viviam na mesma casa, dormiam na mesma cama, comiam na mesma mesa e partilhavam as refeições. (resposta ao quesito 2º da base instrutória)
- No período referido no item 1º Autor e 1ª Ré juntavam os seus rendimentos e pagavam em conjunto as suas despesas sem qualquer distinção ou preocupação de equidade. (resposta ao quesito 3º da base instrutória)
- No período referido no item 1º Autor e 1ª Ré recebiam amigos, convidados e correspondência, na residência de ambos. (resposta ao quesito 4º da base instrutória)
- No período referido no item 1º Autor e 1ª Ré auxiliavam-se mutuamente na doença. (resposta ao quesito 5º da base instrutória)
- No período referido no item 1º Autor e 1ª Ré apresentavam-se publicamente como marido e mulher e sendo assim tratados pelas pessoas das suas relações. (resposta ao quesito 6º da base instrutória)
- No período referido no item 1º Autor e 1ª Ré nunca se separaram. (resposta ao quesito 7º da base instrutória)
- No período referido no item 1º Autor e 1ª Ré relacionaram-se afectiva e sexualmente. (resposta ao quesito 8º da base instrutória)
- A 10 de Outubro de 2011, a 1.ª R. abandonou a residência comum em Macau e abandonou esta região, levando consigo a filha de ambos. (resposta ao quesito 9º da base instrutória)
- Na data referida no item anterior a 1ª Ré pôs termo à comunhão de vida entre si e o Autor. (resposta ao quesito 10º da base instrutória)
- Em 16 de Novembro de 2000 foi decretado o divórcio entre E e o Autor. (respostas aos quesitos 11º e 12º da base instrutória)
- Após o decretamento do divórcio entre o Autor e E, esta passou insistentemente a solicitar-lhe o pagamento de pensão de alimentos, ameaçando-o de que intentaria acção e de que lhe executaria bens nesse sentido. (resposta ao quesito 13º da base instrutória)
- A E instaurou acção declarativa contra o ora Autor no âmbito da qual este foi condenado a pagar àquela pensão de alimentos. (resposta ao quesito 14º da base instrutória)
- Aquando da aquisição referida em B) corria, em Portugal, a acção de alimentos instaurada pela ex-mulher do Autor contra este, pelo que, com receio de eventual futura penhora dos bens referidos em B) por parte da ex-mulher do Autor, este a 1ª Ré decidiram que embora as fracções referidas em B) fossem adquiridas pelo Autor e 1ª Ré apenas esta outorgaria como adquirente na escritura referida em B). (resposta ao quesito 15º da base instrutória)
- Aquando do referido em B) o Autor tinha 54 anos de idade o que limitava o prazo do empréstimo bancário para a compra da casa pelo que, o Autor, a 1ª Ré decidiram que embora as fracções referidas em B) fossem adquiridas pelo Autor e 1ª Ré apenas esta outorgaria como adquirente na escritura referida em B). (resposta ao quesito 16º da base instrutória)
- Relativamente às aquisições referidas em B) o preço do sinal foi pago com dinheiro levantado de uma conta de que o Autor e da 1ª Ré eram titulares e cujo saldo havia sido constituído por depósitos e transferências de dinheiro proveniente dos rendimentos de ambos. (resposta ao quesito 20º da base instrutória)
- Para o pagamento do resto do preço das aquisições referidas em B) foi contraído um empréstimo, apenas, em nome da 1ª Ré, 23 anos mais nova que o Autor, sendo muito mais vantajoso para o Autor e 1ª Ré pois, poderia ser de prazo alargado. (resposta ao quesito 21º da base instrutória)
- Na data referida em B) Autor e 1ª Ré fixaram a casa de morada de família no 21.º andar da ..., n.º 3 - 21.° Andar C, na Ilha da Taipa. (resposta ao quesito 22º da base instrutória)
- O preço das fracções referidas em B), bem como, as prestações mensais do empréstimo bancário celebrado com o BXX foram pagos pelo Autor e pela 1.ª Ré. (resposta ao quesito 23º da base instrutória)
- O seguro de incêndio é debitado, a partir de 2012, duma conta na titularidade da 1ª Ré afecta ao pagamento de empréstimo. (resposta ao quesito 25º da base instrutória)
- Foram o Autor e a 1ª Ré quem escolheu em conjunto os materiais usados nas obras de remodelação da fracção e como tais trabalhos deveriam ser realizados. (resposta ao quesito 26º da base instrutória)
- Todas as despesas com manutenção, fornecimento de energia eléctrica, água, telefone, limpeza, pintura, reparações ou gás, das fracções referidas em B) foram, ao longo destes anos, suportadas pelo Autor e pela 1ª Ré. (resposta ao quesito 30º da base instrutória)
- As despesas com as utilidades relativas ao uso do imóvel pelo agregado familiar, algumas eram suportadas pelo A., outras pelo seu serviço - como as taxas fixas dos telefones -, outras pela 1.ª Ré. (resposta ao quesito 31º da base instrutória)
- Os impostos devidos pelas fracções referidas em B) são pagos em conjunto pelo Autor e 1ª Ré. (resposta ao quesito 32º da base instrutória)
- Aquando da aquisição referida em C) com receio de eventual futura penhora dos bens referidos em C) por parte da ex-mulher do Autor, este a 1ª Ré decidiram que embora a fracção referida em C) fosse adquirida pelo Autor e 1ª Ré apenas esta outorgaria como adquirente na escritura referida em B). (resposta ao quesito 33º da base instrutória)
- O 4º Réu incumbiu a Agência Comercial Predial X (X地產) promovesse a venda do lugar de estacionamento referido em C). (resposta ao quesito 34º da base instrutória)
- Em 1 de Março de 2006, através das Agência Comercial Predial X e “X Properties Limited (Macau) X置業(澳門)有限公司”, o lugar de estacionamento referido em C) foi escriturado a favor da B e assinado o contrato cuja cópia consta de folhas 163 a 165. (resposta ao quesito 35º da base instrutória)
- Aquando do referido no item anterior o 4º Réu constituiu procuradores para tratar dos procedimentos acerca de compra e venda do dito lugar de estacionamento. (resposta ao quesito 36º da base instrutória)
- O 4.º Réu não conhece o Autor nem a 1ª Ré nem nunca com eles se encontrou. (resposta ao quesito 37º da base instrutória)
- O preço da aquisição referida em C) foi pago com dinheiro proveniente indistintamente dos rendimentos do Autor e da 1ª Ré. (resposta ao quesito 38º da base instrutória)
- São o Autor e a 1ª Ré quem suporta em conjunto o pagamento dos impostos relativos ao imóvel referido em C). (resposta ao quesito 39º da base instrutória)
- O preço de compra do veículo automóvel, com a matrícula MM-XX-XX, marca SUZUKI GRAND VITARA, bem como os respectivos impostos e seguros, foram pagos com dinheiro do Autor e da 1ª Ré. (resposta ao quesito 43º da base instrutória)
- O Autor era assessor jurídico do Secretário para as Obras Públicas e Transportes. (resposta ao quesito 45º da base instrutória)
- A 1ª Ré era adjunta técnica na área de recursos humanos do IPIM. (resposta ao quesito 46º da base instrutória)
- O salário do Autor era superior ao da Ré. (resposta ao quesito 47º da base instrutória)
- O Autor e a 1ª Ré quiseram adquirir para ambos os bens indicados em B), C) e item 35º. (resposta ao quesito 48º da base instrutória)
- O A. não quis que os bens referidos no item anterior fossem logo integrados no seu património e que, constituindo garantia geral de satisfação de direitos de seus credores, pudesse ser executados pela sua ex-mulher. (resposta ao quesito 49º da base instrutória)
- As contas conjuntas do Autor e 1ª Ré eram constituídas com depósitos e transferências de dinheiro provenientes dos vencimentos do A. e 1.ª R. e de outros rendimentos de capital e aplicações financeiras. (resposta ao quesito 52º da base instrutória)
- A fracção “C21” tem o valor de MOP$9.227.000,00. (resposta ao quesito 56º da base instrutória)
- A fracção “A1-130” tem o valor de MOP$1,540,000.00. (resposta ao quesito 57º da base instrutória)
- A fracção “A1-131” tem o valor de MOP$1,540,000.00. (resposta ao quesito 58º da base instrutória)
- A fracção “C/V1-133” tem o valor de MOP$1,420,000.00. (resposta ao quesito 59º da base instrutória)
- O Autor continua a habitar a fracção “C2l”, a utilizar um dos parques de estacionamento e o veículo automóvel. (resposta ao quesito 61º da base instrutória)
- Os outros dois parques de estacionamento encontram-se arrendados a duas pessoas distintas. (resposta ao quesito 62º da base instrutória)
* * *
    IV - FUNDAMENTAÇÃO
Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o tribunal a quo decidiu. Este afirmou:
A, divorciado, titular do BIR n.º ..., residente em Macau, na ..., 21º andar C, vem intentar a presente
Acção Ordinária contra
B, solteira, titular do BIR n.º ..., residente na ..., Portugal;
Sociedade de Construção e Fomento Predial X X, SARL (XX發展有限公司), registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º…, com sede em Macau, na…, 5º andar, Taipa;
C (C), solteiro, titular do BIR n.º ..., residente em Macau, na…, 9º andar C.
com os fundamentos apresentados constantes da p.i., de fls. 2 a 28.
Concluiu pedindo que seja julgada procedente e provada a presente acção, e em consequência:
1.
1.1 Julgar-se nula por simulação e de nenhum efeito as compras e vendas das fracções autónomas:
a) “C21” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao 21º andar C, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição ...;
b) “A1-130” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-130, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição ...;
c) “A1-131” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-131, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição ...;
d) “C/V1-133” sita em Macau, na freguesia da Sé, na…, correspondente ao parque de estacionamento C/V1-133, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ... a favor da requerida pela inscrição ...;
e) Bem como, do veículo automóvel, matrícula MM-XX-XX, marca SUZUKI GRAND VITARA.
1.2 Mandar-se cancelar na Conservatória do Registo Predial os registos de aquisição fundados na referida e simulada compra efectuados pelas inscrições nos ... e ... do livro G, bem como, na Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis a aquisição do veículo automóvel;
1.3 Ordenar-se a inscrição a favor do A. e da 1ª R., a aquisição da metade indivisa para cada um dos seguintes bens:
a) Fracção autónoma “C21” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao 21º andar C, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
b) Fracção autónoma “A1-130” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-130, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
c) Fracção autónoma “A1-131” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-131, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
d) Fracção autónoma denominada “C/V1-133” sita em Macau, na freguesia da Sé, na ... n.º51-65, correspondente ao parque de estacionamento C/V1-133, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
e) Veículo automóvel, matrícula MM-XX-XX, marca SUZUKI GRAND VITARA.
2.
2.1 Subsidiariamente, caso se entenda que não houve simulação nas transmissões, condenar-se a R. a transmitir para o A. metade indivisa, nos termos do Art.º 1107º n.º 1 do C.C, dos seguintes bens:
a) Fracção autónoma “C21” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao 21º andar C, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
b) Fracção autónoma “A1-130” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-130, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
c) Fracção autónoma “A1-131” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-131, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
d) Fracção autónoma denominada “C/V1-133” sita em Macau, na freguesia da Sé, na ... n.º51-65, correspondente ao parque de estacionamento C/V1-133, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
e) Veículo automóvel, matrícula MM-XX-XX, marca SUZUKI GRAND VITARA.
2.2 Subsidiariamente ao pedido efectuado em 2.1, no caso de se entender que no instituto do mandato sem representação, não se pode exigir ao mandatário o cumprimento da referida obrigação de facere, deve a Ré ser condenada a indemnizar o A., a título de perdas e danos decorrentes do não cumprimento da obrigação de transmitir, na quantia de MOP$4.575.000,00;
3. Subsidiariamente a todos os anteriores, deve a 1ª Ré ser condenada a pagar ao A., a título de enriquecimento sem causa, a quantia de MOP$4.575.000,00;
Cumulativamente aos pedidos efectuados em 2.2 e 3., condenar-se a R. a reconhecer o direito de retenção no que concerne às fracções autónomas:
a) Fracção autónoma “C21” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao 21º andar C, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
b) Fracção autónoma “A1-130” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-130, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
c) Fracção autónoma “A1-131” sita em Macau RAE, na freguesia da Nossa Senhora do Carmo (Taipa), na ..., correspondente ao parque de estacionamento A1-131, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
d) Fracção autónoma denominada “C/V1-133” sita em Macau, na freguesia da Sé, na ... n.º51-65, correspondente ao parque de estacionamento C/V1-133, inscrita na respectiva matriz predial sob o n.º ... e descrita na Conservatória do Registo Predial com o n.º ...;
e) Veículo automóvel, matrícula MM-XX-XX, marca SUZUKI GRAND VITARA.
4. Deve, ainda, ser a Ré condenada a pagar juros de mora sobre as quantias supra referidas desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal de 9,75%, bem como custas de parte e procuradoria condigna.
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Citados regularmente os Réus, todos apresentaram contestação, com os fundamentos constantes de fls. 214 a 219, fls. 135 a 138, fls. 176 a 189 e fls. 152 a 161 dos autos. Tendo a 2ª Ré e 4° Réu deduzido a excepção da sua ilegitimidade e o 3° Réu a excepção peremptória da inexistência do direito de retenção. O 4° Réu invocou ainda que o Autor está a litigar com má fé, pretendendo a indemnização dos danos a ele causado por essa acção.
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Saneados os autos no saneador, foi julgada improcedente a excepção da ilegitimidade dos 2ª Ré e do 4° Réu. Oficiosamente, foi conhecida, a excepção dilatória da ilegitimidade da 1ª Ré em relação ao pedido de nulidade por simulação da compra e venda do veículo de matrícula MM-XX-XX, absolvendo essa Ré da instância desse pedido e, a excepção dilatória de falta de interesse processual do 3° Ré absolvendo esses Réu do da instância.
Em seguida, foram seleccionados factos considerados assentes e os factos que se integram na base instrutória.
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Por requerimento de fls. 885 a 888, pediu o Autor a ampliação de pedidos subsidiários elencados nos pontos 2.2 e 3, aumentando o valor aí reclamado para MOP$9.193.650,00.
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Foi realizado a audiência de discussão e de julgamento com intervenção do Tribunal Colectivo.
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O Tribunal é competente em razão da matéria, hierarquia e internacionalmente e o processo é próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade jurídicas e são legítimas.
Não existem excepções, nulidades ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Cumpre analisar os factos e aplicar o direito.
Na presente acção, alegou o Autor que se vivia com a 1ª Ré em união em facto desde 1994 até Outubro de 2011. O Autor era casado com a E, quem se moveu contra este acção de divórcio litigioso em 1998, e, a acção de alimentos. Para evitar que os bens pudesse ser executados para pagamento de alimentos pela ex-mulher, o Autor e a 1ª Ré decidiram que os imóveis e móveis adquiridos com dinheiro de ambos seriam outorgados apenas em nome da 1ª Ré. Durante a relação mantida com a 1° Ré, foram adquiridas pelos ambos quatro fracção autónomas, isto é as fracções “C21”, “A1-130”, A1-131” do prédio descrito sob o n°... e a de “C/V1-133” do prédio descrito sob n°... e, um veículo automóvel com a matrícula MM-XX-XX. Embora os bens referidos foram adquiridos pelos Autor e a 1ª Ré com o dinheiro de ambos, os bens em causa foram registados apenas em nome da 1ª Ré, tendo esta prometido transferir para o Autor metade indivisa das fracções autónomas “C21”, “A1-130”, A1-131”, depois de termo da acção de alimentos. Assim, com o intuito de enganar a sua ex-mulher, o Autor, a 1ª Ré, acordaram, com o 2º Réu e o 4º Réu, respectiva que as respectivas escritura públicas constam apenas como compradora a 1ª Ré.
Pretendeu o Autor, como pedido principal, ver nulas por simulação as compras e vendas dos quatros fracções autónomas e do automóvel com o cancelamento dos respectivos registos, ordenando a inscrição a favor do Autor a metade indivisa de cada um dos bens ou, subsidiariamente, a condenação da 1ª Ré a transmissão da metade indivisa dos bens para o Autor na execução do mandato sem representação ou, a condenação da 1ª Ré o pagamento da quantia de MOP$9.193.650,00, por incumprimento da obrigação de transmitir ou por enriquecimento sem causa, com o reconhecimento de direito de retenção sobre todos os bens acima referidos.
Na contestação, a 1ª Ré negou o acordo alegado pelo Autor, defendendo ainda que o dinheiro retirado da conta conjunta aberta em nome do Autor e da 1ª Ré para pagamento de preço dos imóveis foram havidos por ambos como doação à 1ª Ré e que o Autor queria que os bens seriam da sua exclusiva propriedade para proteger ela e a filha dos ambos contra os outros herdeiros concorrentes do património do Autor.
Os 2º e 4° Réus negaram peremptoriamente os factos relativos à simulação.
Considerando as posições tomadas pelas partes, para conhecimento do litígio posto nos autos importa resolver as seguintes questões relevantes:
-Simulação
-Mandato sem representação
-Enriquecimento sem causa
- Direito de retenção
- Litigância de má fé

Simulação
Preceitua-se, quanto ao conceito de simulação, o art°232° do C.C.:
“1. Se, por acorde entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado.
2. O negócio simulado é nulo.”
Dispõe-se os n°1 e 2° do art°233° do C.C. que
“1. Quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado.
2. Se, porém, o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido observada a forma exigida por lei.”
“A simulação é uma divergência bilateral entre a vontade e a declaração, que é pactuada entre as partes com a intenção de enganar terceiro. Na simulação as partes acordam entre si emitir uma declaração negocial que não corresponde à sua vontade real e fazem-no com o intuito de enganar terceiros.”
Na simulação é de crucial importância o pacto simulatório. Trata-se de um acordo, de um pacto, que tem como conteúdo a estipulação entre as partes da criação deu uma aparência negocial, da exteriorização de um negócio falso, e a regulação do relacionamento entre o negócio aparente assim exteriorizado e o negócio real. A esta aparência negocial assim criada pode corresponder um negócio verdadeiro que as partes mantêm oculto ou pode também não corresponde qualquer negócio. Quando, sob a aparência criada com a simulação existir um negócio oculto, fala-se de simulação relativa; quando sob o negócio aparente nenhum negócio verdadeiro existir, fala-se de simulação absoluta. (cfr. Pedro Pais de Vasconcelos que in Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, 4ª Edição, pg.682)
Sintetizando os requisitos da simulação elencando-os: a divergência entre vontade declarada e a vontade real, o acordo simulatório; e o intuito de enganar (“animus decipendi”) ou de prejudicar (“animus nocendi”) o terceiro.
Nos termos do art°335°, “Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.”
Portanto, cabe ao Autor provar que há, efectivamente, pacto simulatório das partes, a divergência entre a vontade declarada e vontade real bem com o requisito de intuito de enganar a terceiro.
Feito o julgamento, não logrou o Autor provar que existe acordo simulatório entre o Autor, a 1ª Ré, e os respectivos vendedores, ora 2° Réu e o 4° Réu, nos negócios de compra e venda relativos aos imóveis discutidos nos autos, a falta de verificação desse pressuposto, sem necessidade de mais desenvolvimento, determinará a improcedência dos pedidos de simulação em relação a todos os imóveis.

Mandato sem representação
Subsidiariamente, apela o Autor para justificar o seu direito sobre os imóveis e o veículo o instituto de mandato sem representação, pretendendo a transferência da metade da propriedade dos bens ou, o pagamento do montante correspondente à metade do valor dos mesmos.
Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra, segundo a definição prevista no art°1083° do C.C. Diz-se mandato com representação quando o mandatário age em nome e por conta do mandante e mandato sem representação quando o mandatário, embora pratique por conta do mandato, mas age em nome próprio. (art°1104° e 1106° do C.C.)
De acordo com o disposto do art°1107° do C.C., o mandatário é obrigado a transferir do para o mandante os direitos adquiridos em execução do mandato.”
Conforme os factos tidos por assentes, vem comprovado que as fracções autónomas “C21”, “A-130”e “A-131”, todas do prédio sito na ..., e a fracção autónoma “C/V1-133”do prédio sito na ... n°51 a 65 foram registados em nome da 1ª Ré.
Também se mostra provado que os imóveis fossem adquiridos para o Autor e a 1ª Ré. (resposta aos quesitos 15°, 33° e 48°)
Ficou provado que o preço e as prestações mensais do empréstimo bancário para a aquisição dos referidos imóveis e do automóvel MM-XX-XX foram pagos com dinheiro proveniente pelos Autor e a 1ª Ré. (resposta aos quesitos 23°, 38ۜ° e 43°).
Flui desses factos que apesar de os bens em causa estarem inscritos em nome da 1ª Ré, os mesmos foram, na realidade, adquiridos pelos ambos e no interesse de ambos.
Porém, não bastam esses factos para dizer que entre o Autor e a 1ª Ré havia estabelecido contrato de mandato, ainda sem representação.
Pois, um dos elementos típicos do contrato de mandato é que o mandatário assume a obrigação de praticar actos jurídicos por conta do mandatário. Só existe contrato de mandato se havia acordo consensual entre as partes no sentido de um praticar acto jurídico por conta do outro.
Mas, feito o julgamento, não logrou o Autor provar que a 1ª Ré foi encarregada pelo Autor para adquirir os imóveis e que esta transferira para o Autor a metade das fracções logo que concluídas a acção de alimentos instaurada pela E contra o Autor (resposta negativa do quesito 44°)
Não provado esse facto, não podemos concluir ter celebrado entre o Autor e a 1ª Ré mandato para a aquisição dos bens em discussão.
Assim, não poderão proceder também esses pedidos subsidiários.

Enriquecimento sem causa
Por último, o Autor recorre ao instituto de enriquecimento sem causa para ser reembolsada a quantia de MOP$9.193.650,00, correspondente à metade do valor actual dos quatros imóveis e do automóvel.
Estatui-se o disposto do art°467° do C.C., “Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.”
O instituto de enriquecimento sem causa pressupõe a verificação cumulativa de três requisitos: i) existência de um enriquecimento; ii) Obtenção desse enriquecimento à custa de outrem; e iii) a ausência de causa justificativa para o enriquecimento.
Além disso, o instituto do enriquecimento sem causa tem natureza subsidiária, já que só é aplicável quando a lei não faculte ao empobrecido outro meio legal de ser indemnizado ou restituído, nos termos do art°468° do C.C..
Em relação ao enriquecimento, conforme o quadro fáctico apurado, o Autor e a 1ª Ré viviam juntos desde 1994 até Outubro de 2011, entre eles foi estabelecida uma relação de convivência de união de facto. Durante essa relação, o Autor e a 1ª Ré adquiriu quatro fracções autónomas “C21”, “A-130”e “A-131” e “C/V1-133”, mais um automóvel MM-XX-XX. Mas, todos os bens foram registados apenas em nome da 1ª Ré. (resposta aos quesitos 15°, 33° e 48°)
Mais, ficou provado que o preço e as prestações mensais do empréstimo bancário para a aquisição dos referidos imóveis e do automóvel MM-XX-XX foram pagos com dinheiro proveniente pelos Autor e a 1ª Ré. (resposta aos quesitos 23°, 38ۜ° e 43°), assim como as despesas relativas aos imóveis são pagas ou pelo Autor ou pela 1ª Ré.
Decorre dessa matéria fáctica que os imóveis e o automóvel foram adquiridos, pelos Autor e 1ª Ré e com dinheiro indistinto de ambos, mas a aquisição só está inscrita a favor da 1ª Ré e não em nome de ambos.
Daí, é patente que a 1ª Ré fica enriquecida com o aumento do seu activo patrimonial, pois ela tem propriedade exclusiva em relação aos quatro imóveis e ao automóvel referidos, mas os bens foram adquiridos não apenas por seu dinheiro mas também por contribuição monetária realizada pelo Autor, durante a vigência da relação de convivência.
Em correspondência, existe o sacrifício patrimonial sofrido pelo Autor. É facto inegável que a 1ª Ré fica com a propriedade exclusiva dos bens para cuja aquisição a 1ª Ré não pagou a totalidade do seu preço, sendo uma parcela do preço proveio dos meios e instrumentos do Autor. É, também verdade, o contributo monetário do Autor para a aquisição dos bens não resulta para ele qualquer direito correspondente. A vontagem patrimonial por parte da 1ª Ré sobre os imoveis e móvel é obtida, sem dúvida, à custa do contributo do Autor.
A questão já é mais complicada no que toca ao requisito da falta de causa justificativa.
Diz-se o n° 2 do art°467° do C.C., que “a obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de uma efeito que não se verificou.”
Segundo o ensinamento do Antunes Varelas, o enriquecimento, contra o qual se reage, careça de causa justificativa- ou parque nunca a tenha tido ou porque, tendo-a inicialmente, entretanto a haja perdido.
A causa do enriquecimento varia consoante a natureza jurídico do acto que lhe serve de fonte. A causa do enriquecimento pode resultar do fim imediato da prestação e do fim típico do negócio. Por isso, se a obrigação não existiu ou se o fim do negócio falhou, deixou de haver causa para a prestação e a obrigação resultante do negócio. Nos outros restantes casos, o enriquecimento é injusto porque, segundo a ordenação substancial dos bens aprovados pelo direito, ele deve pertencer a outro. (in Obrigações em Geral, 7ª edição, Vol. I. pág. 470 a 474)
A falta de causa justificativa pode decorrer da circunstância de nunca ter existido ou, tendo existido, entretanto, se ter perdido (condictio ob causam finitam ), ou ainda o efeito que não se verificou (condictio ob causam futuram ).
Reportado ao caso sub judice, o enriquecimento da 1ª Ré não tem causa justificativa, o contributo monetário por parte do Autor não tem por causa qualquer fonte ou título jurídico que suporta. Durante o período compreendido entre 1994 e 2011, o Autor e a 1ª Ré viviam juntos, mantendo-se uma relação análoga ao marido e mulher, ambos juntavam os rendimento e pagavam em conjunto as despesas sem qualquer distinção.
É justamente por causa da existência dessa relação de união de facto é que os dois companheiros, ao longo dos anos, contribuíram o seu património para aquisição dos imóveis e móveis, investindo para o bem-estar da família que se uniram.
A fracção autónoma “C21” foi destinada para servir como casa morada de família desse a aquisição até a ruptura da relação, enquanto dois lugares de estacionamento “A1-130” e “A1-131”, são localizados no mesmo prédio onde se situa a fracção “C21”, um deles ainda está a ser utilizado pelo Autor.
Aliás, os factos provados deixam claro que os bens em discussão foram sempre adquiridos pelo Autor e pela 1ª Ré, a causa que levou a decisão de os mesmos só estarem inscritos em nome da 1ª Ré é com o propósito de evitar os bens serem integrados no património do Autor e que poderiam ser executados pela sua ex-mulher, face a acção de alimentos instaurada pela última contra este.
Não ficou provado que o Autor queria doar o seu património para a 1ª Ré ao fazer inscrever esses bens apenas em nome desta.
Portanto, o motivo ou fim que determinou o Autor contribuía com o seu rendimento para o pagamento tanto do preço dos imóveis e do automóvel como das despesas realizadas é exactamente a relação de convivência de união de facto.
Cessada a união de facto entre o Autor e a 1ª Réu, desapareceu a causa dessa deslocação patrimonial, não tem razão de esta ficar com a manifesta vantagem patrimonial, sendo ela a única proprietária dos imóveis e do automóvel, que na realidade, foram adquiridos por ambos com as contribuições monetárias de ambos.
Tem sido esse entendimento acolhido pelas jurisprudências, no direito comparado, “A contribuição monetária de um dos membros da união de facto, para a construção de uma casa e a aquisição de um veículo automóvel, não se enquadra no âmbito da satisfação dos encargos da vida familiar. Com a dissolução da união de facto extingue-se a causa jurídica da contribuição monetária, deixando de ter justificação a privação da contribuição monetária prestada. A restituição opera, nomeadamente, por efeito do instituto do enriquecimento sem causa.” (Ac. do STJ, de 03/11/2016, Proc. 390/09/.0TBBAO.S1)
A contribuição pecuniária de cada um dos membros da “união de facto” para a aquisição de bens de que um deles veio a beneficiar inscrevendo-a em seu nome no registo predial, deve ser avaliada à luz de enriquecimento sem causa, na ausência de contrato determinante da transferência patrimonial. (Ac. do STJ, 15/11/1995, Proc. 087127)
“O enriquecimento sem causa pode configurar-se como enriquecimento por prestação, por intervenção, por despesas realizadas em benefício de outrem e por desconsideração de um património intermédio. Com a cessação da vivência em união de facto passa a impender sobre a Ré a obrigação de restituir ao património do autor o montante por este desembolsado para pagamento das fracções destinadas a habitação do casal durante a subsistência dessa vivência.” (Ac. do STJ, de 27/09/2011, proc. 3149/06)
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Não se entende que, no caso, há outro meio para que o Autor seja ressarcido desse prejuízo.
Nestes termos, julgamo-nos que se vislumbram verificados os pressupostos jurídicos, assiste ao Autor o direito de restituição do que ficou empobrecido à luz do enriquecimento sem causa.
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Medida da restituição
No que diz respeito à medida de restituição, dispõe-se o art°473°, n° 1 do C.C.,
“A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo quanto se tenha obtido à custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.”
Defendeu a 1ª Ré, que o não apuramento dos valores exactos que saíram do património do Autor constitui obstáculo à pretensão de restituição.
Os quatro imóveis e o automóvel foram comprados com contributo dos ambos companheiros, cada um deles terá pago uma parcela do preço, visto que o dinheiro para a compra dos bens saiu da conta conjunto aberta em nome dos dois e o saldo nela depositado proveio dos rendimentos de cada um.
Não é possível, nesse caso concreto, determinar a porção de contributo pecuniária por cada um dos companheiros para a aquisição dos bens, justamente por o pagamento ter sido feito por dinheiro proveniente indistintamente dos rendimentos dos dois, durante a vigência da convivência.
Situação essa é normal numa relação convivencial, particularmente prolongada, dada a relação íntima e de confiança que se estabelece entre os membros da união de facto, semelhante ao caso de casamento. Já que não é exigível, segundo a normalidade da vida, cada um dos companheiros regista, detalhadamente, dos valores despendidos e das despesas decorrentes da vida comum.
Mas, a impossibilidade de determinação da parcela de contributo de cada um não deverá conduzir ao resultado extremo da privação do contributo dum em benefício doutro.
Tem sido essa posição perfilhada pelas jurisprudências.
Nesse sentido, “Tendo a Ré vivido em união de facto com o pai da A. e contribuindo, no pressuposto de que a união de facto se manteria, ao longo de um período de tempo de cerca de quinze anos, com o seu dinheiro e trabalho, para construção de moradias pertencentes, por doação, à A., tem direito a ser ressarcida, por via do instituto do enriquecimento sem causa e por recurso a juízos de equidade, em metade do valor actual dos imóveis, a apurar em execução de sentença.” (cfr. Ac. de 10 de Maio de 2007, do T.R.L.)
“O enriquecimento deve corresponder à diferença, calculada equitativamente, entre a situação real e actual do beneficiado confrontada com a situação hipotética em que ele se encontraria se não tivesse ocorrido a participação do empobrecido.” (Ac. do STJ, 15/11/1995, Proc. 087127)
Afiguramo-nos ajustado, nessa situação específica, o recurso ao juízo de equidade para determinar a medida de enriquecimento da 1ª Ré à custa do Autor, visto que, com o propósito comum de partilha da vida, durante a vivência em comum, os dois companheiros juntavam os seus rendimentos e pagavam em conjunto as despesas sem distinção, ambos investiram com o dinheiro e com o trabalho para a convivência, portanto, não sendo possível definir ou distinguir com precisão a parte em dinheiro e em trabalho com que cada um deles contribuía nessa comunhão da vida.
Assim, conforme os factos provados, as fracções autónomas “C21”, “A1-130”, “A1-131”e “C/V1-133” têm, actualmente, o valor de MOP$9.227.000,00, MOP$1.540.000,00, MOP$1.540.000,00 e MOP$1.420.000,00, atingindo, no total de MOP$13.727.000,00.
O enriquecimento que a 1ª Ré obtém à custa do Autor, corresponderá, em princípio, à metade do valor total dos bens, que é de MOP$6.863.500,00.
Todavia, temos por presente o facto de que para a aquisição dos imóveis, foi contraído um empréstimo bancários apenas em nome da 1ª Ré, dos elementos dos autos demonstra que esse empréstimo ainda não foi totalmente reembolsado, se ao Autor deverá restituir pela 1ª Ré o valor actual dos bens obtido com seu contributo, também deverá ter em conta o encargo onerado com os imóveis para sua aquisição, o qual deverá ser suportado, na mesma medida, pelos ambos conviventes.
Pelo que, ao valor de MOP$6.853.500,00 deverão ser deduzidos os montantes correspondentes ao empréstimo bancário ainda em dívida ao Banco XX, à data da ruptura da união de facto, na proporção da metade, cuja quantificação será liquidada em execução da sentença.
Quanto ao automóvel, não foi apurado qual é o valor actual do mesmo, sendo impossível a fixação do valor em metade a que se cabe ao Autor, relegando para a sua liquidação na execução da sentença.

Juros
À luz do disposto do art°474° do C.C., o enriquecido responde igualmente pelos juros legais das quantias a que o empobrecido tiver direito despois de ter sido citado judicialmente para a restituição.
A aplicação desse preceito deverá conjugar com o disposto do n°4 do art°797°, em que se diz que não há mora se o crédito for ilíquido.
Como a quantia que a 1ª Ré deverá restituir ao Autor depende da liquidação dos seus valores concretos, assim, só haverá lugar de juros após a liquidação.

Direito de retenção
Pretende o Autor a concessão do direito de retenção sobre os quatros imóveis e o automóvel.
Preceitua-se o art°744° do C.C.. que “O devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.”
Flui desse preceito a concessão do direito de retenção depende de três requisitos: i) a detenção lícita de uma coisa cuja entrega é devido outrem; ii) apresentar-se o detentor, simultaneamente, credor daquele a quem o bem é devido; iii) a existência de uma conexão directa e material entre o crédito do detentor e a coisa detida, isto é, que resulta de despesas feitas ou danos causados a esse reportados.
Em primeiro lugar, quanto à detenção dos bens, está assente que o Autor habita na fracção “C21”e utiliza um dos parques de estacionamento e o veículo automóvel. Vem comprovado que dois dos três encontram-se arrendados a terceiro, portanto, o Autor não tem, como é óbvio, detenção sobre dois parques de estacionamento.
Aliás, como não consta dos factos provados qual dos parques que o Autor está a utilizar, facto cujo ónus de prova cabe a eles para sustentar o direito pretendido, Assim, não foi apurado qual dos parques que o Autor está a reter, não pode proceder a sua pretensão em relação a qualquer dos parques de estacionamento.
Resta analisar se existem os outros dois pressupostos em relação à fracção autónoma “C21” e o veículo MM-XX-XX.
Argumenta o Autor o seu crédito resultou das despesas que efectuou por causa das coisas que pretende reter, nomeadamente, o preço pago pelos imóveis, as despesas de reparação e decoração e ainda os impostos que suportou.
Por um lado, o preço pago para a aquisição dos próprios bens e os impostos inerentes a eles não podem ser considerados como despesa realizadas com as coisas.
Por outro lado, ao Autor é reconhecido o crédito por enriquecimento sem causa. O enriquecimento sem causa trata-se duma forma de compensação que visa o restabelecimento do equilíbro injustamente quebrado entre patrimónios de quem obtém vantagem patrimonial à custa de quem sofreu tal sacrifício patrimonial, considerando no seu global.
Portanto, o crédito que o Autor tem sobre a 1ª Ré por esse enriquecimento é compensação pela atribuição não só pecuniária mas também material que o Autor contribuía para a compra dos bens, com o propósito de ter uma comunhão de vida harmoniosa, tendo por causa a existência de relação convivencial, não é a pura restituição das quantias despendidas pelo Autor quer no preço das coisas quer nas despesas de reparação e decoração. Tanto mais que as despesas de reparação e decoração não deixam de ser despesas normais e correntes próprias de quem vive a plena comunhão de vida, sendo contributo para os encargos normas da vida em comum, aos quais não só o Autor como a 1ª “Ré fez igualmente o contributo pecuniária e pessoal.
O direito de restituição alicerça-se na vantagem patrimonial que a 1ª Ré alcançou injustamente com os meios e instrumentos prestados pelo Autor, consistindo, essencialmente, no facto de a 1ª Ré estar com o aumento do valor patrimonial por ter propriedade exclusiva sobre os bens adquiridos durante a união de facto, a conexão entre o crédito do Autor e as coisas é, portanto, indirecta, mas não havendo uma conexão directa e material entre um e outro.
Dest’arte, não se acham preenchidos os pressupostos de que depende o direito de retenção em relação a todos os bens. Essa pretensão não pode deixar de ser votado a fracasso.

Litigância de má fé
Invocou o 4° Réu que o Autor actuou com má fé por este saber que o 4° Réu não tinha acertado com eles no acordo ou negócio simulatório, ao abrigo do disposto do art°385°, n°2, alínea a) e b) do C.P.C..
Prevê-se o n°2 do artigo 385º do Código de Processo Civil:
Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
“a)Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta d fundamento não devia ignorar;
b)Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c)Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d)Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção de justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.
Aí se distingue entre dolo substancial e dolo instrumental.
“O dolo substancial diz respeito ao fundo da causa, ou melhor, à relação jurídica material ou de direito substantivo; o dolo instrumental diz respeito à relação jurídica processual” Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume II, pág. 263.
Feito o julgamento, não ficou provado a factualidade sobre a simulação, mas isso não basta para sustentar a litigância de má fé, para o efeito, é necessário apresentar prova de que o Autor, sabendo a falta de fundamentação da sua pretensão ou tinha alterado a verdade dos factos.
De facto, consta dos factos assentes que o 4° Réu não conhece o Autor nem a 1ª Ré nunca com eles se encontrou, o desconhecimento pessoal entre os sujeitos do negócio que poderia levar a pensar que não seria muito provável a existência do acordo simulatório, mas não afasta, absolutamente, a hipótese de que dois ou mais desconhecidos, por interesse que lhes relevam, simulam um negócio jurídico, pelo que meramente com essa factualidade não é suficiente para concluir que o Autor soube a falta de fundamentação da sua pretensão menos que este tinha alterado a verdade dos factos.
Nestes termos, improcede o pedido de litigância de má fé invocado pelo 4° Réu.

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DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, o Tribunal julga parcialmente procedente a acção e, em consequência, decide:
- Condena-se a Ré B a pagar ao Autor A o montante a ser liquidado em execução da sentença, com a quantia de MOP$6.863.500,00, depois de ter deduzido o valor correspondente à metade dos empréstimos bancários devidos ao Banco XX, S.A., concedidos para a aquisição das fracções, contados a partir da ruptura da união de facto ocorrida em 10 de Outubro de 2011, com os juros de mora calculados à taxa legal desde a liquidação.
- Condena-se a mesma Ré a pagar ao Autor a quantia correspondente à metade do valor actual do automóvel MM-XX-XX, a ser liquidada em execução da sentença, com os juros de mora calculados à taxa legal desde a liquidação.
- Absolvendo-se todos os Réus dos restantes pedidos formulados pelo Autor.
- Julga-se improcedente o pedido de litigância de má fé formulado pelo 4° Réu.
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Custas pelas partes na proporção dos decaimentos e do incidente de má fé pelo 4° Réu em 4 Uc.
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Registe e Notifique.
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São colocadas a este Tribunal 2 questões:
1) Recurso interlocutório interposto pela 1ª Ré – indeferimento de da “sugestão” da forma de recolha de depoimento de parte, por carta rogatória, apresentada pela 1ª Ré (cujo depoimento foi requerido pelo Autor);
2) Recurso da decisão final interposto pelo Autor – erro na apreciação de provas.
*
Comecemos pela primeira questão
1) – Recurso interlocutório: forma de recolha de depoimento de parte
A 1ª Ré veio atacar a decisão interlocutória de fls. 586, pela qual indeferiu o requerido de fls. 579.
Discordando desta decisão, veio recorrer com os fundamentos de fls. 598 a 601 dos autos:
I. Requerido e deferido o depoimento de parte residente fora da jurisdição de Macau o tribunal só pode ordenar qua a parte deponha na audiência de discussão e julgamento a ser feita no tribunal de Macau, verificados que sejam, cumulativamente dois requisitos : a) que julge necessária a comparência e b) que a mesma comparência não represente sacrificio incomportável para a parte - entendimento diverso faz indevida intepretação e aplicação do art. 481.°, n.ºs 1 e 2 do CPC.
II. Porque assim, é decisão que ordene o comparecimento da parte residente fora da jurisdição de Macau para prestar depoimento de parte não constitui exercício de um poder discricionário, sendo, portanto recorrível. Assim o entendeu, igualmente o tribunal “a quo”, que a entendeu recorrível (v. fls. 583 dos autos), o que constitui uma admissão de que errou na aplicação do direito, pois, de contrário, a decisão teria sido considerada irrecorrível, nos termos do art. 584.° do CPC.
A retenção do presente recurso torná-lo-á absolutamente inútil, pois não comparecendo a 1.ª R. na audiência de discussão e julgamento para prestar depoimento de parte, o tribunal "a quo" apreciará livremente o valor da sua conduta para efeitos probatórios, e terá a mesma em consideração na decisão de quais os factos alegados e provados que servem de causa de pedir aos pedidos formulados pelo A., sem que o tribunal de recurso possa alterar a decisão sobre a matéria de facto - entendimento diverso fará indevida interpretação e aplicação dos artigos 601.º, n.º 2, e 649.º, n.º 2, do CPC, e do artigo 350.º do CC.
Só que a 1ª Ré não chegou a recorrer da decisão final, com o que fica prejudicado o conhecimento do recurso interlocutório interposto por ela.
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2) – Recurso contra a sentença final: nesta parte, o Autor ataca apenas a seguinte parte da decisão:
- Condena-se a Ré B a pagar ao Autor A o montante a ser liquidado em execução da sentença, com a quantia de MOP$6.863.500,00, depois de ter deduzido o valor correspondente à metade dos empréstimos bancários devidos ao Banco XX, S.A., concedidos para a aquisição das fracções, contados a partir da ruptura da união de facto ocorrida em 10 de Outubro de 2011, com os juros de mora calculados à taxa legal desde a liquidação.
O Recorrente alegou o seguinte:
(…)
2. Ora, se na decisão de condenar a 1.ª Ré no pagamento de metade do valor dos bens, MOP$6.863.500,00, pelo enriquecimento que esta obteve à custa do A. nada há a censurar;
3. Já no que diz respeito à dedução do valor correspondente à metade dos empréstimos bancários devido ao Banco XX, S.A, concedidos para a aquisição das fracções, contados a partir da ruptura da união de facto ocorrida em 10 de Outubro de 2011,
4. E no que diz respeito aos juros de mora calculados à taxa legal desde a liquidação,
5. Não obtém a aquiescência do aqui Recorrente.
6. Salvo o devido respeito, que é muito, entendemos que o Tribunal a quo andou mal.
7. Tivesse o Tribunal a quo atendido aos documentos juntos pelo A. no seu requerimento de 2/3/2015, fls. 682 a 699, e mais recentemente o documento junto pelo A. em 6/9/2016 e teria decidido de outra forma.
8. Teria constatado que o A., ainda hoje, deposita na conta da 1.ª Ré, BXX n.º ..., conta original onde era descontada a prestação, o valor de MOP$6.295,35.
9. Este é, exactamente, o valor da prestação do empréstimo bancário devido ao Banco XX, S.A, concedido para aquisição das fracções.
A este propósito, o Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos:
- Relativamente às aquisições referidas em B) o preço do sinal foi pago com dinheiro levantado de uma conta de que o Autor e da 1ª Ré eram titulares e cujo saldo havia sido constituído por depósitos e transferências de dinheiro proveniente dos rendimentos de ambos. (resposta ao quesito 20º da base instrutória)
- Para o pagamento do resto do preço das aquisições referidas em B) foi contraído um empréstimo, apenas, em nome da 1ª Ré, 23 anos mais nova que o Autor, sendo muito mais vantajoso para o Autor e 1ª Ré pois, poderia ser de prazo alargado. (resposta ao quesito 21º da base instrutória)
- O preço das fracções referidas em B), bem como, as prestações mensais do empréstimo bancário celebrado com o BXX foram pagos pelo Autor e pela 1.ª Ré. (resposta ao quesito 23º da base instrutória); (…)
- O preço da aquisição referida em C) foi pago com dinheiro proveniente indistintamente dos rendimentos do Autor e da 1ª Ré. (resposta ao quesito 38º da base instrutória)
- São o Autor e a 1ª Ré quem suporta em conjunto o pagamento dos impostos relativos ao imóvel referido em C). (resposta ao quesito 39º da base instrutória)

É bom de ver que aquilo que ficou provado é diferente daquilo que foi alegado pelo Autor. O que vale é obviamente o provado.
Em face dos elementos constantes do autos, nomeadamente os de fls. 682 a 699 e os documentos apresentados em 6/09/2016, o Recorrente defende que o dinheiro destinado ao reembolso dos empréstimos bancários provinha dele, mas como ele não chegou a reclamar contra as respostas aos quesitos (fls. 1382- acta de audiência), e o provado sustenta uma versão contrária à defendida pelo Autor. Por isso, nada este Tribunal pode fazer nesta sede!
Nestes termos, também não há omissão de pronúncia da sentença recorrida, pois o Tribunal relega para a execução da sentença a liquidação do valor, nos termos do disposto no artigo 564º/2 do CPC.
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Pelo exposto, é da nossa conclusão que o Tribunal a quo fez uma análise ponderada dos factos e uma aplicação correcta das normas jurídicas aplicáveis, tendo proferido uma decisão conscienciosa e legalmente fundamentada, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de manter a decisão recorrida.
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Tudo visto, resta decidir
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    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao presente recurso, mantendo-se a decisão da primeira instância
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Custas pelas partes na proporção de decaimento.
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Registe e Notifique.
                 RAEM, 08 de Novembro de 2018.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
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