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Proc. nº 434/2018
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 01 de Novembro de 2018
Descritores:
- Créditos salariais
- Prova de ausências ao serviço

SUMÁRIO:

I - Se ficar provado que durante todo o período em que o A prestou serviço, ele nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré, isso significa que deu faltas ao trabalho embora autorizadas.

II - É preciso saber quantas foram as ausências, a fim de que, juntamente com os dias de férias anuais gozados, se possa determinar com a precisão possível o montante dos créditos salariais a título, v.g., de subsídio e alimentação, de trabalho prestado em dias de descanso semanal e compensatório e de trabalho extraordinário.

Proc. nº 434/2018

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
A, casado, de nacionalidade nepalesa, residente em XXXXXX, no Nepal, portador do Passaporte Nepales no. XXXXXXXX, emitido pelas autoridades competentes do Nepal, instaurou no TJB (Proc. nº LB1-16-0097-LAC) contra:
1) B, SARL, (adiante, B), com sede na Avenida de Lisboa, Hotel Lisboa, 9.º andar, Macau, ---
E ---
2) C, S.A., (adiante,C), com sede na Avenida de Lisboa, Hotel Lisboa, 9.º andar, Macau, ---
Acção de processo comum do trabalho, ----
Pedindo a condenação destas no pagamento de créditos salariais vencidos e não pagos, em termos que damos por reproduzidos.
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Na oportunidade, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência disso, condenou as rés a pagarem ao autor as quantias de MOP$ 140.303,22 e MOP$25.565,00, respectivamente.
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A 1ª ré, B, inconformada com esta sentença dela recorre jurisdicionalmente, em cujas alegações formula as seguintes conclusões:
“1 - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a 1ª Ré A, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização no valor global MOP$140.303,00, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório, entendendo a Recorrente que no que respeita ao (i) subsidio de alimentação, (ii) Subdídio de efectividade (iii)trabalho prestado em dia de descanso semanal (iv) compensação pelo descanso compensatório (v) trabalho prestado em feriado obrigatório (vi) trabalho extraordinário por turnos, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu, em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece dos vícios de Erro na aplicação do direito e Nulidade da Sentença.
2 - Foi a seguinte a factual idade tida por assente e provada após audiência e discussão de julgamento: Entre 3 de Dezembro de 1998 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (A).Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes por parte da 1ª Ré para a 2: Ré, com efeitos a partir de 21/07/2003 (cf. fls. 39 a 41, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (B).Desde 22/07/2003, O Autor esteve ao serviço da 2: Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (C).Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pela 1ª Ré (D).Durante todo O tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés (E). O Autor foi recrutado pela D, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contracto de Prestação de Serviços n.º 5/98 (1.º).O referido contracto de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente (2.º).A data da cessão de funções do Autor junto da 2.ª Ré era de 12/04/2004 (3.º).
3 - Mais ficou provado que: “Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés (4.º).Os locais de trabalho do Autor eram fixados de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades (5.º).Ao longo do período que prestou trabalho, as Rés apresentaram ao Autor contractos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação (6.º).Os contractos individuais de trabalho apresentados ao Autor eram idênticos para os demais trabalhadores não residentes, guardas de segurança do Nepal (7.º).Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HKD7.500,00 a título de salário de base mensal (8.º).Resultada do ponto 3.4 do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/98, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço (9.º). Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés (10.º).
4 - Ficando ainda provado que: “Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade (11º).Entre 22/07/2003 e 12/07/2004, a 2ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade (12.º). Resulta do ponto 3.1 do Contracto de Prestação de Serviços n.º 5/98, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contractados) a quantia de “(...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação (13.º).Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação” (14.º).Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, a 1ª Ré nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros (15.º).Entre 22/7/2003 e 12/07/2004, a 2a Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação (16.º) Entre 22/7/2003 e 12/07/2004, o Autor prestou a sua actividade nos Casinos que não disponibilizavam comida nas cantinas (17.º).Entre 03/12/1998 e 31/12/2002, a 1ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, nem um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição (18.º).
5 - E provou-se que: “Entre 03/12/1998 e 31/12/2002, o Autor prestou a sua actividade de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1ª Ré” (19.º).Entre 03/12/1998 e 31/12/2002, a 1ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal (20.º).Entre 03/12/1998 e 21/07/2004, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Anos Novos Chinês (3 dias),l de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1ª Ré (21.º).Durante O referido período de tempo, a 1ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios (22.º).Entre 22/07/2003 e 12/07/2004, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Anos Novos Chinês (3 dias),1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2ª Ré (23.º).Durante o referido período de tempo, a 2ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios (24.º).
6 - Ficando ainda provado que: “Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau (25.º).Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento (26.º) A referida dedução no salário do Autor era operada de forma Automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agencia de emprego (27.º).Durante todo o período da relação de trabalho/ o Autor exerceu a sua actividade para a 1ª Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia (28.º):Turno A: (das 08h às 16h),Turno B: (das 16h às 00h) e Turno C: (das 00h às 08h).Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pelas Rés (29.º).Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo (30.º).Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho durante dois períodos de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos (C-B) e (B-A) (31.º).As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo (32.º).
7 - Quanto ao subsídio de alimentação o douto Tribunal a quo condenou a ora Recorrente a pagar ao Autor, ora Recorrido, a quantia de MOP$15.160,00 a título de subsídio de alimentação e fundamentou assim o Tribunal a aludida condenação, em tradução livre da nossa responsabilidade, [...] Foram registados 29 dias de saída do Autor no período compreendido entre 14 de Junho a 12 de Julho de 2001 ao abrigo do registo de entrada e saída a fls. 203 a 206 dos autos, mas tendo em consideração o direito de trabalhadores que gozam os 24 dias de férias anuais em cada ano, se excedesse o limite de 24 dias de férias anuais, seria visto como falta justificada com dedução de salário, por esse efeito, na perspectiva do Tribunal, devem ser registados os 24 dias de férias anuais do Autor no período de 2002. Ou seja, o Autor gozou 53 dias de férias anuais (14 de Junho a 12 de Julho de 2001, no total de 29 dias e 24 dias em 2002) durante o período de prestação de serviços para a Primeira Ré, além disso, sem mais dados que mostrando a existência de falta justificada ou não justificada do Autor. Tendo em conta o Autor começou a trabalhar para a Segunda Ré depois de ter gozado as férias anuais no período entre 5 de Julho a 6 de Agosto de 2003, portanto, relativamente ao subsídio de alimentação responsável pela Primeira Ré, deve ser contado até 4 de Julho de 2003, a maneira de cálculo sendo (período de prestação de serviços 811- dias de férias anuais 53) x MOP20.00 (subsídio de alimentação por dia) = Valor total de subsídio de alimentação. Por isso, a Primeira Ré tendo necessidade de pagar ao Autor o subsídio de alimentação em total por MOP 15,160.00.
8 - No entanto, e com o devido respeito, está a Recorrente em crer que o Tribunal não estava em condições de proceder à condenação nos termos em que o fez, isto porque ficou provado que durante o período em que o Recorrido trabalhou para a Recorrente, aquele nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés, ou seja, o que se provou foi que durante o período em que o Recorrido prestou trabalho nunca deu qualquer falta ao trabalho, sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés, resultando assim assumido pelo Recorrido, perguntando-se então quantos dias o Recorrido esteve ausente? Ou, a contrario, quantos dias trabalhou? É que a parca matéria fáctica dada como a provada em audiência, não pode conduzir, sem mais, à procedência do pedido. A verdade é que resultou apurado que o Recorrido deu faltas ao serviço e que pediu dias de dispensa com autorização da Recorrente, mas não se comprova quais são esses dias e conforme tem vindo a ser entendido por esse Venerando Tribunal não se trata apenas de determinar o número de dias de trabalho efectivo e o número de ausência, mas antes de determinar quais os dias em que o trabalho foi prestado, já que, mais do que o quanto importa apurar o quando!
9 - Não se tendo apurado os dias em que o Recorrido trabalhou e sendo o subsídio de alimentação atribuído em função da efectiva prestação de trabalho, o Tribunal a quo não poderia ter determinado o número de dias em que o Recorrido tem direito a perceber o subsídio de alimentação. Parece que não estaria o Tribunal a quo em condições de determinar quais os dias relativos aos quais o Recorrido tem direito ao subsídio de alimentação, o qual, conforme tem vindo a ser entendimento unânime da doutrina e jurisprudência, trata-se de um acréscimo salarial que pressupõe necessariamente a prestação efectiva de trabalho por parte do seu beneficiário, tendo sido aliás este entendimento douta mente defendido por esse Venerando Tribunal de Segunda Instância em diversos arestos dos quais se destaca o proferido em 13.04.2014 no processo 414/2012.

10 - Posto isto, estamos em crer que a sentença deixou escapar o Jacto de o autor não ter trabalhado todos os dias. Se assim é sempre necessário seria apurar qual o número de dias de trabalho efectivo, o que não aconteceu nos autos.» Lançando mão à douta decisão, para que houvesse condenação da ora Recorrente no pagamento desta compensação, deveria o Autor ter alegado e provado quantos foram os dias de trabalho efectivamente por si prestados, o que não sucedeu, estando, aliás, a decisão em contradição com a [actualidade provada (cfr. resposta ao quesito 10º).
11 - No entanto, caso assim não seja entendido, pode ler-se na douta sentença recorrida que “Foram registados 29 dias de saída do Autor no período compreendido entre 14 de Junho a 12 de Julho de 2001 ao abrigo do registo de entrada e saída a fls. 203 a 206 dos autos, mas tendo em consideração o direito de trabalhadores que gozam os 24 dias de férias anuais em cada ano, se excedesse o limite de 24 dias de férias anuais, seria visto como falta justificada com dedução de salário, por esse efeito, na perspectiva do Tribunal, devem ser registados os 24 dias de férias anuais do Autor no período de 2002. Ou seja, o Autor gozou 53 dias de férias anuais (14 de Junho a 12 de Julho de 2001, no total de 29 dias e 24 dias em 2002) durante o período de prestação de serviços para a Primeira Ré, além disso, sem mais dados que mostrando a existência de falta justificada ou não justificada do Autor.” Parecendo-nos com esta afirmação que pretende o Digno Tribunal de Primeira Instância inverter o ónus da prova, ónus esse que compete ao Autor.
12 - Isto, é pretende o Digno Tribunal recorrido que seja a Ré a apresentar prova quanto á indicação dos dias de faltas e de ausências que o Autor teve durante a sua relação laboral com a Recorrente, quando tal a esta lhe não compete, pois o ónus da prova não respeita à ora Recorrente mas sim ao Recorrido. E nem o legislador assim esperava essa obrigação por parte da Recorrente já que antes da Lei 7/2008 podíamos supor a obrigação de manutenção de documentos até 5 anos após o terminus da relação laboral aplicando-se analogicamente o Código Comercial, mas que para uma Companhia com a enorme dimensão como a da Recorrente e dada a enorme mobilidade de recurso humanos existente em Macau e na própria Recorrente, se tomava mesmo assim completamente impossível manter documentos de trabalhadores que saíram da Companhia há 15 anos, como o Recorrido.
13 - Aliás, quanto à obrigação do recorrido e ao ónus que sobre si impende se pronunciou já este Venerando Tribunal em casos em tudo semelhantes, dando como exemplo o processo 858/2017 (pagina 30), pelo que, salvo devido respeito por melhor opinião, não tendo sido provados os factos essenciais de que depende a atribuição do mencionado subsídio de alimentação, ou seja, a prestação efectiva de trabalho, não poderia o douto Tribunal ter condenado a Recorrente nos termos em o fez, padecendo assim a douta Sentença, nesta palie, do vício de erro de julgamento da matéria de facto e na aplicação do Direito, devendo consequentemente ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento de compensação a título de subsídio de alimentação.
14 - No que ao subsídio de efectividade diz respeito o douto Tribunal a quo condenou a ora Recorrente a pagar ao Autor, ora Recorrido, a quantia de MOP$22.400,00 a título de subsídio de efectividade, tendo fundamentado assim o Tribunal a aludida condenação, em tradução livre da nossa responsabilidade «A Cláusu1a 3.4 do contrato nº 05/98 prevê que quando o trabalhador não faltou ao trabalho no mês anterior ia receber um subsídio de electividade equivalente ao valor do salário de 4 dias no mês seguinte. Os factos assentes demonstram que o Autor nunca faltou sem o conhecimento ou consentimento prévio da 1ª Ré. (Cfr. quesito 1º) […] O período que o Autor goza do direito de receber o subsídio de efectividade da 1ª Ré é entre 15 de Abril de 2001 e 21 de Julho de 2003. Os factos assentes demonstram que o salário mensal do Autor é de HK$7500.00 A fórmu1ª de cálculo do valor total do subsídio de efectividade que o Autor deve receber: número de meses que o Autor prestou trabalho (total de dias de trabalho 828/30) x salário Dário (257,50/30) x subsídio de efectividade equivalente a 4 dias de salário: MOP27,810.00. Tendo em conta o princípio do dispositivo (...) Por isso, a Primeira Ré tem de pagar ao Autor o subsídio de efectividade no total de MOP 22,400.00»
15 - Com o devido respeito está a Recorrente em crer que a condenação ultrapassa o pedido do Autor, aqui Recorrido. Isto porque o Autor alegou em sede de petição inicial nos seu artigos 35º e 36º que: Entre 03/02/1998 a 21/07/2003 a 1ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. E De onde o Autor é credor da 1ª Ré (B) na quantia de MOP$22,400.00 a título de subsídio mensal de efectividade correspondente à seguinte operação: MOP$100.00 x 4 x 56 meses de trabalho. Ou seja, para o alegado período de 56 meses o Autor peticionou a condenação da Ré no pagamento mensal de MOP$400 (quatrocentas patacas mensais), o que perfaz um total de MOP$22.400.00.
16 - Ora, se é certo que resultou provado que o Autor auferia a remuneração mensal de HK7,500.00 - o que equivale a uma remuneração diária de HK250.00 - não é menos certo que o mesmo Autor limitou o seu pedido de compensação pelo subsídio de efectividade a MOP$400 (quatrocentas patacas) por mês [MOP100 x 4].O Autor foi claro ao computar o seu pedido de compensação pelo subsídio de efectividade com base na remuneração diária de MOP$100 (cem patacas).assim, deste modo, e sempre com mui devido respeito, a sentença Recorrida não podia ter efectuado o computo da indemnização com base no salário diário de MOP257.50 (duzentos e cinquenta e sete patacas e cinquenta avos) porquanto tal ultrapassa o peticionado pelo próprio Autor.
17 - E mais, tendo o pedido de MOP$22,400.00 sido efectuado para um período de 56 meses de trabalho (entre 03/02/1998 a 21/07/2003) está a Recorrente em crer que esse mesmo pedido terá de ser proporcionalmente reduzido tendo em conta a prescrição dos créditos operada entre 03/12/1998 e 15/04/2001, pelo que não se pode dizer que a condenação operada pelo Tribunal se encontra dentro dos limites do peticionado. A decisão recorrida é assim nula nesta parte, atento o preceituado na alínea e) do nº 1 do artigo 571º do CPC, devendo em consequência ser revogada e substituída por outra que, considerando a declaração de prescrição dos créditos reclamados entre o início da relação laboral e 27/02/2002, a factualidade apurada e os limites do alegado e peticionado pelo Autor, determine que o valor do subsídio de efectividade a atribuir nunca poderá exceder a quantia de MOP$10.800.00 (seis mil e quatrocentas patacas), correspondente à seguinte operação: MOP$100.00 x 4 x 27 meses de trabalho=MOP 10.800.
18 - No que á Compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal e compensatório e feriados obrigatórios diz respeito com relevo para a apreciação de tais pedidos deu o Tribunal a quo por provado que: “Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização (10.º) e em face da sobredita matéria o Tribunal a quo condenou a Recorrente a pagar ao Autor a quantia de MOP$41,715.00 entendendo que eram 81 o número de dias de descanso semanal devidos e não gozados, podendo ler-se na decisão - em tradução livre da nossa responsabilidade que - os factos assentes demonstram que além das férias anuais de 24 dias que o Autor gozou todo os anos durante o período que trabalhou para a 1ª Ré, o Autor não tem qualquer registo de ausência ao trabalho.
19 - Ora, parece-nos que, aqui novamente pretendeu o Digno Tribunal de Primeira Instância inverter o ónus da prova, ónus esse que compete ao Autor, já que pretende o Digno Tribunal recorrido que seja a Ré, ora Recorrente, a apresentar prova quanto à indicação dos dias de faltas e de ausências que o Autor teve durante a sua relação laboral com a Recorrente, quando tal a esta lhe não compete, mas sim ao Autor e salvo devido respeito, o ónus da prova não respeita à ora Recorrente mas sim ao Recorrido, como já acima explanado, dando-se também aqui como reproduzido. Por outro lado, da factualidade provada nada resulta quanto ao quantum e ao quando o Autor trabalhou para que se pudesse chegar à conclusão que tem direito a ser compensado por 89 dias de descansos semanais, não se tendo provado que o Autor não tem registo de ausências.

20 - Não se provou, o número de dias concretos que o Autor trabalhou para se poder concluir pelo número de dias de descanso semanal que deixou de gozar, aplicando-se o mesmo raciocínio à condenação do tribunal relativamente aos créditos reclamados pelos dias de descanso compensatório e novamente se mostra insuficiente a matéria de facto apurada nos presentes autos que permitisse ao Tribunal condenar a Recorrente pelo alegado trabalho prestado em dias de descanso semanal sendo que a quantificação de qualquer montante estará dependente do concreto apuramento de dias de trabalho efectuado pelo recorrido, factual idade não apurada, verificando-se, assim, uma errada aplicação do Direito por parte do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal, em violação do princípio do dispositivo consagrado no artigo 5.º do CPC e, bem assim, o disposto nos artigos 17.º do DL 24/89/M, devendo a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado.
21 - E o mesmo raciocínio se aplica à condenação da recorrente ao pagamento de uma compensação pelo alegado trabalho prestado em feriados. E a este respeito é dito na douta sentença recorrida que: “Relativamente à Primeira Ré, os factos assentes mostrando que o Autor nunca gozou as férias anuais em dias de feriado obrigatório no período entre 15 de Abril de 2001 a 21 de Julho de 2003, sem dados que mostrando a existência de férias de descanso que o Autor gozou ou a sua falta justificada em dias de feriado obrigatório (1 de Maio, 1 de Outubro de 2001; 1 de Janeiro, 12 a 14 de Fevereiro, 1 de Maio, 1 de Outubro de 2002; 1 de Janeiro, 1 a 3 de Fevereiro e J de Maio de 2003), por esse efeito, a maneira da calcu1a é (dias de feriado legal não gozados durante o período de prestação de serviços (6 dias por ano que o Autor pediu) - dias de feriado gozados) x salário diário (salário mensal / 30) x 3 = Valor da compensação. Por isso, a Primeira Ré tendo necessidade de pagar ao Autor um montante de MOP10,042.50 por causa da prestação de serviços no feriado obrigatório durante 15 de Abril de 2001 a 21 de Julho de 2003.

22 - Ora, estando provadas as dispensas ao trabalho ainda que autorizadas e justificadas e apesar dos registos emitidos pelos Serviços de Migração indicarem as entradas e saídas do Recorrido no território, não pode o Tribunal a quo, a partir destes registos, considerar que os mesmos possam substituir o registo de assiduidade do Recorrido, isto porque estando provado que o Recorrido dava faltas ao serviço sem que estejam definidos em que dias foram tais faltas dadas, o Tribunal a quo não pode basear-se em tal documento já que o mero facto de o Recorrido se encontrar em Macau não significa que não tenha faltado ao trabalho. E do mesmo modo como pode o Tribunal a quo saber que tais faltas ou ausências não tenham ocorrido em algum dos feriados obrigatórios?
23 - Verifica-se assim, salvo melhor e douta opinião, uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento da matéria de facto por palie do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal e em quantia indefinida quanto aos feriados obrigatórios, já que o mesmo raciocínio se aplica a este pedido de crédito, em violação do princípio do dispositivo consagrado no art.º 5º do CPC e, bem assim, o disposto nos artigos 17º e 19º do DL 24/89/M. Devendo assim a sentença ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do peticionado quanto à compensação sobre a prestação de trabalho do recorrido em dias de feriado obrigatório.
24 - Quanto ao trabalho por turnos e trabalho extraordinário no que diz respeito à reclamação das compensações reclamadas pela prestação de trabalho em regime de turno e trabalho extraordinário, à semelhança do ocorrido com os demais pedidos, o Recorrido limitou-se a invocar factos genéricos, ou seja, Recorrido não alega especificadamente quais os factos que permitam concluir que tenha direito a pedir qualquer tipo de compensação a esse título, isto porque o Recorrido não especifica datas, dias de trabalho efectivamente prestado, quando é que tais turnos coincidiam e quais os dias. Não sendo por isso possível apurar quais as horas que o Recorrido teria trabalhado a mais ou a menos, dada a falta de prova em julgamento. E mais, se se comprovou que o Recorrido dava faltas ao serviço (ainda que justificadas) não se vislumbra como pôde o Tribunal determinar com certeza quais os dias em que estava de turno e quantas horas extraordinárias foram feitas por dia. Não se provou em concreto quantos dias o Autor prestou a sua actividade pelo que não se pode com certeza afirmar quantos ciclos de 21 dias de trabalho continuo e consecutivo prestou durante a relação de trabalho até 21/07/2003. Motivo pelo qual também aqui o Tribunal andou mal ao condenar a Recorrente, em violação do artigo 5.º do CPC e do artigo 10.º do DL 24/89/M, devendo assim ser revogada e substituída por outra que absolva as Recorrentes do peticionado, ou que tão-somente condene Recorrente a pagar ao Recorrido compensação que se venham a liquidar em sede de execução de sentença, nos termos do preceituado no nº 2 do artigo 564º do CPC.
25 - Com o devido respeito, a decisão em crise padece ainda do vício de falta de fundamentação por manter na íntegra as conclusões incoerentes aduzidas pelo Autor em sede de petição inicial, ficando por apurar algumas questões vícios que a seguir se enumeram: (i)Ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da Ré;(ii)Quantos foram esses dias de faltas justificadas que vêm referidas pelo Digno Tribunal a quo na decisão sobre a matéria de facto? Ou seja, esta decisão, por essa razão, padece também de vício de falta de fundamentação decorrente do ónus de alegação por parte do Recorrido, sendo, por isso, nula.Com efeito, neste particular não poderemos deixar mencionar a solução adoptada nos processos que correram termos nesse Venerando Tribunal de Segunda Instância sob os números 313/2017, 326/2017 e 341/2017, em tudo semelhantes as presentes autos. Ressalvando o devido respeito por opinião diversa parecem não subsistir dúvidas que se impõe a anulação do julgamento, por imposição do estatuído no art. 571º, b) do CPC, por forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestados pelo Recorrido.

26 - Ou, caso assim não seja entendido. Face ao acima exposto a decisão em crise padece do vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, conforme estipulado no artigo 571º, nº 1, alínea c) do Código de Processo Civil, pois existe total contradição entre o que foi dado como provado pelo Digno Tribunal a quo e o que foi decidido, já que tendo ficado provado em relação à 1ª Ré a matéria constante no quesito 10º, que para além dos períodos de 24 dias de férias anuais o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem e autorização, ou seja, tendo ficado provado que o Autor deu faltas justificadas ao serviço (...) como pode tribunal a quo apurar os dias de efectivo trabalho do Autor e assim condenar a Ré B no pagamento da compensação relativa ao subsídio de alimentação, ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, ao descanso compensatório, ao trabalho prestado em dia de feriado e trabalho extraordinário por turnos, á compensação da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo, tal como se alude na douta sentença recorrida?
27 - Ressalvando sempre o devido respeito por opinião diversa, parecem não subsistir dúvidas que se encontra a douta sentença ferida de nulidade nos termos e para os efeitos do artigo 571º, nº 1, alínea c) do Código de Processo Civil, pelo que deverá a mesma ser revogada nesta palie e substituída por outra que absolva a 1ª Ré B do peticionado a título de subsídio de alimentação, ao trabalho prestado em dia de descanso semanal, ao descanso compensatório, prestado em dia de feriado e trabalho extraordinário por turnos.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em conformidade, deverá ser declarada nula a sentença recorrida nos termos do disposto no artigo 571º, n.º 1 al. e) do CPC ex vi artigo 43º do CPT, quanto aos créditos reclamados a título de subsidio de efectividade, e ainda,

deverá ser declarada nula a sentença recorrida nos termos do disposto no artigo 571º, n.º 1 al. b) do CPC, ex vi artigo 43º do CPT,
ou
Caso assim não seja entendido, deverá ser declarada nula a sentença recorrida nos termos do disposto no artigo 571º, n.º 1 al. c), ex vi artigo 43º do CPT, com as demais consequências legais.
Sem prescindir, e caso assim não se entenda, deverá ser revogada a sentença recorrida nos termos supra explanados, com as demais consequências da Lei,
Termos em que farão V. Exas. a costumada Justiça!”
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Não houve resposta ao recurso.
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Cumpre decidir.
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II – Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
“1). Entre 3 de Dezembro de 1998 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (A).
2). Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes por parte da 1.ª Ré para a 2.ª Ré, com efeitos a partir de 21/07/2003 (cf. fls. 39 a 41, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido) (B).
3). Desde 22/07/2003, o Autor esteve ao serviço da 2.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (C).
4). Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pela 1.ª Ré (D).
5). Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés (E).
6). O Autor foi recrutado pela D, Lda. – e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/98 (1º).
7). O referido contrato de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente (2.º).
8). A data da cessão de funções do Autor junto da 2.ª Ré era de 12/04/2004 (3.º).
9). Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés (4.º).
10). Os locais de trabalho do Autor eram fixados de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades (5.º).
11). Ao longo do período que prestou trabalho, as Rés apresentaram ao Autor contratos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação (6.º).
12). Os contratos individuais de trabalho apresentados ao Autor eram idênticos para os demais trabalhadores não residentes, guardas de segurança do Nepal (7.º).
13). Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de MOP$7.500,00 a título de salário de base mensal (8.º).
14). Resultada do ponto 3.4 do Contrato de Prestação de Serviço n.º 5/98, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) (…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço (9.º).
15). Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés (10.º).
16). Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade (11.º).
17). Entre 22/07/2003 e 12/07/2004, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade (12.º).
18). Resultada do ponto 3.1 do Contrato de Prestação de Serviços n.º 5/98, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de (…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação (13.º).
19). Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação (14.º).
20). Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer tipo de alimentos e / ou géneros (15.º).
21). Entre 22/07/2003 e 12/07/2004, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação (16.º).
22). Entre 22/07/2003 e 12/07/2004, o Autor prestou a sua actividade nos Casinos que não disponibilizavam comida nas cantinas (17.º).
23). Entre 03/12/1998 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, nem um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição (18.º).
24). Entre 03/12/1998 e 31/12/2002, o Autor prestou a sua actividade de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré (19.º).
25). Entre 03/12/1998 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal (20.º).
26). Entre 03/12/1998 e 21/07/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Anos Novos Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré (21.º).
27). Durante o referido período de tempo, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriados obrigatórios (22.º).
28). Entre 22/07/2003 e 12/07/2004, o Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Anos Novos Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré (23.º).
29). Durante o referido período de tempo, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriados obrigatórios (24.º).
30). Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau (25.º).
31). Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD$750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento” (26.º).
32). A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego (27.º).
33). Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia (28.º):
Turno A: das 08h às 16h
Turno B: das 16h às 00h
Turno C: das 00h às 08h
34). Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pelas Rés (29.º).
35). Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo (30.º).
36). Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho durante dois período de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos (C-B) e (B-A) (31.º).
37). As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e / ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo (32.º).
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III – O Direito
1 – Do subsídio de alimentação
Advoga a recorrente que, face à matéria do art. 10 da BI (facto 15), estando apurado que o autor terá dado faltas ao trabalho, embora com autorização das rés, então não podia a sentença apurar, tal como o fez, o número de dias em que o recorrido prestou trabalho para o ca´lculo do subsídio em epígrafe.
Tem razão, tal como este TSI tem vindo a decidir. Com efeito, segundo, por exemplo, o teor do Ac. do Ac. do TSI, de 14/06/2012, Proc. nº 376/2012 ““Ora, este subsídio tem uma função social radicada numa despesa alimentar efectuada por causa da prestação de trabalho efectiva1. E embora tenha havido por parte da jurisprudência alguma tendência para o considerar prestação retributiva, a verdade é que nem por isso outra a associava, mesmo assim, à noção de trabalho efectivo, tal como, por exemplo, foi asseverado no Ac. da Relação de Lisboa de 29/06/1994, Proc. nº 092324 “ Quer a Jurisprudência, quer a Doutrina têm vindo a entender que o subsídio de alimentação, sendo pago regularmente, integra o conceito de retribuição .... Porém, estando ligada essa componente salarial à prestação de facto do trabalho, só será devida quando o trabalhador presta serviço efectivo à entidade patronal…”.2.
Com o art. 260º do Código do Trabalho Português, o panorama mudou de figura, pois o nº2, do art. 260º deixou claro que esse subsídio não devia ser considerado remuneração, salvo nos casos em que o seu valor excede o montante da despesa alimentar. E assim, terá ficado mais claro que ele só é assumido pelo empregador por causa da prestação efectiva de trabalho. Ele “visa compensar uma despesa diariamente suportada pelos trabalhadores quando realiza a sua actividade”3. Ou “…visa compensar uma despesa na qual o trabalhador incorre diariamente, sempre que vai trabalhar…” (destaque nosso)4.
Em Macau, não está regulada a atribuição destes subsídios, mas não cremos que o sentido da sua natureza que melhor se adequa à geografia local é aquele que atrás descrevemos. Por conseguinte, por não estar regulada na lei (DL nº 24/89/M), nem no referido contrato de prestação de serviços nº 45/94 (fls. 137 e sgs. dos autos), deveremos considerá-lo como compensação pela prestação de serviço efectivo.
Logo, da mesma maneira que deverá descontar-se o subsídio nos períodos de férias ou naqueles em que a pessoa está de licença de maternidade, também ele deve ser subtraído quando o trabalhador não prestou serviço por outra qualquer razão5.”
A ré/recorrente manifesta-se contra a sentença, por considerar que o autor, conforme a matéria de facto provada, chegou a faltar alguns dias ao serviço, mesmo com justificação ou autorização.
Mas, o acórdão deste TSI de 29/05/2014 (Proc. nº 627/2013) deu a resposta para esta questão:
«Contrariamente ao sustentado, não será de afirmar que se retira necessariamente do facto de o autor não faltar sem ser autorizado o facto implícito de ter faltado…. Esse facto pode ser compatibilizado … se dele se retirar que aí se enuncia uma regra que não deixou de ser observada: o trabalhador não podia faltar sem autorização; o trabalhador não faltou sem autorização; se faltasse tinha que ser autorizado. Daqui não se pode concluir que faltou autorizadamente, ou seja, que alguma vez tenha usado essa faculdade». Foi uma solução que seguida foi também no Ac. de 19/06/2014, no Proc. nº 189/2014, e no Ac. de 29/05/2014, Proc. nº 627/2013.
Sucede, contudo, que tal solução não dá resposta segura às situações em que tenha havido gozo efectivo dos dias de descanso anual e de feriados obrigatórios. Por outro lado, estamos em crer que uma leitura mais objectiva da resposta ao art. 7º da BI permite concluir que o trabalhador terá dado algumas faltas ao serviço, ainda que com autorização.
Assim, a melhor solução é aquela que propende para remeter a fixação da indemnização a este título para execução de sentença (assim foi decidido, por exemplo, nos Acs. de Ac. de 13/03/2014, Proc. nº 414/2012, 24/04/2014, Proc. nº 687/2013, 29/05/2014, Proc. nº 168/2014, 24/07/2014, Proc. nº 128/2014)”.
Fazemos nossa a fundamentação acabada de transcrever. Com efeito, a resposta ao art. 10º da BI (facto 15 da sentença) mostra que “durante todo o período em que o A prestou serviço, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés” Ora, isto significa que o autor deu faltas ao trabalho, embora com consentimento.
E não podia o tribunal deixar de levar este facto - incluído em nota 3 de rodapé, conforme pág. 9 da petição – na devida consideração. Deveria o tribunal ter efectuado a quesitação destes (30) dias de faltas em cada ano, para que o autor pudesse demonstrar quais foram os dias em que terá sido dispensado ao serviço. Foram realmente 30 dias de faltas autorizadas e não autorizadas por cada ano civil em média? E trabalhou, portanto, efectivamente, apenas 1572 dias, como ele mesmo dizia (art. 44º da p.i.)? Não sabemos.
Assim, deverão os autos voltar ao TJB para este exclusivo efeito (neste sentido, v.g., Ac. do TSI, de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017 e 313/2017; também Ac. do mesmo TSI, de 19/04/2018, Proc. nº 1001/2017, entre outros).
*
2 – Do subsídio de efectividade
Considera a recorrente que a sentença não podia ter levado em conta o salário diário de MOP$ 257,50 para o apuramento deste crédito salarial, uma vez que o autor o tinha reclamado o respectivo crédito laboral com referência ao valor de MOP$ 100,00 diários. E, assim, o “quantum” a apurar não podia ser aquele que a sentença alcançou de MOP$27.810,00( MOP$257,50x4x27), mas sim, e apenas, o de MOP$ 10.800,00 (100,00x4x27).
Não tem razão. Com efeito, em nossa opinião, o cálculo efectuado pela 1ª instância obedece ao que a lei estabelece. Ou seja, as contas da sentença estão certas e correspondem à verdade dos factos matemáticos (leia-se, dos números), quer dos meses a considerar para este efeito, quer dos quantitativos a ter em consideração no que respeita ao valor salarial mensal. Sucede, efectivamente, que, por o resultado ultrapassar o peticionado, a sentença procedeu à redução da compensação ao limite do petitório, face ao disposto no art. 564º, nº1, do CPC.
Sendo assim, a compensação a atribuir a este título será de MOP$ 22.400,00, exactamente como foi decidido, sendo irrelevante que os valores parciais invocados pelo recorrente (especialmente, o valor da remuneração diária) estejam abaixo dos valores adequados. Para este efeito, o que conta é a pretensão final, o montante do pedido.
Improcede, pois, o recurso quanto a esta parte.
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3 – Do trabalho prestado em dias de trabalho semanal, dias de descanso compensatório e em dias de feriado obrigatório
Neste passo, entende a recorrente que não podia a sentença proceder ao cálculo destes créditos, sem se apurar previamente o exacto número dos dias de trabalho efectivamente prestado, visto que se mostra provado que o autor sempre deu faltas, embora consentidas ou justificadas.
Isso é verdade. Efectivamente, como decorre do facto 15 (10º da BI), nunca o autor deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das rés, o que revela que houve ausências ao trabalho.
Importa, por isso, que os autos baixem à 1ª instância para apuramento desses dias de ausência ao serviço (quantos e quando), porque só então será possível, sem necessidade de recurso à equidade, arbitrar a compensação devida.
*
4 – Do trabalho por turnos e extraordinário
São aqui vazadas as mesmas razões que foram invocadas nos pontos anteriores. Consequentemente, e porque não se justifica nenhuma adicional fundamentação, por identidade de fundamentos somos a acolher a pretensão da recorrente.
*
5 – Na nulidade da sentença
Aos fundamentos trazidos pela recorrente, e baseada nas mesmas considerações, acrescenta a nulidade do julgado, nos termos do art. 571º, nº1, al. c), do CPC.
No entanto, o que a sentença revela não é uma oposição entre decisão e fundamentos, mas sim, e como já visto, um erro de julgamento face aos factos provados.
Isto basta para, sem mais considerandos, negar razão à recorrente.
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IV- Decidindo
Face ao exposto acordam em:
1 – Anular parcialmente a sentença na parte referente à atribuição da compensação pelos créditos laborais a título de subsídio de alimentação e de trabalho prestado em dias de descanso semanal, compensatório, feriados obrigatórios e por turnos e extraordinário.
2 – Determinar que à Base instrutória seja aditada a matéria necessária ao apuramento dos dias (quando e quantos) em que o autor gozou as férias e com consentimento faltou ao serviço, a fim de que quanto àqueles créditos possa, finalmente, ser fixada a devida compensação.

3 – Julgar não provido o recurso na parte restante, mantendo-se ainda a sentença na parte não impugnada.
Custas pela recorrente, em função do decaimento.
T.S.I., 01 de Novembro de 2018
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong





1 Neste ponto, corrige-se a posição anteriormente tomada no proc. nº 781/2011.
2 No sentido de que só deve ser pago nos períodos de prestação efectiva de serviço, ainda Ac. R.P. de 6/05/1995, Proc. nº 9411201; É por isso que ele não deve ser pago nos subsídios de férias e de Natal (Ac. R.E., de 21/09/2004, Proc. nº 1535/04-2).
3 Luis M. Telles de Meneses Leitão, in Direito de Trabalho, Almedina, 2008, pag. 349. No mesmo sentido, Bernardo da Gama Lobo Xavier, Manual de Direito do Trabalho, Verbo, pag. 547 e Diogo Vaz Marecos, in Código do Trabalho anotado, Coimbra Editora e Wolters Kluver, pag. 662-663.
4 Pedro Romano Martinez e outros, in Código do Trabalho anotado, 5ª edição, 2007, pag. 498.
5 A não ser nas situações em que a não prestação se fica a dever a causa imputável ao empregador e em que, apesar disso, o trabalhador teve que efectuar a despesa alimentar.
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434/2018 26